A guerra contra o real forte

Coluna Econômica

A lógica da guerra cambial mundial é um repeteco do que já ocorreu no pós-crack de 1929 e no início dos anos 70. No fundo, o movimento é o seguinte:

Os Estados Unidos possuem a moeda universal. Isso lhes dá o ganho da chamada «senhoriagem», isto é a receita decorrente da emissão da moeda.Antes da crise de 2008, já acumulava enormes déficits comerciais e fiscais, supridos por uma simbiose com a economia chinesa. Grande parte da economia industrial americana mudou-se para a China. De lá, passou a exportar para os EUA, gerando déficits comerciais. Para se financiar, o Tesouro emitia títulos públicos que eram adquiridos pela própria China – com os dólares acumulados na balança comercial.

A crise trouxe elementos novos no jogo. Primeiro, derrubou a economia norte-americana, jogando-a em enorme endividamento das familias, empresas e do Tesouro. De outro lado, obrigou o Tesouro a enormes emissões de dívida para salvar o sistema financeiro e as grandes empresas norte-americanas e à redução dos juros para quase zero.

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AgorAgora, os Estados Unidos convivem com dois problemas: uma economia combalidade, precisando exportar para gerar empregos, e uma endividamento altíssimo.

A saída encontrada foi o aumento da emissão de dólar.

As consequências são claras. Numa ponta, provoca uma desvalorização do dólar e, por tabela, de todo o estoque de títulos e ativos dolarizados. Pela desvalorização, aplica um semi-calote em todos os detentores de títulos públicos norte-americanos.

Na outra ponta, a desvalorização do dólar fortalece a produção interna, que torna-se mais barata em relação aos competidores externos.

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As consequências, no entanto, atingem as demais economias. Com mais dólar circulando e com mais dúvidas sobre a preservação do seu valor, o capital internacional busca ativos protegidos contra a inflação do dólar.

Um deles são as commodities internacionais – cujas cotações têm aumentado em ordem inversa ao do dólar. Quando o dólar cai, aumentam as cotações de commodities.

Outro, são ativos em moedas de outros países. Há bolhas especulativas explodindo na construção civil da China e de Hong Kong, ativos em reais e outras moedas afetadas pela desvalorização do dólar.

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Dentre todas as moedas, o real é o caso mais complicado. Primeiro, porque já valorizou mais do que devia, antes mesmo da eclosão da guerra cambial recente. Depois, porque o Banco Central continua mantendo as maiores taxas de juros das economias desenvolvidas – atraindo mais dólares ainda para cá.

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O Ministério da Fazenda ampliou a ofensiva contra a valorização do dólar, impondo IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) mais alto não apenas nas operações de renda fixa mas também nos mercados de derivativos (mercados altamente especulativos). Mas as taxas de juros e perspectivas de valorização do real são maiores do que a penalização do IOF.

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Ontem, a valorização do dólar internamente se deveu ao anúncio do governo chinês de aumentar em meio por cento ao ano a taxa de juros dos títulos públicos.

É um movimento que, a médio prazo, poderá fortalecer o yuan, reduzindo um pouco os estragos que a economia chinesa têm produzido nos seus parceiros comerciais. De imediato, poderá atrair para a China dólares que hoje inundam economias emergentes. 

Luis Nassif

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