Carbono 14: do escândalo midiático à falta de provas reconhecida por Moro

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.
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Por algum motivo não questionado aos procuradores da Lava Jato, a Carbono 14 foi parar nas mãos de Moro já sem interesse nenhum em cumprir a promessa de revelar os “segredos obscuros” da morte de Celso Daniel. Usaram o caso para atrair mídia às vésperas do impeachment e, depois, trataram-no como “irrelevante” 

Jornal GGN – Carbono 14 é um elemento de vida longa, que resiste à ação do tempo e, por isso, a Polícia Federal achou que seria uma grande sacada nomear assim uma operação da Lava Jato que se propunha, em abril de 2016, às vésperas do impeachment de Dilma Rousseff, a apurar os “detalhes obscuros” da morte de Celso Daniel, o eterno fantasma do PT. 

Mas quem criou expectativas deve ter ficado decepcionado com a sentença de Sergio Moro, proferida nesta quinta (2), no âmbito da Carbono 14. O juiz de Curitiba teve de admitir que a força-tarefa da Lava Jato não encontrou nenhuma prova que sustente a teoria de que o empresário Ronan Maria Pinto teria recebido quase R$ 6 milhões a mando do PT para ficar calado sobre o assassinato de 2002.

Aliás, o Ministério Público Federal sequer apresentou denúncia de extorsão contra Maria Pinto. O que Moro julgou foi o crime de lavagem de dinheiro envolvendo um empréstimo que José Carlos Bumlai tomou junto ao banco Schahin, em 2004, no total de R$ 12 milhões. Em troca, anos depois, o Grupo Schahin foi compensado com um contrato bilionário com a Petrobras.

Foi condenado, na Carbono 14, Delúbio Soares, ex-tesoureiro do PT, como provável mandante do crime, pois ele teria solicitado que Bumlai tomasse o empréstimo e repassasse os recursos a Ronan Maria Pinto. Este último, dono do jornal Diário do Grande ABC, beneficiário final, não conseguiu provar que teria começado a pagar o empréstimo nem explicar as movimentações financeiras típicas de lavagem. Os empresários Enivaldo Quadrado e Luis Carlos Casante também foram sancionados por “arquitetar operações de ocultação e dissimulação, simulando variados contratos de empréstimo” para ajudar Bumlai com as transferências. Todos pegaram até cinco anos de prisão mais multa, com regime semi aberto apenas para Casante. Cabe recurso.

Certo é que restou provado, com as condenações, um enorme contraste entre o que a Lava Jato vendeu à opinião pública em abril de 2016 – ligar o petrolão à morte de Celso Daniel e provar que Santo André era laboratório para a corrupção federal – ajudando a mídia a desgastar o governo Dilma, e o que, de fato, foi levado a julgamento por Sergio Moro, no intervalo de apenas um mês – o MPF ofereceu a denúncia em maio de 2016.

Na entrevista concedida a jornalistas sobre a Carbono 14, um dos procuradores explicou que o objeto das investigações era descobrir por que Ronan Maria Pinto teria recebido dinheiro por intermédio do PT. (Assista aqui, a partir dos 3 minutos)

Durante as audiências, um dos depoimentos mais alardeados pela grande mídia foi o de Marcos Valério, que fez uma cena diante de Moro, implorando para não dizer o que sabia sobre a morte de Celso Daniel, pois temia por sua vida dentro da prisão. 

O próprio juiz Moro citou o caso para deferir o pedido de prisão de Ronan Maria Pinto. Escreveu o magistrado: “É ainda possível que este esquema criminoso tenha alguma relação com o homicídio, em janeiro de 2002, do então Prefeito de Santo André, Celso Daniel, o que é ainda mais grave. Se confirmado o depoimento de Marcos Valério, de que os valores lhe foram destinados em extorsão de dirigentes do Partido dos Trabalhadores, a conduta é ainda mais grave, pois, além da ousadia na extorsão de na época autoridades da elevada Administração Pública, o fato contribuiu para a obstrução da Justiça e completa apuração dos crimes havidos no âmbito da Prefeitura de Santo André.”

Por algum motivo não questionado aos procuradores da Lava Jato, a Carbono 14 chegou às mãos de Sergio Moro já sem interesse nenhum em aprofundar esse tema. Usaram Celso Daniel para atrair mídia e, depois, trataram o caso como “irrelevante” para um processo limitado à lavagem de dinheiro.

À imprensa, um dos procuradores chegou a dizer que faria um “intercâmbio” com o MP de São Paulo caso descobrissem detalhes sobre o caso Celso Daniel – considerado crime comum pelo Supremo Tribunal Federal. Sem mais notícias, desde então.

Moro proferiu a sentença admitindo que “resta ainda obscuro o motivo do repasse desses valores, ou seja, qual o interesse de agentes políticos do Partido dos Trabalhadores em obter recursos no Banco Schahin e destiná­los em benefício de Ronan Maria Pinto? A única explicação nos autos foi concedida por Marcos Valério Fernandes de Souza e por Alberto Youssef, de que seria para fazer frente a uma extorsão. Quanto ao ponto, porém, as palavras deles estão sozinhas no processo.”

