Embargos dos embargos expõem os malabarismos que condenaram Lula

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.
[email protected]

Nos últimos recursos em segunda instância, defesa de Lula quer saber como pode uma delação que, se verdadeira, descreve tráfico de influência, ser usada para fundamentar um crime de corrupção passiva. E mais: como pode uma sentença condenar por recebimento de propina ao mesmo tempo em que reconhece que Lula não recebeu o triplex


Fotos: Ricardo Stuckert

Jornal GGN – As delações contra Lula, se verdadeiras, descreveram, no máximo, condutas típicas de “tráfico de influência”, mas foram usadas para condená-lo por crime de “corrupção passiva”. Já o chamado de corrupção passiva na sentença foi caracterizado pelo “recebimento da vantagem indevida” prometida pela OAS, quando os próprios desembargadores do TRF-4 escreveram que o triplex jamais foi “transferido” a Lula. Deu para entender? 

Foi mirando nesses verdadeiros malabarismos praticados pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região para acatar a já criticada sentença imposta por Sergio Moro que a defesa de Lula apresentou, na terça (10), os embargos aos embargos de declaração. Na prática, podem ser os últimos recursos do petista em segunda instância.

Na semana passada, quando decretou a prisão de Lula, Moro afirmou que estes recursos são do tipo “protelatório” e deveriam ser extintos do ordenamento jurídico. Mas o documento elaborado pela defesa do ex-presidente (em anexo), ao contrário, mostra que os embargos dos embargos são necessários para “clarear” uma série de argumentos usados na sentença que carecem de sentido.

É o caso do modo como o TRF-4 admitiu o crime por corrupção passiva.

Nos novos embargos, a defesa de Lula frisou a contradição em que caiu o desembargador João Gebran Neto quanto rejeitou pelo menos dois tópicos do primeiro recurso que tratavam do tema.

Um deles diz respeito ao reconhecimento, por Gebran, de que Lula não recebeu o apartamento, ao mesmo tempo em que a mera “destinação” da propriedade foi entendida como corrupção passiva.

Para a defesa de Lula, “falta – e muita – clareza na formatação da decisão de condenação em razão de ‘recebimento de destinação'(?) e no que isso difere ou não de uma ‘aceitação de promessa’, para fins da aplicação da lei penal. O quadro é impenetrável, de total perplexidade.”

A defesa ainda sustentou que o “’recebimento de vantagem na forma de destinação’ é forma inapropriada e  tecnicamente inábil para se declarar uma ‘aceitação de promessa’. (…) evidente que o recebimento é um ato concreto, um facere, palpável, dotado de materialidade, não se confundindo com a mera destinação.”

TRÁFICO DE INFLUÊNCIA

No embargo rejeitado, o TRF-4 não esclareceu outro tópico sobre corrupção passiva: o que trata da tipificação deste crime usando exclusivamente delações premiadas que, primeiro, insinuam crime de tráfico de influência; segundo, foram desmentidas por outras testemunhas e, terceiro, não apresentaram provas corroborativas.
 
“(…) não se trata aqui de mero e caprichoso inconformismo da Defesa, mas do devido e necessário esclarecimento por parte do Poder Judiciário das razões e dos fundamentos que suportam a condenação de um jurisdicionado pelo cometimento de um delito (corrupção) com base em afirmada (e inexiste) conduta que seria inerente à estrutura conceitual de outro delito (tráfico de influência).”
 
O CAIXA GERAL DE PROPINAS
 
Outro problema abordado nos novos embargos: o caixa geral de propinas que OAS afirmou ter criado para o PT, sem nunca ter provado sua existência.
 
Na sentença de Moro, o valor de R$ 16 milhões, citado em delação exclusivamente, foi usado como base para gerar a multa de Lula. Isso, é preciso lembrar, a partir da iniciativa do juiz, porque o Ministério Público usou outro valor na denúncia.
 
Ocorre que, em outra ação penal já concluída na segunda instância, o valor que a OAS diz que devia ao PT é outro, de R$ 36 milhões, sendo Paulo Roberto Costa teria recebido a maior parte desse montante em “dinheiro”, sem deixar nenhum “saldo” que pudesse ser empregado na reforma do triplex.
 
“(…) a Turma Julgadora está usando do mesmo dinheiro para destinações diversas — e isto deve ser aclarado”, disparou a defesa de Lula.
 
Além disso, vale lembrar que nos autos do caso triplex, há provas de que a OAS Empreendimentos, que não tem relação com a OAS Construtora, foi quem bancou toda a reforma no apartamento no Guarujá e, possivelmente, iria cobrar a fatura do futuro “comprador” do imóvel.
 
