As 10 medidas anticorrupção do MPF em debate na Câmara

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
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Jornal GGN – Quando procuradores da República que comandam as investigações da Lava Jato foram à Câmara dos Deputados propor que as “10 Medidas contra a corrupção” virassem lei à uma Frente Parlamentar com diversos deputados e senadores investigados por desvios de recursos e ao próprio então presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), hoje alvo de pelo menos sete investigações por corrupção na Petrobras, críticas e questionamentos surgiram. 
 
A tudo isso, o dado de que cerca de 200 propostas sobre corrupção foram apresentadas ao Congresso em 2015, que logo foram paralisadas e abafadas por falta de interesses. 
 
Mas nesta quarta-feira (22), o Plenário da Câmara deu início à primeira discussão para colocar em lei a punição e desincentivo a crimes contra o patrimônio público e ao enriquecimento ilícito. Trata-se do Projeto de Lei 4850, de autoria do deputado Antônio Carlos Mendes Thame (PV-SP) e levado a cabo, após muita pressão, pelo presidente em exercício Waldir Maranhão.
 
Convidados pelos deputados, os procuradores que estiveram presentes não exploraram as críticas, mas as defesas das 10 medidas. Entretanto, em meio ao extenso debate, houve quem lembrou da necessidade de aprimorar as ações e democratizar as punições a não apenas um só partido. 
 
As defesas
 
Na abertura da Comissão, o procurador que coordena a força-tarefa da Lava Jato, Deltan Dallagnol, deu o tom que foi enfatizado e concordado por todos os outros membros do MPF seguintes. 
 
Dallagnol é também um dos autores das medidas e da campanha realizada por todo o Brasil pela instituição. Na apresentação, destacou que o projeto do MPF recebeu a assinatura de mais de 2 milhões de brasileiros e mais de 100 entidades da sociedade civil. 
 
“O primeiro foco é criar a punição adequada, em termos de pena, fechando as atuais brechas na lei. O segundo é prever instrumentos para recuperar recursos desviados. E, por fim, o terceiro foco é criar, estimular a informação, a educação e a conscientização da população, para que tenha reações automáticas de combate à práticas de corrupção”, ressaltou.
 
Para o representante da Lava Jato, a “impunidade é um paraíso para a corrupção” e “a corrupção mata”. E defendeu os pontos que desincentivam a prática dos crimes contra o patrimônio público. 
 
Outro especialista convidado pelos deputados, o procurador Bruno Freire de Carvalho explicou brevemente quatro tópicos da medida número um do MPF: a prevenção, a transparência, a proteção do sigilo da fonte e as regras de accountability. 
 
Em um dos pontos, defendeu a destinação de verbas de publicidade para campanhas de conscientização da população sobre os efeitos da corrupção, “informando [os cidadãos sobre] os mecanismos e caminhos para se denunciar a corrupção”.
 
Lembrou da necessidade de se criar a figura do “informante confidencial”, uma vez que os denunciantes temem a divulgação de seu nome, por possíveis reações e ameaças. Esse projeto estabeleceria regras que também “evitam que sejam vitimadas pessoas de forma injustas”, assegurando também a credibilidade da denúncia, onde o denunciante poderia sofrer punições em caso de mentiras ou informações para prejudicar terceiros.
 
Bruno Freire também citou um instituto polêmico e alvo de críticas, o chamado “teste de integridade”, onde se simula situações sem o conhecimento do agente público, com o objetivo de testar sua conduta moral e predisposição para cometer ilícitos contra a administração pública.
 
Alvo de diversas críticas no meio jurídico brasileiro, o teste busca prevenir e constatar ilícitos administrativos, cíveis e criminais. Segundo o procurador, a prática já é comum e obteve sucesso em países como os Estados Unidos, Austrália e Reino Unido e é recomendado pelas Nações Unidas e organismos internacionais. 
 
Para o procurador, o teste “traz efeitos muito benéficos, mas há espaços para o aprimoramento”, afirmou, abrindo as portas para a possibilidade de se discutir e debater a medida.
 
Também dentro das propostas, o procurador Bruno Calabrich defendeu a transparência na investigação dos casos de corrupção. Entre as medidas estariam regras de transparência para o MPF e para o Poder Judiciário, como a obrigatoriedade de divulgar, todos os anos, estatísticas da tramitação e do julgamento de casos de improbidade, para identificar obstáculos. 
 
