As críticas ao modo de governar de Obama

Velhos tempos. Obama com sua equipe de segurança discutindo a crise no Paquistão em 2009: Gates (do lado esquerdo, no centro), Panetta (na direita, mais afastado do presidente) e Hillary hoje fazem críticas a decisões do antigo chefe – Pete SOUZA / AFP

Jornal GGN – Ex-subordinados do presidente americano Barack Obama deixaram o governo e escreveram autobiografias nas quais é possível ler críticas às decisões do chefe de Estado norte americano. Os ex-secretários de Defesa, Leon Panetta e Robert Gates, e de Estado, Hillary Clinton, pertenciam ao círculo mais íntimo do presidente, mas não pouparam críticas à sua gestão.

Ex-secretários expõem equívocos de Obama

Por Flávia Barbosa

Do O Globo

Livros lançados em sequência por Hillary, Panetta e Gates questionam capacidade de decisão do democrata

WASHINGTON — Acostumado a arder na fogueira das críticas inclementes da oposição republicana e de analistas conservadores, o presidente dos EUA, Barack Obama, chega ao fim do sexto ano de governo contando as feridas abertas pelo fogo amigo de ex-subordinados de primeiro escalão. Nas mais de mil páginas combinadas de suas autobiografias e nas entrevistas para promovê-las, ao longo de 2014 os ex-secretários de Defesa Leon Panetta e Robert Gates e de Estado Hillary Clinton dispararam grosso calibre contra o ex-chefe e seu círculo mais íntimo de assessores. Numa inédita sequência, os desabafos questionam o estilo de liderança de Obama e suas decisões em temas-chave, como a batalha orçamentária com o Congresso e as políticas para Iraque, Síria e Afeganistão.

Das penas e línguas afiadas de Panetta, Gates e Hillary, reforçadas pelas memórias do ex-embaixador em Bagdá Christopher Hill, emerge um presidente inteligente e bem-intencionado, mas distante e relutante, com dificuldades de confiar nos subordinados; que confere poder excessivo à equipe da Casa Branca; é refém da promessa de acabar com as guerras da era Bush; hesita no engajamento com adversários; e subordina várias escolhas aos cálculos de política doméstica.

Os relatos tornam difícil tratar as opiniões como maledicência de quem jogou a toalha, como Gates e Panetta, ou tem interesse em se distanciar dos fracassos do presidente, como Hillary, em pré-campanha para a nomeação democrata à Presidência em 2016. Há uma grande coincidência nas narrativas — temperadas com doses generosas de frustração.

Muito poder a assessores próximos

As estratégias para Iraque, Síria e Afeganistão reservam algumas das críticas mais ácidas a Obama. Hill, no livro “Outpost”, revela um governo desengajado no Iraque, que pouco agiu para influenciar o quadro político e neutralizar o sectarismo do ex-premier Nouri al-Maliki, que teria sido subestimado, e pecou por falta de coordenação entre gabinetes e por intervenções atabalhoadas.

Por exemplo, no debate sobre a lei eleitoral do Iraque, em 2009, as ligações feitas por Obama e o vice-presidente Joe Biden “aumentaram a percepção de que os EUA estavam muito desesperados pela aprovação da legislação para que as tropas pudessem ser retiradas”, minando a influência dos EUA, diz Hill.

Panetta também atribui à determinação de cumprir a promessa de acabar com as guerras do Oriente Médio o fiasco do Iraque após a retirada das tropas americanas, em 2011, que culminou no avanço assustador do Estado Islâmico e levou Obama a iniciar novo confronto na região. Ele diz, em “Worthy Fights” (“Lutas que valem a pena”), que a Casa Branca estava “determinada a se livrar do Iraque” e desprezou a avaliação militar de manter um pequeno contingente para “lidar com o ressurgimento da al-Qaeda e a violência sectária que tomou o país”.

Gates, em “Duty” (“Dever”), faz avaliação semelhante sobre o Afeganistão. Afirma que Obama debateu opções militares sem consultar a Defesa, permitia o questionamento dos comandantes por assessores diretos, passava pitos em oficiais de alta patente que discordavam da fixação de data para o fim da operação, como o general David Petraeus, e desdenhava do ex-presidente afegão Hamid Karzai.

“Eu pensei: o presidente não confia em seu comandante, não acredita em sua própria estratégia. Para ele, tudo é uma questão de cair fora”, escreve Gates, que revelou ter chegado a limitar o acesso a informações sobre opções militares a assessores do Conselho de Segurança Nacional, como a hoje embaixadora dos EUA na ONU, Samantha Powers, para conter o atropelamento do Pentágono.

A tensão entre o círculo íntimo de Obama — que inclui Biden e o ex-chefe do Conselho Tom Donilon — e o primeiro escalão é evidente nas biografias. Num trecho que levanta dúvidas sobre se o presidente utilizava seus auxiliares diretos para “mandar recados” aos secretários, Hillary conta em “Hard Choices” (“Escolhas Difíceis”) ter sido “doloroso” ver Richard Holbrook, seu escolhido para assuntos de Afeganistão e Iraque, ser fritado por jovens assessores “que reviravam os olhos” em sua presença. Ela o manteve no cargo após desafiar Obama, em conversa com auxiliares do presidente, a pedir a demissão do diplomata diretamente a ela.

No caso da Síria, Hillary e Panetta afirmam que foram duas das vozes internas mais dedicadas a convencer Obama da importância de armar parte da oposição, de olho tanto na derrubada do presidente do país, o ditador Bashar al-Assad quanto na estabilidade regional. Animal político, Hillary limita-se a dizer na autobiografia que a decisão de não envolvimento — que provou-se equivocada e será uma pedra no sapato democrata em 2016 — foi de Obama. Nas entrevistas para promovê-la, porém, classificou o passo de “fracasso”, que permitiu “um grande vácuo, que os jihadistas agora ocuparam”.

Panetta acrescenta que o presidente também “vacilou” na reação ao uso de armas químicas por Assad. Obama anunciou e recuou de um ataque militar à Síria, o que, diz o ex-secretário, “foi um soco na credibilidade americana”, pois, quando o comandante em chefe “estabelece uma linha vermelha, é imperativo que aja se ela for ultrapassada”.

Vice-presidente sai em defesa do chefe

Para Hillary, de forma geral, falta a Obama uma política externa que tenha “princípios organizadores”, que tornariam os interesses americanos cristalinos e evitariam o dilema de “não fazer coisas estúpidas” — conceito que o presidente alega orientar seus movimentos no exterior.

As batalhas orçamentárias, que tiveram a Defesa como um de seus alvos, também renderam dissabores. Gates afirma que Obama “quebrou a confiança” ao tratar dos cortes na pasta. Panetta diz que o impasse de 2011 revelou “desdém” de Obama pelo Congresso. “Falta fogo” ao presidente, diz ele, e sobra “uma frustrante reticência a engajar adversários e obter apoio à sua causa”, o que Panetta considera a “mais notável fraqueza” de Obama.

A Casa Branca evita polemizar. O porta-voz disse semana passada, quando o livro de Panetta saiu, que Obama deixa aos outros o julgamento sobre a conveniência do lançamento. É raro memórias do primeiro escalão virem à tona com o presidente no cargo. Dean Acheson, secretário de Estado de Harry Truman, levou 20 anos para publicar as suas. O diplomata-chefe Henry Kissinger esperou cinco anos para revisitar seu tempo com Richard Nixon.

Joe Biden, porém, não se conteve.

— Eu acho inapropriado que ex-autoridades, assim que deixem o governo, escrevam livros — disse o vice de Obama. — Realmente acho inapropriado. Ao menos deem ao cara a chance de deixar o cargo.
 

Redação

9 Comentários

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  1. Hillary – Marina

    Hillary é a Marina do Obama. Uma figura política vaidosa e egocêntrica, sempre focada na busca de rumos próprios, mesmo que, para isso, tenha que passar uma frota de caminhões FNM na frente daqueles que sempre a relevou.

  2. Os dois ultimos paragrafos

    Os dois ultimos paragrafos dizem volumes.  Vamos aos outros que precisam de mais comentarios:

    “As estratégias para Iraque, Síria e Afeganistão reservam algumas das críticas mais ácidas a Obama. Hill, no livro “Outpost”, revela um governo desengajado no Iraque, que pouco agiu para influenciar o quadro político e neutralizar o sectarismo do ex-premier Nouri al-Maliki, que teria sido subestimado, e pecou por falta de coordenação entre gabinetes e por intervenções atabalhoadas.

    Por exemplo, no debate sobre a lei eleitoral do Iraque, em 2009, as ligações feitas por Obama e o vice-presidente Joe Biden “aumentaram a percepção de que os EUA estavam muito desesperados pela aprovação da legislação para que as tropas pudessem ser retiradas”, minando a influência dos EUA, diz Hill”:

    Mentira.  Fala quem estava no centro do furacao e foi contrariado.  Essa “percepcao” eh ficticia e nao aconteceu fora do centro do furacao.  Vou precisar de documentacao extensiva pra acreditar.  Nao havia e nao ha documentacao nenhuma pra existencia de qualquer “percepcao que os EUA estavam muito desesperados pela aprovacao das tropas serem retiradas” do Iraq.  Embora isso nao esteja escrito no item e provavelmente nem no livro, ele esta falando de memos internos e conversas de cupula.  E Obama ja tinha dito COMO POSICAO DO ESTADO que sairia do Iraq.  Ou seja, o Iraq “piorou” pros EUA depois que sairam, entao a culpa eh de Obama.  Entao ta.  Repito:  se o Iraq piorou pros EUA depois da saida, entao a culpa eh de Obama, ne?  Entao va olhar as favelas que os EUA deixaram atraz pra ver.  Que iria piorar ate as minhas pulgas sabiam, que o Estado Islamico ia avancar ate minhas pulgas tambem sabiam.  Era pra deixar tropas la ainda?

    Obama nao declarou guerra nem ocupacao.  Foi problema alheio.  Mas o pior da afirmacao eh clamar direito sobre como o Iraq “se sentiria” depois que as tropas saissem.  Ora, eles estao putos sim.  Tem todo direito.

    “Gates, em “Duty” (“Dever”), faz avaliação semelhante sobre o Afeganistão. Afirma que Obama debateu opções militares sem consultar a Defesa, permitia o questionamento dos comandantes por assessores diretos, passava pitos em oficiais de alta patente que discordavam da fixação de data para o fim da operação, como o general David Petraeus, e desdenhava do ex-presidente afegão Hamid Karzai.

    “Eu pensei: o presidente não confia em seu comandante, não acredita em sua própria estratégia. Para ele, tudo é uma questão de cair fora”, escreve Gates, que revelou ter chegado a limitar o acesso a informações sobre opções militares a assessores do Conselho de Segurança Nacional, como a hoje embaixadora dos EUA na ONU, Samantha Powers, para conter o atropelamento do Pentágono.”:

    Vou ter que discordar de novo, claro.  O segundo paragrafo eh tipico de quem NAO “pensou” em nada disso exceto em retrospecto, e esta tirando o corpo fora.  Se ele quizer dizer que “mais tarde, em retrospecto, e conversando com os militares” eu ate entenderia mais.

    Como o texto do segundo paragrafo esta eu nao acredito pois ate em traducao eu estou vendo a influencia que a conversa (muito mais tarde) com o fulano militar teve frutos e convenceu o autor after the fact.  Nem um segundo antes.  Tambem desafio esse segundo autor a provar documentalmente que discordava das decisoes aa epoca.  Ele nao vai aparecer com essa documentacao muito cedo.  E nao vai porque ele so disconcorda depois, muito depois dos fatos.

    Ah, e quanto ao primeiro paragrafo, Obama eh fichinha perto de Dilma em todas aquelas decisoes:  nada de mais.  Me lembrou de gatos que te mostram o traseiro de rabo levantado toda vez que eles querem te demonstrar amizade.  Gates, esconda o cu, eu nao quero ver.  Nem quero sua “amizade”.

    Agora, Hillary:

    “Animal político, Hillary limita-se a dizer na autobiografia que a decisão de não envolvimento — que provou-se equivocada e será uma pedra no sapato democrata em 2016 — foi de Obama. Nas entrevistas para promovê-la, porém, classificou o passo de “fracasso”, que permitiu “um grande vácuo, que os jihadistas agora ocuparam”.”

    De novo, estamos vendo as opinioes sendo modificadas e gente tirando o corpo fora after the fact.  Na biografia ela “se limita a dizer” que a decisao foi de Obama.  Logo nas entrevistas ela comeca a chamar de “fracasso” o “grande vacuo” da “decisao de Obama.  Entre a escrita e a publicidade, um grande passo, ne?  Entao ela que documente sua discordancia aa epoca, nao agora.  E logo a concorrente aa vaga de indicada para candidatura aa presidencia!

    Va pastar, muieh.

    Isso nao eh dizer que Obama nao fez erros, claro -eu nao cheguei perto de abordar isso.  So que os erros de Obama “no Oriemte Medio” nao estao enderessados no item porque a psicologia forensica nao permite a essas pessoas especificas dizerem agora que nao foram parte do “crime” nem do “erro”.  Foram sim.

    1. Podiam ao menos esperar o cadáver esfriar!

      Não entrando no mérito da política norte-americana acho antes de tudo que estes políticos de primeiro escalão estão simplesmente cuspindo no prato que comeram.

      É extremamente simples falar que um presidente errou por isto ou por aquilo, simplesmente porque nestes casos de política internacional quem está na decisão tem que guardar para si todos os fatos que devem ser escondidos dos aliados.

      Os norte-americanos se cairem nesta balela toda são muito burros, os Estados Unidos entra num país que era seu aliado, destrói toda a infraestrutura, faz as pessoas regredirem de nível de vida um século, depois ainda querem influenciar na eleição do país, é muita cara de pau.

      1. Assino na integra,

        Assino na integra, Maestri.

        Quanto ao seu primeiro paragrafo especialmente:  ou era politica de Estado ou nao era.  Nao, eles nao vao tirar o corpo fora agora nao…

        Quanto ao ultimo paragrafo, so os bostonianos sao burros na integra do primeiro ao ultimo, que eu saiba.

      2. Esqueci de dizer:  o que eles

        Esqueci de dizer:  o que eles estao traindo nao eh Obama.  Eh a politica DE ESTADO norte americana -que esta documentada e que era o que era- mesmo que nao tenham documentacao nenhuma pra provar que eram contra aa epoca e nao depois de serem “esclarecidos” pelos militares infiltrados no governo.

        Ora, eu discordei de UM aspecto, somente UM, da politica DE ESTADO de Dilma e o documentei fartamente.  O Nassif tambem o fez, e o documentou.  Varios de nos o fizemos.  So que NOS NAO SOMOS parte de “reunioes de cupula”.

        Eles?  A cupula contrariada e indoutrinada mais tarde nao tem nada pra mostrar de documentacao dessa discordancia aa epoca.  So agora.

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