O grande negócio de Paulo Guedes com o CEITEC, por Luis Nassif

A proposta de Guedes é esdrúxula. Vende os equipamentos da fábrica. E transfere a área de projetos, com todos os cientistas envolvidos, para uma fundação sem fins lucrativos. Tudo isso sem chamar a atenção de ninguém, sem chamamento público, sem divulgação ampla.

O caso CEITEC (Centro Nacional de Tecnologia Eletrônica Avançada) é a comprovação eloquente das razões para o subdesenvolvimento brasileiro.

É a primeira fábrica de microprocessadores do país. Trata-se de um setor essencial para a competitividade do país. Hoje em dia, quase todos os setores da indústria dependem dessa tecnologia para avançar, entrar na indústria 4.0 ou 5.0. Discute-se a introdução da 5G na telefonia local. Chips servem para desenvolver eletrodomésticos inteligentes, montar sistemas d identificação de veículos, fazer inventário de produtos, criar documentos eletrônicos, fazer rastreio animal.

O CEITEC foi montado em 2008 sob a direção de renomados cientistas. A primeira parte do trabalho consiste na montagem de equipes, geração de conhecimento, desenvolvimento de patentes, até entrar em voo cruzeiro.

Cumpriu a primeira fase do projeto competentemente. Montou um quadro de mestres e doutores. Muitos deles foram contratados pela Apple, Intel e outros fabricantes mundiais de chips.

Quando estava em vôo cruzeiro

Como estatal, o mercado do CEITEC era o setor público. E seu primeiro grande contrato era a confecção de chips de passaportes. A partir de 2016, deveria fornecer os chips para a Casa da Moeda. Já se estava em pleno governo Temer e a Casa da Moeda recusou. A alegação do presidente é que ela adquiria a carteira com o chip já montado razão para fechar contrato com um fornecedor estrangeiro.

O presidente, em questão, é um dos muitos quadros que ascendeu a cargos relevantes com a ajuda do Supremo Tribunal Federal, da mídia e da Lava Jato, visando mudar definitivamente a política no Brasil. Tratava-se de Alexandre Borges Cabral, indicado pelo Centrão do notório Valdemar da Costa Neto.

Em junho passado, foi indicado para o Banco do Nordeste. Aí afloraram as suspeitas sobre seu trabalho à frente da Casa da Moeda.

Segundo o Estadão,

Auditores atribuem a Alexandre Cabral “possível ato de gestão temerária” na presidência da Casa da Moeda e o descrevem como um dos “potenciais responsáveis” por prejuízos em contratos firmados durante sua gestão. 

As acusações eram de contratos ruinosos com as empresas Sicpa e Cetim para a operação do Sistema de Controle de Bebidas e Rastreamento da Produção de Cigarros, que exigem uso intensivo de semicondutores. As empresas receberam R$ 11 bilhões em contratos. E, segundo relatório do Tribunal de Contas da União, as empresas “eram réus em notória ação penal por fraudes a licitações”.

Aliás, no mesmo ano, a Casa da Moeda – sob controle do governo Temer – suspendeu a produção de passaportes, porque o fornecedor entregou produtos com defeitos

O caminho encontrado pela CEITEC foi buscar mercado no setor privado.

Nesse período desenvolveu chips para cartuchos de impressora, etiqueta eletrônica para ser embutida em pneus de caminhões, etiquetas para a Vale gerenciar ferrovias, chips para o Sistema Nacional de Identificação Automática de Veículos etc.

Nos últimos anos, o faturamento da CEITEC vem dobrando, de R$ 3 milhões para R$ 6 milhões, depois para R$ 12 milhões, cifras inexpressivas, por enquanto, mas demonstrando o potencial de que dispõe, especialmente se o setor público voltasse a adquirir seus produtos. Muitas empresas novas alavancaram seu faturamento com os chips produzidos.

Mesmo assim, o inigualável Paulo Guedes resolveu liquidar a empresa, alegando não ser rentável.

O modelo apresentado é um primor de manipulação para negócios obscuros.