OMISSÕES, OBSCURIDADES
 
Os embargos dos embargos ainda abordam outras obscuridades da sentença proferida pelo TRF-4 contra Lula. Entre elas, a omissão de fatos que atestariam a suspeição de Moro em relação ao ex-presidente. Para não ter de comentá-las, Gebran simplesmente decidiu não citar um dos episódios da hostilidade do juiz de piso em seu relatório.
 
Ao final, a defesa solicita que nos novos embargos seja reconhecido o argumento que prova a suspeição de Moro e que a sentença por corrupção passiva seja corrigida e, consequentemente, a inocência de Lula, decreta.
 
“Atribuindo-se a estes aclaratórios efeitos infringentes, seja reconhecida a nulidade apontada na preliminar que sustenta a suspeição do Magistrado, ainda pendente de apreciação, ou, esclarecidas a omissão e as obscuridades, seja reconhecida a atipicidade da conduta com relação ao delito de corrupção passiva. Por fim, seja aplicado à espécie o art. 231 do CPP, para o efeito de se levar a efeito a apreciação da documentação exculpatória acostada nos eventos 128 e 144, comprobatória da inocência do Embargante, a menos que aqui o que menos importe seja a inocência!”
 
Leia o recurso, na íntegra, em anexo.
Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

21 Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

    1. Sacrifício Pessoal temporário

      Penso que Pedro Serrano, Lenio Streck e outros juristas democráticos precisam aceitar um sacrifício pessoal se a canoa virar a tempo.

      Eles têm que aceitar a função de Ministro do STF para providenciar a necessária limpeza do Judiciário.

      A Democracia precisa deles nos postos com Autoridade para efetivar as mudanças necessárias.

  1. A defesa cumpre seu papel com maestria, mas…

    A defesa cumpre seu papel com maestria. Os advogados do Lula são excelentes, como fica sobejamente apresentado pela Cintia Alves e esse GGN vem mostrando desde o início do lawfare em tela. O único problema é que esses golpistas não estão nem aí para o que seja a justiça, sua lógica, seus princípios e regramento positivo. Pudera, para que se preocupar com esses “detalhes”, quando existem tantos manifestoches zumbinizados sempre à mão, devido à desinformação perpétua da grande mídia golpista, 24 horas x 7 dias por semana?

    1. Os três palhaços

      não vão levar em consideração as alegações da defesa do Lula. Mas são argumentos a serem analisados nas instancias superiores. O trabalho dos defensores do Lula é mostrar o caminho das pedras para o STJ e STF.

  2. Moral da história: Moro

    Moral da história: Moro condenou sem provas sabendo que Lula era e é inocente. O TRF4 assinou o erro, logo, errou duas vezes…

  3. Pega-ratão

    Dr. Zanin, tenho quase certeza que os doutos da capa preta não lêem sua apelação . 

    Por que não põe no meio do texto uma receita de bolo ou então um convite para enterro….A título de deboche !

    Duvido muito que seja notado !

    A crise virou zona !

  4. Tenho a impressão que a

    Tenho a impressão que a defesa do Lula ainda não entendeu que estamos em um estado de exceção. Neste caso as leis não valem mais nada.

    Condenam porque dizem ter o poder de condenar. Pouco importam provas ou evidências de inocência.

    A pusilânime rosinha weberzinha já deixou isto bem claro quando condenou José Dirceu.

  5. Sobre as “razões”, tem q perguntar ao estagiário que as escreveu

    Ele só não podia modificar o resultado final: rejeição do recurso e aumento da pena.

    O resto era livre, já que escrever sentença é um saco e eles não têm tempo pra isso, pois precisam ir ao shopping com as patroas (êpa!) para gastar os auxílios-moradia na redecoração da casa ou em viagens com a família para a Disney.

    Vai sobrar pro estagiário!

     

  6. É preciso ir além
    A defesa faz o seu papel, mas de nada adiantará, está claro. No jogo geopolítico o objetivo norte americano é de manter o controle sobre o Brasil, evitando que o país seja um aliado estratégico de China e Rússia no ocidente e na América do Sul, como se construía nos BRICS. O controle sobre o judiciário foi fundamental, não é de se esperar que alguma coisa mude. Buscar alternativas é necessário nesse momento, uma união democrática parece ser uma delas.

