Rui Daher
Rui Daher - administrador, consultor em desenvolvimento agrícola e escritor
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Sinais de cansaço na globalização, por Rui Daher

por Rui Daher

Enquanto em São Paulo discute-se, ferrenhamente, se devemos aumentar a velocidade permitida nas vias marginais, no Paraná, como eleger um Vice-Rei da Justiça e da Vingança, e no Rio de Janeiro se alude como benefício social uma mulher passar o dia fornicando em seu quartinho, fora do Brasil se estuda as repercussões de um possível movimento inverso à globalização da economia.

Ocorre uma profunda desaceleração no comércio mundial. Entre o início dos anos 1980 e 2012, os movimentos de importação e exportação cresceram a taxas próximas a 7% ao ano. De 2012 em diante, caiu para menos da metade.

O comércio exterior, de 1985 a 2003, evoluiu o dobro do que o PIB global. Algo que não aconteceu no Brasil, infernizado por crises resolvidas pelas saias justas da senhora Teresa Ter-Minassian, do Fundo Monetário Internacional (FMI).

A Organização Mundial do Comércio (OMC) prevê, para este ano, no máximo, crescimento de 1,7%. Em dois séculos, indústria e comércio serviram de motores para que o capitalismo entregasse produtividade, empregos e salários às populações onde a distribuição de renda fosse algo menos maldito.

Depois da farra financeira de 2007/08, percorre o planeta um colapso nos investimentos produtivos e de infraestrutura, fatal para a ampliação do comércio. Quando isso acontece, cada um se protege como pode. Crescem barreiras e tarifas alfandegárias.

Ao Brasil, como forte exportador de commodities, interessa sobremaneira o livre comércio, hoje em dia, em ritmo cada vez menor. Tanto nos países desenvolvidos como nos emergentes, umbigos estão sendo mais olhados e protegidos. Um movimento inverso ao da globalização nos seria fatal, até porque pouco aproveitamos dela em seus anos dourados. Certo, príncipe Fernando?

Em caso assim, nos sobraria o amplo mercado interno com potencial de consumo ainda, em grande parte, represado. Mas estamos a 241 quilômetros de recuperá-lo. Sempre achei austeridade fiscal como pimenta nos olhos e lugares menos nobres de quem também não é nobre. Então, esqueçam. Assim como se deve descartar os grandes investimentos públicos capazes de oferecer emprego e renda. O olho gordo da economia está nas bolsas de valores, aplicações financeiras, especulações rentistas.

Depois do golpe, subitamente, as folhas e telas cotidianas passaram a nos ver como sabiás a gorjear entre ventos alísios em campos verdejantes. Verbas públicas de publicidade os garantirão.

O mundo derrubou os juros para conquistar investimentos produtivos. O Brasil os aumentou para segurar inflação sem emprego, renda e, consequência, sem demanda.

Mas, por outro lado, teria mesmo a globalização sido assim tão magistral em benefício da economia? Talvez sim, enquanto considerarmos a medida do bem-estar social dada pelo crescimento do PIB. Sabe-se, no entanto, que esse é um cálculo caolho e manco para avaliar o nível do viver bem, ainda que pior do que o do futuro prefeito de São Paulo.

Vários economistas e cientistas sociais, muito citados em meus textos, têm mostrado que a predominância financeira nos negócios mundiais e as fusões e aquisições entre grandes conglomerados multinacionais têm resultado em perda de soberania pelos Estados, dificuldades na execução de políticas regulatórias, limitação às inovações tecnológicas e, claro, concentração de renda e pauperização na base da pirâmide.

Vale dizer, não só podemos estar na presença de um retrocesso na globalização como, pior, de uma necrose na atual etapa do capitalismo. Nada bom para um país que deixou para trás seu projeto de inserção social. 

Rui Daher

Rui Daher - administrador, consultor em desenvolvimento agrícola e escritor

20 Comentários

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  1. Necrose do capitalismo como sistema

    Não creio que seja necrose a atual etapa do capitalismo. Está mais para necrose do capitalismo como sistema.

