O exemplo das escolas públicas com notas acima da média no Ideb

Sugerido por Assis Ribeiro

Do Correio Braziliense

Projeto pedagógico inovador garante às escolas públicas notas altas no Ideb
 
Manoela Alcântara
 
Com criatividade e inovações no projeto pedagógico, alguns colégios da rede pública alcançam notas acima da média nacional no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), do Ministério da Educação. Pelo menos três instituições são vistas como exemplos às demais
 
É raro encontrar uma família que confie a educação dos filhos a um colégio público por escolha e não por necessidade. Com a degradação do ensino gratuito no cenário nacional, muitos acreditam que os estudantes terão uma formação deficiente, especialmente nos primeiros anos de vida escolar. Mas algumas das 402 instituições de ensino fundamental do DF provaram o contrário. Alcançaram notas acima da média nacional no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), medido pelo Ministério da Educação, sem terem privilégio sobre as demais. Nenhuma delas recebeu verba extra do governo ou funciona em palacetes. Trabalham contra todas as dificuldades. Ainda assim, encontraram a excelência por meio do comprometimento de gestores e professores, além de apostar em ações criativas.
 
O segredo é simples. É uma soma entre o envolvimento ativo dos pais, as políticas pedagógicas regidas por metas e as avaliações de erros para a construção de acertos. Melhores resultados também foram notados após a redução de alunos por turma e na adequação dos projetos de ensino às necessidades de cada região. Guiado por um estudo da Universidade Católica de Brasília (UCB), o Correio visitou três instituições de ensino fundamental que desenvolveram modelos de sucesso.
 
Uma delas é a Escola Classe 03,  do Paranoá. Mesmo instalada em uma cidade periférica e pobre, a instituição alcançou nota 6,7, similar ao índice médio do ensino privado no DF, de 6,8. Entre 783 alunos atendidos, ali, está Luana Cristina Damasceno, 10 anos. Em oito meses, ela leu nove publicações. “A cada livro, conheço um mundo diferente. Vim de uma escola sem esse tipo de incentivo. Aqui, aprendi mais palavras e melhorei a interpretação”, disse.

 
A paixão de Luana pelo hábito nasceu no espaço construído a duras penas, no centro de ensino sediado há 20 anos num local que era para ser provisório. Só saiu do papel com o dinheiro de bazares e de festas organizadas pela instituição. O incentivo à leitura foi uma aposta da direção para fortalecer a formação dos estudantes. “Não somos uma escola de 1.001 projetos. Escolhemos um, no caso, a leitura, para ser o ponto forte. Os alunos devem saber interpretar uma diversidade de gêneros textuais, desde a literatura até uma bula de remédio”, detalha o vice-diretor da instituição, Cássio de Azevedo Guedes.
 
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A Escola Classe 03 não conta com vários requisitos necessários para o bom desempenho. Metade dos computadores do laboratório de informática está quebrada, aguardando uma manutenção do MEC, que parece não chegar nunca. Em dias quentes, as telhas de amianto fazem a temperatura das salas de aula alcançar os 40 graus. Ainda assim, o colégio aparece entre os melhores do DF.
 
A escola é acompanhada pelo Núcleo de Ensino, Aprendizagem e Formação de Professores da UCB. Coordenadora da pesquisa, a professora Lêda Gonçalves investiga o desenvolvimento humano em contextos socioeducativos diversos e quis ver de perto o porquê dos índices positivos. “Em uma das instituições que concluímos a pesquisa, observamos o desenvolvimento de um projeto pedagógico com metas, independentemente da gestão. O foco é o aprendizado por meio da provocação dos estudantes, contribuindo para o desenvolvimento da autonomia deles. Não é somente um professor copiando a matéria no quadro”, detalhou.
 
Em Taguatinga, em meio a tantas escolas com rendimentos acadêmicos fracos, a Escola Classe 39 é uma ilustre exceção. O Ideb da instituição é 6,8, enquanto a avaliação de outros centros de ensino da mesma cidade não passa de 4,0. Lá, um dos fatores de sucesso é o estabelecimento de metas educacionais. O projeto pedagógico é feito a longo prazo e, não, anualmente. O diagnóstico de determinados erros acontece periodicamente, impedindo a repetição deles no futuro. “Não há milagre na educação. Uma fórmula nova não é criada para mudar tudo como num passe de mágica. As experiências com questionários respondidos por professores, pedagogos, pais e alunos causam uma reflexão, que, posteriormente, é transformada em ação”, explicou a vice-diretora, Karine Silva Pereira.
 
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Um exemplo: há dois anos, uma das avaliações expôs a deficiência no aprendizado de matemática. A solução foi matricular os professores em um curso na Escola de Aperfeiçoamento dos Profissionais da Educação (Eape), da Secretaria de Educação. “Surtiu resultado, identificamos novos métodos de ensinar e incentivar os alunos”, completou Karine.
 