De forma a garantir a adesão dos parlamentares, um dos pontos dos procuradores defendidos foi a punição da evolução patrimonial incompatível com a renda, mas sem efeito retroativo, valendo a partir da aprovação da nova lei. 
 
O tema foi exposto pelo procurador José Maria de Castro Panoeiro. Para ele, é necessário legislação contra o enriquecimento ilícito, ainda não prevista na Constituição. “O texto [do projeto de lei na Câmara] propõe que se criminalize a evolução patrimonial ilícita”, disse, destacando o efeito de um “novo marco patrimonial” desde a data de aprovação da lei.
 
Já o procurador da República Guilherme Raposo fez uma defesa mais enfática das medidas. Para justificar o aumento das penas para casos de corrupção, afirmou que é necessário usar o princípio da proporcionalidade do Código Penal, equilibrando com a gravidade do delito. Explicou que, hoje, “os principais atos de corrupção são apenados” com a mesma pena de um “simples furto com emprego de uma chave falsa”, que é de dois anos de prisão.
 
Afirmou que “para cada 1 real desviado, o prejuízo para a sociedade é de 3 reais”, ou seja, triplicado. Isso porque “para cada ato de corrupção, tem empregos que deixam de ser gerados, tributos que deixam de ser geridos e descrédito das instituições que impedem investimentos no Brasil”, disse.
 
“Se a pena tem por finalidade reprimir e prevenir a prática de delitos, enquanto essa balança pender para o benefício da corrupção, é obvio e claro que já há uma propensão à prática do delito, porque a corrupção vai compensar no nosso país. Esse pais deve pender definitivamente para inibição dessa pratica”, concluiu Guilherme Raposo.
 
O ex-ministro da Controladoria Geral da União (CGU), Jorge Hage, também participou do debate. Na sua fala, elogiou a aprovação pelo Senado do projeto que impõe regras para a gestão de empresas estatais, como a Petrobras e o Banco do Brasil, definindo critérios para a nomeação de dirigentes. “É preciso que cobremos a regulamentação e aplicação deste estatuto”, afirmou.
 
Jorge Hage também criticou a falta de controle e obrigação de seguir regras de licitação ou contratação por estatais e empresas de economia mista. Para ele, da mesma forma como não é certo exigir das empresas o cumprimento da Lei de Licitações, também não é justo que quase todas as licitações ocorram sem controle. Segundo ele, o grande volume de recursos públicos que envolvem esses contratos é que provoca espaço propício para “grande parte da corrupção”.
 
O outro viés
 
Apesar de não terem sido abordados temas como o fortalecimento do princípio da inocência, o não uso da condução coercitiva como moeda de troca para a liberação de prisões preventivas ou temporárias e a espetacularização das investigações – neste último caso, ao contrário, foi defendida a transparência dos processos, de modo que a imprensa e a sociedade, ainda que sem preparo, surjam como agentes judiciais -, alguns procuradores ressaltaram as medidas em seu caráter mais democrático.
 
Na contramão do que vem sendo adotado pelos investigadores da Lava Jato pela legislação atual, a procuradora da República do Estado de São Paulo, Thaméa Danelon, criticou a prescrição dos crimes de corrupção e afirmou que essa é uma “das maiores causas da impunidade no Brasil”. 
 
“É o que acontece nos casos de corrupção praticados por pessoas influentes, que se valem de bons advogados apenas para atrasar o processo”, disse Danelon. A mudança integra o PL em análise, propondo o aumento de um terço no tempo que o juiz tem para aplicar a sanção, motivando a agilidade da Justiça antes que seja expirado o crime. Também dentro das medidas está a suspensão do prazo de prescrição enquanto os recursos são analisados pelo tribunal.
 
O procurador eleitoral Ângelo Vilela foi convidado a abordar o ponto que trata da responsabilização dos partidos políticos em relação ao caixa 2 para campanha eleitoral.
 
“Precisamos verificar que, quando há doações eleitorais oficiais que estão dissimulado pagamentos de propina, é preciso atentar para esse fato e punir não só quem paga, mas também o partido e o candidato que receba”, expôs Vilela, que ressaltou que a medida não exclui a responsabilidade individual de dirigentes e administradores.
 
A defesa gerou, de imediato, reações de discordâncias. O deputado Carlos Marun (PMDB-MS), aliado de Eduardo Cunha (PMDB-RJ), ignorando que, atualmente, o PT foi o único partido que se tornou alvo da generalização dos delitos, e que talvez o ponto proposto mudaria o cenário para outras siglas possivelmente blindadas, afirmou que a medida geraria a criminalização da política, o que, segundo ele, é criminalizar também a democracia.
 
