Gilmar Mendes e o avanço da crise sobre o Judiciário, por Janio de Freitas

Após decisão que absolveu Temer, novo processo de impeachment foi protocolado contra ministro, desta vez no STF

Foto: Valter Campanato/Agência Brasil
Foto: Valter Campanato/Agência Brasil

Jornal GGN – A decisão do Tribunal Superior Eleitoral de absolver Michel Temer no julgamento pelo crime de propina e caixa 2, ainda mais após o recente escândalo político mostrando uma gravação em que o presidente avaliza o pagamento de uma mesada ao ex-deputado Eduardo Cunha pelo empresário e dono da JBS, Joesley Batista, aumentou ainda mais a crise institucional no país, promovendo um maior descrédito do poder Judiciário.

A avaliação é de Janio de Freitas, que na sua coluna desta quinta-feira, na Folha de S.Paulo, pondera que “o resultado verdadeiro do julgamento” feito pelo TSE foi um avanço do desânimo com a política. E, a figura mais responsável, e que deu o voto de minerva que pesou em favor de Temer, é o ministro Gilmar Mendes. Freitas destaca que, durante o julgamento no TSE, o magistrado não inovou no método que já vinha apresentando em outros julgamentos, de usar a palavra e o cargo para exercer decisões que vão de encontro aos interesses democráticos. Por outro lado, finalmente pôs em risco os colegas do Supremo Tribunal Federal, pois suscitou mais um pedido de impeachment que foi dirigido contra ele, desta vez no STF, de autoria dos professores de direito da UnB, Cláudio Fontelles e Marcelo Neves.

“Admitir o processo [de impeachment contra Gilmar] será um martírio; recusá-lo leva ao risco de estender ao Supremo o conceito hoje ostentado pelo TSE”, pontua Freitas.   

Folha de S.Paulo
 
Gilmar Mendes promove demolição progressiva do respeito pela Justiça
 
O mais perturbador na atual crise não está nos aspectos políticos e econômicos, apesar da sua extrema gravidade.
 
Está na ausência de alguma saída ao menos razoável entre as presumíveis para a situação a que se chegou. A intuição desse embaraço esteve expressa, até há pouco, no desejo de “fora, Temer” em convívio com o “e pôr quem?”. Ganhou forma e consciência: avançou para um desalento disseminado, com ares de unanimidade fora do arraial de políticos. Esse misto de desânimo e desesperança foi o resultado verdadeiro do julgamento em que o TSE jogou no lixo as provas e o que restava de bom conceito nos tribunais superiores.
 
É provável que o desalento e suas razões resultem em algum amadurecimento político para parcelas tanto da esquerda como da direita. Assim como a “decepção” de que se queixam ex-admiradores de Aécio Neves. (A reação de ex-petistas é diferente, mais se manifesta como ressentimento algo raivoso). Não se espere, porém, que tal amadurecimento se dê onde mais falta: entre políticos e empresários perceptíveis, dois segmentos sociais que se igualam e se associam na mesma recusa a ver e agir além do próprio interesse material.
 
Se o julgamento no TSE deu em alguma coisa, deve-se a Gilmar Mendes. Sua obra de demolição progressiva do respeito público pela Justiça não inovou no seu método –o escárnio agressivo, como arma do facciosismo. Mas criou ali um risco para os seus colegas no Supremo Tribunal Federal. O novo pedido de impeachment de Gilmar Mendes foi preparado para dirigir-se, desta vez, ao STF. O primeiro foi dirigido, como devia ser, ao Senado, onde Renan Calheiros representou a covardia da Casa e o engavetou. A nova destinação é uma beira de abismo para os colegas de Gilmar Mendes.
 
Os autores do pedido são Cláudio Fontelles e Marcelo Neves. Este, professor de direito da Universidade de Brasília. O primeiro é o ex-procurador-geral da República que reinaugurou a decência na Procuradoria Geral, seguindo-se a Geraldo Brindeiro, o “engavetador-geral” nomeado e mantido por Fernando Henrique.
 
Fontelles, que recusou a reeleição porque no passado defendera o rodízio rígido, desfruta de alto prestígio na classe jurídica por sua honorabilidade e pelo saber. É notório que não está se lançando em leviandade.
 
Um processo de impeachment não é, porém, coisa esperável no Supremo dos nossos dias. Até para a mera admissão do pedido, considerada a proximidade intelectual da presidente Cármen Lúcia a Gilmar Mendes. Além disso, a índole dominante no conjunto de ministros é a de pessoas acima de qualquer restrição, por mais que um ou outro dos juízes derrube, em visões externas, a autoconsagração.
 