Participação
Na 4º e na 5º série, o primeiro lugar  no ranking do Ideb no DF ficou com a Escola Classe 314 Sul. Os 7,1 pontos obtidos na Prova Brasil — base para formular o exame — são bem superiores aos 5,0 alcançados no país e à média de 5,7 do DF (veja ilustração). Um dos pilares do bom desempenho é a interação da equipe e a participação da família no ensino. Para se ter ideia da intensidade do envolvimento dos pais com o ambiente escolar, a frequência de participação deles em reuniões com os professores supera 80%, raridade até mesmo nas escolas particulares. “Eles complementam o trabalho realizado em sala de aula, participam de todas as etapas da vida do aluno na escola e sugerem melhorias. Isso aumenta em 60% o aprendizado das crianças”, exemplificou a diretora, Sandra Niel de Melo.
 
Embora seja uma rede, as boas práticas, no entanto, não se repetem em todas os colégios. Entre as 336 pesquisadas pelo MEC, 253 apenas alcançaram a média do DF. A coordenadora do Ensino Fundamental da Secretaria de Educação, Kátia Franca, ressalta que a capacitação dos professores é feita, mas a direção e as ações pessoais fazem a diferença. “As escolas têm autonomia. Alguns fatores contribuem para isso: as iniciativas individuais, a formação dos gestores e a participação da comunidade no ambiente escolar”, enumerou.
 
Colaborou Ariadne Sakkis
 
Destaque
Ela está abaixo somente do Colégio Militar Dom Pedro II, que adquiriu a média 7,2. Mesmo assim, a Escola Classe 314 Sul pode ser considerada a primeira pública porque a outra tem caráter híbrido (pública e privada). O colégio é subordinado à Diretoria de Ensino e Instrução (DEI), pertencente ao Corpo de Bombeiros Militar do Distrito Federal (CBMDF) e não recebe verba do governo para fazer manutenção.
 
“As escolas têm autonomia. Alguns fatores contribuem para isso: as iniciativas individuais, a formação dos gestores e a participação da comunidade no ambiente escolar”
Kátia Franca, coordenadora do Ensino Fundamental da Secretaria de Educação
Redação

6 Comentários

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  1. Esse estudo abre uma

    Esse estudo abre uma possibilidade :

     

    Rotação dos gestores entre as diversas instituições e demissão dos piores gestores. Simples assim.

     

    A estabilidade ampla e irrestrita para todos os servidores públicos burrrada que o constituinte de 88 cometeu. Deveria tê-la restringido às carreiras típicas de estado. O resto – em especial médicos e professores – CLT !

     

    Saudações

  2. O exemplo das escolas públicas com notas acima da média no Ideb

    “É raro encontrar uma família que confie a educação dos filhos a um colégio público por escolha e não por necessidade.”

    A bem da verdade e para que nunca esqueçamos, é bom que se diga que até os anos 60, a escola particular (como negocio, como empresa) era praticamente inexistente. Com o incentivo (ajudazinha) do governo – lembre-se depois da gloriosa e nos bons tempos em que se respirava e vivia-se democracia – houve a necessidade de se criar a clientela para a escola particular. Para conseguir tal intento degradou-se de tal forma a escola pública que obrigou a classe media tirar seus filhos e matriculá-los na escola particular, com alto custo e nem sempre com especial qualidade.

    Vemos hoje que a escola pública, aos poucos, está se igualando, em qualidade, com a escola particular. Não é muita coisa considerando que estas deixam muito a desejar. Não é, como disse, mas, ao mesmo tempo, é muita coisa pois consegue-se isso somente com muito esforço e dedicação. 

    1. Análise equivocada

      Flávio, sua análise sugere que a “piora” da escola pública foi resultado de uma espécie de conspiraçao voluntária, para criar clientela para a escola particular. Mas essa criaçao de clientela veio depois, como consequência, e nao causa. O que aconteceu foi, em princípio, uma coisa boa: até os anos 60, apenas cerca de 50 % da populaçao chegava à escola PRIMÁRIA, e hoje chegam mais de 90%. Só que, para que essa universalizaçao fosse possível, foi preciso (dentro da lógica neoliberal, claro) aviltar os salários dos professores. O que acabou com o magistério como uma profissao possível a pessoas com boa escolaridade anterior. Isso tb trouxe para a escola uma clientela com muito mais problemas, e para a qual a escola nao estava adaptada, e ela nao quis se adaptar. Tudo isso, mas estrutura sucateada, turmas superlotadas, meios violentos, desinteresse dos alunos, etc., causou a situaçao atual. Que é complexa, nao pode ser analisada tendo em vista apenas um ou dois fatores. 

  3. escolas públicas no DF

    Claro que a reportagem se propõe apenas a mostrar uma breve vista da educação no DF, mostrando boas práticas educacionais ou de gestão que dão resultado. Mas mesmo assim dá prá perceber algumas mazelas. As experiências mostradas destacam a necessidade de planejamento; a segunda, inclusive, ressalta o planejamento a longo prazo e a capacitação dos professores. Ponto! Mas como fazer isso quando sabemos que, em muitas escolas, boa parte do  quadro docente é de professores com contrato temporário? Essa  prática, herdada de governos passados, não foi sequer arranhada pelo novo governo e, com certeza, é um dos principais problemas das escolas públicas do DF. 

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