Os impactos econômicos da terceirização

Por Saulo Abouchedid, Ana Luíza Matos de Oliveira e Alex Wilhans Antonio Palludeto

Do Brasil Debate

Os impactos da terceirização sobre o mercado de trabalho e sobre a distribuição de renda já foram amplamente debatidos por diversos especialistas. No entanto, pouco se discutiu os impactos macroeconômicos, em termos de crescimento, do PL 4.330/2004.

Os defensores dessa lei são os mesmos que julgam como principal trava ao investimento – e, portanto, ao crescimento – o aumento do salário real acima da produtividade. Dessa forma, o PL 4.330/2004 é visto como fundamental para se reduzir o custo salarial e, assim, melhorar as condições de oferta da indústria.

No entanto, como apontou o economista Antônio Carlos Diegues em artigo no Valor (26/03/2015), a perda de competitividade da indústria brasileira não é resultado do aumento dos salários reais acima da produtividade, mas, sim, resulta de fatores como a baixa intensidade de capital por trabalhador (sintoma do viés maquilador assumido pela indústria brasileira na última década) e a já baixa participação na estrutura produtiva doméstica de setores com elevada produtividade.

Surpreendentemente, o Fundo Monetário Internacional (FMI) – que é conhecido pelo apoio a medidas de flexibilização do mercado de trabalho – aponta na mesma direção, em recente relatório publicado: o estudo analisa o efeito de reformas estruturais no crescimento da produtividade nos países do G20 e mostra que os maiores ganhos de produtividade estão associados com investimentos em pesquisa e desenvolvimento e em tecnologias de informação e comunicação, indicando que investimentos em infraestrutura também têm impacto positivo na produtividade no longo prazo. Efeitos, a princípio, esperados. Mas a surpresa é que, segundo o estudo, a regulação do mercado de trabalho não tem impacto estatisticamente significante na produtividade total, ou seja, não afeta a produtividade das economias analisadas positiva ou negativamente.

Dessa forma, defende-se que a retomada da competitividade da indústria e, assim, a recuperação sustentada do investimento – em um cenário de acirramento da concorrência global – não se faz por meio da redução do custo salarial.

Um exemplo recente, que, embora distinto, provoca os mesmo efeitos macroeconômicos, é a desoneração da folha de pagamentos , mostrando claramente que o custo salarial não era entrave para a retomada do investimento nos últimos anos.

Ademais, conforme demonstra o relatório de 2014 do National Employment Law Project, a terceirização torna as condições de trabalho mais precárias, aumentando o número de acidentes e acarretando a diminuição de direitos e salários: faz da remuneração média do trabalhador relativamente menor quando comparada à de um trabalhador não terceirizado que ocupa função equivalente.

Além disso, ao reduzir os salários, a terceirização tem um impacto imediato sobre o consumo: por exemplo, os menores salários significam, diretamente, uma redução da demanda solvente da classe trabalhadora e o rendimento mais baixo faz com que os trabalhadores tenham uma capacidade menor de acessar o crédito – ou o façam em condições piores em termos de prazos e taxas. Ambos os fatores, combinados, contribuem para a redução do consumo – e, portanto, das condições de vida da maior parte da população brasileira.

Políticas dessa natureza em um contexto econômico que aponta para uma recessão não parecem ser as mais acertadas: reduzir um componente importante da demanda total – o próprio consumo – e esperar que o investimento privado se eleve de forma sustentada parece uma aposta arriscada quando se tem em mente que a riqueza é investida se, e somente se, existe a expectativa de que a própria demanda seja elevada.

Em outras palavras, ainda que o menor custo do trabalho amplie a rentabilidade de determinadas atividades, nada garante que a menor demanda da classe trabalhadora seja contrarrestada por uma ampliação dos investimentos, uma vez que estes dependem do que se espera ser a demanda total no futuro.

Pelo contrário, o mais provável é que a redução da demanda dos trabalhadores aprofunde o ambiente de pessimismo do empresariado e torne cada vez mais provável o cenário que já se configura: a crise.