  2. Quequéisso Rui, precisas se

    Quequéisso Rui, precisas se atualizar, rapaz !   Comércio significa troca de alguma coisa por alguma outra coisa, que pode até ser dinheiro. E sendo bom para as 2 partes, nem Russo, mano, tem nada a ver com isso. Só que é coisa do passado quando se fala em Comércio Exterior, e nisso tu tás por fora. Hoje não é mais necessário transação comercial, quando um país rico como o nosso tem alguma coisa que não nos interessa mas que possa servir aos pobres países capitalistas que estão todos necrosando por esse mundão afora nós damos e pronto, Pra que precisamos de pré-sal se podemos já ir direto pro sal, que abunda e não prejudica em nosso imenso país, até salgema temos ? E saibas de uma coisa, aquele seu post sobre umas imagens no Paraná foi da pá virada. 

     

     

    1. Ir direto ao sal, Eduardo?

      Não é saudável. Te cuida, rapaz. Junta o sódio com os zumbis paranaenses pra ver no que dá. Quero você bem de saúde, comentando aqui.

  3. A globalização acelera de desintengração do capitalismo

    “O sistema protecionista é, em nossos dias, conservador, enquanto o sistema de livre-câmbio é destruidor. Dissolve as velhas nacionalidades e leva ao extremo o antagonimso entre a burguesia e o proletariado. Numa palavra, o sistema da liberdade comercial (globalização) acelera a revolução social. É só nesse sentido revolucionário que eu, Senhores, voto a favor do livre-câmbio.” Kar Marx.

    “Sob a liberdade de comércio (globalização), as leis da economia política serão impostas à classe trabalhadora em toda a sua severidade. Isto significa que somos contrários ao livre-câmbio? Em absoluto. Somos favoráveis ao livre-câmbio porque através dele todas as leis econômicas, com suas mais profundas contradições, atuarão em larga escala, sobre um território mais vasto, enfim, sobre todo o globo; e que todas essas contradições reunidas em um único conjunto levarão a um confronto do qual resultará a luta que emancipará o proletariado”. Engels.

    Opor-se à globalização é tentar, em vão, girar para trás a roda da História.

  4. Taxa de juros e inflação estão ambas na estratosfera

    O autor do artigo ora comentado afirmou que ‘o mundo derrubou os juros para conquistar investimentos produtivos. O Brasil os aumentou para segurar inflação sem emprego, renda e, consequentemente, sem demanda’. Ele entretanto se esqueceu de dizer que inflação e juros estratosféricos coexistem pacificamente.

    “Antes, quando a inflação estava dentro da meta e os juros estavam bem menores, a Miriam Leitão disse:

    “A presidente Dilma Rousseff defendeu juros menores e o ministro da Fazenda também. E o controle da inflação, como fica?”

    O cenário econômico atual, em que a taxa de juros está alta e a inflação descontrolada, reduziu a pó essa falácia idiota da Miriam Leitão segundo a qual o que mantem a inflação sobre controle são taxas de juros elevadas. Prá tentar salvar sua falácia, a Miriam Leitão mudou seu discurso:

    “O economista José Roberto Mendonça de Barros disse que a partir de agosto o Banco Central já pode começar a reduzir a taxa de juros, mesmo a inflação estando alta, porque a economia está muito fraca e a tendência é a inflação cair”.

    Traduzindo: as teorias da Miriam Leitão só funcionam numa economia forte.

    1. taxa,,,

      Caro sr. Rui Ribeiro: “cachorro mordido por cobra tem medo de linguiça”.  Sem empregos, sem renda, sem demanda. Que inflação? Em país de menos de mil dólares de renda média como se gasta mais que os mil dólares? Aumenta preço diminuem as vendas. Qualquer dono de pequeno e médio comércio pelo país sabe disto. Ou se aumenta preços em mercados oligopolizados e monopolizados e se mantém a lucratividade. Aí esta o X da questão. Vamos começar a sair da discussão rasa, quase infantil. Por isto as montadoras estão lançando carros a 90, 120, 150, 200 mil reais. Um carro popular passou de 25 mil para 40 mil reais. Eles estão lidando com os “geniais brasileiros”, que não sabem nem escrever oligopolizados, quanto mais o que é isto. Modelos novos, preços novos. Aumento mínimo, afirmarão. E você pode correr para onde? E a culpa do monstro da inflação? 100%. Vejam bem 100%. Culpa do tomate que passou de 2 para 4 reais o Kg. Que absurdo?! Enqianto um refrigerador fica lá com seu módico preço estacionado em 2 mil reais, apenas. Aumentando entre 1,6 e 2,8%, a economia brasileira é destruida pelo tomate e pela banana. É muito fácil mesmo lidar com o cachorro. Quando não está correndo atrás do próiprio rabo. Está assustado com a linguiça. abs.

