A data de vencimento da conta da FIFA, por Jason Gay

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
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Do The Wall Street Journal

Traduzido pelo Jornal GGN

Depois de anos de suspeitas de abusos, a entidade máxima do futebol mundial está a apenas alguns passos do apito final

Por JASON GAY

Em uma entrevista coletiva no Brooklyn, bairro de Nova Iorque (EUA), a procuradora-geral, Loretta Lynch, chamou os cartolas presos de conspiradores que “corromperam o negócio do futebol mundial para encher seus próprios bolsos”. Em Zurique, eles foram levados para fora da porta de (obviamente) um hotel de cinco estrelas, com pelo menos um deles escondido debaixo dos lençóis.

Dos lençóis de oitocentos fios, um tinha que assumir.

Durante décadas, o suntuoso gosto, junto com os suspeitos abusos dentro do organismo que tutela o futebol, a FIFA, tem sido uma piada mundial exasperante, um tipo de mistura perversa da oligarquia mimada com James Bond. Histórias de gastos de futebol corriam soltas, incluindo a de um dirigente da FIFA que, de acordo com um editorial do New York Daily News de 2014, manteve um estilo de vida opulento que agregava um luxuoso apartamento na cidade de Nova York para seus gatos.

Vou apenas repetir para enfatizar. Um apartamento de luxo para seus gatos.

Um apartamento de gato seria engraçado se essa cadeia de corrupção também não viesse com um custo humano terrível. Como o negócio do futebol internacional cresceu a uma taxa exponencial, o Departamento de Justiça dos EUA acusou em um inquérito desconcertante, anunciado nesta quarta-feira, a liderança do futebol de subornar anfitriões e patrocinadores, dispostos a fazer o que fosse preciso para reivindicar uma parte da ação. Isso significava recompensas para os tomadores de decisão, que controlavam os maiores palcos de jogos. O dinheiro destinado a promover o crescimento do jogo foi, ao contrário, desviado para inchar carteiras de executivos de futebol.

Enquanto isso, o mesmo sistema quebrado também incentivou as nações anfitriãs a gastar bilhões em estádios e infraestrutura, com garantia de retorno financeiro zero – e, no caso dos trabalhadores encarregados da absurda Copa do Mundo do Catar de 2022, pondo em perigo a vida dos trabalhadores que pediram por um martelo para concluir a loucura do esporte.

Agora, um árbitro entrou em cena. Dos Estados Unidos, entre todos os lugares e não de uma superpotência do futebol internacional, mas sem vontade de dar um passe para elite governante do jogo. “Isso realmente é a Copa do Mundo da fraude, e hoje estamos a emitir um cartão vermelho para a FIFA”, disse Richard Weber, chefe do IRS de investigação criminal.

Provavelmente, foi fácil ser capturado pelo escândalo de quarta-feira de manhã, que incluiu a detenção de nove funcionários atuais e antigos da FIFA e as prisões de vários deles em Zurique pela polícia suíça.

Mas, finalmente, os já conhecidos suspeitos estão enfrentando repercussões reais. Durante anos, a FIFA tinha se presumido grande demais e forte demais para ser derrubada. Resistiram a alegações antigas e escândalos com poucos danos. Contrataram um ex-procurador dos EUA para fazer uma investigação interna da licitação da Copa do Mundo de 2018 a 2022, e depois deu de ombros quando o mesmo advogado saiu em protesto contra a resistência da Fifa para publicar seu relatório.

Senhores do futebol se comportaram com a desfaçatez dos intocáveis. Decisões desastrosas como a concessão de uma Copa do Mundo para o Catar no calor do verão foram jogados de lado como gafes menores. (A Copa de 2022 acabou sendo empurrada para o inverno, criando um impasse de pesadelos de agendamento para o esporte em todo o planeta, e continua a haver preocupações abundantes de direitos humanos sobre o tratamento dos trabalhadores que preparam o país.) Quando as participantes da próxima Copa do Mundo Feminina queixaram-se sobre jogar em grama artificial – as não masculinas partidas de futebol são disputadas em grama falsificada – a FIFA dificilmente se dignou a prestar atenção antes de dizer não.

A FIFA sempre escapou porque sabia o que tinha: o controle sobre o jogo mais popular da Terra. Tal controle conferia a autoridade notável. Comandava a lealdade dos chefes de Estados, patrocinadores e multinacionais. E, de acordo com as 161 páginas acusação do Departamento de Justiça, a Fifa entregou um rio de dinheiro para alguns de seus membros.

Era como se eles acreditassem que a festa nunca iria parar.

Na sua parte superior, a FIFA continua a ser a mesma, pelo menos por enquanto. O indiciamento de quarta-feira não tocou Sepp Blatter, presidente da entidade desde 1998. Blatter tem sido marcado por críticas de sua gestão insular e, ocasionalmente, absurdas – ele sugeriu uma vez que as jogadoras de futebol mulheres usassem roupas mais apertadas para impulsionar o interesse no esporte – mas ele também supervisionou aquela era de crescimento financeiro espetacular, o que lhe rendeu a lealdade feroz. Blatter mantem-se acima para a reeleição desta semana, e espera-se que vença.

Essa perseverança é tanto notável e surpreendente. É tentador ver este arrastão transatlântico e ataque em hotel de luxo como um primeiro passo encorajador em uma eventual revisão, mas a aristocracia do futebol é uma grande espessura com todas as estrelas de autopreservação. Todos esses anos e todo esse dinheiro construíram na FIFA uma parede formidável de poder. Se ela vier a cair, terá que ser tijolo por tijolo.

Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

8 Comentários

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  1. Não esquecendo do Interventor-Geral…

    Não foi aqui que apareceu um cabra  apontando o dedo para todomundo  e  exigindo que no mês da copa, quem dava  as cartas  era a Fifa.  As nossas leis não se aplicariam a  nenhum ato deles ???

    E  quase que nossa justiça tupiniquim acertava na mosca, visto que a polícia prendeu a  gangue  dos ingressos paralelos….porém, acostumada  a  abrir as  pernas  pros gringos,  deu mole e  os cabras se picaram !!

    1. Sim, foi a maneira do Blatter se livrar de uma

      revolução de palacio encabeçada pela turma da CONCAFAT/CONMEBOL, que se aliou ao grupo dos cheiks do Golfo Persico…

  2. A tal da Copa no Qatar é de

    A tal da Copa no Qatar é de fato a cereja do bolo da corrupção mundial.

    Uma aberração sem limites. Milhares de trabalhadores já morreram em construções de estádios faraônicos refrigerados. E até agora nenhum “fifeiro” apareceu para dar um chute na bunda dos principes do Qatar. Muito pelo contrário.

    E numa demonstração de solidariedade, os velhinhos ladrões da FIFA resolveram dar uma chance de sobrevivência para jogadores e torcedores transferindo a Copa para Dezembro…..

    Chamar esses caras de ladrões, é muito pouco.

    Ainda não inventarm palavra para os definir.

     

  3. “Em uma entrevista coletiva

    “Em uma entrevista coletiva no Brooklyn, bairro de Nova Iorque (EUA), a procuradora-geral, Loretta Lynch, chamou os cartolas presos de conspiradores que “corromperam o negócio do futebol mundial para encher seus próprios bolsos”. 

    Para completar a lista de brasileiros comprometidos, além dos já citados:

    Metralhas Marinhos, Galvão Bueno, Ronaldo Fenomeno, Eurico Miranda, Zé Perrella … 

     

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