Uma discussão sobre educação para a era pós-Ricardo Vélez, por Luis Nassif

Um dos avanços da educação brasileira foi a introdução de indicadores de desempenho, através do INEP (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira), ligado ao Ministério da Educação. Esses indicadores estimularam a criação de ONGs bancadas por empresas, destinadas a apoiar os avanços na educação, seguindo métodos corporativos.

Indicadores são o primeiro passo para o salto mais relevante: identificar as escolas que se saíram melhor, entender o seu contexto, e disseminar as experiências bem-sucedidas. Então, são o ponto de partida, não o objetivo final.

Durante algum tempo, o MEC cuidou desse trabalho, identificando escolas modelos, cujas experiências pudessem ser replicadas. Havia um ponto em comum em todas elas, especialmente no Piauí (um estado que vale a pena ser acompanhado): todas incluíam um amplo modelo de aproximação dos professores com alunos e com as famílias. Não apenas nos conselhos escolares, mas na própria visita dos professores às residências do aluno, para entender melhor suas necessidades.

Durante algum tempo, no Brasil, ganharam visibilidade – e espaço na mídia – especialistas em métodos corporativos, com a educação se resumindo a pressionar as escolas a obter bons resultados nos exames nacionais do IDEB (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) e do ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio). Com a superficialidade que caracteriza as discussões públicas, um desses especialistas chegou a propor que cada escola colocasse uma placa na entrada, com sua nota do IDEB ou do ENEM.

A visão meramente estatística gerou um conjunto de manobras, tanto por parte das escolas públicas quanto privadas. Um dos indicadores é o índice de repetência. Para melhorar o índice, alunos passavam sem condições. Em muitos casos, escolas selecionavam somente os melhores alunos para as provas nacionais.

Esse mesmo fenômeno ocorreu nos Estados Unidos, quando um grupo de filantropos, como Bill Gates e os Waltons, da Walmart, incentivou reformas educacionais baseadas nessa visão corporativa pré-Toyota.

Hoje em dia, um aluno médio norte-americano é submetido, ao longo de sua passagem pela escola, a mais de uma centena de testes padronizados, todos focados em matemática e no inglês. É uma espécie de taylorismo aplicado à educação.

No século em que a informação e a criatividade estão no centro das grandes mudanças, começaram a brotar experiências individuais muito mais eficazes e criativas, segundo levantou a jornalista Andrea Gabor em seu livro “Depois das Guerras Educacionais: Como as Escolas Inteligentes Aprimoram a Reforma Empresarial”, conforme artigo da analista Lyn Perramore.

Em algumas dessas escolas, seguiu-se o método corporativo. Mas, em lugar dos métodos de Fredrick Winslow Taylor, o pai do taylorismo – que, no início do século 20 treinava trabalhadores para funções repetitivas -, o guru foi W. Edwards Dreming, especialista em qualidade e estatística, que influenciou o modelo de sucesso da Toyota, no Japão. Seu método se baseia na contribuição dos funcionários comuns, derrubando o temor imposto pelas hierarquias e apostando na motivação intrínseca de todos os envolvidos no processo.

Em vez de estimular alunos e professores com chicote e cenoura, diz Gabor, obrigando-os uma rotina interminável de preparação para testes, essas escolas criaram um ambiente rico para aprender, explorar e desenvolver o potencial humano.

Em 1990, os cortes de impostos promovidos pela era Reagan depauperaram a rede pública, nela o Brockton High, que se tornou o maior e mais pobre colégio de Massachusetts. Com demissão em massa de professores, havia turmas gigantescas em cada sala, muitos dos alunos precisando de assistência especial.

O primeiro passo foi uma ação judicial que se tornou a Lei de Reforma Educacional de Massa de Massachusetts, de 1993, apoiado por uma ampla coalizão de partidos, associações empresariais, sindicatos de professores e Judiciário. Definiu-se um objetivo central: as reformas precisariam ser colaborativas, democráticas e não seriam impostas de cima para baixo,

Um grupo de professores e administradores elaborou novas metodologias, não apenas o básico, leitura e escrita, como uma série de habilidades não previstas nos testes padronizados, como falar, aproximar-se das belas artes, do teatro, dos esportes e atividades que permitissem a interação de alunos e famílias com as escolas. A prioridade maior era criar uma cultura de confiança, que fosse assimilada não apenas pelos alunos, mas pelos funcionários e professores.

Em 2012, pesquisadores de Harvard constataram que, com dois terços dos alunos da décima série em Brockton negros e hispânicos, 64% se qualificaram para bônus de alimentação, superando a maioria dos demais estudantes do Estado.

O que há em comum em todos esses movimentos progressistas é o respeito pelos processos democráticos, respeito aos professores, conquista de corações e mentes para aderirem espontaneamente ao projeto, abrindo espaços para inovação.

Mas, obviamente, esta é uma discussão a ser retomada depois que o país sair do pesadelo da Idade Média, representada pela Escola Sem Partido e pelo inacreditável Ministro da Educação Ricardo Vélez Rodríguez, lídimo representante da refundação do Brasil preconizada pelo Ministro Luís Roberto Barroso.