A defesa de Delúbio, em nota, nesta sexta (3), apontou a falta de provas materiais de que ele tenha solicitado que Bumlai tomasse o empréstimo com o objetivo de beneficiar Ronan e Altman, por sua vez, foi absolvido por Moro justamente por constar contra ele, assim como contra Delúbio, apenas delações e outros depoimentos.

Para Moro, contudo, os antecedentes de Delúbio (condenado no Mensalão) e sua posição dentro do PT (tesoureiro, à época dos acontecimentos) o coloca numa situação complicada, somado ao fato de que ele teria sido “evasivo” em vários depoimentos ao juiz.

“Tendo as operações de ocultação e dissimulação seguido o plano e o objetivo criminoso de Delúbio Soares de Castro, deve ser ele ser responsabilizado pelo crime de lavagem de dinheiro”, decidiu o magistrado.

“Oportuno destacar a similitude dos fatos apurados neste processo com parte daqueles que foram objeto da Ação Penal 470, inclusive com a participação, em parte das mesmas pessoas e empresas, como Delúbio Soares, Enivaldo Quadrado e Marcos Valério Fernandes de Souza [na Carbono 14, absolvido], apesar da desistênci deste último. Segue-se o mesmo modus operandi da concessão de empréstimo fraudulento, a pessoa interposta, por instituição financeira, no interesse de agentes do Partido dos Trabalhadores, e com posterior direcionamento, com ocultação e dissimulação, a terceiros, com a diferença que nesse caso o beneficiário não é agente público”, lembrou Moro.

Na grande mídia, silêncio sobre as promessas não cumpridas pela Lava Jato.

Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

11 Comentários

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  1. O Juiz não é incisivo e diz que o réu é que é evasivo

    Ora, ninguém é obrigado a produzir provas contra si mesmo. Se o réu não se incrimina espontaneamente, cabe ao Juiz competente provocar a confissão. Mas não é esse o caso do Moro.

  2. E daí ?
    O que interessa é que

    E daí ?

    O que interessa é que o objetivo foi alcançado. Dilma caiu. Nâo, despencou. 

    Aliás, e o Cardosão, alguem sabe aonde ele anda ? Será que está dando muitas aulas de cursinho ?

    Montou banca ?

     

  3. Avolumam-se casos desse jaez
    Avolumam-se casos desse jaez nessa hipocrisia jurídica chamada, jornalistas não alinhados são inquiridos e tem seus nome jogados na lama e casos sem nexo nenhum são relembrados apenas com objetivos eleitorais, todos os prejudicados deveriam acionar a justiça e requerer reparação pelos prejuízos.

  4. Se fosse nos EUA, país

    Se fosse nos EUA, país fetiche do herói, o próprio e os lavajatenses jecas estariam sujeito a processos milionários.

    Diria que impossível de serem pagos, se os vestais não recebessem ás vezes até 80 mil mensais, com os penduricalhos tipo auxílio creche para filho de 20 anos.

    Pois teriam então um belo pé de meia que seria usado para pagar indenizações que passariam de 100 mil dolares. Se estivessem no país modelo deles não poderiam ser o que são. Agradeçam ter nascido em uma democracia rastaquera

  5. Esse juizeco de merda, não

    Esse juizeco de merda, não fosse pelo mérito do seu (lá dele) patrocinador, os irmãos marinho. A OAB, mesmo tendo se tornado a porcaria que ai está, não teria outra alternativa. Restando-lhe apenas, aplicar um robusto par de ponta-pés na bunda-mole desse moleque mimado de papai. Cassar a licença, carta, diploma, ou a merda que seja. Contanto, que o cabra fique impedido de delinquir, usufruindo de privilegios de foro e imunidade diversas. Essas mutretas que de hábito, desde a colônia, ainda são oferecidas aos privilegiados serviçais de luxo, do restolho que sobrou da Casa-Grande.

    O que se pode fazer para esses marajas pagarem pelos crimes que cometem? Será que vale a pena reeditar?…Quiçá, abrindo uma franquia da Revolução Francesa! E assim, agilizar a importação de uns engenhos completos, para guilhotinar algumas dúzias desses marajás FdP.!?…

    Orlando

  6. Pelo mesmo diapasão esse Juiz

    Pelo mesmo diapasão esse Juiz condenará Lula. Merce da inexistência de provas(ao contrário, há contra-provas) e só com base em ilações e deduções, emitirá uma sentença desfavorável. Há também as pressões externas que nesse caso em nada o pressionam, apenas ajudam a subverter ainda mais a sua consciência moral e jurídica. Se é que algum dias as teve. 

    Não sei se alguém mais observou, mas a este cidadão nada passa desapercebido. No caso, a referência é a recorrente pergunta que ele faz nas audiências de testemunhas graúdas, a exemplo de ex-procuradores Antônio Fernando de Sousa e Cláudio Fonteles, acerca se Lula fizera alguma denúncia, ou notícia-crime nos episódios do mensalão e do envolvendo a Petrobras. O que está implícito nessa indagação?  Ora, que o ex-presidente sabia dos dois esquemas e a inação, além do aspecto da prevaricação, seria a “prova” de que de alguma maneira também se beneficiara política e pessoalmente. 

