Cinco razões para derrubar o Ministro da Justiça, por Gabriela Cunha Ferraz

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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do Justificando

Cinco razões para derrubar o Ministro da Justiça

por Gabriela Cunha Ferraz

Nos últimos dias, uma pauta conseguiu unificar os movimentos de esquerda e direita do país: A insustentabilidade do atual Ministro da Justiça, Alexandre de Moraes. Depois dos trágicos episódios testemunhados nas penitenciárias brasileiras no começo deste já tenebrosos 2017, todos os jornais e revistas do país publicaram matérias, editoriais ou colunas afirmando que o atual Ministro não pode permanecer à frente da pasta. Diante desse fato, resolvi dar a minha contribuição, pensando objetivamente nas cinco razões pelas quais o Sr. Alexandre de Moraes não está à altura do cargo que lhe foi ofertado.

1. Um Ministro Populista

O Ministro da Justiça assumiu, desde a primeira semana do seu mandato, uma postura completamente contrária ao direcionamento “low profile” do Governo Temer. Enquanto o atual Presidente se ausentava de eventos públicos como a parada de 7 setembro ou o encerramento das Olimpíadas, seu Ministro fazia questão de estampar as capas dos jornais com o único intuito de se tornar notícia, no melhor estilo ex-BBB.

Na sua primeira grande aparição polêmica, o Ministro convocou a imprensa para acompanhá-lo até a fronteira do Paraguai, onde cortou – com um facão que mal sabia manipular, alguns cinco pés de maconha. A cena é dantesca, sobretudo por essa não ser, em absoluto, a função de um Ministro. Mas, ficar sentado no seu gabinete resolvendo questões políticas emergenciais para o país não é o perfil de Alexandre que quer ganhar a capa dos jornais a qualquer preço.

Pouco tempo depois, Alexandre afirmou que o país “precisa de mais armas e menos pesquisas”, assumindo, publicamente, que não dispõe de qualquer racionalidade mais profunda sobre o tema. Mais uma vez, frases soltas e tecnicamente vazias são usadas apenas para causar frisson popular. Na sequência, e no auge da sua audácia, Alexandre publica um posicionamento interno sobre o resultado do “Dossiê Palocci” e recebe um puxão de orelha de Temer, estremecendo no cargo pela primeira vez.

Porém, conforme era de se esperar, ele não conseguiu ficar muito tempo na sombra e, recentemente, voltou a enfrentar a discrição do Presidente, ao afirmar que seria o responsável por “erradicar a maconha na América do Sul”. Sobre esse último comentário eu vou me reservar o direito de não opinar por ser mais ridículo do que a minha capacidade de argumentação.

Mas, porque Alexandre faz tudo isso? Seria por puro ego? Seria apenas mais um narcisista em busca dos seus 5 minutos de fama? Não. Alexandre tem ambições maiores e está, claramente, usando seu atual mandato como escada para fazer a maior campanha eleitoral pelo Governo de São Paulo já vista na história desse país. Com dois anos de antecedência, ele já está com todo gás populista, tentando convencer a população a confiar em alguém que levanta do seu escritório para cortar maconha com as próprias mãos. Um Alexandre trabalhador que almeja ser Governador!

2. Um Ministro que não toma decisões

Desde que assumiu o cargo, alguns episódios trágicos aconteceram no país – como já era esperado, e forçaram Alexandre a assumir uma posição. O primeiro deles foi o estupro coletivo de uma menina carioca de 16 anos, violentada por 30 homens. Diante desse fato escabroso, Alexandre reuniu sua equipe e propôs a construção de um núcleo de enfrentamento à violência contra a mulher, ignorando, completamente, o trabalho realizado durante os 13 anos de existência da Secretaria de Políticas para as Mulheres. Passados seis meses, este núcleo nunca avançou e a Secretaria especializada foi propositalmente esvaziada durante a sua gestão.

Com isso, Alexandre comprova que não consegue tomar decisões concretas e acaba por reinventar a roda quando o tema é política pública. Suas ações se resumem a propor a organização de grupos de estudo ou de especialistas, sem, contudo, se comprometer ou criar políticas capazes de garantir os direitos da população.

