A judicialização da internet

Do Valor

Empresas e governo querem que internet resolva conflitos sem acionar a Justiça

Juliano Basile, de Brasília
14/05/2010

Reunidos para discutir o marco regulatório da internet, autoridades do governo, do Supremo Tribunal Federal (STF) e representantes de empresas com atuação forte em meios eletrônicos concordaram em dois pontos. Primeiro, é preciso evitar a judicialização dos problemas que acontecem na rede. Segundo, as empresas do setor devem procurar desenvolver regras próprias de conduta, seja para conceder respostas ou para tirar ofensas de seus sites.

Para o ministro da Justiça, Luiz Paulo Barreto, é preciso encontrar mecanismos para solucionar os conflitos que surgem na internet, sem o Judiciário. “O nosso objetivo é chegar a uma constituição da internet, como a de 1988, uma constituição cidadã”, disse Barreto. Segundo ele, várias questões devem ser discutidas para se chegar a esse ideal de uma regulamentação que evite que todos os problemas cheguem à Justiça. Entre elas está a fronteira entre a liberdade de expressão e o anonimato, a proteção da privacidade e a responsabilização pelo conteúdo veiculado.

“Inúmeros países têm mecanismos para solucionar conflitos de maneira extrajudicial”, afirmou Felipe de Paula, secretário de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça. Para ele, as empresas podem definir regras claras para retirar comentários ofensivos de seus sites. Essa seria uma solução extrajudicial, mas também deve existir, de acordo com o secretário, mecanismos judiciais para proteger a pessoa ou a empresa ofendida.

O ministro do STF Gilmar Mendes revelou-se preocupado com a possibilidade de judicialização de problemas na internet. Ele lembrou que, no ano passado, tramitaram 80 milhões de processos na Justiça. “Temos que encontrar mecanismos que afastem a judicialização. A internet é um laboratório do tamanho do mundo, e não podemos cometer os erros do passado”, advertiu. O risco, segundo ele, é criar leis muito rigorosas que permitam todo o tipo de contestação judicial sobre os conteúdos veiculados na rede. “Não podemos criar um monstro e, depois, não atender a todas as demandas.”

“Eu não sou juiz, mas certamente a judicialização é um cenário possível caso o marco civil estipule a notificação judicial para a remoção de conteúdo”, afirmou Stelleo Tolda, diretor-presidente do Mercado Livre. Ele defendeu um mecanismo chamado Programa de Proteção à Propriedade Intelectual (PPPI), pelo qual o site é notificado pelo autor para retirar determinado conteúdo do ar. “É um mecanismo de autorregulação”, explicou. “Para nós, facilita. Com ele, não é preciso que o detentor de um direito autoral entre na Justiça.” Tolda defendeu ainda uma salvaguarda no marco civil para evitar que o autor processe o site, mesmo se esse último remover o conteúdo.

Ivo Corrêa, diretor de Políticas Públicas e Relações Governamentais do Google, disse que o sistema de notificações para a retirada de material de sites funciona bem em questões de direito autoral. Por esse sistema, o autor faz a requisição e o site retira o conteúdo sobre o qual ele tem direito. “Agora, com relação ao direito à intimidade isso é mais complicado”, completou. Como exemplo, ele citou o caso de um cidadão que denuncia um prefeito pela internet. Nesse caso, fica difícil retirar o conteúdo sem decisão judicial.

Corrêa reiterou ainda que, em muitos casos, a melhor maneira de informar ainda é a judicial. O You Tube, por exemplo, recebe 24 horas de vídeos por minuto. Se o site tiver que atender a todos os pedidos extrajudiciais para retirar vídeos teria as suas atividades dificultadas. “O site é o intermediário, e não o responsável pelo conteúdo”, disse o diretor do Google.

Luis Nassif

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