O debate sobre a remuneração nas universidades paulistas

Tatiane Correia
Repórter do GGN desde 2019. Graduada em Comunicação Social - Habilitação em Jornalismo pela Universidade Municipal de São Caetano do Sul (USCS), MBA em Derivativos e Informações Econômico-Financeiras pela Fundação Instituto de Administração (FIA). Com passagens pela revista Executivos Financeiros e Agência Dinheiro Vivo.
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Enviado por Claudio W

Sobre a greve nas universidades paulistas

Da Adusp

As sérias consequências do arrocho salarial

Muitas informações interessantes podem ser extraídas deste gráfico, em particular o resultado dos movimentos de greve em 1994, 2000 e 2004. O que talvez mais chame a atenção é que após a enorme perda imposta em apenas dois anos — entre 1989 e 1991 — foram necessários quase 25 anos para que recuperássemos uma parcela significativa do poder aquisitivo real médio que nos tomaram. Aparentemente, um novo ciclo de arrocho se inicia com o mandato de Zago e Vahan. A história nos ensina que é preciso resistir com firmeza a este tipo de iniciativa, pois deixa marcas indeléveis no corpo e nas atividades-fim da universidade.

O arrocho de salários, como já vimos acontecer na educação pública básica, contribui para a corrosão e eventual destruição da capacidade instalada, constituindo-se em enorme desperdício de investimento público anteriormente destinado ao setor. Além disso, potencializa a privatização interna da universidade pública, em particular através das fundações privadas, ditas “de apoio”.

De pouco vale a “temperança” que a atual administração tenta passar aos docentes por meio de vídeos e cartas. O fato é que sem a luta — que empreendemos e continuaremos a empreender — por mais investimento nas universidades estaduais paulistas, assistiremos, em pouco tempo, ao desmonte destas instituições como universidades que mereçam esse nome.

Causa surpresa que a Reitoria considere inapropriado responsabilizar o governo estadual pela falta de financiamento perene e adequado para contemplar a expansão das universidades estaduais paulistas, ou que defenda como legítimo, por exemplo, o desconto do montante da Habitação da base de cálculo do repasse a que elas fazem jus. Todos aqueles que leem com atenção (e um mínimo de isenção) a argumentação amplamente divulgada pelo Fórum das Seis e pela Adusp sabem que tínhamos duas frentes:

Arrocho é inaceitável e há espaço para negociação;

A situação das universidades estaduais é séria e precisamos agir de forma enérgica para mudar o enunciado do artigo 4º da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de forma que recebam o mesmo tratamento que os municípios, o que nos levou a defender a introdução da expressão “total do produto do ICMS”. Isto porque estamos no Brasil; em países organizados não seria necessária a mudança de redação para que as bases de cálculo de municípios e das universidades estaduais fossem as mesmas.

Adicionalmente, cabe destacar que, conforme mostra estudo do Sindicato dos Agentes Fiscais de Renda do Estado de São Paulo (Sinafresp), a lei que instituiu a Nota Fiscal Paulista viola preceitos básicos e precisa ser revista. Em particular, como já escrevemos, ainda que seja uma iniciativa destinada a combater a sonegação, não pode ser financiada por meio da retirada de recursos dos municípios e do financiamento de direitos sociais fundamentais, tais como educação e saúde públicas.

Argumentar, como fez o reitor da USP, que um artigo do secretário da Fazenda responde a essas questões é o mesmo que argumentar ser indevido suspeitar de raposa indicada para cuidar de um galinheiro. Afinal, o governo Alckmin é mais um exemplo dos que têm ojeriza da vinculação de verbas para o financiamento dos direitos sociais fundamentais da população paulista.

Os demais membros do atual Cruesp reconheceram a validade e oportunidade das propostas (1) e (2) acima, tanto é que, à sua maneira, tentaram intervir na Assem­bleia Legislativa (Alesp) durante o debate da LDO-2014. Só o reitor da USP, isolado, publicamente avisa o governo e propala aos docentes da USP que as universidades estaduais não precisam de mais recursos. Interessante esta postura, mais adequada a um representante do gover­no na USP, do que a um mandatário da USP perante o governo.