Essa sua característica voltou à tona com a publicação de um “novo” Plano de Segurança Pública, em resposta às tragédias (sim, não foi “acidente”) das últimas semanas. O novo plano está focado nas ações de segurança pública e, talvez, o primeiro passo seria explicar ao Ministro a diferença entre esta e a pasta do sistema carcerário. Grande parte das ações propostas já havia sido pensada anteriormente na construção do plano de redução de homicídios. Quando finalmente aborda o tema da gestão penitenciária, o Plano de Alexandre falha por não apresentar nenhuma ação capaz de enfrentar o encarceramento em massa, que é a principal causa do problema no país. Mais uma vez, ele e seus especialistas se limitam a redesenhar algumas estratégicas completamente inócuas, na maioria das vezes, controversas.

3. Um Ministro centralizador

A primeira norma que o atual Ministro da Justiça editou quando assumiu sua cadeira foi centralizar todas as ações do Ministério na sua pessoa. Alexandre resolveu que todos os gastos, as contratações, viagens e a gestão dos trabalhos em desenvolvimento deveriam passar primeiro por ele para, depois, serem concretizados. Ora, qualquer manual de gestão pública vai te ensinar que é isso é absolutamente impossível quando lidamos com uma pasta dinâmica, imensa e crucial para a manutenção da paz social de um país.

Ao propor esse excesso de centralização, Alexandre conseguiu paralisar o trabalho de todo um Ministério, atravancando decisões (já vimos que ele não gosta muito de ter que tomá-las) e criando obstáculos para continuidade das políticas existentes. Aliás, em sua própria fala, Alexandre admite não ter qualquer compromisso em dar seguimento às políticas pensadas por governos anteriores. Com isso, além de não dar continuidade ao que já existia, ele também não propõe nada novo.

4. Um Ministro sem repertório político

Se você decide ser um gestor centralizador, você deve dominar a maioria dos temas que estão sob sua responsabilidade. Mas, isso não acontece com Alexandre que além de não ser especialista nas áreas de atuação do Ministério da Justiça, também não dispõe de assessores capazes de auxiliá-lo.

Ao assumir seu posto, Alexandre convocou seus assessores e nomeou seus secretários. O grande problema é que a imensa maioria deles é formada por policiais. Os assessores locados no Gabinete do Ministro são em sua imensa maioria membros da Polícia Militar. O novo Diretor do Departamento Penitenciário Nacional (que, inclusive, nem foi chamado para sentar ao lado do Ministro da coletiva de imprensa que tratou dos temas da sua pasta) é um coronel da Polícia Militar de São Paulo. Sua nova diretora do Departamento de Estrangeiros (DEEST) também é uma policial, dessa vez, federal. O Secretário da Secretaria Nacional de Política sobre Drogas (SENAD) é Policial Militar e o Secretário da Secretaria de Segurança Pública um perito da Polícia Civil de São Paulo. A Coordenação Geral do Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional (DRCI) é Policial Federal.

E o que isso significa? Significa que o Ministro não tem repertório próprio e que seus assessores e secretários não são capacitados para trabalhar com diferentes temas porque estão limitados dentro dos conhecimentos proporcionados por um universo único. Contrário à toda ideia de diversidade, Alexandre não tem repertório para assumir o complexo e interdisciplinar posto de Ministro da Justiça.

5. Um Ministro da Justiça que não respeita leis

Por fim, a cereja do bolo: O caso do Fundo Penitenciário (FUNPEN). O Supremo Tribunal Federal, ao decidir a Ação Declaratória de Preceito Fundamental (ADPF) 347, descontigenciou um alto montante orçamentário para que o Departamento Penitenciário pudesse trabalhar políticas públicas focadas na melhoria da qualidade do sistema prisional

De acordo com um Termo de Cooperação assinado pelo próprio Ministério da Justiça sob a batuta do saudoso Eugênio Aragão, o Governo Federal precisaria de aprovação do CNJ para repassar o montante descontigenciado para os cofres dos Estados. Mas, assim como Alexandre de Moraes afirma não ter qualquer vínculo com as políticas assumidas em outros governos, ele aparentemente também não é afeito a obedecer normas e leis assinadas no passado. Sendo assim, o Ministro passou por cima do Conselho Nacional de Justiça e simplesmente transferiu 1.2 bilhão para os Estados, sem autorização do CNJ e sem prever qualquer critério para posterior prestação de contas.

No ato de transferência orçamentária, o Governo Federal repassa a integralidade do valor de uma única vez e, com isso, não obriga os Estados a aplicar essa verba na melhoria das condições carcerárias. Considerando que muitos Estados Brasileiros alegam estar “quebrados” é, no mínimo, temerário não impor critérios objetivos para liberação e utilização gradual da verba pública, além de ser um potencial grande problema a ser enfrentado junto aos órgãos de controle.

O Ministro não só retirou do Departamento Penitenciário Nacional – órgão especializado, a capacidade de criar políticas públicas uniformes e eficazes, como atropelou o CNJ e, em mais um episódio de ímpeto, esvaziou uma decisão tomada pelo próprio Supremo Tribunal Federal.

Estas cinco razões não são as únicas que demonstram a falta de capacidade técnica e política do atual Ministro da Justiça, mas indicam que é insustentável mantê-lo nesta posição. Ao testemunhar tamanhas trapalhadas, rogamos para que a campanha eleitoral em curso do ainda Ministro acabe antes do que ele imaginava.

Gabriela Cunha Ferraz é advogada, militante, mestra em Direitos Humanos pela Universidade de Estrasburgo e Realizadora do Projeto Vidas Refugiadas (www.vidasrefugiadas.com.br)

 

 

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

11 Comentários

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  1. Melhor que o Zé da Justiça

    Melhor que o Zé da Justiça ele é.  Ele é um bandido em um governo de iguais seus.

    Ele serve bem a quem o botou lá… já o Zé da Justiça incitou a indisciplina, a insubordinação e a rebelião aberta contra o executivo. É um bandido em um governo de iguais seus.

    Era o principal conselheiro de Dilma, mesmo tendo como confidente de alcova jornalista que trabalhava pela derrubada dele, inclusive, fazendo reportagem insinuando loucura da chefe dele.

    1. Ia citar justamente ele mas goste mais rápido
      Em adição as péssimas nomeações para o STF, a manutenção de JEC no cargo foi o ápice da inoperância da saudosa Presidenta em seu cargo.

  2. Quem tem de ser derrubado é o

    Quem tem de ser derrubado é o governo inteiro que é golpista. 

    O que essa gente quer é que nos preocupemos com os acessórios e deixemos passar o principal.

    1. quem….

      5 razões teria só para não ser convidado para o cargo. As dezenas de chacinas no estado de SP que não são investigadas, omissão descarada com a cumplicidade do Poder Judiciário e Ministério Público. E a imprensa então?! Houve mais uma chacina no começo do ano no bairro Edu Chaves na zona norte da cidade de São Paulo. Começo de ano e rebeliões em presídios foram a desculpa perfeita para a imprensa acobertar mais esta aberração no protegido governo Picolé de Chuchu. E a festança de explosões de carros fortes e caixas eletrônicos? Assim como nas chacinas, até as pedras sabem do escrachado envolvimento de forças sob o comando do governo do Estado de SP. Já existe uma parte deste cancro dentro do governo federal. E tem gente querendo levar para lá o pacote todo. Pobre Brasil.  

      1. quem….

        A Justiça e o Poder Judiciário  de SP, de onde vem o Ministro: 10 anos após a tragédia do desmoronamento das obras da privataria do Metrô paulista com 7 mortes, ninguém foi responsabilizado nem condenado criminalmente. O presente que o país vive, o futuro que este país almeja?

  3. Santa ingenuidade, Batgirl…

    São exatamente os cinco motivos que são enxergados como “qualidades” para que permaneça no cargo.

    Qualquer um com um pouco mais de estudo, mas também com uma visão mais sistêmica do problema, sabe que segurança pública sempre foi a espinha dorsal do aparato de controle social do Estado, principalmente na gestão do modelo capitalista.

    Não é à toa que Polícia e Política derivam do mesmo radical polis (cidade como ente abstrato, ao contrário de urbe, cidade física).

    Nos tempos atuais essa importância foi elevada a categoria impensável.

    (i)moraes não é um acidente.

    Ele,(i)moraes, assim como capez (fernando) são “instituições” que povoaram a cabeça de boa parte dos juizecos e batmans e outros super-heróis do ministério público, pois seus “livros” de processo penal e direito constitucional (argh!) foram a base curricular de quase todas as faculdades de Direito (?) privadas do país, justamente aquelas que alimentam a cadeia da indústria do concurso.

    Até bem pouco tempo, gilmar (dantas) mendes, barroso (o venturoso), teori (na prática é outra coisa), e tantos outros, eram (e em alguns círculos ainda são) incensados como pilares do pensamento constitucional brasileiro.

    Esse “pensamento”, que na sua aplicação prática (práxis) erigiu um dos sistemas penais-judiciais mais desiguais do planeta, justamente como nossa realidade sócio-econômica.

    Ate porque, uma condição é causa e efeito recíproco da outra (desigualdade social-desigualdade jurídica).

    Eu temo ser ácido (e pessimista) demais com a moça, mas a verdade que tanto fez, tanto faz…

    Ativistas de direitos humanos e policiais brucutus, presos psicopatas e judiciário seletivo, infelizmente, são engrenagens de um sistema de enxugamento de gelo permanente, que funciona unicamente para manter as coisas como estão: o Estado é de quem o controla.

    Nossa gestão (do PT) também pouco (ou nada) mexeu nessa estrutura, por motivos diferentes, é claro, mas com resultados semelhantes.

    O PT manteve tudo como está porque nunca se preocupou de verdade em tratar da reforma do sistema policial-judiciário-penal brasileiro, tratando como tema secundário.

    Boa parte do imaginário petista (e da esquerda) considera o problema policial a partir de uma referência ruim, vinda da ditadura…essa referência é correta, mas não pode ser a única a servir de filtro para enxergar um tema tão policrômico.

    A agenda “war on drugs” manteve-se inalterada.

    Teve gente boa que comemorava (inclusive por aqui) as UPP…

    …piada…trágica…

    “Ocupação do Alemão”? Oba, vou poder passear de carro livremente pela Av Brasil ou Linha Vermelha…

    Ok, ok, eu também quero, mas é preciso saber que as coisas não se resumem a isso.

    A questão é (ou deveria), porque ocupar o Alemão e deixar livre a Barra da Tijuca?

    A violência, responderão todos, traficante de morro é violento…

    Concordo…

    Sim, mas aí vem outra pergunta:

    Por que o traficante da Barra, que alimenta o do morro, não precisa ser violento?

    Por que temos índices de mortalidade violenta no Leblon iguais a Europa e em São Gonçalo iguais ao Iraque?

    E alguém será cínico suficiente para dizer que não há tráfico nos bairros “nobres”?

    Pois é…

    Alguém imaginava, sem ser cínico, obviamente, que “ocupação militar” poderia “pacificar” algo?

    Existem tantas outras questões, como as “escolhas” para “pacificação”, muito mais voltadas para o atendimento das demandas “casadas”, imóveis-histeria da mídia, fatores muito mais decisivos que os indicadores estatisticos relativos a letalidade violenta.

    Arf, eu confesso que isso cansa…

  4. Em suma: transformaram o mais

    Em suma: transformaram o mais antigo dos ministérios numa delegacia de polícia de subúrbio entregando-a a um inepto politiqueiro. 

    Coloca mais essa na conta do golpe parlamentar. 

    1. Data venia, caro JB

      Quem lê o que você escreveu tem algumas impressões, pelo menos esse foi o meu caso…

      Que a “tradição” do Ministério da Justiça lhe conferisse uma natureza distinta da que tem no estamento normativo, ou seja, garantir que, desde sua criação, o sistema judiciário desça o pau no lombo dos pobres e pretos (sempre pobres) e preserve os direitos dos médios e ricos.

      Que uma delegacia de subúrbio funcione com uma lógica diferente do stf ou do citado ministério…

       

      E enfim, que haja como adjetivar a política entre “politiqueira” e “pura”….não creio que seja um tema que possa ser reduzido dessa forma…

       

      Como sempre leio seus bons comentários, impregnados de bom senso, fico com a sensação de que fui eu que não entendi, mas como dizia Bordieu, as palavras são de quem ouve…

  5. Concordo com o Marcelo 33 e

    Concordo com o Marcelo 33 e discordo da eminente advogada. O Alexandre está à altura do cargo sim. Do cargo num governo como esse em que a “altura” é abaixo do solo, lá onde fica o esgoto, mais ou menos.

    Quem era a pessoa errado no governo certo e legítimo era o Zé Cardoso. Este conseguiu ser uma das portas de entrada do golpe. Já o Alexandre se cair ou ficar não vai fazer muita diferença, num governo em que todos, de cabo a rabo, são a mesma porcaria. 

    Esse governo, com quaisquer nomes, até o Frota no MEC, fica de pé enquanto a Globo quiser

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