O juízo competente em crime cometido por militar brasileiro no exterior, por Vladimir Aras

Episódio anterior, dos anos 1990, também envolvendo avião da FAB, foi julgado pela Justiça Federal no Rio de Janeiro, à luz do art. 109, V e IX, da CF.

do Blog do Vlad

O juízo competente em crime cometido por militar brasileiro no exterior

por Vladimir Aras

Em 25 de junho de 2019, o Ministério da Defesa divulgou por meio de nota que um militar da Aeronáutica fora preso por supostamente transportar drogas em avião da FAB. O fato teria sido descoberto na cidade de Sevilha, na Espanha.

Inicialmente, é preciso verificar se há jurisdição brasileira sobre o crime cometido por um militar brasileiro, em avião militar brasileiro, em missão no exterior.

A jurisdição do Brasil resulta da aplicação do art. 7º, §1º do Código Penal Militar:

Territorialidade, Extraterritorialidade

 Art. 7º Aplica-se a lei penal militar, sem prejuízo de convenções, tratados e regras de direito internacional, ao crime cometido, no todo ou em parte no território nacional, ou fora dêle, ainda que, neste caso, o agente esteja sendo processado ou tenha sido julgado pela justiça estrangeira.

Território nacional por extensão

§1° Para os efeitos da lei penal militar consideram-se como extensão do território nacional as aeronaves e os navios brasileiros, onde quer que se encontrem, sob comando militar ou militarmente utilizados ou ocupados por ordem legal de autoridade competente, ainda que de propriedade privada.

Logo, de acordo com o CPM, o crime ocorreu em território brasileiro por extensão.

O art. 23 da Lei 6/1985 – Lei Orgânica do Poder Judiciário espanhol, segue a regra quase universal de que a jurisdição sobre crimes cometidos em navios e aeronaves militares, onde quer que se encontrem, é do Estado de origem do veículo.

Assim, o Brasil tem jurisdição sobre o fato.

Qual o juízo competente para processar este caso?

Episódio anterior, dos anos 1990, também envolvendo avião da FAB, foi julgado pela Justiça Federal no Rio de Janeiro, à luz do art. 109, V e IX, da CF.

De fato, em abril de 1999, um Hércules C-130 foi retido na Base Aérea do Recife com 32 kg de cocaína a bordo. A aeronave, que partira da capital fluminense e tinha como destino Clermont Ferrand, na França, com escala nas Ilhas Canárias, foi apreendida graças à Operação Mar Aberto, da Polícia Federal.

O oficial responsável pelo tráfico foi condenado a 16 anos de reclusão pela Justiça Federal, em sentença confirmada pelo TRF-2. Posteriormente, em 2015, o STM determinou a perda de seu posto e patente, ao atender representação para declaração de indignidade para o oficialato, apresentada pelo MPM.

No entanto, isto foi antes da Lei 13.491/2017, que alterou o art. 9º do Código Penal Militar (Decreto-lei 1001/1969) e que, com isto, ampliou a competência da Justiça Militar para julgar crimes previstos na legislação comum.

Por força desse dispositivo, vigente desde 2017, a competência para processar crime de narcotráfico (inclusive internacional) cometido por militar das Forças Armadas agora é inequivocamente da Justiça Militar da União.

Tal lei deve ser compatibilizada com o art. 109, inciso IX, da Constituição, que atribui aos juízes federais a competência para julgar os crimes cometidos a bordo de navios ou ou aeronaves, mas ressalva a competência da Justiça Militar.

Em razão do art. 91 do CPPM (Decreto-lei 1002/1969), o foro competente é o da auditoria militar em Brasília, observado porém o art. 92 do mesmo código.

Crimes fora do território nacional

Art. 91. Os crimes militares cometidos fora do território nacional serão, de regra, processados em Auditoria da Capital da União, observado, entretanto, o disposto no artigo seguinte.

