Como a demografia impacta a economia

Por Assis Ribeiro

Do Zwela Angola

População: factor ou obstáculo do desenvolvimento económico

Avizinha-se a realização do primeiro censo populacional depois da independência e com ele a hora da verdade: quantos somos, como somos, como vivemos, onde estamos?

Como estas operações censitárias obedecem a regras estatísticas e metodológicas rigorosas e universalmente estabelecidas, depois dos resultados do censo tudo será diferente: maior rigor das políticas públicas, melhores bases de investigação social, aperfeiçoados suportes para os estudos empresariais de investimento, aproximações mais rigorosas às componentes do mercado político e de disputa eleitoral, etc. O debate sobre o crescimento populacional já vem desde Thomas Malthus e a sua visão catastrófica, segundo a qual, a longo prazo, toda a Humanidade morreria de fome, uma vez que a população crescia geometricamente, enquanto a produção de alimentos apenas aritmeticamente.

A lei dos rendimentos marginais decrescentes de David Ricardo ajudou a aprofundar o receio sobre as influências nefastas do crescimento demográfico sobre o crescimento económico e as condições de vida dos cidadãos. Provou-se, mais tarde, com o aparecimento da técnica, das tecnologias e da inovação, que a produção per capita de alimentos aumentou substancialmente e que hoje, com as enormes potencialidades que o fundo dos mares pode encerrar, o dilema malthusiano pode ter sido completamente ultrapassado.

No entanto, a população continua a merecer amplos debates, entre economistas, demógrafos, sociólogos, padres, ambientalistas e políticos, segundo prismas, evidentemente, diferentes. Que política demográfica devem os países seguir? Devem ser levantadas barreiras ao crescimento da população, em nome do aumento do nível de vida das gerações vindouras ou, pelo contrário, por razões éticas, morais e religiosas, o crescimento demográfico deve ser o que tiver de ser, devendo a economia ser capaz de prover as necessidades crescentes em bens de consumo privado e colectivo?

Como encarar o grave problema do envelhecimento da população e o aumento da esperança de vida nos países mais ricos e desenvolvidos? Com semelhante acuidade e actualidade se coloca o problema da preservação do ambiente, directamente relacionado com a qualidade de vida actual e futura: como se interage o (excessivo?) crescimento populacional com as naturais limitações em terra disponível para agricultar e habitar, em água potável para consumo humano, irrigação e produção de electricidade limpa e barata, em energia (o esgotamento do petróleo pode estar para mais breve do que se julga, a manterem-se os actuais níveis de consumo e os esperados pelo intenso crescimento económico das futuras potências económicas, Brasil, Rússia, Índia e China) e a biodiversidade?

Terra, água, energia e biodiversidade parecem estar sob o maior stress de sempre, e o crescimento da população parece ser a sua principal causa. O outro lado do debate enfatiza a circunstância de a população estar a diminuir nos países ricos e desenvolvidos, onde a taxa de fertilidade tem vindo a sofrer um declínio evidente no decurso dos últimos anos. Esta inversão demográfica vai desencadear pesadas consequências sobre os sistemas de segurança e previdência social, que deixarão de desfrutar, em escala devida, da sua principal fonte de reprodução e financiamento, a população jovem empregada.

Assim, parece que a solução demográfica nos países que se apresentam hoje numa fase de estagnação ou declínio populacional é fomentar o aumento das taxas de fertilidade. Quem tem razão, afinal? Há quem defenda que os que se preocupam com o excessivo crescimento populacional têm o melhor argumento.

As consequências com que se confrontam a Europa, o Japão, os Estados Unidos (em menor escala) e alguns países de rendimento médio sobre o envelhecimento das populações são controláveis. Além disso, os benefícios do crescimento mais lento da população têm mais peso do que os custos de ajustamento induzidos por um forte aumento demográfico.

Assim sendo, mesmo nos países onde as taxas de natalidade são actualmente baixas, os governos deveriam implementar políticas demográficas conservadoras, tendentes a preservar o ambiente, a diminuir o stress sobre a utilização de recursos não renováveis e outros tendencialmente esgotáveis, como a água, e a melhorar o nível de vida actual e futuro dos cidadãos.

Em alguma medida, a confusão entre estes dois pontos de vista quanto ao crescimento populacional reflecte as desiguais tendências demográficas em diferentes zonas do planeta. O crescimento populacional mais rápido está a verificar-se nas regiões mais pobres e, em especial, nos respectivos meios rurais, onde a taxa de fertilidade ultrapassa a cifra de seis crianças por mulher em idade de procriar.

