Castelo de Areia: anulação de provas será contestada

Da Folha

Procurador recorrerá de decisão que anulou provas em ação da PF

Para Gurgel, não há vício em material obtido por meio escutas telefônicas na Castelo de Areia

Principal ponto que Procuradoria analisará é se STJ anulará dados obtidos com mandados de busca e apreensão

FILIPE COUTINHO
DE BRASÍLIA

O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, disse ontem que vai recorrer da decisão do STJ (Superior Tribunal de Justiça) que invalidou todas as provas obtidas a partir das interceptações telefônicas da Operação Castelo de Areia.
Segundo Gurgel, a Procuradoria vai analisar o texto final a ser publicado pelo tribunal para decidir como vai recorrer da decisão. O recurso pode ser apresentado ainda no STJ ou, em último caso, no STF (Supremo Tribunal Federal).

“Temos que ver a decisão publicada para que possamos ver o alcance e como vamos impugná-la. Não concordo com a decisão porque não há qualquer vício nas provas colhidas”, afirmou Gurgel.

O principal ponto a ser analisado pelos procuradores é se o tribunal vai invalidar os documentos obtidos com os mandados de busca e apreensão, uma vez que essas diligências aconteceram depois de os investigados terem sido grampeados.

AcasA Castelo de Areia é a maior investigação da Polícia Federal contra fraudes em obras públicas e envolve mais de 200 políticos. Executivos da construtora Camargo Corrêa são os principais investigados e foram os autores do habeas corpus que travou a operação.

O STJ decidiu ontem que os grampos e as provas originadas a partir dessas interceptações são ilegais porque foram baseados em denúncia anônima.

Gurgel contesta esse argumento. “Diferentemente do que diz a decisão do STJ, nós não nos baseamos apenas em denúncias anônimas”, disse o procurador-geral.

Por 3 votos a 1, os ministros da 6ª Turma do STJ entenderam que apenas uma denúncia anônima motivou a autorização judicial das interceptações, o que seria irregular. Para eles, a permissão do juiz Fausto de Sanctis para a instalação dos grampos ocorreu de forma indiscriminada, genérica e sem a devida fundamentação.

Não há prazo para o acórdão da decisão do STJ ser publicado. A Operação Castelo de Areia estava suspensa pelo tribunal desde janeiro do ano passado. 

Sistema criminal trata diferente ricos e pobres, afirma De Sanctis

FLÁVIO FERREIRA
DE SÃO PAULO

O desembargador Fausto Martin De Sanctis, que atuou no caso Castelo de Areia, recusou-se ontem a falar sobre o julgamento do STJ que anulou os grampos da operação, mas disse que o sistema criminal do país vive uma situação de “dualidade de tratamento” entre ricos e pobres.

Folha – Como o sr. avalia a decisão do STJ que anulou os grampos da Castelo de Areia?
Fausto De Sanctis – Não posso falar sobre esse caso concreto, mas posso falar sobre o sistema criminal de um modo geral. Em várias situações o Supremo Tribunal Federal já legitimou interceptações após denúncias anônimas e prorrogações de interceptações por longos prazos.
A Justiça tem um compromisso, pois ela serve de estímulo ou desestímulo para outros órgãos de poder. Não se pode comprometer a imagem da Justiça como uma Justiça dual, que trata diferentemente pobres e ricos.
O grande desafio do Judiciário brasileiro é reafirmar o princípio da igualdade e não fazer reafirmações que passam de forma concreta a ideia de que o crime compensa para alguns. A dualidade de tratamento já foi discutida no passado e os países desenvolvidos já superaram essa fase. Mas parece que o Brasil não superou.

Qual será a repercussão desse julgamento para outros casos que tiveram interceptações após denúncias anônimas?
Não posso falar desse julgamento, mas é nítido para juízes criminais, Ministério Público, Polícia Federal e advogados o desestímulo institucional já existente. Tudo o que é feito é sempre interpretado de maneira favorável às teses provenientes daqueles que lucram muito com elas.
Não existem direitos sem deveres, mas parece que os deveres não são exigidos ou são muito bem flexibilizados em determinadas situações, o que é inconcebível.

O subprocurador que representou o Ministério Público no julgamento disse ser preciso reavaliar os cuidados nas apurações. O sr. concorda?
Não falo do fato concreto, mas acontece que há uma total desorientação da jurisprudência com relação aos trabalhos de apuração, porque a jurisprudência sempre permitiu interceptações por tempo indeterminado, denúncias anônimas e ações controladas.
A partir do momento em que determinados casos vieram à tona, e não estou falando da Castelo de Areia, a jurisprudência simplesmente vira e interpreta com rigor tal que não se tem como investigar ou processar, pois tudo leva à prescrição, à nulidade ou à inépcia da denúncia. 

Luis Nassif

0 Comentário

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador