A pedagogia bolsonariana do assassinato, por Fábio de Oliveira Ribeiro

Num dia o Ministro da Educação resolveu destruir financeiramente as Universidades Federais brasileiras. No outro o presidente autorizou a importação de fuzis e a compra de 5 mil cartuchos por cidadão

Em julho de 2016, aqui mesmo no GGN, fiz algumas observações sobre a pedagogia do opressor https://jornalggn.com.br/sociedade/reflexoes-sobre-a-pedagoria-do-opressor-adotada-pelo-governo-provisorio/. Às tentativas de censura e ataques feitos contra a obra de Paulo Freire pelo usurpador Michel Temer, se somaram agora os decretos do desgoverno Jair Bolsonaro que pretendem destruir o que resta dos direitos sociais e dos direitos humanos.

Num dia o Ministro da Educação resolveu destruir financeiramente as Universidades Federais brasileiras. No outro o presidente autorizou a importação de fuzis e a compra de 5 mil cartuchos por cidadão. Crianças poderão ser ensinadas a usar armas de fogo desde que isso seja autorizado pelos pais. Bolsonaro também prometeu que modificar a legislação para permitir que qualquer pessoa possa cometer assassinatos nas ruas sempre que julgar necessário.

O direito a vida e à dignidade humana, a proibição da pena de morte e a criminalização dos grupos de extermínio, as garantias a educação, saúde e previdência social pública prescritas na CF/88 não estão sendo apenas revogados. Eles estão sendo substituídos pelo direito de morrer de inanição ou a tiros e pelo direito de matar com impunidade garantida pelo Estado.

A pedagogia do opressor da era Temer está rapidamente se transformando na pedagogia do pistoleiro Jair Bolsonaro. Em algum momento, o tirano se sentirá suficientemente tranquilo para substituir a Lei das Delações Premiadas pela Lei dos Assassinatos Políticos Premiados. O prêmio oferecido ao assassino neste caso não poderá ser apenas a impunidade (pois está já estará garantida). Suponho, portanto, que o “assassino premiado” da era bolsonariana receberá uma premiação em dinheiro.

No mês de julho de 2016, também no GGN, comparei o lawfare contra José Dirceu e a Lula às degolas que ocorreram em nosso país https://jornalggn.com.br/artigos/sergio-moro-e-os-cacadores-de-cabecas/. Jair Bolsonaro é incapaz de sutilezas e já está demonstrando que não é adepto das metáforas. Ele quer ver petistas, gayzistas, sem-terras, índios, comunistas, etc realmente degolados pelos seus adversários. Em razão da resistência do Exército a cumprir essa missão, o tirano brasileiro está criando condições materiais e jurídicas para que o trabalho sujo seja feito por seus fanáticos seguidores.

A Shoah, ou seja, o genocídio dos judeus europeus – que foi meticulosamente concebido, organizado, estruturado e concluído pelo III Reich nos anos 1930 – não pode servir de modelo para a obra macabra que Jair Bolsonaro pretende realizar no Brasil. O mais provável é que esse pedagogo do assassinato busque inspiração no genocídio que ocorreu em Ruanda em 1994.

O que causa mais estranhamento no caso brasileiro é o apoio que o tirano genocida está recebendo de advogados, procuradores e juízes. Nos últimos anos uma verdadeira legião de juristas parece ter se convencido de que o “direito a matar” deve ser mais sagrado do que o “direito à vida”. A “pedagogia do pistoleiro” encontra um solo fértil.

Eu fiz o curso de Direito nos anos oitenta, na fase final da Ditadura Militar. A esmagadora maioria dos meus professores não era de esquerda. Alguns eram liberais, outros eram de direita. Mesmo assim, posso dizer com absoluta segurança que até aqueles que odiavam os “barbudinhos do PT” ficariam horrorizados ao ver Jair Bolsonaro prometer aos cidadãos o direito de cometer assassinatos com garantia de impunidade.

O desgoverno Bolsonaro quer proibir o abordo, porque defende a vida. E quer revogar o direito à vida mediante a descriminalização do homicídio. Os problemas jurídicos que serão criados por este neo-necropenalismo são evidentes. Ninguém precisa ser especialmente perspicaz para imaginar exemplos que farão os juízes quebrarem as cacholas caso Bolsonaro consiga ver suas inovações referendadas pela maioria no STF.

Matar não é crime. Portanto, se um rapaz se sentir ameaçado pela moça que engravidou ele pode dar um tiro na cabeça dela e ninguém poderá condená-lo. O que ocorreria se ele desse um tiro na barriga dela e matasse apenas o feto? Mesmo não podendo ser processado por homicídio tentado contra a moça (quando matar não é crime a Lei não pode considerar criminosa a tentativa) ele poderia ser processado por abortar o filho de ambos?

Antes de embarcar na aventura genocida de Jair Bolsonaro os juristas que o defendem deveriam pensar melhor. O problema é que dificilmente alguém consegue fazer isso quando já engatilhou uma arma dentro da cabeça.

A direita tradicional brasileira costuma dizer que “o governo não pode dar o peixe, ele deve ensinar o povo a pescar”. A esquerda faz várias objeções a esta simplificação: para pescar é preciso material de pesca, o rio não pode estar poluído e não adianta nada o pescador chegar em casa com o peixe se ele não tiver dinheiro para pagar o botijão de gás.

Jair Bolsonaro quer tirar o peixe da mesa do trabalhador aposentado e não ensinará ninguém a pescar. O que ele pretende fazer é ensinar o pescador a matar depois de ter aumentado o preço do gás, facilitado a poluição do rio e mandado o policial da esquina apreender a vara de pesca do sem-terra miserável. Mate que o presidente colocará comida na sua mesa – esse é, sem dúvida alguma, o maior axioma pedagógico do novo regime.

Fábio de Oliveira Ribeiro

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