Um caso de “insider”

Coluna Econômica – 19/02/2007

O mercado de capitais é um terreno onde convivem diversos e poderosos interesses. Parte relevante desse jogo acontece na CVM (Comissão de Valores Mobiliários), o órgão regulador do mercado. Cabe a ela assegurar acesso às informações aos investidores,investigar as suspeitas de “insider information” (vazamento privilegiado de informações), analisar a composição dos fundos que investem no mercado, em um ambiente dominado por disputas entre grandes grupos e grandes escritórios de advocacia.

No ano passado, a Telemar decidiu fazer oferta pública aos minoritários. Era assunto controvertido, que possivelmente exigiria manifestação da CVM. Veio a manifestação. Nos dias anteriores à divulgação do parecer, as ações da Telemar caíram. Após a divulgação despencaram. Havia indícios fortes de vazamento de informações.

Houve reunião tensa na própria CVM. Dela participou o conselheiro Sérgio Weguelim, funcionário de carreira do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), funcionário público exemplar, dessas unanimidades raras. É chamado de Poliana por conhecidos, por sua crença ilimitada na boa fé alheia. E, foi dentro desse espírito que, nas discussões sobre o vazamento, ele próprio aventou a possibilidade de uma resposta que deu ao e-mail de um investidor estrangeiro, poder ter dado margem a alguma ilação que provocou o movimento de venda no mercado.

Foi o que bastou para ser colocado no olho do furacão pelo presidente da CVM, Marcelo Trindade. Instado a se demitir, Weguelim se recusou e tomou a iniciativa inédita de oficiar o Ministro da Fazenda e a presidência da CVM, solicitando a abertura formal de um inquérito.

O inquérito está na fase final. Com quase toda certeza ele será inocentado. A comissão de inquérito analisou o teor dos e-mails trocados, e concluiu que o conteúdo era absolutamente anódino. A análise das operações indicou que o investidor que recebera o e-mail não operara com Telemar nas dias de negociação suspeita. As investigações acabaram indo bater na Hedge-Griffo e no fundo Mauá, do ex-diretor do Banco Central Luiz Fernando Figueiredo.

Há informações fidedignas no mercado de que o próprio Trindade teria entrado em contato com ambos, atrás de subsídio para o parecer que a CVM deveria emitir. Não teria havido intenção de vazar informações, mas uma imprudência que permitiu aos interlocutores intuir sobre a posição do órgao.

Sérgio Weguelim está recluso em sua casa. Não atende telefonemas de jornalistas.

Como ficará agora a CVM, após a provável absolvição de Weguelim? Corrige-se uma injustiça mas repõe-se o problema: houve vazamento, intencional ou não, de informações. E há suspeita forte no ar de que o autor foi o próprio presidente do órgão.

Será fácil à comissão apurar a inocência ou a culpa de Trindade. É só consultar os telefones de Trindade, de Figueiredo e da fonte da Hedge-Griffo. E tomar depoimento de todas as partes envolvidas.

Por uma questão de Justiça e de isonomia, Trindade deveria se licenciar do cargo até o término das investigações. Não sem antes providenciar um pedido formal de desculpas a um funcionário exemplar.

Para incluir na lista Coluna Econômica

Luis Nassif

13 Comentários

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  1. Nassif, você que tanto fala
    Nassif, você que tanto fala de boa apuração jornalísitica, ir contra a corrente, etc etc. nesse caso está acusando sem nenhuma prova. lançando suspeitas sobre o marcelo trindade e alguns investidores, como o Figueiredo. não seria o caso de entrevistá-los antes?
    aliás, porque não falar do início do processo de reestruturação da Telemar ? de como ele foi anunciado no dia do vencimento de opções (telemar é a opção mais negociada no mercado), fazendo fortunas em alguns minutos para quem estava na ponta certa?

  2. complementando meu post
    complementando meu post anterior: Nassif, note como toda sua argumentação é construída sob terreno arenoso.
    no parágrafo 6 vc diz “há informações fidedignas no mercado”. informações de quem? não seria o informante parte interessada em desacreditar a CVM?
    no parágrafo 8 vc diz “há suspeita forte no ar”. suspeita de quem? sua? das suas fontes fidedignas? do ministério público? o caso é público há tempos, e só agora vc o discute – porque ?
    não acha que está brandindo a espada da suspeição com um tanto de leveza Nassif? ainda mais quem se toma como paladino da boa prática jornalística, vide o caso da viúva da mega-sena, do assassinato do menino joão hélio, para ficar apenas nos mais recentes…

  3. Luiz, conhece-se um
    Luiz, conhece-se um jornalista por suas fontes. Não tenho histórico de grandes erros de avaliação. Os pequenos erros, corrijo quando convencido de tal. Você, como pessoa próxima à CVM, poderia trazer mais subsídios para que possamos entender o por que dessa tentativa de crucificação do Weguelim.

  4. Nassif.
    Falta-me capacidade
    Nassif.
    Falta-me capacidade intelectual (doutorados, mestrados e etc.), mas cada dia mais fica evidente que a macroeconomia e “derivativos” funcionam de acordo com a “ideologia” de plantão. Veja as receitas indecentes dos bancos com tarifas. Estes serviços deveriam estar contabilizados como custos e não como receita. Já não bastam estes juros indecentes?
    Tanta receita aos banqueiros faz parte da política econômica de todos os governos brasileiros?