O CEITEC tem uma área de desenvolvimento de produtos e outra de fabricação de produtos. A fábrica tem equipamentos com o tamanho exato para os novos chips da tecnologia 5G.

A proposta de Guedes é esdrúxula. Vende os equipamentos da fábrica. E transfere a área de projetos, com todos os cientistas envolvidos, para uma fundação sem fins lucrativos. Tudo isso sem chamar a atenção de ninguém, sem chamamento público, sem divulgação ampla.

Mais que isso, o documento que propõe a extinção da CEITEC não tem nenhuma assinatura dos 6 representantes de governo que participam do programa de desestatização..

O resultado é óbvio. Um esperto qualquer adquire a fábrica pelo preço dos equipamentos – não do conhecimento acumulado, e mantem os funcionários. Todo o valor intangível – conhecimento, métodos de produção, patentes – se perde. Depois, vai até a tal fundação e recontrata os engenheiros ali acantonadas. Isso se as grandes multinacionais do setor já não tiverem levado embora.

Luis Nassif

16 Comentários

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    1. Centenas de tramoias como essas são praticadas diariamente em todos os países capitalistas desde que essa doutrina transformou a vida em business e o dinheiro em Deus. A nenhum desses governantes interessa o bem do povo nem da nação. Estamos no mundo dos homens maus e todos os Estados foram usurpados.

  1. Foi o mesmo que aconteceu ao CPqD da Telebrás, na década de 90: FHC desnaciomalizou o Centro, transformando-o em “fundação de direito privado”; tudo foi desmontado e décadas de novos métodos, processos e patentes foram subvendidos ao G7…

    1. … e com o CTI, voltado a desenvolvimentos similares de micro-processadores, circuitos e que tais, que foi transformado numa mera agência de certificação digital. A suspeita destruição em Alcântara com a morte de diversos cérebros e conhecimentos que levam tempo para repor (se houvesse reposição…).
      Nada de relevante acontece nesse país sem dedinhos externos, caso das “plantas” (de plantados) FHC, Collor, Temer e Bozo, sempre com o “sub-dedo” do PSDB, o partido “representante” deles.
      Não que não haja uma imensa rede em todas as instituições, seja na PF, judiciário, parlamento(s), imprensa, empresários (?), banca,etc.
      Riquíssimo como poucos, somos um país de aluguel.
      O aluguel, pagamos nós.

  2. A elite brasileira sempre deixou claro que gosta apenas de ganhar dinheiro num capitalismo de compadres ou puxando o saco dos EUA, esse negócio de soberania tecnológica é coisa de comunista que as forças armadas estão sempre em prontidão para combater.

  3. Depois da revelação feita no artigo acima, ainda aparecem especialistas para discutir “as inconsistências da política ultraneoliberal”, do ministro Paulo Guedes e respectiva quadrilha. Nao há nada de ideologia mas, tão só, puro saque. Como disse um colunista aqui, no Jornal GGN, dias atrás: no atual governo, “Bolsonaro foi apenas o “Cavalo de Tróia”.

  4. Nojo dessa turma sem carater q vive p enriquecer ilicitamente. Incapazes de usarem seus talentos e sua influência exercendo cargo publico p cumprir o dever de trabalhar pelo coletivo.
    Rompem com a igualdade de forcas de modo q tds possam prosperar cada qual na sua medida. Q futuro eu terei ao 50 anos qdo a cada dia mais as atividades se concentram nas mãos de poucos os quais ainda privilegiam a corrupcao como modus operande? Desejo q possamos nos reengajar na luta pela transferência e enxergar c discernimento. Treva!

  5. Nassif, escrevi sobre isso na minha dissertação de mestrado! Se quiser que eu passe as informações que levantei, estou à disposição. Bela (e necessária) matéria! Estou procurando parlamentares para auxiliar na tentativa de reversão desta tragédia. Abraços.

  6. Centenas de tramoias como essas são praticadas diariamente em todos os países capitalistas desde que essa doutrina transformou a vida em business e o dinheiro em Deus. A nenhum desses governantes interessa o bem do povo nem da nação. Estamos no mundo dos homens maus e todos os Estados foram usurpados.

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