Classificações de risco ideológicas, por Paul Krugman

Por maurobrasil

Abaixo minha tradução de um artigo de hoje do Paul Krugman sobre o rebaixamento da França pela S&P.

Do NYT

Classificações de risco ideológicas

Paul Krugman

Então a S&P rebaixou a França. E o que isso nos diz?

A resposta é: não muito sobre a França.  Não pode ser subestimado que as agências de classificação de risco não têm, repetindo não têm, informações privilegiadas sobre solvência nacional – especialmente de grandes países como a França. A S&P tem informações privilegiadas sobre a situação das finanças francesas? Não. Será que ela tem um melhor modelo macroeconômico do que, digamos, o FMI – ou, para o que é relevante, do que qualquer um dos homens e mulheres que estão nesta sala de conferências do FMI comigo? Você deve estar brincando.

Então sobre o que estamos tratando? Eu acho útil comparar as projeções do FMI para a França com as de outro país que ultimamente vem recebendo boas menções das agências, o Reino Unido. Os gráficos abaixo são do banco de dados do WEO – dados reais até 2012 e projeções do FMI até 2018.

Em primeiro lugar, o PIB real per capita:


Assim, a França teve desempenho melhor do que o Reino Unido até agora, e o FMI espera que essa vantagem deve persistir.

Em seguida, a dívida em relação ao PIB:

A França está um pouco menos endividada, e o FMI espera que esta diferença deve se ampliar um pouco.

Então porque é que França foi rebaixada? Porque, afirma a S&P, ela não realizou as reformas que irão melhorar suas perspectivas de crescimento a médio prazo. O que significa isso?

OK, outro segredinho sujo. O que é que nós sabemos – realmente sabemos – sobre quais reformas econômicas vão gerar crescimento e quanto crescimento elas vão gerar ? A resposta é: não muito! Pessoas em lugares como a Comissão Europeia falam com grande confiança sobre as reformas estruturais e as coisas maravilhosas que elas realizam, mas há muito pouca evidência clara para sustentar essa confiança. Será que alguém realmente sabe se as políticas de Hollande vão significar um crescimento que é x.x por cento – ou, mais provavelmente, 0.x por cento – mais lento do que seria se Olli Rehn fosse colocado no comando ? Não.

Então, mais uma vez, de onde vem isso?

Sinto muito, mas eu acho que quando a S&P reclama sobre a falta de reformas, ela está de fato reclamando é que Hollande está aumentando, e não reduzindo os impostos sobre os ricos, e que ele não é suficientemente pro-mercado de modo a satisfazer o pessoal de Davos. Lembre-se que, uns dois meses atrás, Olli Rehn reprovou o ajuste fiscal da França – que foi realmente exemplar – porque os franceses, inaceitavelmente, estão aumentando os impostos ao invés de cortar os programas socias.

Assim como a conversa sobre austeridade não é realmente sobre a responsabilidade fiscal, a pressão por “reforma estrutural” não é realmente sobre o crescimento. Em ambos os casos, é principalmente sobre o desmantelamento do estado de bem-estar.

A S&P pode não estar participando deste jogo de uma forma totalmente consciente. Quando você circula nesses ambientes, as coisas que na verdade ninguém sabe tornam-se parte do que todo mundo sabe. Mas não encare este rebaixamento como uma demonstração de que há algo de muito podre no reino da França. Isso tem muito mais a ver com ideologia do que com uma análise econômica defensável.

Luis Nassif

7 Comentários

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  1. E não foram essa e outras

    E não foram essa e outras “agências de risco” que deram notas ótimas para os derivativos em 2008? O pior é que eles logo, logo, vão assestar suas baterias em direção ao Brasil e isso interessa a muita gente boa que não vence eleições. Quem viver, verá.

  2.  
    Krugman ainda acredita na

     

    Krugman ainda acredita na possibilidade das agência participarem do jogo de forma inconsciente, depois de assistir o documentário Trabalho Interno eu já abandonei essa ilusão.