Luis Nassif

12 Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. Desconhecimento sobre a Idade Média

    É recorrente a alusão a “medieval” e “Idade Média” como “sinonimo” de TUDO que é visto (entendido!?) como negativo. Tais referências são eivadas de “pré-conceito” e certamente indicam falta de conhecimento aprofundamento sobre a “longa” (vários séculos) da Idade Média. Há vasta produção acadêmica em inglês e francês sobre as mais diversas nuances do período medieval da Europa Ocidental, com efeito é incorreto referir a tal  período como a “idade das trevas”. Certamente tais “fakes news” surgiram nas refregas do “período das Luzes”, levado à cabo por escritores de orientação maçônica em suas incansáveis estripulias na tentativa de desacreditar a Igreja – fautora da Cristandade – que se configurou a partir do Séculos IX e X.   

  2. Desconhecimento sobre a Idade Média

    É recorrente a alusão a “medieval” e “Idade Média” como “sinonimo” de TUDO que é visto (entendido!?) como negativo. Tais referências são eivadas de “pré-conceito” e certamente indicam falta de conhecimento aprofundamento sobre a “longa” (vários séculos) da Idade Média. Há vasta produção acadêmica em inglês e francês sobre as mais diversas nuances do período medieval da Europa Ocidental, com efeito é incorreto referir a tal  período como a “idade das trevas”. Certamente tais “fakes news” surgiram nas refregas do “período das Luzes”, levado à cabo por escritores de orientação maçônica em suas incansáveis estripulias na tentativa de desacreditar a Igreja – fautora da Cristandade – que se configurou a partir do Séculos IX e X.   

  3. a distensão política e social

    a distensão política e social nas escolas é fundamental para que

    todos os que participam da política educacional possam sentir-se

    co-participantes de um processo de crescimento humano…..

    lembro que no tempo de fhc era um tipo de relacionamento, depois

    com lula tudo mudou com um distensão evidente, inesquecível,

    de um tempo fundamental de incusão social, de lançamento de uma

    série de livros que abriam discussões na área de literatura, et e tal….

    quer dizer: a políica governamental tem tudo a ver com a

    educação, determina quase tudo….

  4. Quando o h a d d a d era

    Quando o h a d d a d era ministro da educação, fizeram um filtro dentre as escolas que tinham alunos com piores condições economicas e melhor desempenho  no enem. Se nao me engano boa parte delas seguia um mesmo modelo pedagogico diferenciado… mas parece que isto se perdeu na midia e nas acoes do mec… vcs deviam retomar/fomentar tal pesquisa…. muitas escolas se orgulham de terem as melhores notas, porem se for feita uma avaliação o fator escola pouco transformou o estudante: simplesmente alojaram e deram tempo ao aluno estudar… algumas com notas abaixo pegaram um publico de pouco conhecimento e realizaram verdadeira transformação, e estas é que deveriam ser avaliadas

  5. “Apesar”?!?
    Nassif, o antepenúltimo parágrafo precisa ser reescrito. Duvido que o preconceito presente nele por meio do mau uso do advérbio “apesar” seja original do texto que você consultou; espero também que não seja intencional de sua parte, pois destrói todo o espírito democrático de seu raciocínio.

  6. Penso Logo(S) ReXisto

    Poema “Z”

    Para Dilma, Lula e o PT e todos/as os/as progressistas do mundo inteiro. Sinta-se homenageado/a, também.

    Penso

    Logo(S)

    ReXisto

    (Autor: Cláudio Carvalho Fernandes. Poeta (anarcoexistencialista). Teresina, PIauí)

    #LulaPresoPolítico
    #LulaLivre

    :.:
     

  7. O tal Ministro da Educação é

    O tal Ministro da Educação é inqualificável. O cara é uma aberração total. Verdade que nesse país a educação nunca foi levada a sério e a cultura sempre foi deprezada. mas dessa vez exageraram.

    Olha, a realidade nunca me deixou ser otimista com o futuro do país. Não quero desanimar ninguém, mas pelo que tô vendo vai difícil sair do atoleiro em que nos metemos. Tem que repensar tudo e tem que começar já.

     

  8. Sobre o ministro da educação,

    Sobre o ministro da educação, após a entrevista dele na Veja fiquei numa dúvida cruel, não sei se ele é um colombiano de merda ou um merda de colombiano. O que sei é que ele é um colombiano que veio ao Brasil roubar nossa Educação.

  9. O fator Ricardo Vélez

    Tudo o que vem no bojo de Ricardo Vélez – o Escola Sem Partido, o macartismo nas escolas públicas e a sua consequencia lógica de migração em massa para as escolas privadas de baixíssima qualidade mas que não incomodam os pais, a idiotia do estudo em casa (“homeschooling”) de uma geração de pais que queriam clones e tiveram filhos, a substituição de qualquer técnica científica de medição por youtubices olavetes – arremessará a educação brasileira décadas de volta em todo o esforço de avanço e modernização.

    Para um país que já estava atrasado em relação ao que está acontecendo na vanguarda da educação mundial, é garantir que iremos para a rabeira mundial em termos de educação. Mas tudo bem, o Deus dos Neopentecostais e da Opus Dei nos salvará disso. RISOS.

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador