Silvio Santos: vítima ou beneficiário?

Coluna Econômica

Afinal, o que aconteceu de fato com o Banco Panamericano, do empresário Silvio Santos?

Sabe-se que houve um conluio para a prática de uma fraude. E que o conluio ocorreu dentro do banco. Sabe-se também que o ex-controlador foi amplamente beneficiado, já que a fraude simulava um lucro fictício a partir do qual o controlador poderia retirar dividendos.

Mas os movimentos iniciais, aportando todos seus bens em garantia pelo empréstimo bancado pelo Fundo Garantidor de Liquidez (FGL) de repente transformaram Silvio Santos em um herói do capitalismo brasileiro: o primeiro dono de banco que aporta recursos para impedir sua quebra.

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ComoCom os desdobramentos posteriores da operação, esse heroísmo começa a ser colocado em dúvida.

O modelo da fraude consistiu na criação de dois sistemas paralelos: um sistema gerencial oficial, a partir do qual se extraíam os dados para balanço; e um sistema paralelo, operado na surdina, onde se controlavam as jogadas.

Analistas que estudaram o caso – nos 50 dias entre a descoberta da fraude e a entrega do balanço – sustentam que o esquema era muito mais sofisticado do que no Banco Nacional, pois o banco de dados paralelo batia em tudo com as informações que constavam do balanço.

O mistério é maior ainda quando se sabe que, sob o ponto de vista de governança, o banco parecia bem aparelhado. Havia comitê de auditoria, com ex-diretores do Banco Central; um conselho de administração presidido por um ex-presidente do BC; auditoria interna, área de compliance (práticas para conferir as normas legais do banco).

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Um dos problemas detectados estava na própria forma de contabilizar algumas operações, especialmente quando vendia sua carteira de operações para outros bancos.

No Brasil, a operação se dava assim:

1. O banco concedia um determinado volume de financiamentos.

2. Pegava a carteira – que lhe rendia, digamos, 3,5% ao mês – e repassada para outro banco, que se dispunha a pagar 1,5% ao mês.

3. Nos Estados Unidos, o comprador ficava com toda a carteira, responsabilizando-se inclusive pela inadimplência. No modelo brasileiro, ele adquiria o fluxo de caixa do vendedor, adiantava para ele o dinheiro futuro e passava a receber todo mês. Se um cliente não pagava, o banco vendedor se responsabilizava por cobrir a inadimplência.

4. Como o risco da carteira continuava sendo do banco vendedor (no caso o Panamericano) ele não podia tirar o crédito da carteira: o ativo ainda era seu. Era como se conseguisse capital de giro dando a carteira como garantia.

5. Pelas normas internacionais, quando se vende uma carteira, o banco vendedor registra como um passivo com o banco cessionário (que comprou). Cada vez que recebe um pagamento do cliente, repassa para o banco cessionário e estorna (retira do balanço) o que recebeu do cliente.

Para isso cada financiamento é registrado individualmente. Na operação em questão, o Panamericano cedia um pacote de financiamentos ao cessionário e recebia o adiantamento pelo repasse. Mas não havia individualização de cada financiamento.

Mais ainda. O BC obriga a individualização (com registro de CPF) de toda operação acima de R$ 5 mil. Mas a maior parte das operações era com valores abaixo desse limite.

A quantidade de contratos

Quando a Delloitte, e o Banco Central juntaram as bases de dados para reprocessá-las, havia 2 milhões de contratos, 90 milhões de parcelas de recebimento e 300 contratos de cessão com diferentes bancos. Depois de rodar todos os dados, constataram que o rombo era muito maior do que os R$ 2,5 bilhões iniciais. A segunda parte da fraude consistia em receber pagamentos antecipados de mutuários e não repassá-los ao banco cessionário.

O anti-herói

No frigir dos ovos, acabou não desembolsando um tostão pelo rombo. Mesmo tendo sido beneficiário direto das fraudes em pelo menos duas circunstâncias: quando recebeu dividendos sobre lucros fictícios; e quando vendeu uma parte do banco quebrado para a Caixa Econômica Federal (CEF), em cima da maquiagem dfas fraudes. A imagem do empresário desligado, que não acompanhava seus negócios, não fecha. 

Luis Nassif

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