  7. Na ONU ,vai ficar lindo!
    Quero ver essa corja explicando isto na ONU,para o Mundo!!!

    Moro: _ eeeeh,eeehhhhh,eee…. X2000000

    Nossa justisssssa! Com ssssss!

  8. Assaltantes Conscientes

    Impetrar recursos no TRF-45 é o mesmo que implorar para um perigoso assaltante não lhe assaltar e não levar os seus pertences. São palavras e feitos que não tem eco na mente dos assaltantes em geral. Todos os processos contra o Presidente Lula são fajutos e vergonhosamente aparelhados na esteira do golpe empresarial (Patos Amarelos), midiático (Redes Golpe), parlamentar (golpistas do Congresso Nacional) e judiciário (colaboracionistas do Power Point). A fala do Ministro Gilmar Mendes resume a manipulação para atingir o objetivo de fraudar as eleições e tirar Lula de circulação: “Este sujeito fala com Deus e o judiciário está eivado de corrupção” e citou vários roedores. Estamos há dois anos num estado de exceção e só temos uma saída que é uma CPI dos colaboracionistas chamando todos os associados ao Departamento de Justiça americano ao feito e os interrogando. O comportamento sem moral e ética dos seus acusadores fica comprovado com a retirada do seu nome das pesquisas eleitorais antes de seus recursos juntos ao TSE. Infelizmente, os partidos unidos da oposição progressista não estão fazendo o contraponto correto no parlamento que faz parte dos argumentos da própria defesa do Presidente quando denunciou a ilegal colaboração dos lavajateiros com a inteligência americana. O Golpe de 2016 tem as mesmas características e padrões da conspiração de 1964 em todas as suas etapas e planejamento. Não sabemos se vai acabar tão bem como no passado.

  9. A defesa de Lula pode

    A defesa de Lula pode impetrar embargos até o esperado fim do Universo, coisa para trilhões de anos, que não conseguirá êxito. A máfia, digo, o braço jurídico que integra a grande estrutura que tem por propósito destruir uma experiência de Poder jamais recuará nesse afã. Mesmo assim devem recorrer até para o inferno se for possível. Tanto por razões de Justiça, mas também políticas. 

    Revolta a passividade do Supremo Tribunal Federal frente a essa desvirtuação do aparato repressivo, máxime o Judiciário, a serviço de uma causa política. Impossível não se dignar a quem assiste pela TV as sessões daquela Tribunal. Uma minoria que pugna pelo protagonismo da Constituição, expõe o processo de corroção da mesma via desrespeitos aos princípios básicos do Estado de Direito, em destaque os ministros Lewandowks, Gilmar Mendes e Marco Aurélio de Mello, é simplesmente anulada por uma maioria, à frente o ministro Barroso, claramente imbuída de fazer do Supremo um puxadinho dessa frente que busca trazer o país para a Idade Média.

    A propósito, alerto para mais uma prova da falta de compostura desse último ministro citado, qual seja, não dar a mínima atenção quando seus colegas, em especial os da ala “garantista”, estão com a palavra. Fica ou lendo ou digitando no computador, uma atitude claramente debochada.

     

    1. Perfeito, JB Costa: “A defesa

      Perfeito, JB Costa: “A defesa de Lula pode impetrar embargos até o esperado fim do Universo, coisa para trilhões de anos, que não conseguirá êxito.”

      “Com o Supremo, com tudo” está em pleno curso o golpe arquitetado e empreendido. 

      Não será a razão apontada nos embargos que será examinada, mas o contexto do golpe e o papel do judiciário em toda essa parafernália para impor a condenação a qualquer preço.

      Lula só terá sobrevida fora dessa institucionalidade corrompida que chancela o golpe.

      Não precisa mais de dois neurônios para se ver que NADA, nenhuma acusação contra Lula nesse processo do Triplex se sustenta. No entanto, tenhamos claro, o que importa é a consumação do golpe. 

      Reconhecer a inocência de Lula seria para esse poder judiciário comprometido o fim do golpe, e isso os golpistas jamais aceitarão. Ou não seriam golpistas.