      1. Olá, Amigo Zé Sérgio

        Amigo Zé Sérgio, eu não fui mordido por cobra, portanto não estou assustado com linguiças. Eu apenas nunca achei e agora acho menos ainda que a solução para manter a inflação sobre controle seja manter a taxa de juros na estratosfera. Antes a taxa de juros estava bem mais reduzida e a inflação estava dentro da meta, agora a taxa de juros está na estratosfera e a inflação está acima da meta. Em sendo assim, há relação de causalidade entre elevadas taxas de juros e controle inflacionário? Não. Devemos baixar a taxa de juros.

        Em país de menos de mil dólares de renda média como se gasta mais que os mil dólares?

        Endividando-se. Mais da metade das famílias brasileiras estão endividadas. Se só se gastasse o que se ganhasse, não heveria dívidas.

        Aumentar preços em mercados oligopolizados e monopolizados só manteria a lucratividade se a demanda dos produtos e serviços dos monopólios e oligopólios fosse inelástica. Mas em regra, a demanda dos produtos e serviços dos oligopólios e dos monopólios é elástica, isto é, aumentando os preços, as vendas caem e o faturamento despenca. Você pode viver sem um carro ou sem uma jóia, mas não pode viver sem pão. Dobre o preço dos carros e a demanda respectiva cai para um quarto ou menos. Dobre o preço do pão e a demanda continua praticamente a mesma, enquanto o faturamento dobra.

        Se não for assim, como você explica a crise e o desemprego no setor automobilístico?

        1. olá….

          Inflação, não é uma entidade extraterrestre, assim como juros. É prática política de governo que a sociedade ainda não alcança. Antes se rodava a máquina imprimindo dinheiro e inflação. Agora, sem produzir dinheiro e inflação, pagamos dinheiro barato com juros caros. Trocamos seis por meia dúzia. Os interesses estrangeiros são defendidos, por exemplo, na industria de automóveis. É muitao fácil bater na agropecuária, que é nacional. E não em oligopólios estrangeiros. Veja a Lava Jato? Centenas de empresas estrangeiras ligadas à indústria petrolífera se locupletando da Petrobras. E quem foi para a cadeia. Brasileiros, só brasileiros (olhe a matéria sobre Angola, aqui num vizinho). Amadores, simplórios, despresparados é o que somos. abs.    

        2. Zé Sérgio e Rui

          penso que suas argumentações são mais complementares do que antagônicas e convergem para as tremendas estratificação e concentração de classes de renda que temos. Por incrível que pareça, depois de tanto tempo, o apelido Belíndia ainda vale. Na ponta do consumo, isso conta muito, ainda mais, como diz o Zé, após forte processo oligopolizador. lembrem-se que tais segmentos, hoje em dia, pisam muito mais forte no acelerador da Tesouraria do que no da Produção. Assim vivem. O setor mercantil sofre com consumidores de baixa renda e endividados. Fecham as portas. Abraços

          1. ZSeR….

            Caro sr, Rui  Daher, sua analise foi exata. Se gastassemos o que ganhamos, morreríamos de fome. Ganhamos menos que deveria ser um salário minimo. A maioria dos brasileiros faz isto mesmo. E a miséria nacional é evidente. Um dos pontos seria  governos com mais enfase em defender os interesses e sociedade nacional. Nisto somos muito limitados. Um gigante continental, maior que a soma de todos outros países da Am. Latina, mas que tem na sua elite adminstrativa e intelectual, uma representação tão medíocre, que faz parecer qie o país é um pequeno território, sem força populacional. economica, financeira ou de recursos naturais. Ficamos famosos internacionalmente como “Anões Diplomáticos” 

  5. Donald Trump

    Trump promete voltar à política do protecionismo, isso seria contra aquilo que o Tio Sam sempre defendeu. Esse discurso lhe tem amealhado adimiradores. Pode ser que vingue!

