Os temores da deflação

Do The Wall Street Journal

Cresce temor de deflação na economia americana 

Gregory Zuckerman
The Wall Street Journal 

Por meses, só as cassandras ousavam mencionar a palavra. Mas agora alguns dos principais investidores do mundo estão alertando para a ameaça dela, a deflação.

Bill Gross, um dos principais investidores de fundos de renda fixa do mundo, o gestor de recursos Jeremy Grantham e os administradores de fundos de hedge David Tepper e Alan Fournier estão entre os responsáveis por grandes somas de dinheiro que veem a deflação como um risco suficientemente grande nos Estados Unidos para mudar a forma como eles investem.

Eles citam os dados econômicos capengas e a percepção de que autoridades monetárias ao redor do mundo estão relutantes, ou incapazes, de tomar novos passos, como motivos para mais preocupação.

MuiMuitos desses investidores não veem a deflação prolongada como uma aposta certa. Alguns preveem que, à medida que a deflação se torne mais provável, o Federal Reserve, o banco central dos EUA, e as autoridades do governo americano vão tomar medidas radicais para conter a queda. O presidente do Fed, Ben Bernanke, construiu sua carreira acadêmica em torno do estudo da deflação e de seus efeitos durante a Grande Depressão e como combatê-la. Mas uma probabilidade mais alta de deflação está levando alguns a fazer vários investimentos em ativos que pagam juros, como os bônus, e a favorecer ações que pagam dividendos e aplicações de curto prazo, ao mesmo tempo em que compram ativos para se proteger de possíveis quedas do mercado acionário.

“A deflação não é apenas um tópico de curiosidade intelectual, está acontecendo”, diz Gross, que administra o Pimco Total Return Fund, uma carteira de US$ 239 bilhões. Ele cita uma queda anual de 0,1% no índice de preços ao consumidor nos últimos dois anos. “É um mundo incerto que está tendendo à deflação.”

É uma mudança em relação a apenas dois meses atrás, quando a inflação, não a deflação, mantinha os operadores acordados durante a noite, levando investidores como John Paulson a comprar ouro e vender títulos do Tesouro americano.

A deflação é vista como perniciosa e difícil de atacar, uma vez que ela se estabeleça. Ela é mais prejudicial que a desinflação, ou uma queda gradual da taxa de inflação. A queda dos preços pode deixar as pessoas e as empresas relutantes em gastar e investir, reduzindo o lucro e aleijando a economia e investimentos como ações. Ela pode ser causada por uma queda na base monetária e no crédito, baixa dos gastos e alto desemprego, todos fatores que encorajam as empresas a cortar preços.

Gross tem comprado dívida do governo americano agressivamente nas últimas semanas. Os títulos do Tesouro agora correspondem a 51% da carteira do Pimco Total Return Fund, ante 33% no fim de março. De acordo com a Morningstar Inc., esta é a alocação mais alta em títulos do governo para o fundo, que ganhou 7% desde janeiro, nos últimos seis anos.

Tepper, que administra o fundo de hedge Appaloosa Management LP, tem cerca de 70% da carteira em bônus com a classificação de crédito BB ou BBB — o mais baixo na escala de grau de investimento e o mais alto na escala especulativa — de bancos e outros. Esse valor, 63% superior ao do início do ano, segundo os investidores, ajudou o fundo a ganhar cerca de 12% em 2010.

“Eu temo que o lento crescimento possa criar um ambiente muito mais difícil para os preços”, diz Tepper. “Isso pode signficar deflação em alguns setores, mesmo que tenhamos inflação na economia como um todo.”

Outros, entre eles o Fortress Investment Group LLC, que tem US$ 42 bilhões, o fundo de hedge de Nova York Argonaut Capital Management, com US$ 1,2 bilhão, e a empresa de investimentos de Boston GMO LLC, fundada por Grantham, com uma carteira de US$ 107 bilhões, estão alertando os clientes sobre uma possível deflação.

“Tememos que os principais índices de inflação nos EUA possam entrar em território indiscutivelmente deflacionário nos próximos meses”, informou recentemente aos investidores a Argonaut Capital, que está sem ganhos este ano. “Este deve ser um fato positivo para títulos de renda fixa de longo prazo.”

Dados recentes são responsáveis pela preocupação. O índice de preços ao consumidor subiu 1,1% em junho no acumulado de 12 meses. O relatório sobre o produto interno bruto do segundo trimestre, divulgado na sexta-feira, mostrou que o núcleo da inflação — que exclui variações nos voláteis preços de energia e alimentos e é acompanhado de perto pelo banco central — foi de 1,1%, a menor variação desde o primeiro trimestre de 2009. O presidente do Fed de Saint Louis, James Bullard, alertou na semana passada para o risco de uma situação semelhante à japonesa, com um período de deflação e fraco crescimento.

Para o fundo de hedge de Fournier, o Pennant Capital, com US$ 4 bilhões, “os ventos políticos mudaram” quando as nações europeias recentemente disseram ao secretário do Tesouro americano, Timothy Geithner, no encontro do G-20, que vão se concentrar em equilibrar os seus orçamentos, em vez de estimular o crescimento. A cada vez maior influência do movimento conservador Tea Party nos EUA também reforça a percepção de que as autoridades eleitas não terão condições de gastar.

“A economia dos EUA tem de crescer mais que 2% para evitar a deflação, e nós estamos bem nessa faixa”, diz ele.

Gross diz que a deterioração de um índice apurado pelo Instituto de Pesquisa dos Ciclos Econômicos que tenta prever o futuro da saúde da economia, uma queda na base monetária e o aperto fiscal na maior parte do mundo são razões para a mudança de opinião da Pimco.

“Nós dissemos: ‘Olha, dois terços do mundo estão se movendo para a linha zero'” de inflação, diz Gross.

O grupo da Pimco prevê que o “núcleo” da inflação nos EUA pode cair ligeiramente para menoz de zero nos próximos anos, e pode subir para até 2% se o crescimento aumentar.

Um problema: é difícil encontrar investimentos atraentes se a deflação aparece.

Os setores de commodities e outros são favoritos em ambientes de alta de preços, mas há menos experiência com a deflação prolongada, o que não acontece desde a Grande Depressão. Alguns dizem que as empresas de serviços públicos e as que têm fluxo de caixa estável são as melhores apostas, junto com bônus do governo.

Gross encoraja os investidores a se concentrar em fluxos de caixa que são “relativamente certos”, como dividendos e juros de ações e bônus de empresas de qualidade.

Fournier acredita que outras dificuldades econômicas vão estimular o Fed e outras autoridades a tomar medidas agressivas para evitar a deflação. Mas as bolsas precisam cair bruscamente antes que isso aconteça: ele está comprando proteção como fundos negociados em bolsa que sobem quando o mercado cai.

O fundador do Argonaut David Gerstenhaber também está evitando ações, embora diga que o dólar pode se sair bem caso haja deflação porque os tomadores de empréstimos reduzem as dívidas.

Mesmo as estrelas estão incertas se a deflação está nas cartas. Tepper argumenta que se os EUA crescerem 1%, ou perto disso, nos próximos anos, deflação e problemas para as bolsas vão surgir, enquanto um crescimento de 3% elevaria a rentabilidade e as ações.

Mohamed El-Erian, presidente e co-diretor de investimentos da Pimco, diz que que o “risco de uma espiral inflacionária aumentou, mas ainda não é o cenário mais provável”. Mas ele diz que os investidores precisam se preparar para uma série de possibilidades não corriqueiras e que as chances de acontecimentos extremos, potencialmente incluindo uma deflação prolongada, “não são insignificantes”. 

Luis Nassif

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