Registre-se que o Cruesp há tempos sabe que os 9,57% são insuficientes. Ofício datado de 29/7/2005, assinado pelo professor Marcos Macari, então presidente do Cruesp, reivindicava a passagem dos 9,57% para 10,27%. Os argumentos apresentados no ofício envolvem, entre outras ponderações, a expansão das estaduais paulistas. Vai ver que a atual administração da USP também não sabia disto; no entanto, suas declarações desqualificam seus pares do Cruesp, de ontem e de hoje. Aparentemente, a atual gestão reitoral da USP não parece importar-se com isto. Fato é, porém, que se trata de atitude incompatível com o exercício dos cargos de reitor e vice-reitor.

Interessante também a repetida assertiva da atual administração de que de nada sabia, tudo ignorava, embora seus expoentes compusessem a administração J.G. Rodas. Será que não era para desconfiar da origem dos recursos destinados por J.G. Rodas às Pró-Reitorias, em particular a de Pesquisa, com os quais financiou-se um grande número de Núcleos de Apoio à Pesquisa (NAPs), os quais tiveram suas verbas confiscadas tão logo Zago e Vahan tomaram posse como reitor e vice-reitor?

Carta alguma da atual administração fará os docentes esquecerem as páginas amarelas da Veja, a entrevista no Estadão, as ameaças de corte do RDIDP, a desqualificação do pessoal docente que há anos dedica-se à USP, a manutenção no cargo do coordenador da Superintendência do Espaço Físico (SEF) depois de insultar docentes e estudantes, o modo desres­pei­toso como foi tratada a ques­tão da EACH, a ameaça de corte de ponto e o desrespeito ao direito de greve, a indisposição ao diálogo, à argumentação e à contestação… A lista já é longa e estamos apenas no primeiro semestre de mandato.

Salário real

Enquanto a Reitoria tergiversa, a tabela 1 indica o valor real do nosso salário em relação ao de maio de 2013, utilizando uma variedade de estimadores da inflação: ICV-DIEESE (o nosso padrão de estimativa), IPC da Fipe e Índice de Preços ao Consumidor Ampliado (IPC-A).

Frise-se que, em tempos de inflação não muito alta, perdas de cerca de 7% são muito significativas. Se a evolução inflacionária acirrar-se, esta situação pode agravar-se consideravelmente. É por isto que insistimos em não aceitar arrocho de salários: quando começa, é muito difícil de reverter.

A sangria continua

A perda de recursos por não termos a mesma base de cálculo dos municípios (i.e., não ter no artigo 4º da LDO a expressão “total do produto do ICMS”) permanece em 2014 e continuará vigorando em 2015! Até o mês de junho de 2014, não foram incluídos na base de cálculo das estaduais paulistas R$ 1,305 bilhão, incluindo o desconto mensal de R$ 104 milhões correspondente à Habitação. Se incluirmos os 75% de R$ 999,8 milhões distribuídos pela Nota Fiscal Paulista em abril/2014, o montante faltante na base de cálculo dos 9,57% das estaduais paulistas atinge, apenas no primeiro semestre de 2014, R$ 2,055 bilhões! Ou seja, até agora essa prática já subtraiu, em 2014,  R$ 197 milhões das universidades públicas estaduais!

Ida ao Palácio

Faz parte da nossa luta contra o arrocho salarial, continuarmos a nos empenhar em obter mais investimento em Educação Pública em geral e nas universidades estaduais paulistas em parti­cu­lar. Com esta perspectiva, o Fórum das Seis protocolou pedido de audiência com o governador do Estado e realizará, no dia 14/8, Ato Público no Palácio dos Bandeirantes. Até agora, não recebemos resposta do governo. Apresentamos ao governador Alckmin no ofício, e o faremos também no Ato, nossas reivindicações de maior investimento na Educação Pública em geral, assim como na USP, Unesp, Unicamp e Centro Paula Souza.

