As preocupações com o retorno do investimento em logística

Do Valor

Retorno de investimento preocupa os empresários

Por Gleise de Castro 

O pacote de R$ 133 bilhões em concessões de rodovias e ferrovias anunciado pelo governo em agosto foi saudado por usuários e especialistas em logística como demonstração da disposição do governo de investir de forma planejada e integrada no sistema logístico do país, um dos principais obstáculos à competitividade dos produtos brasileiros. Os detalhes, muitos deles ainda não definidos, é que suscitam dúvidas, como a divisão dos recursos entre governo e iniciativa privada e as taxas de retorno do investidor privado. Os investimentos serão feitos em 25 anos e a maior parte, R$ 79,5 bilhões, será aplicada nos primeiros cinco anos.

Apelidado de “PAC das Concessões”, o Programa de Investimentos em Logística – Rodovias e Ferrovias transfere à iniciativa privada 7,5 mil km de rodovias federais, com a aplicação de R$ 42 bilhões entre 2013 e 2038, dos quais R$ 23,5 bilhões já nos cinco primeiros anos. As empresas que assumirem a administração das estradas só poderão iniciar a cobrança de pedágio quando tiverem concluído 10% das obras. O plano prevê também a construção ou modernização de 10 mil km de linhas ferroviárias, com o desembolso de R$ 56 bilhões nos próximos cinco anos e mais R$ 35 bilhões entre 2018 e 2038. A malha brasileira hoje é de 28 mil km. Os novos trechos terão “acesso aberto”, rompendo com a regra de exclusividade na operação de cada linha. A Valec vai operar a nova malha, que poderá ser usada por diversas empresas.

As concessões rodoviárias somam nove lotes, formando grandes corredores articulados com outras estradas: BR-101, na Bahia; BR-262, no Espírito Santo e Minas Gerais; BR-153, em Tocantins e Goiás; BR-050, em Goiás e Minas Gerais; BR-163, no Mato Grosso; BR-163/BR-262/BR-267, no Mato Grosso do Sul; BR-060, no Distrito Federal, e BR-153, em Goiás e Minas Gerais; BR-262 em Minas Gerais; BR-116 em Minas Gerais; BR-040 no Distrito Federal, Goiás e em Minas Gerais. Para as ferrovias, o modelo será o da parceria público-privada (PPP) e incluirá a construção dos trechos norte e sul do ferroanel de São Paulo, o acesso ao porto de Santos (SP) e as ferrovias entre Lucas do Rio Verde (MT) e Uruaçu (GO); entre Uruaçu e Corinto (MG); entre Campos (RJ), Rio de Janeiro e Vitória; entre Belo Horizonte (MG) e Salvador (BA); entre Salvador e Recife (PE); entre São Paulo e Rio Grande (RS) e entre Belém (PA) e Açailândia (MA).

“O pacote foi uma excelente notícia porque, pela primeira vez, o governo pensa em implementar um plano logístico”, diz Manoel Reis, coordenador do Centro de Excelência em Logística da FGV/SP. Para ele, não estão claros no programa quanto do pacote caberá à iniciativa privada e também o retorno do investimento. “As taxas consideradas, de 5% a 6%, são vistas como muito baixas. Elas poderiam ir de 8% a 12%, níveis que a iniciativa privada considera válidos para remunerar os acionistas”, afirma.

Quanto às ferrovias, Reis diz que o plano indica que a rede toda será controlada pelo governo. Com isso, a expectativa é de que elas funcionem de modo integrado para operações de longa distância, “A ferrovia é muito competitiva para extensões acima de 500 quilômetros”, diz.

“O Brasil precisa dar uma virada na infraestrutura de transporte”, diz Bruno Batista, diretor executivo da Confederação Nacional do Transporte (CNT). Mas, a seu ver, os investimentos anunciados são insuficientes para uma melhora significativa. Estudo da entidade, de 2011, apontou a necessidade de o país investir R$ 405 bilhões em 748 projetos prioritários de transporte em todos os modais e obras de integração multimodal. “Sabemos que não dá para fazer isso de uma hora para outra, mas o governo precisa aumentar anualmente os investimentos porque os problemas tendem a se agravar. As rodovias estão sobrecarregadas.”

Levantamento da CNT, feito em junho e julho deste ano, mostra que 46% das estradas federais estão com pavimento deficiente. “A maioria das estradas é da década de 1970, projetada em outro momento, com uma população menor”, diz o diretor da CNT.

Para Hostílio Xavier Ratton Neto, professor associado do Programa de Engenharia de Transportes do Instituto Coppe, da UFRJ, rodovias e ferrovias precisam não apenas ser melhoradas, mas reconstruídas. “A maior parte da malha rodoviária foi projetada e construída há mais de 30 anos. Já houve muitas retificações e melhorias, como duplicações, mas ela está ultrapassada”, diz. Já a malha ferroviária, com mais de 50 anos de existência, para ele, é anacrônica. “A bitola da maior parte das linhas ferroviárias do Brasil é a bitola estreita, de um metro, que foi muito conveniente para as condições de projeto e construção e para os padrões de demanda e operação do século XIX, mas que não têm qualquer sentido hoje”, afirma.

Peter Wanke, coordenador do Centro de Estudos em Logística do Instituto Coppead de Administração da UFRJ, diz que o programa está no caminho certo, mas ainda há muito o que fazer. Para ele, um dos obstáculos, no caso das rodovias, é o prazo das obras, que considera ambicioso. “Quatro anos não é prazo típico de entrega de obras no Brasil”, diz.

Luis Nassif

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