      1. Stanislaw,

        democratas (menos), republicanos (mais), os EUA prega o livre-comércio até a página 9. Com Trump nem na orelha do livro. Protecionismo bravo dentro da concepção norte-americana de uma bandeira listrada em cada casa.

    1. A globalização é irreversível. Ruim com ela, pior sem ela

      “O sistema protecionista não é senão um meio de se estabelecer numa nação a grande indústria, isto é, de fazê-la depender do mercado mundial, e desde que se dependa do mercado mundial já se depende mais ou menos do livre-câmbio”. Karl Marx

      A burguesia não tem mais como voltar ao protecionismo, pois, ‘a estreiteza e o exclusivismo nacionais tornam-se cada vez mais impossíveis’.

      “A necessidade de um mercado constantemente em expansão impele a burguesia a
      invadir todo o globo. Necessita estabelecer-se em toda parte, explorar em toda parte,
      criar vínculos em toda parte.

      Por meio de sua exploração do mercado mundial, a burguesia deu um caráter cos-
      mopolita à produção e ao consumo em todos os países. Para desespero dos reacioná-
      rios, retirou da indústria sua base nacional. As velhas indústrias nacionais foram
      destruídas ou estão se destruindo dia a dia. São suplantadas por novas indústrias,
      cuja introdução se torna uma questão de vida e morte para todas as nações civiliza-
      das, por indústrias que não empregam matérias-primas autóctones, mas matérias-
      primas vindas das zonas mais remotas; indústrias cujos produtos se consomem não
      somente no próprio país, mas em todas as partes do globo. Em lugar das antigas
      necessidades, satisfeitas pela produção nacional, encontramos novas necessidades
      que requerem para sua satisfação os produtos das re-giões mais longínquas e dos
      climas mais diversos. Em lugar do antigo isolamento local e da auto-suficiência das
      nações, desenvolvem-se, em todas as direções, um intercâmbio e uma interdepen-
      dência universais. E isso tanto na produção material quanto na intelectual. As
      criações intelectuais de uma nação tornam-se propriedade comum de todas. A estrei-
      teza e o exclusivismo nacionais tornam-se cada vez mais impossíveis e das numero-
      sas literaturas nacionais e locais surge a literatura universal.”
      Marx e Engels, Manifesto Comunista

  6. Sinais de cansaço na globalização, por Rui Daher

    Rui, na realidade quem foram os vencedores do neoliberalismo ?

    Em se tratando de países foram a China, seus satélites e adjacências. Se desenvolveram rapidamente aproveitando as oportunidades do livre comércio e amealharam uma montanha de reservas.

    O que chamávamos de “grandes democracias” do ocidente estacionaram e, socialmente, regrediram.

    Os EEUU curam já há uma década a crise inicial. E o “social” é mais conversa que realidade.

    Na Europa vivem às voltas com imigrantes fugidos das “libertações” de suas nações e levam às reduções de benefícios sociais, também. Poucas nações se salvaram, se é que existem.  Os movimentos “ocupa” sinalizaram fartamente a dura realidade europeia e norte-americana .

    No privado foram os grandes rentistas internacionais e seus prepostos, os grandes bancos inquebráveis, empoçando trilhões de dólares que circularam pelas facilitações dos bancos centrais.

    O que temos hoje é uma brutal massa de recursos estacionados a rendimentos mínimos mas, que pela massa, são significativos.

    E nós aqui nesse “Brazilzão” seguimos sendo o último peru de natal, sob as bençãos do urusurpador e seus camarilheiros.

    Uma realidade ou não ?

    1. Milton, realidade total.

      Quando analistas falam em “sucesso de três décadas” estão tomando seus exemplos asiáticos, pela inércia de um mercado interno que ficou menos represado, e pelas medições através de índices de crescimento que na da têm a ver com desenvolvimento. Ficará pior, meu caro. Abraço 

  7. Os vencedores do liberalismo foram os neoliberais

    Os vencedores do neoliberalismo foram os neoliberais, não os chineses. O que ocorreu foi quem devido à grande oferta de mão-de-obra barata atraiu para a China os parques industriais dos neoliberais. Se eles vão produzir na China, a produção não é para os Chineses, é para fora da China, ou seja, tem de haver liberdade de comércio. O faturamento do comércio vai para as mãos dos neoliberais, não dos Chineses.

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