Os erros das companhias japonesas no setor de celulares

Do Wall Street Journal

Marcas japonesas cometeram erros caros no setor de celular

O primeiro andar da enorme loja de eletrônicos Bic Camera, num edifício de oito andares que cobre um quarteirão inteiro da capital japonesa, é um centro nervoso para a indústria de eletrônicos do Japão.

Televisores de tela plana, a maioria exibindo logomarcas japonesas, há muito abarrotam a ala norte do show-room, onde ficam os produtos mais vendidos da loja

Atualmente, com a queda nas vendas, as prateleiras de TV foram relegadas ao apertado segundo andar para dar lugar a centenas de acessórios para smartphones, especificamente o iPhone, da Apple Inc., aparelho distintamente não japonês.

A decisão da loja é uma mostra do que aconteceu com a indústria japonesa de tecnologia. Conglomerados de eletrônicos outrora poderosos, que apostaram tudo no mercado de TV e não embarcaram na onda dos smartphones, estão perdendo o melhor da festa.

Os smartphones agora ocupam o centro do palco, não só impulsionando um crescimento surpreendente das vendas, mas também prejudicando as vendas de câmeras digitais, consoles portáteis de videogame e outros pontos fortes das fabricantes japonesas.

Hoje, a Apple e a Samsung Electronics Co. estão desfrutando de lucros recordes e, juntas, foram responsáveis por 54% das vendas globais de smartphones no primeiro trimestre, segundo a firma de pesquisa Strategy Analytics.

A participação de mercado conjunta da Sony Corp., Panasonic Corp., Sharp Corp., Fujitsu Ltd. e outras fabricantes japonesas: 8%.

Para recuperar o atraso, as empresas japonesas estão redobrando o esforço no mercado de smartphones com diferentes graus de ambição.

A Sony é a mais agressiva entre as japonesas, depois de não ter tido muito sucesso no mercado de celulares na última década com sua conturbada sociedade Sony Ericsson. Depois de se desfazer dessa joint venture, o diretor-presidente da Sony, Kazuo Hirai, se comprometeu a transformar os smartphones num dos pilares de seu negócio.

Panasonic, Fujitsu e Sharp — as três maiores fabricantes de celulares do Japão — estão ensaiando um retorno modesto ao cenário mundial.

Mas um impulso verdadeiramente global não será fácil, especialmente numa indústria tão competitiva, na qual só sobrevivem os que promovem inovação constante.

“Tanto em casa quanto no exterior, estamos em uma situação difícil” com os smartphones, diz Hideaki Kawai, diretor-gerente da Panasonic que supervisiona as finanças da empresa.

Pessoas dentro e fora da indústria citam uma série de fatores para explicar por que as empresas japonesas perderam a dianteira das tendências: atenção demasiada no mercado interno; demora para se adaptar às dinâmicas do mercado, enganos sobre as preferências do consumidor e arrogância sobre a superioridade de seu hardware .

No começo dos anos 90, os celulares japoneses eram maravilhas tecnológicas. A Sharp, em 2000, foi a primeira empresa do mundo a adicionar uma câmera a um celular.

Em 2006, um ano antes de a Apple lançar o iPhone, os consumidores japoneses já podiam assistir TV em seus celulares.

Mas, apesar de todos os avanços, as fabricantes japonesas tiveram dificuldades para desafiar a finlandesa Nokia Corp. e a norte-americana Motorola Inc. no exterior porque tinham criado telefones nos anos 90 e início dos anos 2000 com base em um padrão de telecomunicações utilizado apenas no Japão.

Atrasadas, as fabricantes japonesas penaram para ganhar posição com as operadoras de celular estrangeiras, ao contrário da sul-coreana Samsung, que forjou relações com operadoras do mundo todo e trabalhou rapidamente para fornecer produtos sob medida para os mercados internacionais.

A estréia do iPhone em 2007 mudou tudo.

Enquanto o resto do mundo via o iPhone como um produto revolucionário, alguns executivos ignoraram sua importância, acreditando que seus celulares já eram inteligentes o suficiente.

Em julho de 2008, poucas semanas depois de a Softbank Corp. lançar o iPhone no Japão, Tadashi Onodera, diretor-presidente da segunda maior operadora japonesa, a KDDI Corp., disse que o celular não podia “satisfazer plenamente as necessidades dos usuários [japoneses]”. Três anos depois, a KDDI, sob nova direção, começou a oferecer o iPhone, que se tornou o smartphone mais vendido da empresa.

Smartphones respondem hoje por 56,6% de todos os celulares novos vendidos no Japão, segundo a firma de pesquisas MM Research Institute, de Tóquio. Apple e Samsung responderam por mais de 20% do mercado japonês no ano fiscal passado.

A Apple foi a maior fabricante de smartphones do Japão no ano fiscal passado. E a Samsung subiu ao ranking das cinco maiores no mercado japonês de smartphones.

Quando finalmente as fabricantes japonesas abraçaram a tendência — os primeiros smartphones japoneses rodando com o sistema operacional Android, da Google Inc. apareceram no mercado local em 2010 — a Samsung já estava inundando a Europa e os Estados Unidos com uma vasta gama de modelos.

Jogadas para escanteio em seu próprio país, as fabricantes japonesas de celulares tiveram de se consolidar para reentrar nos mercados estrangeiros.

Em 2010, a NEC Corp., a Hitachi Ltd. e a Casio Computer Co. uniram forças para formar uma empresa controlada pela NEC. Mais tarde no mesmo ano, a Toshiba Corp. vendeu seu negócio de telefone para a Fujitsu. Em fevereiro, a Sony comprou a participação de sua sócia Telefon AB L.M. Ericsson na Sony Ericsson e passou a ter controle sobre a empresa de smartphones, que estava perdendo dinheiro.

Mas os tempos continuam difíceis. No trimestre mais recente, tanto a Fujitsu como a NEC, Sharp, Sony e Panasonic tiveram prejuízos em seus negócios de celulares.

Além disso, Sony, Panasonic e Sharp estão se afastando do negócio de TV, sem condições de resistir à concorrência.

“A idade de ouro da TV acabou, e o televisor nunca voltará a ser o rei dos eletrônicos de consumo”, disse Kunio Nakamura, ex-presidente da Panasonic, numa entrevista no mês passado ao jornal “Nikkei”.

A Panasonic entrou recentemente na Europa com um novo smartphone à prova d’água chamado Eluga, com a meta de vender 1,5 milhão de unidades na região neste ano fiscal.

A NEC Casio espera vender cerca de dois milhões de telefones fora do Japão este ano fiscal, ou cerca de 40% da sua meta total de 5 milhões de unidades.

A Sharp está com foco no mercado chinês, embora a empresa não especifique quanto de sua meta de vender 7,7 milhões de unidades este ano fiscal irá para fora do Japão. A Fujitsu, por sua vez, tem como objetivo chegar a um acordo com uma operadora no exterior ainda este ano.

Quanto à Sony, a maior parte de seus telefones é vendida fora do Japão. Ela planeja vender 34 milhões de smartphones em todo o mundo, ultrapassando a produção combinada de celulares de suas quatro concorrentes japonesas mais próximas. A Sony planeja oferecer modelos originais que tiram o máximo proveito dos ativos de entretenimento da Sony, como videogames.

Luis Nassif

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