Por Amanda Costa
para o Acerto de Contas
Iniciando a temporada 2011 de posts, venho tratar de um tema que me é muito caro: os jogos eletrônicos. Mas, antes de iniciar o texto propriamente dito, não posso deixar de registrar meus parabéns à nossa primeira presidenta, Dilma Roussef.
Quando a campanha eleitoral estava ainda no início, havia declarado meu voto em José Serra. Minha intenção era votar em Marina Silva no primeiro turno, e em José Serra no segundo. Mas com o andar da carruagem, e percebendo o baixíssimo nível da campanha tucana, não tive dúvidas de que deveria depositar o meu voto na candidata Dilma. E aquilo que antes me parecia uma desvantagem da então candidata (falta de experiência política), hoje me parece uma virtude. Oxalá, inauguremos uma nova forma de fazer política nesse país, sem os velhos clientelismos.
Retomando a temática do post, devo indicar primeiramente o link para os que tiverem interesse em baixar o artigo que resultou da minha pesquisa de Trabalho de Conclusão de Curso em Pedagogia na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). O artigo “Hipermídia Didática: relato de uma experiência no ensino médio” sistematiza o experimento que realizamos (eu, meu orientador Dr. Sérgio Abranches e o professor de Física do Colégio de Aplicação, Ms. Ricardo Amaral) no início do ano passado ao desenvolvermos um jogo de computador para o ensino de Física no 1º ano do ensino médio.
Embora eu já tivesse experiência na criação de mídias para educação, foi a primeira vez que desenvolvi um jogo propriamente dito, com regras, personagens, penalidades, recompensas, enfim… tudo o que compõe o universo dos jogos. A partir de então, me encantei com a experiência e tenho direcionado minha atenção a tudo o que se refere ao desenvolvimento desse tipo de software, especialmente às questões de natureza didática que devem nortear o processo de produção para o contexto educativo.
Aproveito para pedir sugestões de leitura na área, pois a literatura que trata desse recorte (pressupostos pedagógicos para o desenvolvimento de jogos) é muito escassa, dado o seu caráter emergente. Há vasta literatura sobre o desenvolvimento de jogos em suas implicações de ordem mais técnica (linguagem de programação, concepção de interfaces, arquitetura de informação etc.), mas os aspectos de ergonomia próprios da dimensão pedagógica compõem um segmento ainda muito novo e, devo admitir, fascinante.
Outro objeto de investigação, ligado aos jogos de computador, que também ganha força (especialmente fora do Brasil) é o dos efeitos que eles provocam no psiquismo, e mesmo nos cérebros, daqueles que se dedicam a ficar horas diante de uma máquina interagindo com mundos virtuais. Com o avanço da tecnologia de jogos, que favorece a criação de ciberexperiências cada vez mais complexas e envolventes, suas possíveis conseqüências começam a levantar questões absolutamente pertinentes para os desenvolvedores, mormente aos que se dedicam à produção de jogos com propósito educativo.
Quem acompanhou as manchetes de tecnologia nos últimos dias deve ter se deparado com a notícia de que uma empresa japonesa de desenvolvimento, a Nintendo, anunciou que a próxima geração de seus aparelhos de game portáteis, Nintendo DS 3D, que, como o nome indica, virá com a tecnologia de visualização 3D incorporada em suas telas, deve ser ajustada pelos pais para que crianças menores de seis anos vejam as imagens em 2D, como em uma tela comum.
Outras empresas como a Toshiba e a Sony também fizeram alertas do tipo, e a alegação é de que a tecnologia pode interferir no desenvolvimento normal da visão em crianças pequenas, pois a ilusão do 3D é provocada pelo envio de sinais diferentes para os olhos direito e esquerdo.
De fato, o que se sabe é que algumas pessoas que têm sido expostas à experiência de visualização de imagens com as novas tecnologias 3D reclamam de náuseas, e embora não exista nenhuma evidência médica de que essas tecnologias causem danos à visão, as empresas que têm interesse em incorporá-la aos seus produtos preferem divulgar um alerta e prevenir problemas futuros na justiça.
Apesar de o comunicado da Nintendo parecer fundamentado em gossip, o fato é que há estudos sérios a respeito dos efeitos dos jogos e suas tecnologias sobre o desenvolvimento e a cognição dos sujeitos, inclusive em contexto educativo, e felizmente eles começam a ganhar relevância na esteira da popularização desse tipo de produto. Só em 2010, o mercado de jogos faturou 12 milhões de dólares nos Estados Unidos, e o seu crescimento é estimado em 10% ao ano.
O programa Milênio, da Globo News, também tratou do tema no último fim de semana, e trouxe a palavra de especialistas de universidades americanas a respeito de alguns dos aspectos mais relevantes das pesquisas sobre o uso de jogos por crianças e adultos.
No tocante aos jogos educativos, o professor americano Mike Edwards, da Universidade de New School, em Nova Iorque, que realiza um trabalho muito bem-sucedido de criação de jogos para o ensino fundamental e médio, diz que um dos elementos centrais do uso dos jogos em sala de aula deve ser o de favorecer nos estudantes a capacidade de gerenciar de forma competente os elementos que compõem o jogo. Nesse sentido, o jogo é entendido como um sistema no qual os elementos, e as relações entre eles, são tão importantes quanto os conteúdos escolares que estão sendo trabalhados.
A competência de aprender a pensar e tomar decisões dentro de um sistema, gerenciando habilidades pertinentes, seria uma vantagem trazida pelos jogos educativos concebidos dentro da perspectiva defendida pelo professor. Algo que está muito distante da sala de aula tradicional.
Outra vantagem apontada para o uso de jogos na escola é a mudança de perspectiva que eles trazem como instrumento de avaliação, pois ao contrário da prova tradicional, na qual o aluno não aprende nada, apenas reproduz conhecimento, no jogo educativo concebido como sistema o estudante aprende mesmo quando se dá mal na solução de um problema, uma vez que ele pode aproveitar essa experiência adquirida com o erro para jogar novamente ou para lograr êxito em outra etapa semelhante do jogo.
Essa concepção de avaliação materializa aquilo que os construtivistas dizem desde os tempos do meu bom e velho Piaget, “o erro faz parte do processo de aprendizagem”. Ora, se o processo de aprender é fundamentalmente um processo investigativo a respeito de um sistema, é evidente que o aprendente vai esbarrar em dificuldades e cometer erros, e o aproveitamento da experiência do erro é importante para a aprendizagem como um todo. Na pior das hipóteses, com o erro (e com a compreensão das razões que o conduziram ao erro), o aluno aprende pelo menos o que não deve ser feito para avançar, e os jogos concebidos como sistema favorecem essa abordagem que tira o melhor proveito de qualquer ação, sempre a favor da aprendizagem.
Nos próximos posts, vamos expandir o tema para outros aspectos da ciberexperiência provocada pelos jogos que têm sido objeto de investigação científica, e que se relacionam principalmente com as mudanças que podem provocar naquilo que entendemos hoje como a forma tipicamente humana de pensar e de viver em sociedade.
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Amanda Costa é autora do blog www.pedagoguices.com, tem formação profissional em computação gráfica e editoração eletrônica para mídia impressa pela Data Control, graduação em Pedagogia pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), experiência acadêmica em pesquisa e desenvolvimento de software educativos baseados em Action Script e animação tridimensional.
A ciberexperiência dos videogames: questões pertinentes – II
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