As justificações estão repartidas por factores culturais e pelas insuficiências e lacunas das políticas demográficas dos governos. Dentre os primeiros avultam o trabalho infantil (as famílias rurais têm mais filhos porque os utilizam como fonte de trabalho e de geração de produção), os comportamentos reactivos face às elevadas taxas de mortalidade infantil (a circunstância de se ter mais filhos funciona como se fossem uma espécie de seguro contra o seu desaparecimento precoce6) e a solidariedade de grupo (muitos filhos são uma segurança para os pais quando atingirem a velhice).

Do conjunto dos segundos sobressaem o não acesso a métodos contraceptivos e de planeamento familiar, a falta de sistemas concretos e funcionais de segurança e previdência social, as limitações dos sistemas nacionais de saúde e de cuidados primários e a debilidade dos sistemas de educação, em especial na componente do género. Como consequência das elevadas taxas de fertilidade em África, o Departamento de População da ONU projecta uma duplicação da população africana, dos actuais 900 milhões de pessoas, para 1,8 mil milhões em 2050. A idade média dos africanos passará, no mesmo período, de 19 para 28 anos.

Na Europa, a tendência é de sentido inverso. A ONU prevê uma diminuição da população, dos actuais 725 milhões para 630 milhões em 2050. Com poucos filhos e uma esperança de vida mais longa, a idade média (ou a média das idades) da população aumentará significativamente, de 39 anos em 2005, para perto de 48 anos em2050. Para o mundo, no seu todo, prevê-se que a população continue a crescer e aumente em cerca de 2,5 mil milhões de pessoas entre 2005 e 2050. Todo este crescimento concentrar-se-á nos países em desenvolvimento: 1,3 mil milhões a mais na Ásia, 900 milhões a mais em África e o resto na América Latina e noutras regiões do planeta.

É neste ponto que os argumentos conservadores quanto ao crescimento populacional ganham mais sentido: mais 2,5 mil milhões de pessoas sobre o planeta colocarão enormes pressões sobre o meio ambiente, os recursos não renováveis e, mesmo, os recursos renováveis (como ainda é a água).

A maior utilização de energia já está a mudar o clima mundial de forma muito perigosa, porque, provavelmente, irreversível. Além disso, as pressões demográficas e o aumento dos rendimentos estão a conduzir ao rápido desflorestamento, à diminuição dos bancos de pesca, à degradação dos solos, à destruição dos habitats e à extinção de numerosas espécies animais e vegetais. Por isso, é que o crescimento populacional nas regiões mais pobres do mundo – principalmente em África e na Ásia – precisa de abrandar.

Algumas medidas públicas nesse sentido e que interagem com os factores culturais têm de ser implementadas: – extensão do acesso aos serviços de planeamento familiar ao maior número possível de pessoas, em particular, os mais pobres; – redução da mortalidade infantil, através do aumento e melhoria dos cuidados primários de saúde, com destaque para as campanhas de vacinação para debelar as doenças endémicas; – constituição ou melhoria dos sistemas de segurança social, financiados pelo Estado; – melhoria dos serviços de educação e extensão da educação às mulheres, de modo que compreendam a interacção do crescimento populacional com a qualidade de vida; – aumento das oportunidades de trabalho, em especial para as mulheres.

A população da Europa pretende seguir noutra direcção, qual seja a do regresso às famílias numerosas. A principal razão é o temor de não existir, no futuro, um número suficiente de jovens trabalhadores para financiar a reforma dos idosos. Contudo, esta preocupação pode ser mitigada por maiores poupanças dos jovens e das pessoas de meia-idade (à medida que se preparam para a reforma) e pelo aumento da idade da reforma (as pessoas, graças à maior esperança de vida, podem trabalhar até aos 70-75 anos).

No final, os benefícios de se viver em sociedades com populações estabilizadas são muitos e variados: – gastar-se-á menos em despesas familiares directas (despesas com educação, saúde, alimentação, vestuário e lazer dos filhos); – poupar-se-ão investimentos em novas estradas, centrais eléctricas, escolas e outros serviços públicos; – apreciar-se-ão cidades menos congestionadas e menos pressões ambientais nas zonas campestres; -menores custos para se eliminarem as emissões de gases, porque se produzirão menores quantidades; – em resumo, a qualidade de vida melhorará.

Luis Nassif

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