A degradação do Elevado do Joá, no Rio de Janeiro

Do O Globo

Coppe recomenda reconstrução do Elevado do Joá

Luiz Ernesto Magalhães

Relatório aponta degradação estrutural; mas prefeitura, que encomendou estudo, contesta

Alerta vermelho no Elevado do Joá. Após 40 anos enfrentando a corrosão provocada pela ação das marés e pela infiltração da água da chuva, as estruturas em concreto armado que sustentam os 1.100 metros (em cada sentido) da principal ligação entre a Barra e a Zona Sul estão comprometidas, segundo estudo feito pelo Programa de Engenharia Civil da Coordenação dos Programas de Pós-Graduação em Engenharia (Coppe/UFRJ). De acordo com o relatório, a situação é tão grave que existe risco de colapso, embora não seja possível precisar quando isso poderia acontecer. Há quatro anos a equipe estuda as condições estruturais do Elevado do Joá.

No entanto, a prefeitura, que encomendou o estudo, argumenta que é preciso ouvir a opinião de mais especialistas. O secretário municipal de Obras, Alexandre Pinto, diz que o parecer da Coppe não pode ser considerado conclusivo. Segundo ele, o consórcio contratado para fazer a última recuperação estrutural do Joá teve como consultor o engenheiro Bruno Contarini, que descartou qualquer risco, desde que as estruturas corroídas fossem recuperadas.

Para o professor Eduardo de Miranda Batista, que coordenou o estudo da Coppe, a única solução possível seria reconstruir praticamente todo o elevado, adotando técnicas de engenharia mais modernas, que facilitem a futura manutenção. Ele recomenda que os estudos comecem desde já, antes que a situação chegue a um ponto incontornável, que exija a interdição total da via. Segundo Batista, pelo estado atual apenas os pilares de sustentação – que recentemente passaram por recuperação sugerida pela própria Coppe – podem ser mantidos.

Eduardo recomenda que sejam adotadas medidas imediatas para minimizar os riscos de acidentes. As principais são: proibir a circulação de caminhões e reduzir o limite de velocidade para ônibus e carros de passeio, de 80 km/h para 60 km/h. Hoje, caminhões só não podem circular pelo Joá nos horários de rush (das 6 às 10h e das 17h às 20h).

As conclusões do estudo serão apresentadas hoje, às 17h30m, num evento organizado pelo Clube de Engenharia e pela Associação Brasileira de Pontes e Estruturas (ABPE).

Alexandre Pinto rebate a avaliação da Coppe:

– Num relatório inicial, a Coppe não havia identificado qualquer problema nas estruturas. Eu não posso fazer uma interdição desse tamanho apenas com a opinião de um especialista. Para tomar a melhor decisão, vamos precisar ouvir mais especialistas. Por isso, esse evento no Clube de Engenharia é importante.

Já Eduardo faz uma analogia entre o que acontece no Joá e o atendimento médico a um paciente obrigado a conviver com a doença crônica que um dia poderá causar sua morte:

– A corrosão é a doença crônica do Joá. Nas últimas décadas, cada vez que o elevado apresentou um problema, houve uma intervenção emergencial. É como se o médico receitasse um remedinho para reduzir a febre do paciente, mas que é incapaz de curar a doença. O que acontece agora é que esse paciente se encontra em estado grave – comparou o especialista.

Eduardo explicou ainda que os sinais de degradação estrutural foram identificados no que é conhecido como dentes de apoio Gerber. Trata-se de uma estrutura construída em concreto armado, em forma dentada, na qual se apoiam as pistas e as vigas de sustentação. Ao todo, o Elevado do Joá conta com 1.996 dentes, sendo que a Coppe vistoriou 840 (42,1%). Cerca de 10% das estruturas inspecionadas estavam comprometidos. Em alguns casos, o concreto rachou e, em outros, é possível observar sinais de corrosão no ferro. A Coppe, no entanto, alerta que a situação pode ser ainda pior, já que, por uma falha de concepção do projeto, não há uma galeria de serviço que permita avaliar toda a extensão dos dentes de apoio. Tecnicamente, também não é possível usar guindastes para levantar um a um os 66 tabuleiros que formam as pistas, de modo a observar toda a estrutura.

– Para fazermos essa inspeção, tivemos que abrir janelas nas partes mais expostas dos dentes de apoio, junto à encosta e ao mar. O problema é que o método não permite inspecionar integralmente os dentes. E, nas partes mais internas, é possível que a corrosão seja maior, porque a água da chuva entra pelas juntas de dilatação e fica anos infiltrada, como se fosse uma piscina – explicou Luiz Roberto de Miranda, outro consultor do estudo.

O secretário Alexandre Pinto, por sua vez, diz que a empreiteira que fez a reforma do Joá identificou problemas em apenas 2% dos dentes.

Diagnóstico foi entregue em agosto

Segundo a Coppe, o diagnóstico foi entregue à prefeitura em agosto deste ano. Há dez dias, a instituição enviou ao município uma nova versão condensada, para reiterar as conclusões. Mas não obteve retorno. Diante disso, o diretor da Coppe, Luiz Pinguelli Rosa, tenta agendar uma audiência com o prefeito Eduardo Paes.

Eduardo Batista acrescentou que, tecnicamente, seria possível reconstruir o Joá por fases. Mas, para isso, o trecho que permanecer em funcionamento terá de operar em mão dupla. Ele recomendou que, nesse caso, as obras comecem pelo tabuleiro superior (sentido Barra), que, devido ao contato direto com as chuvas, deve estar mais comprometido.

O Joá – via estratégica para os Jogos de 2016 – foi inaugurado em 1971. Esta não é a primeira vez que a Coppe detecta riscos de colapso. Em 1988, especialistas identificaram corrosões em outras partes da estrutura. Na época, a recuperação levou três anos e custou 8 milhões de dólares. No período de obras, o tráfego de veículos pesados chegou a ser proibido por diversas vezes, porque os técnicos divergiam se a presença deles aumentaria ou não o risco de acidentes.

Luis Nassif

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