  5. Caro Nassif
    A CVM sempre
    Caro Nassif
    A CVM sempre foi uma vergonha. Lembro de uma denúncia, que fizemos há mais de 10 anos, relativa à capitalização do BB pelo Tesouro. Levamos documentos que comprovavam que o Tesouro aportava em títulos – na maioria das vezes, micos – o que implicava perda de liquidez da Instituição, No final do ano, no entanto, o Tesouro recebe em dinheiro bom seus dividendos. Levamos a denúncia, inclusive parecer da área de liquidez do BB sobre o assunto, e a resposta que recebemos alguns meses após foi esquizofrênica: a denúncia não procede porque o aporte do Tesouro é feito em pecúnia. Ou seja, levamos a prova de que não era em pecúnia, e a CVM deu uma resposta padrão.
    Esse tipo de postura daquele órgão – que não costuma ser diferente dos demais, como Susep e SPC, a propósito – é que permite a lesão do consumidor ou do pequeno investidor. É que permite que aconteçam esses “gênios”, de tempos em tempos, com suas grandes tacadas que no futuro viram objeto de CPIs.
    Isso tudo é falta de profissionalização do Estado, de investimento em suas carreiras, e falta de cobrança, também. A criação das agências ditas reguladoras só piorou o quadro: ali, foi terceirizada a gestão pública, a forma de pensar o Estado.
    Essa é a palhaçada que vivemos: de um lado, a pregação de um Estado mínimo, e esse estado mínimo não tem condições de fiscalizar e de criar políticas específicas. De outro, a jogatina correndo solta, a lesão ao cidadão, ao consumidor, ao pequeno investidor.
    Lembro, por último, em outra oportunidade, que, em audiência pública promovida por uma das comissões temáticas da Câmara, um dos deputados leu uma informação pública e indagou do então Presidente da CVM quanto ao tema. Imediatamente o tal Presidente afirmou que era necessária “a imediata publicação de um fato relevante”. Ou seja, é uma piada: o fiscal ficou sabendo de uma informação que estava nos jornais pela boca de um deputado, e aí proferiu aquela sandice de sempre.
    Lamentável, meu caro.

  6. note como mudou: uma coisa é
    note como mudou: uma coisa é um caso de insider com envolvimento do marcelo trindade. outra coisa é crucificação do wegellin.
    não sei dessa briga interna na cvm como vc relata. mas originalmente o caso estava ligado à recomendação da cvm de que ordinaristas não poderiam votar na assembléia da telemar, que supostamente teria vazado. na época, uma carta anônima (pense por um minuto em quem teria interesse nela) circulou nas redações de jornais acusando pessoas do mercado de serem insiders dessa decisão, que prejudicava os interesses dos acionistas majoritários da telemar…o wegellin só foi aparecer depois desta carta, explicando sua troca de emails com o investidor estrangeiro.
    ah, muito importante: procure no site do jornal valor economico a edição do dia 04 de setembro de 2006. vai ajudar…

  7. Prezado Nassif.
    Gostaria
    Prezado Nassif.
    Gostaria muito, como brasileiro que sou, poder ser um investidor da Bolsa de Valores, porém como instituição fechada que é à maioria da população brasileira, vemos este excelente instrumento estratégico de dinâmica da economia dos países desenvolvidos, no nosso país ser tratado como mais uma capitania hereditária.
    Chateia-me sobremaneira verificar que lá não existe nenhum instrumento para a promoção do crescimento no povo do hábito de investir em ações ou, se existe, é inoperante, omisso, ou cabide de emprego.
    Todo brasileiro, com um mínimo de sentimento cívico e observação verifica, com inveja, que nações como os EUA somente são o que são devido a grande força que dão a democracia econômica que praticam de fato.
    Inclusive na defesa de seus interesses empresariais e estratégicos avançam até a ações imorais, o que não admiro, mas serve como exemplo para demonstrar o grau de importância que dão a esse instrumento.
    As informações que recebo dos meios de comunicação: jornais, internet, tv, etc, levam-me a perceber que nosso país não tem lideres mas chefes, como nas repartições publicas do passado que se mantém no presente e se perpetuará no futuro, nos retirando o direito a sonhos de inserção futura nos blocos das grandes nações, não pelo tamanho territorial, mas pela força econômica de seu povo.

  8. Oi Nassif
    Antes é necessário
    Oi Nassif
    Antes é necessário por um freio entre a excessiva mobilidade entre ex-funcionários do governo federal, estadual e municipal ( orgãos reguladores inclusos) e agentes privados do mercado.
    Sem isso qualquer medida de reforma é balela.
    ()s Paulo

  9. Confuso o seu artigo mas pelo
    Confuso o seu artigo mas pelo que entendi você está acusando o presidente da CVM de ter passado, indiretamente, informação privilegiada para dois gestores de recursos e ter usado um funcionário público exemplar seu como bode espiatório? Alguma coisa me parece fora da ordem: ou a atitude do presidente da CVM ou o seu artigo.

  10. Nassif,
    sem querer defender o
    Nassif,
    sem querer defender o Marcelo, seria bom voçê perguntar para o Sergio VERDElim onde êle passou suas férias e onde êle mora.
    êle é culpado sim.
    o Marcelo também pode ser culpado por suas ligações com o PIPOCA, mas o VERDElim é muito mais
    Antonio Carlos

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