Na moda de colorir, por Janio de Freitas

 
19/07/2015 – Folha de S. Paulo
 
A direção mudou. Mas não muda o peso de verdade dado a umas poucas palavras acusatórias vindas, sem provas ou indícios, de pessoa com idoneidade inatestável. E as instituições políticas se abalam, jornalistas falam de futuras retaliações e derrubadas entre Câmara e Presidência, políticos espertalhões pensam em um acordo de compensações com impeachment de Eduardo Cunha e impeachment de Dilma. Claro, Estado de Direito e democracia à brasileira.
 
Tudo que se passou na política desde a segunda posse de Dilma Rousseff esteve, e está, condicionado pelo retorno ao poder do grupo Collor, ocupante das presidências de Senado e Câmara com Renan Calheiros e Eduardo Cunha, discípulo que encantou PC Farias. É apenas lógica a volta do próprio Fernando Collor à projeção, acompanhado, entre outros, de Pedro Paulo Leoni Ramos, que foi o seu encarregado de neutralizar a rede de informações e negócios do SNI, para maior tranquilidade das transações colloridas.
 
Deputados e senadores, com exceções exíguas, outra vez aceitaram bem o domínio e as práticas do collorismo. Associação, e em muitos casos sujeição, bem ilustrada no silêncio de Aécio Neves e do PSDB, capazes de pedir na Justiça a cassação do mandato presidencial com base em uma frase de delação premiada, mas emudecidos quando a mais grave das acusações a políticos cai sobre Eduardo Cunha.
 
Essa situação de Câmara e Senado não precisará esperar a comprovação ou negação da culpa de Eduardo Cunha para receber efeitos políticos importantes. Tanto mais que ele sentiu o golpe. Sua resposta de superioridade quando esteve na expectativa de uma visita policial substituiu-se, em apenas 24 horas, por um jorro de agressões patéticas, evidência de tombo e descontrole. Eduardo Cunha não imaginaria, a sério, que o governo dirija o procurador-geral da República, nem Rodrigo Janot obrigou delator algum a difamar Eduardo Cunha. Nem o juiz Sergio Moro detém indevidamente o inquérito em que Eduardo Cunha é acusado da extorsão de US$ 5 milhões.
 
O enfraquecimento de Eduardo Cunha é imediato, embora parcial. Se a acusação não for eliminada no recesso parlamentar, a iniciar-se amanhã, os projetos induzidos na Câmara por seu presidente já serão recebidos, no Senado, sem a complacência interesseira ou temerosa dada a Cunha. O PSDB, por exemplo, não será o mesmo da semana passada.
 
Citar Eduardo Cunha já é meia lembrança de Renan Calheiros. O enfraquecimento de um alcança o outro. Mas na Câmara é que a provável permanência da acusação tem o maior campo de influência. Cunha adiou para agosto a votação final de alguns projetos, convencido de que os deputados voltarão radicalizados pelos eleitores. Mas as aprovações obtidas por Eduardo o foram acima de tudo por suas manobras e articulações. No caso de seu enfraquecimento, a esperteza encontrará, no mínimo, um ambiente incerto.
 
Para completar, a situação de Eduardo Cunha é muito mais complicada do que o enfrentamento a uma afirmação breve de delator bem premiado. Ele o prova, descontrolado a ponto, por exemplo, de desmentir-se em apenas horas. Mal acabara de repetir que passar à oposição –na qual, de fato, sempre esteve– não influiria na conduta de presidente da Câmara, correu a aprovar duas CPIs contra o governo. Na porta do recesso. Desespero raivoso é isso aí.
 
BRASIL BRASILEIRO
 
Música é também história. Franklin Martins faz um passo a passo do Brasil político, ao longo do século 20, por intermédio de um levantamento do Brasil musical, com notas complementares. Boa ideia e leitura, além de divertida, sonorizada com a reprodução de gravações originais: “Quem foi que inventou o Brasil?” (Nova Fronteira).
 
Lilia M. Schwarcz e Heloísa M. Starling fazem uma crônica biográfica do Brasil com largueza temática e disposição de veracidade muito enriquecedoras. Até porque às vezes você discutirá com as autoras. Mas será levado a fazer ou aprimorar sua visão deste país que está sob seus olhares sempre e forçosamente estarrecidos, com o bom e com o restante. “Brasil: Uma Biografia” (Companhia das Letras).
Redação

10 Comentários

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  1. O governo não pode comer

    O governo não pode comer mosca. Precisa aproveitar a situação para fortalecer as alas do PMDB que não apoiam Cunha, trocando os cargos de aliados de Eduardo Cunha por outros nomes do PMDB que não sejam apadrinhados dele.

    Imagine se convidasse Requião para o ministério da justiça? Mas isso está muito mais para sonho do que possibilidade real. O Zé grudou na Dilma e não descola de jeito nenhum.

