O Ibovespa e a volta à normalidade do STF, por Wanderley Guilherme dos Santos

Ao remeter o mensalão tucano à instância apropriada de julgamento, o STF, em autocrítica, definiu a etiqueta da AP 470: foi mesmo um julgamento de exceção.

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Segundo a versão da imprensa, o Ibovespa teria subido esta semana devido ao rebaixamento de grau do País patrocinado pela Standard&Poor’s e pelo o IBOPE aquecendo as oposições com a pesquisa sobre avaliação do governo. Finalmente, colhidas as necessárias assinaturas, o Senado pode instaurar uma Comissão Parlamentar de Inquérito sobre os negócios entre a Petrobras e a Astra a propósito da refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos, também promovendo a alegria antecipada dos pré-candidatos oposicionistas, prevendo uma devastação do governo. Leitores amadurecidos devem estar tão entediados com a versão da imprensa quanto com o estilo modorrento deste parágrafo. Vamos a outra.

O Ibovespa, altar de todos os rentistas, bem que podia revelar-se satisfeito por motivos distintos. Aprovou-se, na semana, o marco civil da internet e o início da legislação definitiva sobre o regime diferenciado de contratações públicas (RDC), ato capaz de revolucionar a administração dos órgãos de Estado se monitorado com rigor. A obrigação de licitar toda compra governamental (grampos e escutas inclusive) representa uma ferramenta burocrática adequada à sabotagem de qualquer plano de governo. Faz parte das razões que explicam os atrasos nas grandes obras públicas (em associação com os poderes paralisantes do Tribunal de Contas da União), cobrado como fracasso pelas versões midiáticas.
 
Quebrar as algemas da legislação atual, vigilante de um Estado inerme, e alterar os dispositivos que permitem ao TCU interromper obras vultosas por meras suspeitas, é indispensável à redução dos custos de operação de um Estado de Bem Estar. A diferença entre o orçamento inicial de uma obra de infra-estrutura e seu custo final decorre em larga medida das interrupções infundadas sob mandados do TCU e de instituições policialescas como o IBAMA. Quanto a este, com a obtenção de um empréstimo no valor de trezentos milhões de dólares para financiamento de empresas pouco predatórias, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico faz mais do que a fiscalização preventiva e preconceituosa do IBAMA, e isso sem contabilizar os custos operacionais da burocracia ibamesca.  

Ao contrário das agências de avaliação, a opinião praticamente unânime dos economistas de prestígio internacional consagra o Brasil como um dos menos afetados em todo mundo pelo desabamento da economia internacional em mais uma das quedas anunciadas pela teoria dos ciclos capitalistas. Se o País está arranhado convém olhar para os hematomas dos que se submeteram ao tipo de ortodoxia adotado pelos assessores dos candidatos à Presidência, cujo programa é fazer do Brasil uma gigantesca Espanha. Os investidores da Ibovespa podem se animar com competentes juízos internacionais antes que com o inoportuno velório dos farejadores de carniça. Para estes, a fusão de duas das maiores firmas no comércio do açúcar criando, nesta semana, a maior trading do mundo (metade nacional, metade americana), a ser responsável por 25% das exportações globais de consumo, deve representar formidável carniça futura. E passam a torcer pela versão que eles próprios inventam.

Ao remeter o mensalão tucano à instância apropriada de julgamento, o Supremo Tribunal Federal, em autocrítica, definiu a etiqueta da AP470: um ponto fora da curva, isto é, um julgamento de exceção. O STF voltou à normalidade. Este evento, retorno à previsibilidade jurídica, animou o Ibovespa, com certeza. Ao mesmo tempo, a direita e a esquerda se agitam a propósito de certo cinqüentenário: a primeira, nostálgica, a segunda, reivindicativa. Os ânimos permanecerão assim até que o acontecimento originário se transforme em cisco histórico como o golpe de 37, por exemplo, ou como os 18 do Forte de Copacabana, diante do já então enorme percurso coberto pela democracia.

Os períodos ou tentativa de ditaduras estão destinados a não representar senão zero vírgula e cada vez mais zeros antes do mortiço 1 da história republicana.  Não terão capacidade de gerar filhotes, mas a de servir de alimento aos historiadores. Adepto do esclarecimento dos fatos, sou, não obstante, avesso a compassos de espera. A democracia e o progresso do país estão sob artilharia, tendente à piora.

Com sintomas da síndrome de Estocolmo, a opinião pública parece tomar o progresso antecedente como natureza, desconsiderando o mérito da política que a tornou possível. Pois se a democracia e o progresso se transformaram em natureza cumpre aos democratas zelar por sua preservação. A bandeira anti conservadora vem a ser a sustentabilidade da democracia e do bem estar social, condição necessária à garantia dos ganhos efetuados. Alerta contra a mudança em direção ao passado.