Saulo Abouchedid – É mestre em Economia pela Universidade Estadual de Campinas (2014), atualmente é doutorando em Teoria Econômica pela mesma instituição

Ana Luíza Matos de Oliveira – É economista (UFMG), mestra e doutoranda em Desenvolvimento Econômico (Unicamp). Colaboradora do site Brasil Debate

Alex Wilhans Antonio Palludeto – Mestre em Economia pela Universidade Estadual de Campinas (2012), doutorando em Teoria Econômica pela mesma instituição

Redação

5 Comentários

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  1. Temos uma elite sabuja,

    Temos uma elite sabuja, sorrateira e servil a interesses estrangeiros…enquanto nós, pensando no desenvolvimento de nosso pais e nos empregos, acertadamente defendemos as empresas, seja no campo do petroleo como na area privada,como por exemplo as do mercado de carnes,….enquanto fazemos isso os ladroes que deram o golpe de estado se aproveitam do barulho em torno da Carne Fraca para aprovar a terceirização e o fim de direitos previdenciarios…horror….com esse elite que se assemelha a grupos disputando diamantes no Congo será que esse pais tem jeito..o desrespeito contra o povo brasileiro é muito grande…

  2. De forma simplista, há a

    De forma simplista, há a esquerda e há direita.

    Supõem-se que os políticos filiados a cada corrente queiram o bem das pessoas de seus países!

    O fundamental de um pais é o seu povo!

    O Temer não representa o que politicamente seria a direita.

    Até o Trump, a seu modo quer enriquecer a classe média americana ao impedir que empresas americanas criam plantas industriais fora dos EUA!

    O que eu vejo que no Brasil o grupo politico do Temer e PSDB e agrupados, estão fazendo a politica de uma elite econômica, que só não toma o poder, por que não são políticos!

    Estamos sendo governados por fantoches políticos!

    A junta militar de 64, foi substituída por um junta econômica!

    São totalmente irresponsáveis quanto a sensibilidade de escolher o futuro de uma nação!

    Nem de direita eles podem ser chamados!

    É de um primarismo absurdo!

    Pec 55, mais aposentadoria aos 49 anos e terceirização e outras medidas, vão fazer o Brasileiro desejar a volta da Lei Áurea e da Lei do Sexagenário!

  3. E a terceirização nos serviços públicos?

    Leis são entregues prontas a deputados e senadores pelos interessados nelas. Tem deputado e senador que nem sabe em que estará votando, porque não leu, não entende do que se trata, mas já recebeu ordens para votar sim (ou, em certos casos, votar não).

    Juízes têm vários modos de terceirizar, ou você acha que Gilmar teria tempo para as conferências, aulas em seu IDP, viagens ao exterior e tantas reuniões com os golpistas atuais se não terceirizasse os trabalhos que lhe competem como juiz?

     

  4. Terceirizar ou não, antes de

    Terceirizar ou não, antes de tudo, é uma decisão técnica.

    Claro é que se uma empresa SUB UTILIZA um determinado processo (por exemplo, manutenção, criação e arte, embalagem, desenvolvimento de software etc)  ..claro que ela DEVE tentar buscar empresas especializadas no setor, que possam RODAR 24 h, se dedicar em tempo integral à tarefa  ..maximizando ali tempo, MO e recursos pra tanto

    ..mas vai do caso

    Já cheguei a ver empresa MULTINACIONAL terceirizar SETOR inteiro de sopro (embalagem), que mal dava conta da demanda da produção  ;;ali foi levada a erro de avalização  .chegando a terceirizar uma área FÌSICA pra que prestadores de serviços ali se instalassem (e encarecessem com seus LUCROS, o processo)  ..neste caso, passado um tempo, veio o arrempendimento, e o diretor falastrão foi DEMITIDO pela incompetente decisão (da qual ele mordia um filão)

    TERCEIRIZAÇÂO tb não é só maximizar recursos, mas avaliar riscos ..ponderar sobre a exclusividade e segredos de sucesso ..ou de fatores importantes e indelegáveis a terceiros (..uma montadora desenvolver projeto dum novo veículo por exemplo)  ..quantos não são os casos que uma vez terceirizado o processo a empresa fica ESCRAVA do fornecedor do serviço tb ? (vide Volks recentemente com seu multi fornecedor de estofamento)