Este dispositivo deve ser lido em conjunto com o parágrafo único do art. 27 da Lei Orgânica da JMU, incluído pela Lei 13.774/2018:

Art. 27. Compete aos conselhos:

I – Especial de Justiça, processar e julgar oficiais, exceto oficiais-generais, nos delitos previstos na legislação penal militar,

II – Permanente de Justiça, processar e julgar militares que não sejam oficiais, nos delitos a que se refere o inciso I do caput deste artigo.

Parágrafo único. Compete aos Conselhos de Justiça das Auditorias da circunscrição com sede na Capital Federal processar e julgar os crimes militares cometidos fora do território nacional, observado o disposto no Decreto-Lei nº 1.002, de 21 de outubro de 1969 (Código de Processo Penal Militar) acerca da competência pelo lugar da infração.

Assim, concluída a investigação, caberá ao Ministério Público Militar em Brasília promover a ação penal contra o militar da FAB, perante a Justiça Militar da União, com base no art. 109, IX, da CF e no art. 9º, do CPM.

Redação

14 Comentários

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  1. Esse nóia está na Espanha e os espanhóis não tem obrigação alguma de reconhecer a competência da justiça brasileira para um crime que ocorrem no território deles. Na verdade seria melhor que esse militar fosse julgado lá e não aqui. No Brasil, com “jeitinho” ele acabaria sendo absolvido, promovido e aposentado. Alguns anos depois ele poderia chegar à presidência da república pelos mesmos caminhos nebulosos e nauseabundos que foram percorridos por Jair Bolsonaro.

  2. Porém a cocaina foi encontrada na bagagem de mão do militar, ns alfândega espanhola, ou seja, em território espanhol, nesse caso nso se estende à bagagem de mão a territorialidade, ou estou errado?

  3. Nome, patente e atribuição do “suposto” narco-traficante, por ser miliquento, nem pensar em tornar público? Começou mal, muito mal, já que o referido “aparelhos” (argh) é da conta da presidência de república, ou seja, os militares que lá co-habitam em serviços são (ou deviam ser) escolhidos entre a escol da aeronáutica, não?
    Muito estranho. E lastimável a falta de informações sobre o “transviado”… Talvez – kkkkkkkkkkk – estejam investigando a possibilidade de conluio e quadrilha…

  4. A vítima do crime é o povo da Espanha, em território espanhol, já que a droga foi descarregada.
    Essa é somente a pauta de exportação através de aeronaves oficiais.
    Dá direito a imaginar qual seria a pauta de importação nos voos da alegria com passagem ao largo da aduana nativa.

  5. Mais uma baixaria na Putaria Brasil !
    Mas vejam bem… o militar-traficante está em conformidade com os novos tempos.
    Afinal, não há uma aliança TÁCITA entre milícias e militares ?
    Na intervenção no Rio os militares incomodaram alguma das milícias ? Cadê o Queiroz ? O general Villas Boas não defendeu os crimes cometidos por Moro ?
    Por que uns podem e outros não ? Afinal, são “só” 39 quilos de cocaína…

  6. Não precisaremos nos preocupar com uma possível impunidade da “mula qualificada” (conforme definiu Mourao), haja vista a “Moção de Congratulações e Apoio” emitida em 2006 pelo probo deputado federal Bozo ao presidente da Indonésia no caso da execução de traficante brasileiro preso naquele pais.
    No documento além de culpar o PT pelo tráfico de drogas, o probo deputado aplaude a aplicação da pena máxima ao traficante e critica a solicitação de clemência feito por Lula ao presidente Bambang .
    Então ele, bozo, vai apoiar que o processo se desenrole na Espanha e que seja aplicada a pena máxima prevista em lei. No Brasil caberia apenas a exclusão do traficante (desculpe, mula qualificada) da FAB.
    Talvez uma delação premiada feita pelo sargento naquele país o livre da pena máxima.

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