Foi justamente nesse sentido que se manifestou o deputado Henrique Fontana (PT-RS), que disse apoiar as dez medidas contra a corrupção, ampliando-se em uma “profunda reforma política e eleitoral” que combata a corrupção e retire o enfoque “unilateral” contra um único partido.
 
“Esse discurso fascista e unilateral que alguns setores da sociedade têm adotado de combater um partido político atrapalha enormemente o combate à corrupção. A corrupção está no meio empresarial, dentro da política, no serviço público. A corrupção existe em quase todos os partidos políticos”, disse Fontana, criticando o viés restrito das investigações.
 
“Quero que todos sejam julgados dentro da lei, dentro do devido processo legal. E que ninguém seja condenado a partir de vazamentos ilegais e de manchetes de jornais”, disse, em apoio ao combate à corrupção, mas criticando o caminho usado pela Lava Jato para punir.
 
Sobre a reforma política e eleitoral defendida, o deputado criticou o Congresso conservador, em tom de desesperança: “Este parlamento não fará a reforma política. Ele é eleito por estas regras e demonstrou o seu conservadorismo ao não fazer a reforma política. O povo brasileiro precisa lutar por uma constituinte exclusiva para realizar a reforma política e eleitoral que o nosso país precisa”, defendeu Fontana.
 
Na liderança do PSOL, Chico Alencar (RJ) também foi um dos poucos deputados que defendeu a importância de acabar com a “impunidade seletiva dos mais ricos”. E lembrou que muitas das 10 medidas anticorrupção já estão previstas em projetos de lei tramitando na Câmara, que por falta de vontade política não são votadas. “Vamos defender que esta comissão especial, criada para analisar essas medidas, não dure 40 sessões, e sim 10 sessões”, disse.
 
***
 
Leia mais: Por trás das propostas de grande adesão popular, há interesses políticos e omissões que devem ser esclarecidos nessa fase de debates
 
Abaixo, a íntegra do PL 2850:
Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

10 Comentários

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  1. medidas de “combate à

    medidas de “combate à corrupção”, com esse congresso, só pode ser piada. Além do mais, essa história de tolerância zero, seja pro que for só gera mais corrupção, desvio de conduta, arbítrio, enriquecimento de poucos. Basta ver a tal guerra às drogas, que não dimunuiu 1 g no consumo, só prende o pequeno traficante ou usuário (basta lembrar do heilicoca). Já temos muitas leis sobre o assunto corripção e não precisamos de intocáveis a desfilar sua arrogância por aí

    1. (…) a tal guerra às drogas,

      (…) a tal guerra às drogas, que não dimunuiu 1 g no consumo, só prende o pequeno traficante ou usuário

      Realmente.  A polícia vai na favela, pega um neguinho de chinelo furado e bermudas rasgadas, com drogas embaladas para venda  e, diz que deram um duro golpe no tráfico da região. Chegam até a dizer que aquele era o chefe do tráfico.  É realmente uma piada. Enquanto isso os barões do tráfico estão em suas mansões com piscina, belos e formosos, livres e felizes. 

  2. Muito cuidado!…

    Trata-se de mais do mesmo!…Na verdade, os não eleitos querem turbinar mais do que está turbinado, no Brasil, a opressão do Estado sobre os cidadãos!….

  3. Redução da roubalheira

    Redução das roubalheiras e das injustiças

    Caso a turma de preto não tivesse partido para o desmantelamento da economia do Brasil, iniciado nas gigantescas badernas, apesar de toda grande crise do capitalismo desde final de 2007, a economia Dilma/PT continuaria com pleno emprego, com as classes “B”, “C” e “D” comprando e consumindo de tudo, como estava em 2013. Lugar de ladrão é na cadeia. Disso, ninguém pode ter dúvida alguma. Agora, destruir a economia do Brasil a pretexto de caçar ladrões, nunca! Não pode ser aceitável nem tolerado continuar provocado prejuízos maiores do que os causados pelas roubalheiras.

