Advogado-geral da União volta a defender acordos de leniência

Jornal GGN – O Valor Econômico entrevistou o advogado-geral da União, ministro Luís Inácio Adams, que falou sobre o que se pode esperar para os acordos de leniência com as empreiteiras envolvidas na Operação Lava Jato. De acordo com ele, os valores que forem apontados pelo balanço da Petrobras como perdas com corrupção devem constituir a base de dados mais confiável para as negociações com as empresas.

“Acho que o primeiro esforço é a própria Petrobras terminar sua avaliação e, a partir dessa avaliação, teremos um primeiro número, mais efetivo. Até porque vai estar no balanço auditado. O volume de recursos apontados eu poderei considerar como base e, em cima desse volume, a gente vai acertar, se for pedido, as formas de ressarcimento”, disse Adams.

Para ele, o acordo de leniência “não isenta o criminoso e não impede o processo penal”. “O acordo de leniência, ao ser firmado, potencializa o processo de investigação. A influência é positiva”, afirmou.

Ele também trouxe à tona algo que a mídia convencionou ignorar nos últimos tempos. “A delação premiada é um instrumento para incentivar a investigação penal, para apurar crimes. É uma forma de início de provas. A delação em si não é suficiente para uma condenação, é preciso uma coexistência. Ela pressupõe a formação de indícios, de outras provas que corroboram a investigação”.

Valores de acordos de leniência vão depender de resultado da Petrobras

Por Leandra Peres e Murillo Camarotto

Do Valor Econômico

O aguardado balanço auditado da Petrobras servirá como parâmetro para os acordos de leniência que o governo pretende celebrar com as empreiteiras envolvidas na Operação Lava-Jato. Em entrevista ao Valor PRO, serviço de informações em tempo real do Valor, o advogado-geral da União (AGU), ministro Luís Inácio Adams, disse que os valores que a estatal vier a apontar como perdas com corrupção poderão constituir uma base mais confiável para as negociações com as empresas interessadas em um acordo que as deixe livres do temido selo de inidoneidade a que estão sujeitas.

“Acho que o primeiro esforço é a própria Petrobras terminar sua avaliação e, a partir dessa avaliação, teremos um primeiro número, mais efetivo. Até porque vai estar no balanço auditado. O volume de recursos apontados eu poderei considerar como base e, em cima desse volume, a gente vai acertar, se for pedido, as formas de ressarcimento”, disse Adams, que está em plena queda de braço com o Ministério Público Federal (MPF) para viabilizar os acordos de leniência.

Para o AGU, é importante que todos os órgãos públicos de alguma forma envolvidos com a Lava-Jato encontrem uma forma de atuarem em conjunto, com o intuito de dar mais segurança aos eventuais acordos de leniência, que são celebrados em âmbito administrativo pela Controladoria-Geral da União (CGU). Adams critica a estratégia do Ministério Público Federal de tentar ampliar o número de delações premiadas por meio do “estrangulamento das empresas”.

“Não estamos falando de um sócio da empresa ou de um diretor, mas de milhares de funcionários e milhares de fornecedores que não têm nada a ver com o assunto”, disse o advogado-geral. Adams vê com naturalidade os encontros do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, com os advogados das empreiteiras acusadas e informou que ele próprio já orientou os representantes das empresas sobre os acordos de leniência.

Nas próximas semanas Adams terá que intensificar suas visitas ao Tribunal de Contas da União (TCU). Além de tentar convencer os ministros a não colocarem barreiras sobre os acordos de leniência, o AGU vai liberar um despacho no qual vai defender o governo das acusações de maquiagem nas contas públicas. O relatório do TCU sobre as “pedaladas fiscais” aponta descumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal e deve chegar às mãos do ministro relator, José Múcio, nos próximos dias. A seguir, os principais trechos da entrevista:

Valor: O senhor vem defendendo que eventuais acordos de leniência firmados pela CGU com as empresas da Lava-Jato não prejudicam as investigações do MPF. Os procuradores discordam e tentam convencer os ministros do TCU a barrarem os acordos. Como vê esse imbróglio?

Luís Inácio Adams: Nós apresentamos uma contradita à representação do procurador que pediu isso aos ministros. Ele mistura dois eventos diferentes para criar uma confusão – acho, até, que isso é intencional. Esse acordo que eles pretendem que não seja realizado por antecipação não isenta o criminoso e não impede o processo penal. Mais que isso, o acordo de leniência, ao ser firmado, potencializa o processo de investigação. A influência é positiva.

Valor: Mas o procurador menciona um artigo da lei anticartel que livra as empresas beneficiadas por acordo de leniência de denúncia na esfera criminal.

Adams: Se essa era a preocupação deles, a representação deveria ser dirigida ao Cade e não à CGU. A Lei de Defesa da Concorrência, exatamente por incentivar a quebra do cartel, ela cria um benefício adicional para aquele que faz o acordo de leniência, que é só um. No cartel só um faz acordo de leniência, que é o primeiro. Os demais não fazem acordo.

Valor: Mas a Lei Anticorrupção também fala que somente o primeiro voluntário é que pode firmar o acordo de leniência.

Adams: Ela fala que é o primeiro, mas aqui nós temos uma sequência de crimes. O cartel é um crime em uma coletividade, aqui nós temos várias corrupções. É por isso que temos uma multiplicidade de agentes com os quais é possível fazer acordos de leniência.

Valor: Então, na questão específica do cartel de empreiteiras, não há acordo com a CGU?

Adams: No caso do cartel, a CGU não avança. A questão do cartel é no Cade, que está fazendo investigação e conduzindo. A investigação da CGU se refere às práticas de corrupção. Agentes da Petrobras teriam sido comprados para facilitar ou viabilizar negócios com empresas. Então, cada evento é um caso de corrupção.

Valor: Nas investigações criminais há a preocupação de que as delações premiadas não sejam repetitivas, ou seja, que tragam novos elementos. No caso dos acordos de leniência, não há esse risco?

Adams: A delação premiada é um instrumento para incentivar a investigação penal, para apurar crimes. É uma forma de início de provas. A delação em si não é suficiente para uma condenação, é preciso uma coexistência. Ela pressupõe a formação de indícios, de outras provas que corroboram a investigação. O acordo de leniência é um instrumento que tem vários objetivos. Um deles é a investigação. Além disso, o objetivo do acordo é ressarcimento e mudar as práticas da empresa.

Valor: O que o MP defende é que os eventuais acordos de leniência não se antecipem à conclusão das investigações criminais. Isso não seria possível?

Adams: Precisa acabar a investigação? Não. Porque a própria empresa se antecipa à investigação. Qual o sentido de se fazer acordo de leniência depois que já se está investigado? Nenhum. Um dos elementos do acordo de leniência é colaboração com a investigação. Ao antecipar-se à investigação, ela coloca à disposição de quem investiga – MP, CGU ou TCU – todos os elementos que ela tenha à disposição para esse trabalho. Outra coisa: a necessidade do acordo está associada às condições econômicas da empresa. Vai esperar a empresa fechar para fazer o acordo de leniência?

Valor: Por que o governo defende os acordos se eles são uma saída para o setor privado?

Adams: É uma saída para o setor público também, especialmente no que diz respeito ao ressarcimento. Quanto tempo você acha que vai durar uma ação de mais de R$ 4 bilhões em ressarcimento? Se você pegar os precedentes, isso não gera ressarcimento. Porque até chegar lá a empresa, provavelmente, já fechou. Temos a mania, no Brasil, de fulanizar as pessoas jurídicas. O problema é que não estamos falando de um sócio da empresa ou de um diretor, mas de milhares de funcionários e milhares de fornecedores que não têm nada a ver com o assunto. Será que a lógica é punir todo mundo?

Valor: O senhor acha que é essa a lógica que move a Lava-Jato?

Adams: Não sei qual é a lógica. O foco do Ministério Público é na investigação penal, é evidente. Uma das formas de conseguir o resultado que eles buscam é fortalecer os processos de confissão. Pelo que eu soube, já são 13 delações premiadas e eles querem mais. O foco deles é o penal e, nesse sentido, subordinar o processo administrativo ao penal. Isso está errado, legalmente e conceitualmente. Quando você faz isso, você força o estrangulamento da empresa como instrumento de produção de confissões.

Valor: Algumas empresas têm resistido em admitir os ilícitos. Sem isso, há chance de acordo de leniência?

Adams: Se a empresa não pedir, não haverá acordo de leniência.

Valor: Alguma já pediu para fazer?

Adams: Aí você deve perguntar para o ministro Valdir Simão [da CGU], que é lá a porta de entrada. E o pedido é sigiloso, a empresa pode ou não divulgá-lo.

Valor: Os acordos pressupõem que as empresas não sejam consideradas inidôneas?

Adams: Não existe sentido fazer acordo cuja resultante seja a inidoneidade. O dilema da inidoneidade é que ela fecha a empresa. Eu, governo, faço acordo para garantir ressarcimento ao erário, facilitar o processo de investigação e exigir mudança da prática e aí a considero inidônea? Não há nenhuma empresa que tenha passado por isso e tenha resistido. Não só pelos contratos com o poder público, mas também pela questão do crédito. As principais linhas de funding são públicas. Mais ainda: o fato de estar inviabilizado no crédito público acaba também prejudicando o crédito privado, pois vão botar o risco lá em cima e o custo de capital será altíssimo.

Valor: Qual a força de um acordo de leniência no âmbito administrativo se há uma discussão de mais de R$ 4 bilhões no Judiciário?

Adams: Existe uma disputa de protagonismo nessa discussão. Eu e a CGU temos defendido que o conjunto de atores tem que, ao máximo possível, se entender. Por isso fui procurar o TCU, que vai homologar os acordos. Quanto mais órgãos assinando, maior a segurança do acordo. Mas não posso obrigar todo mundo a assinar. É essa indeterminação que gera um risco de a empresa não saber o que fazer. Eu tenho feito um esforço, que não vejo o Ministério Público fazer, de tentar achar uma base comum de entendimento.

Valor: Mas a AGU já tem um plano do que pretende propor em termos de ação judicial?

Adams: Hoje nós não temos nenhuma estimativa de valor. Acho que o primeiro esforço é a própria Petrobras terminar sua avaliação e, a partir dessa avaliação, teremos um primeiro número mais efetivo. Até porque vai estar no balanço auditado e tudo mais. O volume de recursos apontados eu poderei considerar como base e, em cima desse volume, a gente vai acertar, se for pedido, as formas de ressarcimento. Evidentemente, todo o valor vai ter que ficar aberto a ajustes por conta de eventuais fatos novos da investigação. Além disso, é importante a articulação entre os atores envolvidos que estão em negociação e também as empresas decidirem o que elas querem. Acredito que a Operação Lava-Jato pode resultar em uma melhoria substancial das relações do Estado com o setor privado.

Valor: A Lei Anticorrupção, que prevê os acordos, ainda não foi regulamentada. Isso não é um problema?

Adams: O que a lei exige para regulamentar não a impede de ser aplicada. Não somente para acordo de leniência, mas também na penalização. Mas é óbvio que o decreto [de regulamentação] pode dar mais clareza em alguns itens.

Valor: Os ministros do TCU ainda vão avaliar o pedido do MP para que o tribunal barre os acordos na CGU. O senhor pretende procurá-los?

Adams: Devo me encontrar com o ministro Augusto Nardes, que é o relator, na próxima segunda-feira.

Valor: Uma polêmica recente foi a agenda do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, que recebeu os advogados das empresas. Qual o papel do ministro de Estado nisso? O senhor também recebe os advogados da Lava-Jato?

Adams: Já recebi em duas audiências. Dei esclarecimentos sobre a questão dos acordos de leniência. Todo agente público ou servidor se relaciona com a sociedade. Eu, como ministro, sempre busquei manter uma agenda aberta para advogados. O ministro Cardozo tem autoridade em várias áreas, não só policiais, portanto é legítimo e conveniente que o faça.

Valor: Os auditores de tribunais de contas também apontam uma falta de independência da CGU para firmar os acordos de leniência. Como o senhor vê isso?

Adams: Não é porque o chefe do órgão é indicado pela Presidência da República que ele não exerce seu papel com independência. Existe uma maturidade institucional. Isso é um tipo de acusação tendenciosa e maledicente.

Valor: O procurador do MP-TCU que propõe barrar os acordos de leniência é o mesmo que denunciou as pedaladas fiscais. Esse processo deve ir ao plenário nas próximas semanas…

Adams: Ele fez um parecer, a decisão é do tribunal.

Valor: O senhor afirmou que vai procurar pessoalmente os ministros para dar sua versão sobre as pedaladas. Já o fez?

Adams: Já conversei e estamos encaminhando um parecer sobre o assunto. Estou finalizando o despacho e devo liberá-lo na próxima semana.

Redação

5 Comentários

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  1. O Advogado Geral da União

    O Advogado Geral da União demonstra extrema competência e conhecimento nessa entrevista.

     

    Explica de forma didática, clara todos os aspectos envolvidos na questão da Petrobrás e se mostra preparada para desmontar as verdadeiras bombas-relógios que o MP Federeal e o Juíz Moro estão deixando no caminho para destruir a Petrobrás, as empreiteiras e afetar seriamente a economia de todo o país, com extrema irresponsbilildade diria.

     

    Quanta diferença dos pronunciamentos ” tati-bi-tates ” do ministro da justiça josé eduardo cardoso (tudo com minusculas mesmo)  e seu ” republicanismo de província “, em que todos ( MP, Juíz Moro, oposição e mídia partidarizada) deitam e rolam em cima do governo federal com intenções polítidas e partidárias e o ministro não move um dedo para esfriar a crise política,  que consome o governo nesse início do segundo mandato da Presidenta Dilma.

     

    Dilma faria um ” gol de placa “se demitisse o ministro zé e  simplesmente nomeasse o Adams como Ministro da Justiça, esse tem estofo, personalidade e conhecimento para ser um MINISTRO DA JUSTIÇA  de verdade e não só de aparencia e nome.

     

    Ah, e Dilma poderia para completar o acerto, nomear o Desembargador  Fausto  de Sanctis como novo Ministro do STF.

  2. leniência clemência demência

    advogado geral irrestrito deveria “causar” com começo meio e fim o pacote de bondades de porteira fechada:

    advogar a defesa da união em torno de um acórdão de clemência paratodos… inclusive para o brasileiro condenado na Indonésia, para genoino mais kátia…

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