  3. Bão, o que  era  certeza já

    Bão, o que  era  certeza já não há dúvidas.  As  agências  classificadoras  são o braço  politico-econômico(redundância),dos países centrais ,particularmente, o  Tio e   alguns  sobrinhos  selecionados.

    Os EUA,   pelas estrepolias  que   executaram  levando o mundo à quase  bancarrota e enriquecendo quem já não tinha  mais onde    armazenar a grana, sofreram,modo de dizer, uma  suave advertência. Continuam,com seu sistema  financeiro sem controle e supervisão, lembram  a Associação Nacional do Rifle,entidade  tão  poderosa   quanto o  FED. Ambas com poder deletério…

  4. Um Paul Krugman excelente que só ele supera

     

    Maurobrasil,

    Muito boa a sua tradução. Não que eu tenha conhecimento de inglês para julgar tradução, mas ficou muito compreensível em português. E sua tradução foi boa também pela oportunidade. E melhor ainda quando se sabe que seu comentário com a indicação deste artigo de Paul Krugman “Classificações de risco ideológicas” e que se transformou neste post “Classificações de risco ideológicas, por Paul Krugman” de sexta-feira, 08/11/2013 às 16:46, foi enviado originariamente para o post “O fato e o boato da economia” de sexta-feira, 08/11/2013 às 06:00, onde o artigo de Paul Krugman veio bem a calhar. No post “O fato e o boato da economia” Luis Nassif optou por aproveitar a oportunidade para dirigir os ataques dele não só aos analistas da nossa economia, mas também ao ministro da Fazenda e ao Secretário do Tesouro. O endereço do post “O fato e o boato da economia” é:

    https://jornalggn.com.br/noticia/o-fato-e-o-boato-da-economia

    E neste artigo Paul Krugman é implacável. E não só com as agências de risco. É um post bom para ser mencionado toda vez que se ouvir falar em reformas.

    Parece que Paul Krugman está em um Seminário no FMI. Não sei como ele fez o texto, mas me deixou a impressão de que ele estava dialogando com a plateia.

    Recentemente, quarta-feira, 30/10/2013 às 08:58 am, Brad DeLong fez um post com o seguinte título “Paul Krugman Is Tired of Trying to Reason with You People: John Taylor’s Award-Winning Paragraphs: Noted” O endereço é o que se segue:

    http://delong.typepad.com/sdj/2013/10/paul-krugman-is-tired-of-trying-to-reason-with-you-people-john-taylors-award-winning-paragraphs-noted.html

    Lá há uma foto montagem de Paul Krugman e a transcrição de artigo de Paul Krugman com críticas a John Taylor. A idéia da fotomontagem é mostrar o Paul Krugman como o cara que não tem piedade com as conversas ocas. Vendo este artigo dele “Classificações de risco ideológicas” vê-se razão na analogia que Brad DeLong fizera.

    Clever Mendes de Oliveira

    BH, 08/11/2013

     

     

    1. Valeu, Clever!

      Muito obrigado, Clever!

      Vale a pena acompanhar o blog do Paul Krugman, pela clareza de suas argumentações, recheadas de gráficos e dados sobre a economia real, e por sua defesa vigorosa do estado de bem estar social.

  5. É uma hora a Nova Ordem

    É uma hora a Nova Ordem Mercantilista não possuirá mais defesas contra o multicuturalismo vertido pelo mundo digital.

     

    É chegada a hora da “primavera” do mercado.

     

    Torço para que a crise de 2008 aos poucos enterre o capital antes do trabalho. Mundo conectado é mundo livre! Com razão dos seus medos espionam tudo e a todos.

     

    Os inimigos nunca foram os estados e sim o que gira a economia dentro do mesmo, e quem tenta atrapalhar a onipresente dominação econômica não importando o preço a pagar.

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