    Além da maldita praga da corrupção drenando a riqueza do povo rumo aos cofres dos ricos, entregar riquíssimas e estratégicas empresas estatais a preços de bananas, em leilões de privatizações, como fez FHC/PSDB, é outra forma de causar siderais prejuízos ao Brasil, nada a dever as inúmeras formas de roubalheiras e corrupções. A telefonia brasileira tornou-se a mais cara e uma das piores do mundo, apesar de privatizada. Depois de privatizada, a energia elétrica passou a ser uma das mais caras do Planeta. A medicina privatizada, de há muito que é reconhecidamente cara e de baixa qualidade, salvo raras e caríssimas exceções.

    Por outro lado, desde os tempos da ditadura militar que escutamos dizer que os concursos para juiz seriam de cartas marcadas. Ou seja, só passaria quem é filho de juiz, neto de juiz, sobrinho de juiz, e outros privilegiados parentescos, fora os poucos brilhantes e competentes de sempre. Se isso é verdade, então, temos a bela mistura de ladrão com incompetentes atuando como magistrados. Pior não poderia ser. Tamanha suspeita inviabiliza qualquer movimento de combate às injustiças e as corrupções.  

    Pelo muito pouco acima abordado, combater roubalheiras e injustiças no Brasil é missão quase impossível.

    Apesar disso, antes que passe essa repentina súbita vontade de acabar com a conhecida roubalheira, aqui vai algumas sugestões:

    Aperfeiçoar o combate à gigantesca sonegação. Já existem suficientes recursos de informática e de contabilidade para reduzir muito o velho crime de sonegação;

     

    Todos os envolvidos em qualquer processo de corrupção (inocentes e culpados) terão que responder com os seus bens pessoais, desde uma simples secretária, passando pela engenharia, chefias, financeira, diretoria, presidência, etc.;

     

    Montar um mecanismo seguro para pronta denuncia de coisas “esquisitas”, suspeitas e ou evidentes corrupções;

     

    Aumentar até onde possível a transparência pela internet de todas as obras, compras, projetos e serviços, envolvendo grana pública;

     

    Etc.

     

     

  4. corrupção e poder

    A corrupção é o meio para se adquirir poder.

    Mas vamos salientar que::

    Com a contrapartida das delações premiadas o que se criou? Impunidade, certo. Senão o que  podemos dizer de caguetas e arapongas que , ao se verem próximos de viverem vendo o sol quadrado nos próximos anos, saem atirando para o lado para onde o MP e a PF querem? Penas brandas para Sérgio Camargo, Paulo Roberto Costa , Nestor Cerveró etc. cujas condenações certas em penas altas se transformam em prisões albergues com várias regalias?

    Que a lava jato só visou golpear o PT , nós sabemos, mas o mais interessante é que os funcionários da petrolífera eram de outros partidos, em especial PMDB e PP. Ocupavam cargos na empresa desde muito antes do PT. As empreiteiras pagavam propinas aos políticos desde muito tempo antes do PT sequer existir. O PT aderiu a uma conduta mais antiga, certamente, do que a sua própria fundação e no entanto, ele é o corrupto e o motivo de se “acabar” com a corrupção.

    De que adianta mostrar ao povo a corrupção , se o povo não tem voz ativa na decisão do que fazer? Ah, responderão: Nas urnas é só não votar nos corruptos. Não serve tal argumento nem como cócegas a me fazer rir.

    A corrupção nunca vai acabar. Ela é inerente ao poder. Ela é sedutora.

    Do ponto de vista político, quem sabe diminuindo o número de cargos eletivos, o número de partidos, acabando com campanhas extensas e espetaculeiras , coligações  interesseiras e restrições legais aos valores a serem gastos. Fim de doações de campanha por quem quer que seja. Quer ser candidato? ponha do bolso.

  5. ESSE PESSOAL GANHOU…

    ESSE PESSOAL GANHOU NOME ACUSAND SOMENTE O PT,  SE NÃO FOSSE O PARTIDO ELES NÃO SERIAM MERDA NENHUMA. EU QUERO VER SE ELES IRÃO PEGAR TODOS O ACUSADOS COMO DO PSDB, PMDB SE IRÃO INVESTIGAR O TEMER E  TUDO QUE ELE TEM… EU DUVIDO… EU SO ACREDITO VENDO.

  6. Nassif: tem certeza disso? A

    Nassif: tem certeza disso? A Câmara federal votanto medidas anti corrupção? Só se for piada. Desde quanto os nobres deputados dão tiro no pé? A fonte maior de roubos e maracutáias nesse Pais, por sua maioria, votando tais coisas temos que concordar alguma parece errada. É como se botássemos uma raposa para vigiar o galinheiro…

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