Somente nossa mobilização e nossa organização podem, de fato, garantir condições dignas de vida e trabalho para o corpo da universidade, resistindo ao descompromisso do governo estadual em dar a devida prioridade à educação, bem como às ameaças e à intransigência que têm caraterizado a administração da USP até agora.

Tatiane Correia

Repórter do GGN desde 2019. Graduada em Comunicação Social - Habilitação em Jornalismo pela Universidade Municipal de São Caetano do Sul (USCS), MBA em Derivativos e Informações Econômico-Financeiras pela Fundação Instituto de Administração (FIA). Com passagens pela revista Executivos Financeiros e Agência Dinheiro Vivo.

13 Comentários

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    1. salários

      Pois é, ia fazer  a mesma pergunta. O povo, que sustenta a USP , não tem idéia dos valores recebidos por professores e servidores a título de salários e vantagens (inclkusive aposentadoris cheias) e a relação com a prestação de serviços. O povo não tem idéia da contrapartida social das universidades públicas financiadas pelo governo do estado de São Paulo. Depois de ter sido divulgado que a USP compromete em salários mais de 100% do que recebe, é preciso ficar de olho nas “inteligências”.  

  1. Causa surpresa que a Reitoria

    Causa surpresa que a Reitoria considere inapropriado responsabilizar o governo estadual pela falta de financiamento perene e adequado para contemplar a expansão das universidades estaduais paulistas,

     

    hahaha. De fato, o Tucanistão não tem Governo, é uma anarquia, por isso é inapropriado jogar a culpa em lideranças.

  2. Salários nas universidades estaduais e federais

    Gostaria de ver uma comparação entre a remuneração nas universidades paulistas e as federais. Aí sim, teríamos melhores condições de avaliar melhor. Se isso acontece com professores universitários, com os demais servidores estaduais a situação deve ser de calamidade.

    1. Não ria, por favor!

      Prezado, sou professor adjunto III (acima de meu nível, só o adj. IV, associado e titular, que é, virtualmente, impossível de alcançar), 40h, DE, numa IFES; sou, também, coordenador de meu curso há quase quatro anos.  Atuo, ao mesmo tempo, na graduação,  no mestrado e num projeto de aperfeiçoamento voltado para professores da educação básica da rede pública. Participo de várias comissões oficiais e de um dos conselhos superiores da universidade. Sou professor desde 1985; doutor (pela USP) desde 1998; tenho, livros, capítulos e artigos publicados; sou parecerista de revistas A2 do Qualis/Capes.  Meu salário deste mês? R$ 8.000. Vamos compará-lo ao de qualquer profissional com qualificações semelhantes em qualquer outro ramo de atividade? 

      1. Vamos sim entao, porque nem o

        Vamos sim entao, porque nem o gerente nacional de convencoes e meetings da MacMillan-McGraw Hill fazia 3800 dolares por mes.  E eu o conheci.

          1. Cara Anarquista lúcida, creio

            Cara Anarquista lúcida, creio que há um engano no post do professor Carlos. Eu que entrei a 6 anos no magisterio federal e ainda só com o mestrado tenho o salário igual o dele. Alias sou adj III também.

          2. Ele nao se enganou nao

            Sou aposentada por uma universidade federal, adjunto II, com doutorado. Ganho líquido um pouquinho mais de R$7.000,00, já incluindo vários triênios (entrei como assistente, tive vários anos antes de completar o doutorado e passar a adjunto). E você é adjunto só com mestrado e 6 anos de serviço na universidade? Conta outra. 

      2. Prof.Carlos, era justamente

        Prof.Carlos, era justamente aí que eu queria chegar. Nas universidades federais o salário inicial de professor com doutorado já é mais de 8.000; Alguem com o seu currículo e com o seu tempo de serviço, estaria ganhando pelo menos o dobro.

      3. Srs leitores creio que houve

        Srs leitores creio que houve um engano no post do Professor em lide, a renda que ele alega receber é bem diferente da que eu conheço.

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