    É a mais previsíveis das condenações “anunciadas”. 

     

  7. Mesmo modo operandi criminoso é o do sr. sérgio moro

    Prezados,

    Pelo que se vê, evasivo, dissimulado, usando o mesmo modus operandi criminoso, age o sr. sérgio moro, quando na sentença escreve expressões como 

    “É ainda possível que este esquema criminoso tenha alguma relação com o homicídio, em janeiro de 2002, do então Prefeito de Santo André, Celso Daniel, o que é ainda mais grave. Se confirmado o depoimento de Marcos Valério…”

    Ou ainda:

    “Oportuno destacar a similitude dos fatos apurados neste processo com parte daqueles que foram objeto da Ação Penal 470, inclusive com a participação, em parte das mesmas pessoas e empresas, como Delúbio Soares, Enivaldo Quadrado e Marcos Valério Fernandes de Souza…”

    Ou seja: assim como não tinha NENHUMA PROVA para condenar José Dirceu, sérgio moro não tem PROVA ALGUMA contra Delúbio Soares. A própria citação daquele farsesco e midiático julgamento da AP-470, em que sérgio moro redigiu o voto lido por Rosa Weber, no qual se lê a pérola “Não tenho provas concretas/cabais contra José Dirceu, mas a literatura jurídica me permite condená-lo” mostra que esse juizeco nazifascista exerce perseguição política contra o PT e seus líderes desde aquele vergonhoso e aberrante ‘julgamento’. Claus Roxin, em entrevista a FSP, condenou o contrabando da ‘teoria do domínio do fato’, levado a termo por joaquim barbosa e colegas do STF numa ação vingativa dese capitão-do-mato contra José Dirceu, José Genoíno, João Paulo Cunha, Delúbio Soares, Henrique Pizzolato e outros.

  8. Moro é um amarelo entreguista

    Moro é um juiz com valores fascistas que serve de instrumento aos interesses dos EUA.

    Assim eu penso com base nas próprias ações de Moro.

  9. Um auto judicial que é quase uma confissão de Moro.

    Ao fazer constar trechos como:

     

    “resta ainda obscuro o motivo do repasse desses valores, ou seja, qual o interesse de agentes políticos do Partido dos Trabalhadores em obter recursos no Banco Schahin e destiná­los em benefício de Ronan Maria Pinto? A única explicação nos autos foi concedida por Marcos Valério Fernandes de Souza e por Alberto Youssef, de que seria para fazer frente a uma extorsão. Quanto ao ponto, porém, as palavras deles estão sozinhas no processo.”

     

    Quando não tem provas continua na sentença perpetuando ilações, caluniando e gerando suspeitas

    Para Moro, contudo,

    “os antecedentes de Delúbio (condenado no Mensalão) e sua posição dentro do PT (tesoureiro, à época dos acontecimentos) o coloca numa situação complicada, somado ao fato de que ele teria sido “evasivo” em vários depoimentos ao juiz.”

     

    Com esta frase chegamos à definição do que é desfaçatez ou descaramento. No auto em que absolve Marcos Valério, que segundo o proprio juiz  está fazendo uma acusação  que se não é falsa é no minimo passível de ser punida criminalmente por tentativa de incriminar sem provas, o juiz condena Delubio apenas por ser o tesoureiro do PT e ser evasivo. Isto é,  por não se submeter ao Juiz e não delatar ninguém. Não tem provas mas a literatura assim o permite!!!! 

    Seria muito interessante saber o que é ser evasivo para um juiz  que aceita delatores que confessam terem mentido, e mesmo assim se mantém livres ricos e soltos.

    Este e outros autos vem sendo emitidos há muito tempo, cheio de insinuações poucas provas, e com a ajuda da mídia que reverbera frases como estas enquanto esconde os mal feitos ( crimes) do tucanato. Eu gostaria de  ver  uma análise jurídica deste parecer, por algum egrégio membro do Conselho Nacional de Justiça. Apenas temo que a resposta de Barrosos e Fachins e Fuxes  sigam as diretrizes da  suprema Carmem, que já se posicionou publicamente como defensora de juízes, haja o que houver.

    Não é surpresa Moro e seus associados brigarem tanto para que a lei de abuso de autoridade não puna juízes  por erro de interpretação.  Apenas lendo este auto  fica mais do que claro que Moro é transparente nas suas intenções.

    Seria interessante ver  uma avaliação  jurídica de Aragão  deste auto.

  10. Repito: alguém apresente um

    Repito: alguém apresente um único despacho desse desMoronado que contenha – efetivamente – provas contra alguém do PT. Não evasivas acusações. Não provas desconexas. Não ilações. Não conversa fiada. Não mentiras descaradas. PROVAS. Houvesse judiciário neste país e esse juizeco teria sido defenestrado há muito tempo. Mas, que fazer, né? País de merrecas é assim: uma merda.

  11. Sério isso

    é uma decisão judicial que condena alguém a prisão?

    Sem apurar a causa nem motivos da acusaçao?

    Simplesmente inacreditável. 

     

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