  2. E O HUMOR?

    Com tanta presepada de governo, oposição, partidos, imprensa, poderes, etc, com a extraordinária abundância de matéria prima, como se explica a enorme falta de humor político? Figuras onipresentes do noticiário aprontam diariamente os micos mais ridículos, então pergunta-se: cadê o humor para transformar a palhaçada em graça?

    Falta até lugar mais apropriadp para desabafar meu comentário, então abuso da paciência dos leitores de Nassif e de Janio de Freitas para clamar no deserto só mais uma vez: cadê a porra do humor?

  3. Agora a Montanha tem que se mover.

    Cito insistentemente o filme de Akiro Kurosawa, “A sombra de um Samurai”, mas poderia citar outros textos e ações sobre estrategia militar que todos se baseiam no seguinte princípio, o inimigo deve ser combatido no momento em que ele entra nos domínios dos outros. Simples, quando o inimigo entra numa zona em que se tem mais controle, em que todos esperam a reação, é exatamente o momento de contra-atacar. 

    O maior general da segunda-guerra,  Gueorgui Konstantinovitch Jukov, título atribuído muitas vezes atribuído erroneamente ao Marechal de Campo Erwin Rommel, tinha um princípio muito simples nas suas ações, atacar somente quando tinha condições de ganhar, sempre esperava o inimigo ficar em condições de desvantagem para aí atacar com todas as forças.

    Se o governo federal quiser resistir é chegado o momento da contra-ofensiva, Eduardo Cunha entrou na esfera do executivo, está brincando de primeiro ministro sem o sê-lo, começa a tentar governar sem nunca ter recebido delegação para isto, tenta criar leis sobre atividades típicas do executivo e de quebra entra em atrito direto com o Ministério Público, Procuradoria Geral da República e Judiciário, tudo ao mesmo tempo sem contar com tropas realmente leais ao seu lado.

    Com todo este cenário desfavorável a Cunha é chegado o momento da “montanha se mover”, mas o movimento deve ser forte e vigoroso baseado nos erros e nas fraquezas de Cunha, que neste momento ficam mais evidentes do que nunca.

    A ação deve deixar evidente que Cunha neste momento está agindo com o simples objetivo de prejudicar não só o Governo mas também o Estado Brasileiro, e esta ação é feita por motivos torpes e de defesa pessoal contra ações judiciárias que o artormentam.

    Chegou a hora, “A Montanha” deve se mover.

    1. maestri

      Se não  aproveitarem o momento, o jeito é pegar mesmo o boné ! Ou deixar que outros o coloquem. O grande problema é saber quais os  conselheiros da presidente terão peito suficiente. Melhor chamar o Silvio Costa do PSC de Pernambuco ou um Cearense arretado.

  4. Se Dilma fosse boa em Oratória…

    Imagine se a Presidenta falasse assim…(Trump: Basta! Enough!!!)

    Com Renans/Cunhas e a Crise atual, imagine que uma Presidenta tivesse a Retórica (os Colhões, ela têm) da Hillary:

    https://www.youtube.com/watch?v=G6A54G7bqCg

    O Vídeo tem uma síntese (bem rápida) com várias “Frases de Efeito”.

    Agora, imagine, também, Hillary convocando os USA para uma Guerrinha Mundial (após vencer as Eleições)…

    1. Trump

      E por falar em Trump, o Huffington Post declarou ontem que não vai cobrir a campanha dele na área política: quem quiser saber do Trump que o procure na área de entretenimento, junto das peruas Kardashian, etc…

  5. Nem Cunha acredita em Cunha…

    “Eduardo Cunha não imaginaria, a sério, que o governo dirija o procurador-geral da República,”

    Nenhuma pessoa em sã consciência poderia imaginar que o PT usaria o poder de dirigir o PGR pra ferrar Cunha, ao invés de se safar.

    Mas, infelizmente, loucos conscientes pululam hoje em dia…

  6. Bom lembrar, o poder que

    Bom lembrar, o poder que entra em recesso é o legislativo;o executivo permanece ativo. Portanto, espera-se, que saiba  empregar  adequadamente  a oportunidade…

    1. nessas horas eu lembro do ditado,

      mais cumprido que esperança de pobre. que nunca acaba.

      será que a presidenta vai aprender a ocupar esse espaço??

      ou mais uma esperança vã da nossa parte?

  7. Cunha e … quem o banca.

    Este caso Cunha está muito além de Trapatona. Talvez num périplo pelo Caribe e Europa (Suiça, quem sabe?!).

    Vejam voces, hoje no site da Globo não se comenta nada do Cunha, apesar de ser um assunto quente. Porque será????

    Cunha era contra o projeto de repatriação de dinheiro. Será que estava trabalhando só por seus interesses … ou será que os interesses da platinada também estava em pauta?

    O grupo Globo com seus jornais, revistas, TV, rádio e etc estão forçando no factoide ‘lobby de Lula’, como se abrir portas para as empresas brasileira lá fora … fosse crime.

    Não sei qual o mais raivoso – o Cunha ou a prole Marinho – mas, meu palpite é que Cunha tem conhecimento de coisas que podem levar o grupo Globo à derrocada.

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