Redação

10 Comentários

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  1. WGSantos

    Nassif,

    Artigo muito bom,  sem qualquer tipo de tergiversação, no qual o excelente cientista político faz uma abordagem sobre o atual cenário político sem vestir uma camisa de torcedor, algo cada vez mais raro.  

  2. 50 anos depois, os mesmos dilemas para problemas diferentes.

    Uma das grandes sacadas do marxismo é dissecar o problema da luta de classes, e a consciência que cada classe acumula neste processo.

    Em outras palavras: cada classe, ainda que de forma não homogênea, e de acordo com a maior ou menor coesão de seus valores e interesses, será mais ou menos bem sucedida na imposição destes valores e interesses às demais.

    A construção e manutenção da Democracia, na perspectiva da luta permanente que as classes travam entre si, é algo assombroso, quer seja porque em cada classe, de forma heterogênea, como já dissemos, os indivíduos tenham noções particularistas de Democracia, quer seja porque há momentos que as classes em conflitos articulam a derrubada dos modelos democráticos que as impedem de acessar ao controle da sociedade.

    As elites, sempre cientes destas cisões, e monopolizando os instrumentos vitais para a sobreviência dos demais (capital, mídia, judiciário, etc), por várias vezes, atacaram as Democracias e as liberdades democráticas para a instalação de modelos restritivos e excludentes, e em alguns lugares, como foi na América Latina, ditaduras, ou nas regiões centrais, como a Alemanha nazista.

    Ainda que pareça um tipo de darwinismo, não é difícil imaginar que o processo de “seleção econômica” capitalista, baseado na exploração e desigualdade, permitam a um grupo cada vez mais restrito reunirem seus desígnios de forma muito mais coesa, enquanto às demais classes, a dispersão é resultado quase natural.

    Mas se as vanguardas das forças progressistas de democráticas sabem disto, ou ao menos, intuem estes momentos, por que não reagem?

    Eu não ousaria questionar Wanderley Guilherme dos Santos, pelo menos não abertamente, mas o fato é que os democratas como ele, não raro, engolem uma isca, ou melhor, ficam atados em uma armadilha semiótica que é vital para as classes dominantes:

    Fazer significar o sistema econômico (capitalista) com Democracia, impedindo que se veja que:

    Se não há uma normalidade econômica (o capitalismo se alimenta de seus paradoxos e assimetrias), nunca este sistema conseguirá coincidir com uma normalidade institucional e democrática.

    Falta, portanto, a gente como WGS e outros auto-intitulados democratas, o radicalismo necessário para entender que o STF nunca voltará a normalidade, ao menos, não a imaginada por ele (WGS) simplesmente porque o STF é o esteio jurídico da ordem capitalista (ou a desordem humana permanente).

    Neste sentido, imaginar que agora tudo está bem porque enforcamos petistas, e aos tucanos daremos o tal do “julgamento justo”, e que isto é uma “garantia a todos” é a mesma ingenuidade que impediu Jango de cortar as cabeças golpistas. Assim que for necessário, voltam os carrascos e o circo de horrores, até que os réus mudem.

    Esta hesitação típica de classe a qula pertencia Jango, permite que assistamos a preparação, evolução e eclosão de golpes contra a Democracia, justamente ela fragilizada pela incapacidade dos seus defensores de exercerem um radicalismo necessário para que ela não seja emulada.

    Mais ou menos como querer debater os aspectos sociológicos s filosóficos do assalto à mão armada enquanto o ladrão tenta entrar em sua casa, e você, armado, ainda não decidiu o que fazer.

    Não. O STF não voltou ao normal, porque não pode ser normal que gente inocente ou não culpada esteja na cadeia, e mais, que ainda que culpados, não tenham merecido um julgamento digno e correto.

    Ou se corrige este injustiça ou se dê aos demais o mesmo tratamento. Isto sim é normalidade.

    Para manter a Democracia e o interesse da maioria, às vezes é preciso baixar a porrada, e esquecer os bons modos barrosianos.

    Democracia não é lugar para frouxos.

    Caso contrário, a luta de quem morreu e foi torturado, persguido e exilado será em vão, e esta sim, será a verdadeiro ignomínia, maior que dos abutres fardados e civis.

    É fácil exaltar a fluema de Jango em decidir não resistir a um general de m..rda, que veio de Minas com uns gatos pingados, apoiado por cadetes Geisel da Aman, claro…

    Só quem sofreu na mão da ditadura poderá dizer o preço da covardia.

    Já passou da hora de dizermos os golpistas que não vale à pena tentar de novo, ou…

  3. A propósito dessa “agência de

    A propósito dessa “agência de risco”, a S&P, há uma pergunta que não quer calar: de onde vem a receita que sustenta essa agência, ou, no popular, quem paga a conta dessa S&P?!

    Mais uma coisa, essa tal de S&P já explicou o “rating” atribuido ao banco americano Lehman Brothers antes dele quebrar?!

    Como dizia o macaco Sócrates: Não precisa explicar, só queria entender!!!

  4. Será que vamos
    deixar a mídia
    Será que vamos
    deixar a mídia nativa capitaneada
    pela Rede Globo e a oposição
    transformar mais esse Caso da
    Refinaria de Pasadena em um novo
    “Mensalão” em que somente
    “apanhamos” de tudo quanto foi
    jeito para somente depois de anos
    descobrir que tudo não passou de
    “caixa dois de campanha”? Em que
    caverna terá se escondido aquele
    gigante que acordou indignado e
    que foi às ruas pedir o fim da
    corrupção? Voltou para o seu sono
    profundo? Ou ele não sabe que
    existe um Mensalão do PSDB
    anterior ao do PT que não foi
    julgado? Esqueçam! Não teremos
    18 minutos de JN contanto em
    detalhes como o patrimônio
    público foi espoliado pelos tucanos
    em MG! Muito menos coberturas
    diárias, mês após mês, com
    repórteres e âncoras da mídia
    hegemônica nativa cobrando
    punição dos culpados! Juízes do
    Supremo como Gilmar Mendes ou
    Marco Aurélio Mello não farão
    “caras e bocas” na TV Justiça ou
    sequer demostrarão com seus falas
    eloquentes que estão indignados
    com a corrupção que grassou(e
    ainda grassa) lá nas Minas Gerais
    do Aécio ou Sampa com o
    Trensalão! O Mensalão Tucano será
    sumariamente esquecido e irá
    PRESCREVER. E o Eduardo Azeredo
    (PSDB-MG), ex-presidente do PSDB,
    ex-governador de MG, “o líder
    ferido que não foi abandonado na
    estrada” por um único minuto,
    provavelmente, ainda irá se
    candidatar, novamente, a deputado
    federal(ou estadual). Afinal, ele é
    ficha limpa, limpíssima, meus
    caros! O nome disso? Indignação
    “seletiva”! Hipocrisia! Fizeram uma
    tremenda crocodilagem com o PT!
    Pilantragem mesmo! Hehehe! Só
    rindo pra não chorar! É o que digo!
    Nestes tempos bicudos a lei só vale
    pra pobre, preto, puta e petista!
    Nos transformaram numa espécie
    “párias” da sociedade! Nas redes
    sociais ou nos espaços destinados
    comentários somos todos
    “petralhas”! E a História do “Maior
    Escândalo de Corrupção” do Brasil,
    mais uma vez, confirma aquilo que
    já se disse: Foi uma “farsa”
    montada pela Mídia, pela Oposição
    e por um STF formado por uma
    “maioria de ocasião” com o único
    intuito de “criminalizar”, agora
    sabemos, não só o PT, mas todo um
    segmento da sociedade que ousou
    sonhar com um país melhor para
    nossas futuras gerações. Foi sim
    um “Julgamento de Exceção”! E
    todos terão que administrar isso
    em suas consciências, currículos e
    na própria história da mais alta
    corte do país! Não está fácil não!
    Mas tenho orgulho e não entrego
    sem lutar! Tenho ainda
    Coração…como diria Renato Russo,
    que ontem faria se vivo estivesse.
    Vamos à luta!

    1. STF

      ruy,

      Você tem inteira razão, mas o STF não conseguiria ser empresa de governança comporativa, já que é um tremendo de um balaio de gatos. 

  5. Em ralação à S&P é bom

    Em ralação à S&P é bom lembrar que ela já este ano abaixou as notas de França, Itália, Espanha, Portugual e Grécia entre outros países e que está sendo PROCESSADA NOS EUA POR MANIPULAÇÃO DE DADOS

  6. wanderleicas

    “instituições policialescas como o IBAMA.”

    Licenças ambientais serão ou não concedidas. Se os trâmites carecem de maior agilidade, é outra história.

    Parece que pro Wanderley a concessão de licença ambiental é mera burocracia.

    “O STF voltou à normalidade.”

    O caminho é este: após uma eternidade para a conclusão do processo e pouco antes do oferecimento da denúncia no STF, basta o parlamentar renunciar e, destarte, ganhar mais uma eternidade.

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