Burocracia deixa Brasil atrás do Vietnã e países da África na ciência

Em 2015 o Brasil ficou em 75ª lugar no ranking do Relatório Global de Competitividade, divulgado pelo Fórum Econômico Mundial
 
Jornal GGN – Um trabalho realizado pelo Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) em 2010 e repetido em 2014 com 165 cientistas de 35 instituições de pesquisa de 13 Estados apontou a alfândega como um ponto estratégico para a dificuldade de se desenvolver ciência e tecnologia no país. Praticamente todos os entrevistados (99%) declararam que precisam de matérias primas importantes para pesquisas sendo que 76% já perderam encomendas por causa do longo tempo de espera em que os produtos importados ficaram retidos – 98% afirmaram que já deixaram de realizar alguma pesquisa por conta deste problema. 
 
A matéria à seguir, do jornal O Tempo, traz mais dados preocupantes da pesquisa, como por exemplo a forma como os impostos atrasam o desempenho da ciência no país. Por conta dessa barreira, o valor final de um produto desenvolvido no Brasil pode chegar a três vezes mais do que é investido por cientistas nos Estados Unidos. Em 2015 o Brasil ficou na 75ª posição do ranking do Relatório Global de Competitividade, divulgado pelo Fórum Econômico Mundial. Foi a pior marca já alcançada pelo país que, segundo levantamento da Thomson Reuters, está na 13ª posição entre as nações com maior produção científica.  
 
O Tempo
 
Burocracia deixa o país na lanterna do desenvolvimento
 
Papelada, morosidade e impostos atrasam pesquisas que melhorariam a vida da população, e Brasil fica atrás de países como África e Vietnã na ciência
 
Por Litza Mattos
 
Um cientista, uma ideia, uma pesquisa e muita burocracia pelo caminho. Ano após ano, os exemplos de dificuldades operacionais se multiplicam nos laboratórios científicos pelo Brasil, impedindo que pesquisadores promovam avanços que poderiam alçar o país à vanguarda da inovação. Esses obstáculos desestimulam novos e veteranos estudiosos, que acabam optando pelo êxodo científico, gerando atrasos significativos no desenvolvimento nacional. Com a posse de Michel Temer na Presidência, o Ministério da Ciência se fundiu com a pasta das Comunicações, levando pelo menos 13 associações científicas a publicar uma carta de repúdio à medida, reclamando de rebaixamento. O TEMPO trará, nas próximas semanas, uma série de reportagens abordando um tema negligenciado a preço alto: a burocracia na prática da ciência no Brasil.
 
A burocracia é determinada no dicionário como o “excesso de papelada e de exigências que tornam morosos os serviços prestados pelos órgãos públicos e privados”. Essa definição reflete como o problema está praticamente institucionalizado no país, e exemplos não faltam.
 
A atual epidemia de dengue e zika são casos emblemáticos desse atraso, pois o país já poderia ter desenvolvido uma vacina contra os males do Aedes aegypti, o que vem sendo feito por institutos de pesquisa de outros países, como Estados Unidos e Índia. Embora existam, os estudos com esse objetivo no Brasil andam a passos lentos. E na corrida pelo desenvolvimento científico não existe segundo lugar: uma nova descoberta pode dar fim à pesquisa de uma vida inteira.
 
Um levantamento realizado pelo Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) em 2010, e repetido em 2014 com 165 cientistas de 35 instituições científicas de 13 Estados, mediu o problema e mostrou que as alfândegas são um dos principais gargalos. O trabalho apontou que 99% dos cientistas precisam importar materiais para suas pesquisas regularmente (células, equipamentos, micro-organismos e reagentes, por exemplo). Mas, como 76% deles já perderam encomendas devido ao tempo excessivamente longo de retenção das importações, não é de se espantar que 98% tenham deixado de realizar alguma pesquisa (ou parte dela) por causa desses problemas.
 
Os impostos também despontam como outra barreira. O valor final do produto pode alcançar até três vezes o que é pago por cientistas nos Estados Unidos e na Europa. Em países em desenvolvimento, os pesquisadores chegam a pagar 70% mais do que seus colegas de nações desenvolvidas para ter suprimentos idênticos, de acordo com uma pesquisa realizada pela revista científica “Nature”.
 
O mais irônico, segundo a chefe do laboratório nacional de células-tronco embrionárias da Universidade de São Paulo (USP), Lygia da Veiga Pereira, é que essas limitações todas são impostas pelo grande financiador das pesquisas: o governo federal. “Criou-se um labirinto legal para importações que não distingue um pesquisador de um potencial contrabandista. E, assim, o governo dá um tiro no pé e no desenvolvimento científico do Brasil”.
 
Lygia espera há mais de um ano por uma bomba de vácuo para dar continuidade a seus estudos com células-tronco. “O governo me ‘deu’ esse dinheiro para a compra do equipamento, mas, nesse período de espera, o dólar passou de R$ 2 para R$ 4”, afirma. A cientista acredita que, se o equipamento tivesse sido liberado há um ano, custaria cerca de 30% menos
 
Por isso, não basta o Brasil estar na 13ª posição entre os países com maior produção científica, conforme levantamento da Thomson Reuters. A competitividade rege a área, pois ciência, tecnologia e inovação são verdadeiros motores das economias dos países desenvolvidos.
 
No último ano, o Brasil atingiu sua pior posição no ranking do Relatório Global de Competitividade, divulgado pelo Fórum Econômico Mundial, chegando ao 75° lugar – uma queda inédita de 18 posições – entre as economias mais competitivas do mundo. A pior colocação, até então, tinha sido o 72º lugar de 2007. O melhor resultado foi alcançado em 2012 – 48º lugar. Em termos de inovação, o país está abaixo do México, Índia, África do Sul e Rússia, e de economias menores como Uruguai, Peru e Vietnã.
 
Mudança de foco. Com um doutorado nos Estados Unidos, a pesquisadora Lygia da Veiga conhece outra realidade. “Se você quer mudar seu experimento, no dia seguinte o reagente está na sua bancada. Aqui, quando isso acontece, são pelo menos dois meses”, diz. O sistema dos norte-americanos não deixa o cientista perder tempo com burocracia. “O pesquisador brasileiro tem uma carga administrativa horrível. Sua inteligência é usada mais para tentar viabilizar o projeto do que para pensar a ciência de verdade. O prejuízo é enorme. Aqui, chego a gastar um terço do meu dia lidando com questões burocráticas”, estima. Uma prática que os pesquisadores costumam usar com frequência, segundo Lygia, é aproveitar algum colega em viagem ao exterior para trazer materiais. “A ciência é zero burocrática, ela é metodológica, segue métodos; já a burocracia é um inventado”, afirma.
 
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Redação

5 Comentários

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  1. Burrocracia não mata só a ciencia

    Só no segundo semestre de 2013 as concessões de infraestrutura acertaram o passo, com um atraso de pelo menos dois anos. O governo sente na carne a tremenda ineficiência gerada pela complexidade da administração pública que construiu.

    Talvez seja isso que tenha levado a candidata à reeleição, Dilma Rousseff, a colocar como parte importante do seu Plano de Transformação Nacional, o programa Brasil sem Burocracia.

    Um pequeno (mas significativo) exemplo de como as agências do governo batem suas cabeças duras, é a narrativa cheia de peripécias feita pela excelente jornalista Lu Aiko Otta (“O Estado de S. Paulo”, 22/6, pág. B12), do esperado asfaltamento de cerca de três quilômetros de acostamento no chamado Morro dos Cavalos, nas vizinhanças de Florianópolis e de um território dos indios guaranis. Depois de quatro décadas foi parar, a pedido do Ministério da Justiça, na Casa Civil da Presidência da República.

    O “imbróglio” começou quando – ainda nos anos 70 – o Dnit pensou que tivesse conseguido as licenças necessárias para fazer a obra. Ledo engano. Ela foi embargada pelo Ministério Público Estadual! Envolveram-se, depois a Funai, o Ibama, a Advocacia-Geral da União e “tutti quanti”. Hoje, depois de 40 anos, há uma esperança que o acostamento será feito nos próximos cinco anos pelo próprio Dnit!

    A crise do Estado brasileiro só será debelada quando a sociedade se convencer de que são necessárias mudanças institucionais

    Quase duas décadas de gestões modernizantes e não autoritárias da economia ainda não conseguiram recolocar definitivamente o Brasil numa trajetória sustentável de desenvolvimento. De onde vem essa herança maldita? Ainda estão em ação os vícios em meio aos quais foi formada a nação brasileira.

    Depois da redemocratização política, da estabilização da economia, da abertura parcial dos mercados, da inserção (ainda tímida) do país na economia global, será preciso agora, discutir o Estado no Brasil. E como romper as maldições do passado.

    A ausência de um feudalismo e de uma revolução burguesa em Portugal concedeu ao Estado brasileiro, desde a origem, um poder centralizador inquestionado. Sem ameaças regionais e sem reivindicações de classes, foi muito fácil consolidá-lo, não foi preciso fazer concessões à Nação para legitimar-se. Erigiu-se um “governo das elites”, estabeleceu-se um fosso entre ele e a volumosa massa populacional obsequiosa e cordial.

     A apropriação estamental da máquina pública é uma deformidade de origem da qual o país ainda não se curou.

    Toma-se posse de cargos públicos para a obtenção de vantagens pessoais.

    O Estado foi, durante séculos, o agente do subdesenvolvimento brasileiro, porque o tipo de colonização introduzido aqui não foi o de ocupação, mas o de exploração.

    Mesmo hoje, o Estado é um entrave ao crescimento sustentado.

    O capitalismo brasileiro é de Estado, improdutivo e caçador de rendas.

    O que não vai mudar é o capitalismo de compadrio.

     

    Conheça as 25 empresas que mais receberam verba do BNDES em 2013, o banco de desenvolvimento do governo brasileiro, gasta dois terços de seu orçamento total em grandes empresas. 

    A situação chegou neste ponto porque desde Getulio os politicos vem criando leis demagogicas e oportunistas, para sairem bem na foto, e se manterem mamando nas tetas dos bens publico. Nasceu o politico profissional e a informalidade. Sindicatos fortalecem categorias de trabalhadores, quem não faz parte do corporativismo sindical fica desprotegido e relegado as inteperies economicas. Como não é possivel favorecer todos os trabalhadores brasileiros com estas leis demagogicas a informalidade não acaba.

    Quando se fala em ajuste do mercado de trabalho, na proteção trabalhista, entra-se em um terreno que foi historicamente o responsável pela situação desastrosa da atualidade. No Brasil como um Pais colonial, formado em bases paternalistas, sustentado por elites que agregavam a riqueza e o poder, desde as capitanias hereditárias passando pelos latifúndios.

    Os sindicatos posteriormente herdaram esta postura nociva de paternalismo para os apaniguados, excluído do banquete quem não faz parte da panelinha. Os políticos, então vieram na cola e oportunisticamente, para ficarem bem na foto diante do eleitorado patrocinaram leis e continuam patrocinando, sem querer saber quem paga a conta.

    É evidente de quem paga a conta é o lado menos forte da corda.

    O Governo não criou mecanismos para as empresas sobreviverem ao mercado sem pagarem impostos abusivos, se focou em carteiras assinadas por construção civil e indústria automobilística, e o resto? não existem outras áreas? Carga tributária mil…só quem tem empresa sabe das dificuldades interminaveis.

    Quem tem empresa e não tem benefícios fiscais, está em apuros. 

    A experiência sacrificial de um pequeno empresário, nesta terra de ninguém, tem muito mais peso do que o mais pomposo discurso de economia teórica.

    Desde a pequena quitanda até as gigantes corporativistas como a Petrobrás, estão sujeitas as mesmas leis do mercado, o diferencial é a responsabilidade da gestão e o tamanho dos desvios monetários na hora de se fazer o balanço anual.

    O segredo do sucesso dos países adiantados é o fundamento de suas economias, todos eles possuem um mercado interno forte e pujante. Sem isto não existe pais forte economicamente.

    Se os governos não fizessem nada, além de apenas arbitrar as forças econômicas já seria um enorme ganho.

    Governo que interfere demais é semelhante o árbitro de futebol que quer aparecer mais do que os jogadores, geralmente só faz burrada, o bom jogo é aquele que corre solto, porem com uma arbitragem firme, que não favoreça nenhum dos lados.

    O pior defeito dos políticos brasileiros é fuçar nas vidas dos cidadãos, regulamentando até a hora de ir ao banheiro se aliviar dos prazeres da mesa. Comparem os políticos dos países mais civilizados, como Suécia, Suiça, Alemanha e até nosso vizinho Uruguai, com os nossos políticos que adoram se reunir para dar nome de rua e regulamentar até a respiração da pobre população.

    A BMW mesmo que estava implantando uma fábrica no país mostrou o tanto de documentos que precisou para implantá-la, chega a ser ridículo a burocracia do nosso país. 

    Com a longa crise que vem dos anos 70, arrefeceram-se os níveis de produção, o crescimento desacelerou no mundo, e o capital, que antes tinha ovos produtivos e os colocava num ninho para gerar mais produção, diminuiu esses ovos na produção e passou a colocá-los no ninho financeiro. O capital foi deixando de ser basicamente produtivo para se converter cada vez mais em capital financeiro. E o que sucedeu com os empresários que receberam uma cacetada diante da abertura? Reduziram níveis de produção e colocaram mais ovos na cesta financeira.

    É consenso que o Brasil está metido numa armadilha de baixo crescimento. Trata-se de políticas que estimulem investimentos em capital humano, físico, inovação e infraestrutura, melhoria dos serviços públicos, redução da burocracia e dos impostos incidentes sobre a produção, integração econômica internacional, estímulo ao capital de risco, modernização das instituições que encorajam o livre mercado e políticas fiscais responsáveis.

    Microeconomicamente, o Estado brasileiro ainda mantém uma estrutura usurpadora de renda. Vive mais em função de si mesmo do que no cumprimento de seu papel básico de transferência de recursos para políticas públicas promotoras de justiça distributiva. Macroeconomicamente, o Estado habituou-se a conviver com uma constante crise fiscal, antes refletida no financiamento inflacionário de seus gastos e hoje numa incapacidade de racionalizá-los e de controlar o custeio da máquina pública, em detrimento do investimento em infraestrutura e do planejamento de investimentos consistentes.

    A empresa brasileira foi submetida à maior carga tributária do mundo, à maior taxa de juros do mundo e ao câmbio.

    — No momento em que você aterrissa no Brasil você começar a perder tempo — disse o dono do restaurante BOS BBQ, que se mudou há três anos para o país.Se pudéssemos imaginar qual evento milagroso mudaria com a realidade brasileira, lembraríamos um estadista com o estilo de JK. Infelizmente aquele momento foi utilizado para se construir uma sede para os políticos e não a estrutura que beneficiasse todo o povo brasileiro.

    1. Com certeza a hegemonia do

      Com certeza a hegemonia do PMDB tem contribuido em muito para a manutenção da burocracia, o “criar dificuldade para vender facilidade”. Ninguém tem conseguido governar sem pedir – ou melhor, comprar – a benção desse partido, que vinha surfando na onda da fama de ser oposição desde a ditadura.

      Assumiu o protagonismo da volta às eleições diretas negociando o poder com o capitalismo armado que dera o golpe em ’64 tornando-se assim o atravessador da Democracia, como se fora seu único e legítimo dono por herança. A anistia aos miltares é a prova mais consistente dessa negociação. Michel Temer nem esconde quando diz que sabe negociar com bandido.

      – “Quer comprar um naco da democracia? Compra aqui, na nossa mão, só a gente tem e vende.”

      Quem sabe estamos conseguindo vencer esse partido? Fernando Haddad tem obtido algumas vitórias na cidade de São Paulo. Como toda hegemonia, todo império colonial e coronelista, o PMDB precisa ser dissolvido para que surja, cresça e se estabeleça, de forma natural e realmente legítima uma democracia no nosso país.

       

      P.S.: Temer é Cunha.

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