O BTG tenta dar início à privatização da USP, por Luis Nassif

É hora de Justiça, Tribunal de Contas e mídia darem mais atenção ao conceito de bem público.

A partir de 2016, observou-se o maior assalto aos bens públicos desde as privatizações dos anos 90. Com uma mídia que perdeu o rumo sobre o que é interesse público, grupos financeiros têm avançado sobre bens essenciais em todas as pontas. 

Dentre todos os abusos, nada se compara à tentativa de privatização da Universidade de São Paulo tentada pelo BTG Pactual, em parceria com o governo Dória – o mesmo que pertencia privatizar o Instituto Butantã um pouco antes da explosão da pandemia.

A intenção do BTG é montar uma universidade particular dentro da Cidade Universitária, um tal de Instituto de Tecnologia e Liderança. Pelo projeto, oferecerá quatro cursos de graduação: Engenharia da Computação, Engenharia de Software, Ciência da Computação e Sistemas de Informação. Três dos cursos já são oferecidos pela Universidade de São Paulo (USP).

A notícia ainda não chegou à mídia, mostrando o extraordinário poder de convencimento do BTG Pactual. Colhi a informação no excelente Jornal do Campus, periódico dos alunos da Escola de Comunicação e Artes.

A intenção de André Esteves seria criar um MIT (Instituto de Tecnologia de Massachussets). Segundo entrevista concedida ao Brazil Journal: “Queremos formar futuros líderes e para isso vamos oferecer um ensino que vai além da computação, integrando ao currículo disciplinas como empreendedorismo, economia de mercado, estado de direito e sustentabilidade”. Para tanto, segundo declarou, teria investido R$ 200 milhões – valor inverossímil para um investimento que depende fundamentalmente de recursos humanos.

A intenção é óbvia.

Primeiro, apropriar-se da imagem da USP para alavancar seu instituto. Depois, apropriar-se do próprio conhecimento desenvolvido nos centros de pesquisa, Escola Politécnica, Instituto de Matemática, Instituto de Pesquisas Tecnológicas, através da convivência dentro do próprio campus.

Identificados os principais pesquisadores e as principais pesquisas, terá plenas condições de trazer para seu instituto, em detrimento da USP, privatizando um conhecimento público.

Nem se venha falar de maior eficiência do capital privado. Há uma ignorância ampla disseminada, que impede uma comparação adequa1da das características do capital privado e do público. O público obedece a metas públicas, desde que submetido a um projeto claro de desenvolvimento. O capital privado busca resultados imediatos. Esta é a razão das pesquisas acadêmicas estarem concentradas nas universidades públicas, estaduais e federais.

Vale para todas as empresas. Tome-se o exemplo da Eletrobras. Entra um presidente, visando privatizá-la,. Reduz substancialmente os investimentos. Com isso, compromete a segurança energética do país mas, em contrapartida, melhora o balanço e aumenta a distribuição de dividendos. E a ignorância rotunda classifica essa melhoria do balanço como sinal de eficiência, mesmo tendo sido obtida à custa de redução de investimentos.

Justamente por isso – e, secundariamente, pelo fato de serem gratuitas – as universidades públicas atraem a juventude com maior potencial de aprendizado.

O que o BTG pretende é atuar como um parasita, beneficiando-se da imagem da USP – afinal, é uma universidade erguida em pleno campus da USP -, da convivência com os pesquisadores da USP, podendo atrair, tirando da área pública os melhores pesquisadores. Mais que isso, a Politécnica e o IPT tem sido um criadouro de startups. Com sua universidade privada, o BTG terá todo esse estoque à sua disposição.

O episódio da licitação da Zona Azul foi um escândalo amplo, coonestado pelo Tribunal de Contas do Município e pelo silêncio reverente da mídia.

É hora de Justiça, Tribunal de Contas e mídia darem mais atenção ao conceito de bem público. 

Luis Nassif

4 Comentários

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  1. Luís, seria interessante fazer uma análise comparativa com os Institutos Tecnológicos da Vale. Eles foram criados dentro de parques de ciência e tecnologia (como o do Pará) e contrataram os melhores pesquisadores das universidades e institutos de pesquisa públicos – a valores quatro ou cinco vezes superiores ao salário pago pelo governo federal. Aproveitam-se do conhecimento desenvolvido e acumulado pelas instituições públicas (e das coleções e dos laboratórios também) e se apropriam de tudo isso em seu benefício. Pouquíssimo contribuem ou colaboram com as instituições públicas.

  2. É hora de Justiça, Tribunal de Contas e mídia darem mais atenção ao conceito de bem público. Está brincando Nassif. A mídia tem interesse no lucro da propaganda e no mercado educacional! Justiça? Por ela a unica coisa que não privatiza é o judiciário, só não sabe explicar como o estado vai pagar seus nababescos salários quando o estado falir

  3. Nassif, nas décadas de 90 e 2000, o MPSP interviu nas “fundações” ligadas à USP (FIPE, FIPECAFI, FIA e outras) que eram fundadas por professores dessas faculdades de economia e administração para prestar serviços para a própria USP e também vendiam cursos de MBA que eram ministrados dentro do Campus, com cobrança de mensalidade e tudo o mais. Com o tempo, essas fundações foram obrigadas a sair do campus e parar de usar o nome da USP para vender os projetos e MBAs.

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