  10. Dois filmes, dois roteiros.

    Se o PT tivesse bom senso, um líder para analisar a situação de crise que se instalou em SBC, ele teria que ter analisado os cenários e tomado as decisões baseadas por exemplo em dois roteiros de filmes completamente diferentes um do outro, e que certamente xigiriam decisões completamente diferentes daquels que foram tomadas. O PT cometeu erros gravíssimos de avaliação da situação colocada. Ou por burrice, ou por covardia, ou por substimarem o adversário ,ou por todas as alternativas juntas, escolheram o pior roteiro,  se deram muito mal e colocaram o seu maior líder em situação de risco. Essas duas alternativas poderiam ter sido analizados por exemplo como  roteiros para dois filmes. O primeiro deles para retratar a situação de Lula na ocasião quando ele aibnda estava no Sindicato. A outra, retratando a sua sutuação numa eventual entrega que de fato acabou acontecendo. Esses dois roteiros deveriam ter sido pensados e por exemplo como segue:

    No primeiro caso: Um Rei no seu Castelo cercado por milhares de guerreiros  fiéis  observado ao longe por um exército contrário.

    No segundo Caso: Um velho pescador solitário à noite em alto mar, num velho barco à deriva, enfrentando uma violenta tempestade, cercado de tubarões por todos os lados.

    Se assim fosse feito, não precisaríamos ser nenhum gênio para sabermos quais seriam muito provavelmente o final dos dois filmes. O PT sem dúvidas apostou no roterio errado. Aliás, o PT sequer escolheu qualquer roteiro.

  11. Embargos….

    Enquanto isto, fica provado que existe mesmo a tal “CELERIDADE” tão propagandeada por TRF 4. Bastaram 24 horas para que Raquel Dodge da PGR, livra-se Picolé da Lava Jato para Justiça Eleitoral, contrariando seus pares na Procuradoria. Os Comparsas de Temer ficarem livres de acusações. Paulo Preto, Coronel Lima, nada tem a ver com seus ‘patrões’. Aécio e Loures desaparecem. E só agora às vésperas das eleições e sem tempo para condenações decisivas é que são investigados. O único que está legalmente impedido e preso é Lula. Mas tudo é coincidência, na Pátria da Coincidência. Merendão, Trensalão, Petrolão e Mensalão Tucanos cumprem a sua ‘celeridade’. Não é mesmo, Azeredo? O Brasil se explica.   

  12. Auditoria do Julgado do TRF4

    A Defesa do Lula deveria mandar uma cópia dos processos para a Direção dos cursos de direito de todas as faculdades do Brasil pudessem recomendar aos professores de direito penal e processual penal fizessem um estudo de caso das teses de acusação, defesa e sentença. 

    O vexame seria total para o TRF4!!!! 

  13. É vergonhoso ver isso

    É vergonhoso ver isso acontecer. Um homem que dedicou sua vida a melhorar as condições dos mais humildes ser jogado aos chacais, sem nenhum respeito ou dignidade. Tenho certeza que matarão Lula na cadeia, e a massa de calhordas da direita irá dizer que foi bom, rindo como as hienas que são. Maldito país, maldito povo.

    Se me perguntam de que país venho, respondo com silêncio.

  14. O que LULA fez ao se
    O que LULA fez ao se entrincheirar no sindicato dos metalúrgicos foi ASSUMIR O CONTROLE DA NARRATIVA. Se continuasse com essa estratégia e fosse para uma embaixada, ainda estaria no comando, poderia pautar a mídia, dar entrevistas, criar fatos e factóides, inverter o jogo sujo da grande mídia, enfim fazer e acontecer. Ao se entregar, creio que fez uma aposta arriscada e errada. PERDEU o controle da narrativa, e agora está nas mãos do jogo pesado da midia-judiciario-punitivista, enfim temo pelo pior desfecho.

  15. O final desse caso já estava desenhado

    Cada vez mais acredito na frase que dizia um grande amigo meu (advogado experiente e conhecedor dos corredores dos tribunais): “Que Deus nos livre da polícia e da justiça”.

    O Brasil está se tornando um país onde todas as causas no judiciário são resolvidas na primeira instância. Nas outras instâncias, é só enchimento de linguiça com verborréia da acusão.

    O final da história estava já desenhado: Lula condenado. Esperar uma guinada no STF? Ela é pouco provável. Se o STF fosse, de fato, o guardião da Constituição, já teria feito intervenção nesse escândalo processual que envergonha o Brasil. Não há um jurista internacional sequer que não esteja chocado com a situação.

    Parece que a defesa do Lula acredita demais que os doutos lêem os processos, e espera demais que eles saibam o que, sob as regras vigentes, poderiam e o que não poderiam fazer num processo penal.

    Talvez o Paulo Henrique Amorim tenha razão ao dizer que Lula entregar-se foi um erro estratégico do PT. A resistência seria, pelo menos, um verdadeiro fato novo e relevante em toda essa trágica história. E, quem sabe, fizesse emergir um acontecimento extraordinário que trouxesse alguma esperança.

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador