por Wilson Ferreira
Um operador de um crematório na antiga Tchecoslováquia, às vésperas da invasão nazista, é um respeitado e aparentemente equilibrado chefe de família que recita nos jantares teses do Livro Tibetano dos Mortos, é obcecado em budismo e reencarnação. E também acredita na missão messiânica da sua profissão: acelerar o trabalho de Deus de fazer o homem retornar ao pó. Essa mistura de cristianismo e budismo na sua cabeça vai encontrar o esoterismo nazi que começa a se espalhar pelo país – a pureza da raça ariana cujas origens milenares estariam no Tibete e a sabedoria guardada pelos lamas. O filme “O Cremador” (Spalovac Mrtvol, 1969) do diretor tcheco Juraj Herz é um mergulho no psiquismo da chamada “banalizadade do Mal”, motor psicológico do nazi-fascismo: como um homem aparentemente equilibrado e sem precedentes violentos mistura cristianismo, budismo e ocultismo nazi para se auto-investir com um propósito sinistro: eliminar a dor e a impureza desse mundo através das fornalhas do seu crematório.
Antes da II Guerra Mundial, ocultistas alemães acreditavam que a Terra era oca, e dentro dela habitava uma super raça com poderes telecinéticos, o “vril”. Sociedades ocultistas como Thule e a Vril na Alemanha contataria esses seres para que os nazistas utilizassem esses super poderes. Antes da guerra iniciar, a SS promoveu expedições oficiais entre 1931 e 1936 para visitar os lamas no Tibete em busca de poderes ocultos e uma suposta origem da raça ariana na Ásia. Em Berlim, os nazis permitiam o ensino do budismo por mestres tibetanos. E a suástica, símbolo indiano e tibetano da boa sorte imutável, tornou-se o símbolo do Partido Nazista.
Na Europa a febre de interesse por ocultismo começou na segunda metade do século XIX, prolongando-se no século XX adentro. O modismo dominava salões e círculos intelectuais – e na Alemanha o Ocultismo encontrou um terreno fértil para se desenvolver em seus aspectos mais sombrios. Pessoas aparentemente sérias e equilibradas passaram a acreditar que poderiam criar uma nova ordem global a partir de ideias e práticas ocultistas.
O filme eslovaco O Cremador é um verdadeiro estudo do caráter psicológico oculto por trás dos aspectos mais conhecidos da ascensão do nazi-fascismo. Mas com uma forte carga de alegoria.
O diretor Juraj Herz ficou conhecido pelo seu interesse nos aspectos góticos, grotescos, surreais e decadentes por meio de uma estilização gótico-barroca. O seu protagonista, com um rosto redondo que sugere um Adolph Hitler por meio de referências ao ator Peter Lorre, domina a tela: é o operador de um crematório na Tchecoslováquia no final dos anos 1930 às vésperas da invasão nazista ao país.
A narrativa mostra como um típico chefe de família de classe média, aparentemente equilibrado e respeitado, aos poucos vai adaptando suas convicções sincréticas cristãs e budistas à ideologia nazista da pureza racial que progressivamente invade o país.
“Ao pó retornarás…”
Obcecado por budismo e a crença na reencarnação, Kopfrkingl (Rudolf Hrusinsky) também crê no papel sagrado e cristão da sua profissão: “O Senhor disse: ‘Lembre-se, tu és pó e ao pó retornarás’. Um crematório, queridos amigos, é claramente um instrumento que agrada a Deus, porque O ajuda a acelerar a transformação das pessoas em pó”, diz o protagonista em uma linha de diálogo.
Certamente, o leitor já deverá estar imaginando como essa convicção cristã facilmente vai se amalgamar com o ocultismo tibetano e a ideologia nazi da pureza da raça.
O Cremador vai aos poucos mostrando o mecanismo psicológico da conversão de Kopfrkingl, como ele absorve toda ideia que atravessa a sua mente: a eficiência da cremação, budismo, reencarnação, a noção nazista da pureza do sangue, ocultismo nazi, tudo se fundindo na fornalha da sua mente para reforçar um íntimo complexo messiânico.
O Filme
Kopfrkingl é um respeitado chefe de família de classe média em Praga, e o operador do crematório à espera da sua promoção a diretor do complexo – o chamado “templo da morte”.
Seu livro inseparável é Tibete: Magia e Mistério da escritora espiritualista Alexandra David-Néel (budista e exploradora na década de 1920, com grandes estadias no Tibete adquirindo conhecimentos esotéricos dos lamas) que cita e recita nos jantares em família, com sua esposa e um casal de filhos adolescentes.
Kopfrkingl crê numa função transcendental do seu trabalho: libertar as almas do corpo para que alcancem o éter e voltem a se reencarnar. A morte é sempre bem-vinda e presta um serviço inestimável para o mundo.
“O sofrimento é um grande mal e temos que fazer de tudo para aliviá-lo”, diz insinuando a eutanásia. Também se apresenta como abstêmio, não fuma e nem bebe, e aparenta um caráter convicto. Porém, apenas esconde dois vícios profundos: o desejo por prostitutas e bordeis; e a ambição em subir socialmente.
A narrativa basicamente consiste em grande monólogos interiores do protagonista, acompanhado de uma trilha composta por um coro fantasmagórico e planos de câmera inusitados como deformações em grande angular e cenas a partir do ponto de vista de objetos em movimento.
Kopfrkingl parece seguro de si, mas aos poucos é influenciado pelas ideias sobre a pureza do sangue divulgadas pelo partido nazista que aos poucos se infiltra na vida política, enquanto as tropas alemãs aproximam-se das fronteiras do país.
Budismo funde-se com nazismo
O homem que tem como profissão transformar pessoas em cinzas e um apego esotérico bizarro pela arte da cremação, começa a justificar a invasão pelos alemães. Afinal, para ele são tão civilizados quanto os checos – a Alemanha também tem leis de cremação desde os tempos antigos.
Obcecado por budismo e reencarnação, integrando com crenças cristãs que fala em seus sermões funerários, Kopfrkingl começa a conciliar budismo com nazismo. Ele conclui maravilhado que os campos de extermínio, com seus crematórios, irão limpar o mundo do sofrimento.
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Onde assistir????
Fico com
Onde assistir????
Fico com água na boca com as diicas do Wilson, mas nunca acho os filmes…
Wilson, dê uma olhada nesse
Wilson, dê uma olhada nesse site.
makingoff.org
Caro Jorge
No makingoff,
Caro Jorge
No makingoff, segue o link:
http://makingoff.org/forum/index.php?showtopic=6794
Nesse blog, é uma maravilha, para quem quer fugir do convencional.
É muito rico em filmes.
Boa sorte
Deveria existir uma “Netflix
Deveria existir uma “Netflix alternativa” onde se poderia encontrar esses fiolmes de arte. O blog “toca dos cinéfilos” é péssimo.
making off
Infelizmente não consigo acessar o site….mas a sugestão é excelente. existe alguma alternativa? Obrigado.