Se aceitar o processo de impeachment seria um despropósito para os colegas de Gilmar Mendes, repeli-lo, a priori ou por decisão final, seria desastroso. Do ponto de vista mais objetivo, são inúmeras as provas de conduta imprópria desse ministro que se considera acima de todo regramento. E das maneiras pessoais civilizadas –sobretudo se recomendadas pela ética da magistratura.
 
A par daquele cadastro factual, prevalece na opinião pública, por iniciativa do próprio Gilmar Mendes, a convicção de sua incompatibilidade com a função. E não se vislumbra defesa possível para as atitudes que formaram tal convicção e, muito menos, para convencer a opinião pública. Admitir o processo será um martírio; recusá-lo leva ao risco de estender ao Supremo o conceito hoje ostentado pelo TSE.
 
O Supremo está à porta do seu momento mais difícil. Seus últimos presidentes quiseram assim, preferindo curvar-se, omissos, aos desafios de Gilmar Mendes.
 
 
Redação

7 Comentários

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  1. Pizza, pizza, pizza

    O STF jamais irá julgar um dos seus. Da mesma forma que juizes pegos em algum delito são “aposentados” com todos os vencimentos e nao sumariamente demitidos – ou presos.

    Se Lula tivesse enfrentado Gilmar no episódio da Satiagraha, do grampo sem áudio, ou mesmo tivesse encampado com sua enorme popularidade um mandato limite para membros do STF, já estariamos livres desse senhor. Mas nao, preferiu o nao enfrentamento.

    E o resultado é esse.

  2. É impressionante a cegueira,

    É impressionante a cegueira, Gilmar está no campo defensivo do PT e das eqsquerdas contra o mega inimigo e não enxergam.

    1. É impressionante a cegueira,

      Diferenças de pontos de vista, André.

      O Gilmar esteve no campo defensivo do PT.

      Entre um Fora Temer tutelado e um desconhecido optou pela tutela do amigo.

      Fez como sempre faz, optou pelos interesses partidários próprios.

  3. As gilmargices de Gilmar Mender

    As ‘gilmargices’ não tem mais jeito, pois Gilmar Mendes pouco entende ou não o interessa entender seu caso conflituoso de atuar como juiz, atacante, centro, lateral e até goleiro. Se fosse estudante de Direito, faria uma tese so sobre o caso sui generis Gilmar Mendes. Merece um livro que decortique o personagem.

  4. Gilmar quer salvar a PO-LÍ-TI-CA (1)

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    – A Medida Provisória que permite ao Banco Central celebrar acordos de leniência – secretos! – com os Bancos muda o jogo.

    – Esvazia sobremaneira o poder de chantagem da Força Tarefa da Lava a Jato – e de Palocci! – sobre o Mercado: a “bomba atômica” está em vias de virar uma…

    – … biribinha (!)

    – Esse fato – tomado isoladamente – é ruim para o PT. E para Lula (!)

    – Mas…

    – Sempre se pode contar com a estupidez dos Procuradores de Curitiba. Eles que – até agora! – ainda não entenderam que o Acordão é…

    – … I-NE-VI-TÁ-VEL!

    – Por quê?

    – Ora, “é o too big to fail, estúpido!”.

    – No caso, literalmente “estúpidos” M E S M O.

     

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    LAVA A JATO: “VISITA DA SAÚDE” (ANTES DA MORTE) – A DELAÇÃO DOS BANCOS POR PALOCCI

    Por Romulus & Núcleo Duro

    Aí vocês me perguntam:

    – Mas então você está tranquilo, Romulus?

    E eu respondo “tranquilamente”:

    – Não: estou APAVORADO!

    Enquanto o Dallagnol e cia. não entenderem que em Banco não se mexe (e eles não entenderam ainda, como verão mais abaixo…) e não aprenderem o que é “too big to fail”, “risco sistêmico”, corrida bancária e “alavancagem” de instituições financeiras (falidas contabilmente “de fato”), estamos correndo um ENORME risco.

    Imagina quantos novos seguidores o Dallagnol não pensa que vai ganhar no Twitter falando que “prende e arrebenta”…

    – … os Setúbal/ Aguiar/ Safra/ Dantas/ Esteves??

    Bancos:

    – Ruim com eles…

    – … HOLOCAUSTO NUCLEAR sem eles!

     

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