A gestão fiscal em 2012

Do Valor Econômico

‘Desafio fiscal é auxiliar crescimento’

Por Luciana Otoni e Ribamar Oliveira | De Brasília

Embora o valor do contingenciamento das verbas orçamentárias este ano ainda não tenha sido definido pelo governo, o secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin, garantiu que o corte não atingirá os investimentos. “Não haverá problema de espaço fiscal para os investimentos em 2012”, afirmou.

Augustin destacou, como fator importante para o ajuste das contas, a compreensão que o Congresso teve de não realizar uma nova rodada de reajuste salarial para o funcionalismo este ano. Segundo ele, essa decisão ajudará a acomodar a elevação das despesas provocadas pelo aumento do salário mínimo.

Para o secretário, o mix de política econômica definido pela presidente Dilma Rousseff em 2011, de maior esforço fiscal, foi bem sucedido, pois permitiu ao Brasil atravessar a turbulência internacional sem sobressaltos. Ele destacou que, no meio da crise, o Tesouro fez uma emissão de títulos no exterior com a menor taxa de retorno ao investidor da história.

Augustin afirmou que o governo trabalha “com a ideia de meta cheia” para o superávit deste ano, sem o desconto do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). O secretário avaliou que o maior desafio da política fiscal em 2012 será auxiliar o crescimento. Para ele, o mercado externo vê o Brasil como um país seguro que cresce. “Isso é o que a gente quer manter.”

Ele antecipou ao Valor que o estoque da dívida em títulos chegou em dezembro do ano passado com 65% da sua composição formada por papéis prefixados e indexados a índices de preços, um perfil que amplia a previsibilidade da gestão do passivo e reforça a solidez fiscal. A seguir, os principais trechos da entrevista.

“O custeio em 2011, na nossa visão, teve um comportamento adequado, pois caiu em relação ao PIB”

Valor: Qual será a característica do ajuste fiscal deste ano?

Arno Augustin: Ainda estamos avaliando isso. Não definimos o valor do contingenciamento. Vamos fazer essas avaliações a partir de alguns parâmetros. Um deles é definir o melhor mix da política econômica, como fizemos em 2011. No ano passado, fizemos superávit maior, inclusive aumentamos o primário ao longo do ano. Não há definição ainda sobre o mix da política econômica para este ano. Os parâmetros são a continuidade dos investimentos e o crescimento.

Valor: A proposta orçamentária foi preparada pelo governo com a previsão de alta do PIB de 5% este ano. Essa previsão será mantida?

Augustin: Estamos fazendo uma análise do conjunto dos parâmetros, inclusive do crescimento. A discussão não pode ficar apenas em estimar quanto vai crescer este ano, pois precisamos saber também como a expansão será distribuída ao longo do ano, como e quando haverá o impacto sobre a receita e qual é a base da receita. É preciso definir o próprio ritmo do superávit ao longo do ano, que nem sempre é igual de um ano para o outro. Em alguns momentos, aceleramos o superávit e tem algumas despesas que a gente pode fazer antes ou depois.

Valor: O ritmo de crescimento de 2012 e o comportamento da receita determinarão a velocidade do primário? Pode-se, então, fazer um primário mais fraco no primeiro semestre e maior no segundo dependendo da economia?

Augustin: Isso. Exatamente. É importante dar um sinal claro da solidez fiscal. Isso é relevante porque parte da crise tem a ver com isso. O Tesouro acabou de fazer um lançamento de títulos de dez anos no mercado externo, que teve taxa de retorno ao investidor de 3,45% ao ano. A menor da história, no meio da maior crise. Por que isso ocorreu? Porque, quando veio a crise, o Brasil fortaleceu o lado fiscal. Isso ajudou. Na sequência, as nossas empresas fizeram alguns lançamentos, a taxas em torno de 4,5% ao ano. A estratégia de fazer o fiscal um pouquinho mais forte em 2011 foi bem sucedida.

Valor: A partir de agosto do ano passado, o governo adotou um mix de política econômica com maior esforço fiscal. A ideia era que o maior ajuste abriria espaço para o BC reduzir os juros. Essa estratégia será mantida?

Augustin: A estratégia de 2011 foi bem sucedida. Qual a circunstância da economia em 2012 é algo que estamos avaliando.

Valor: O que pode determinar uma mudança do mix de política econômica?

Augustin: Essa não é a minha visão. É a visão unânime de todos os analistas do mercado de que o parâmetro principal é o ritmo do crescimento. E como nossa economia vai reagir à crise internacional.

Valor: Qual é o principal desafio na área fiscal em 2012?

Augustin: Auxiliar o crescimento. Manter a estabilidade fiscal com um melhor auxílio ao crescimento. O fiscal, estrito senso, pode ajudar o crescimento com a solidez. Vamos continuar vendo qual é a melhor forma de encarar o fiscal para que o objetivo de crescimento equilibrado seja mantido. A solidez fiscal de 2011 foi importante para o país manter boas condições em meio à crise. O mercado externo vê o Brasil como um país seguro que cresce. Isso é o que a gente quer manter. Segurança e crescimento, as duas variáveis são importantes. Alguns países são seguros, mas tem dificuldades de crescimento. Temos que manter essa dualidade: um país seguro que cresce. Esse é o nosso objetivo.

“Temos que manter essa dualidade: um país seguro que cresce. Esse é o nosso objetivo”

Valor: Em 2011 houve redução dos investimentos públicos em relação a 2010, mesmo com a elevação dos gastos totais. Qual foi a razão?

Augustin: Nós avaliamos que 2011 foi um ano bem sucedido, do ponto de vista fiscal. Essa consolidação fiscal é uma das razões pelas quais o Brasil pode enfrentar a crise internacional em situação favorável. Reconheço, no entanto, que o ritmo de crescimento dos investimentos em 2011 foi abaixo do que gostaríamos. Mas foi um ritmo normal, considerando um primeiro ano de gestão, de equipes novas. Em 2012, o ritmo dos investimentos continuará forte e essa nossa expectativa é baseada no fato de que, no início do PAC 1, os desembolsos demoraram um pouco. No PAC 2 está ocorrendo a mesma coisa.

Valor: A ideia do governo era reduzir os gastos de custeio para abrir espaço para os investimentos. Isso não foi possível em 2011?

Augustin: Não enxergo dessa forma. É preciso observar que o ritmo de pagamento dos investimentos é muito específico, pois há um problema de tempo. Há um tempo entre o início do investimento e o pagamento. Nenhum investimento deixou de ser feito por um problema de contingenciamento. Não houve falta de espaço fiscal para os investimentos. Também não enxergo um problema de espaço para a manutenção da ampliação dos investimentos em 2012. O custeio em 2011, na nossa visão, teve um comportamento adequado, pois caiu em relação ao PIB. Em 2012, as principais contas, de pessoal e da Previdência, estão sob controle.

Valor: O que está claro é que o esforço fiscal, seja qual for feito, não afetará o investimento. É isso?

Augustin: Essa norma continua.

Valor: O senhor disse que as grandes contas estão sob controle, mas houve elevação de 14% do salário mínimo este ano que terá grande repercussão nas despesas previdenciárias e assistenciais.

Augustin: Claro que o salário mínimo tem um impacto fortíssimo, mas dentro de uma conta que vem em queda, muito pela formalização do trabalho. Portanto, é uma conta sob controle. Vamos ter que acomodar o reajuste dentro das contas públicas, mas não acho que haverá dificuldade intransponível na área de custeio. O fato de não ter havido uma rodada forte de pessoal [de reajustes salariais do funcionalismo] é muito relevante. 2012 vai ser difícil por causa da crise e dos seus efeitos sobre o Brasil, que podem ser relevantes. Mas, especificamente por causa do perfil da despesa pública, estamos confiantes de que a estratégia vai continuar, de diminuir custeio, diminuir as principais contas e de ter espaço para investimentos.

Valor: As negociações salariais com o funcionalismo preocupam?

Augustin: De todas as conquistas de 2011, talvez uma das mais relevantes tenha sido que o Congresso compreendeu que não era o caso de abrir uma nova rodada de reajuste salarial dos servidores. Isso não é algo fácil. É difícil.

Valor: Os sindicatos dos servidores alegam que há uma defasagem de quase 25% dos salários em relação à inflação, de 2009 para cá.

Augustin: Não. Nenhuma categoria teve reajuste inferior à inflação.

Valor: Quando o senhor avalia que a situação fiscal é tranquila, o senhor está trabalhando com a obtenção da meta “cheia” de superávit em 2012, sem o desconto dos investimentos do PAC?

Augustin: Estamos trabalhando com a ideia de meta cheia.

Valor: Houve uma receita excepcional no ano passado. O senhor conta também uma receita excepcional este ano?

Augustin: A receita de 2012 tende a não ter o mesmo ritmo de crescimento de 2011. Isso é verdadeiro. Mesmo porque ela parte de uma base maior. Mas tudo isso estava na nossa programação. Não está acontecendo nada que não tivéssemos avaliado. Há efeitos da crise e isso pode ter impacto no crescimento e nas nossas receitas.

Valor: Houve uma desaceleração da receita no fim de 2011. Isso não é preocupante?

Augustin: Sim, é evidente que estamos atentos a esses movimentos. Este é um ano que vamos ter um cuidado grande nas projeções [de receita]. Também é verdade que há uma defasagem entre o fenômeno econômico e a repercussão sobre a receita.

Valor: O senhor está animado em fazer uma emissão no exterior de bônus denominado em real?

Augustin: Continuaremos com a estratégia de emissão de bônus.

Valor: Mas será uma emissão em real?

Augustin: Faremos uma emissão no próximo período. Não direi se será em real ou em dólar porque não decidimos.

Valor: A recente decisão de fazer os fundos extramercados se desfazerem das Letras Financeiras do Tesouro (LFT) irá acelerar, de forma expressiva, a parcela de títulos prefixados da dívida?

Augustin: Fechamos 2011 com mais de 65% de títulos prefixados e corrigidos pela inflação, sendo 37% de prefixados, 28% indexados a índices de preços e 4% corrigidos pelo câmbio. Foi o melhor resultado da composição da dívida desde o início da série, em 1994.

Luis Nassif

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