    NÂO vejo terceirização como precarização automática de empregos  ..muito menos como diminuição de salários  ..ou redução direta de custos, inclusive (aonde o ganho pode se dar de forma indireta com a empresa se dedicando mais a sua atividade principal do que a pequenos problemas de processo) 

    Olha, to mais pra acreditar que querer que o ESTADO MARMITÃO tome conta disso, e defina por a mais b quem é quem e o que deve permitir, é engessar a atividade econîmica de forma perigosa

    Acho mesmo que o tema tem que ser discutido com serenidade e bom senso ..pq convenhamos  ..a continuarmos com estes preços internos realtivos frente a renda  (por ex: em infra, telefonia, energia, combustiveis, máquinas, insumos, serviços, alimentos etc etc etc) o BRASIL não sobrevive por muito tempo frente e concorrência  ..e a desnacionalização (canibalização ou autofagia) e/ou sucateamento de muitas das empresas Nacionais é questão de tempo.

     

  5. A reforma Trabalhista como está posta é claramente inconstitucio

    A reforma Trabalhista como está posta é claramente inconstitucional, com base no princípio da proibição do retrocesso. Segue um trecho da obra do professor português José Gomes Canotilho, um dos mais importantes constitucionalistas da atualidade. Este trecho foi extraído do informativo 582 do STF:

    “O princípio da democracia econômica e social aponta para a proibição de retrocesso social.
    A idéia aqui expressa também tem sido designada como proibição de ‘contra-revolução social’ ou da ‘evolução reaccionária’. Com isto quer dizer-se que os direitos sociais e econômicos (ex.: direito dos trabalhadores, direito à assistência, direito à educação), uma vez obtido um determinado grau de realização, passam a constituir, simultaneamente, uma garantia institucional e um direito subjectivo. A ‘proibição de retrocesso social’ nada pode fazer contra as recessões e crises econômicas (reversibilidade fáctica), mas o principio em análise limita a reversibilidade dos direitos adquiridos (ex.: segurança social, subsídio de desemprego, prestações de saúde), em clara violação do princípio da protecção da confiança e da segurança dos cidadãos no âmbito econômico, social e cultural, e do núcleo essencial da existência mínima inerente ao respeito pela dignidade da pessoa humana. O reconhecimento desta proteção de direitos prestacionais de propriedade, subjetivamente adquiridos, constitui um limite jurídico do legislador e, ao mesmo tempo, uma obrigação de prossecução de uma política congruente com os direitos concretos e as expectativas subjectivamente alicerçadas. A violação no núcleo essencial efectivado justificará a sanção de inconstitucionalidade relativamente aniquiladoras da chamada justiça social. Assim, por ex., será inconstitucional uma lei que extinga o direito a subsídio de desemprego ou pretenda alargar desproporcionadamente o tempo de serviço necessário para a aquisição do direito à reforma (…). De qualquer modo, mesmo que se afirme sem reservas a liberdade de conformação do legislador nas leis sociais, as eventuais modificações destas leis devem observar os princípios do Estado de direito vinculativos da actividade legislativa e o núcleo essencial dos direitos sociais. O princípio da proibição de retrocesso social pode formular-se assim: o núcleo essencial dos direitos já realizado e efectivado através de medidas legislativas (‘lei da segurança social’, ‘lei do subsídio de desemprego’, ‘lei do serviço de saúde’) deve considerar-se constitucionalmente garantido sendo inconstitucionais quaisquer medidas estaduais que, sem a criação de outros esquemas alternativos ou compensatórios, se traduzam na prática numa ‘anulação’, ‘revogação’ ou ‘aniquilação’ pura a simples desse núcleo essencial. A liberdade de conformação do legislador e inerente auto-reversibilidade têm como limite o núcleo essencial já realizado.”

    (“Direito Constitucional e Teoria da Constituição”, 1998, Almedina, p. 320/321, item n. 3)

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