Prisões de ativistas ferem cláusula pétrea do Estado de Direito, por Marcelo Cerqueira

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Enviado por Leo V

Do Outras Palavras

“Mais respeito à democracia”

Um dos grandes defensores das liberdades políticas durante a ditadura afirma: prisões de ativistas ferem cláusula pétrea do Estado de Direito. Ministério da Justiça continua conivente

Por Marcelo Cerqueira

Vejo-me como no passado quando certas teorias do mau direito informavam, então, as sucessivas leis de segurança nacional: a posterior mais grave que a anterior.

O conceito de conspiração do Código de Mussolini é que animava perseguidores de então. Antigamente, dizia-se que o alemães criavam as leis, os italianos as copiavam, os franceses as comparavam e os espanhóis as traduziam. Assim, os portugueses. Leia-se parte do art. 179 do anoso Código Penal Português: “Aqueles que sem atentarem contra a segurança interior do Estado, se ajuntarem em motim ou tumulto…” O elemento material do tipo descrito é “ajuntar-se naquele motim”, “conjurar para aquele motim”.

 

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Marcelo Cerqueira: “juízes decidem por induções e presunções e contaminam suas decisões por premissas ‘morais’ e preconceituosas; a hipótese substitui os fatos e impede a ampla defesa”

Copiando o Código Penal de Rocco (1930, na ascensão do fascismo na Itália), os autores das leis de segurança nacional da ditadura militar ampliaram os tipos penais: a conspiração, que no direito brasileiro ganharia o nome de “formação de quadrilha ou bando”, era o crime que se praticava contra o Estado, então reduzido a miserável ditadura.

O que vem me causando perplexidade e mal-estar é ver que esses conceitos fascistas foram, em parte, assimilados em pleno Estado de Direito, na vigência da mais avançada Constituição do mundo no que diz respeito aos direitos fundamentais. As acusações abusam do tipo penal “crime de quadrilha” para indiciar ou denunciar cidadãos quando não encontram para eles um efetivo tipo penal descrito nas leis.

O crime de quadrilha ou bando, abrigado no art. 288 do Código Penal na parte que trata dos “Crimes contra a paz pública”, pune a associação “de mais de três pessoas, em quadrilha ou bando, para o fim de cometer crimes”. Esse tipo penal é uma exceção à dogmática do Direito Penal quando admite que um “ato preparatório” constitui-se em crime autônomo.

A doutrina e a jurisprudência são unânimes em afirmar não existir quadrilha se os componentes (quatro ou mais) não são unânimes em afirmar não existir quadrilha se os componentes (quatro ou mais) não são sempre os mesmos.

Com tristeza, tenho verificado que, à falta de uma acusação específica, a polícia e o Ministério Público têm indiciado ou denunciado cidadãos que rigorosamente não praticaram concretamente qualquer delito punível. Mais grave é que magistrados “autorizam” os pedidos de prisão em bloco e, pelo que se sabe (processos correm em segredo de justiça [sic]), as “provas” são fabricadas pela polícia e o MP e os juízes, sempre apressados, não as examinam. O trabalho dos advogados é tolhido pelo arbítrio da “justiça”.

O que se observa é que os juízes decidem por induções e presunções e contaminam suas decisões por premissas “morais” e preconceituosas; a hipótese substitui os fatos e impede a ampla defesa. A presunção de inocência é cláusula pétrea do constitucionalismo.

Mais cuidado com o Direito dos cidadãos, mais respeito à democracia tão duramente reconquistada.

Redação

24 Comentários

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  1. Quando criticamos o excesso

    Quando criticamos o excesso do julgamento do mensalão que definiu como quadrilha os reus temos a mesma obrigação intelectual de criticar o excesso dessas prisões dos manifestantes e dos crimes que lhes são atribuídos.

    A relação desequilibrada do Estado americano e sua população é conhecida. Recentemente na França manifestantes que vaiaram Hollande foram presos.

    Está ressurgindo na história confronto entre sistema e população. Tal como na Revolução Francesa, nos famosos movimentos da década de 60, entre outros, se o sistema não avançar a democracia teremos conflitos cada vez maiores. Enganam-se os que pensam que a repressão faz recuar tais movimentos, aqui no Brasil já tivemos exemplo disso.

    1. Assis, não é obrigação

      Assis, não é obrigação intelectual. É moral mesmo.  Mas a moral também está sendo relativizada por alguns , então melhor esperar que o que chamam de pig  ( há quem se orgulhe de copiar paulo henrique amorim …)esfrie a campanha e a insensatez fique restrita aos manifestantes violentos.

      Quanto ao último parágrafo de seu comentário, repare que os conceitos povo e população são manipulados de acordo com o interesse do freguês .

    2. Não, não e não…!

      Não, caro Assis, não se tratam de episódios que podem ser comparados.

      As consequências dos atos preparatórios estão aí, no mundo objetivo: patrimônio foi depredado, a vida de pessoas alheias às manifestações foram colocadas em risco (incêndio, obstrução de vias públicas, e outras ações violentas), assim como a afronta as forças policias (independente do que pensamos sobre elas, elas são as únicas legitimadas para o uso da força). Há um nexo causal entre o que se apura como formação de quadrilha e as condutas exauridas (depredações).

      Partindo da premissa que todo preso que afronta o Estado e o status quo é um preso político, temos que estender esta condição aos pretos e pobres que integram as “forças comerciais paralelas” do mercado farmacológico (entorpecentes), que poderiam ser considerados uma versão recente de bandidagem social.

      Se considerarmos ainda que os rigores da lei (prisões e as execuções extra-judiciais-fatais) sempre recaem sobre eles, aí teríamos que dar a estas falanges o condão de legítimos portadores das demandas do povo mais pobre, e eu acho que não seria o caso de relativizar tanto, portanto…ratifico minha discordância ao dizer que os (in)justiçados pela ação 470 não podem NUNCA ser comparados a estes coxinhas-radicais.

      Sua comparação é um desrespeito a História coletiva e a história individual de cada um daquels quadros político.

      O texto do Cerqueira beira ao ridículo, pois:

      “(…)A doutrina e a jurisprudência são unânimes em afirmar não existir quadrilha se os componentes (quatro ou mais) não são unânimes em afirmar não existir quadrilha se os componentes (quatro ou mais) não são sempre os mesmos.(…)”

      Condicionar a consumação do tipo penal a aceitação dos autores é uma piada, quando é pacífico que os autores sequer precisam saber da existência dos demais, bastando haver liame (nexo causal) entre as condutas de todos, divisão de tarefas e um hierarquia, onde os escalões inferiores nem precisam conhecer a identidade de quem lhes dá ordens.

      Este é o problema do Cerqueira: está comentando como se estivesse em 1971. 

      Fazer firula constitucional no meio da ditadura é até meio fácil, difícil é divisar os princípios e sopesar os bens jurídicos em conflito no ambiente democrático.

      Como vemos, não são apenas os gorilas de pijama que ficam anacrônicos, vomitando vitupérios militaristas, mas também envelhecem nossos heróis dos direitos humanos.

       

    3. Admiro você, Assis

      Admiro e respeito você, gosto muito dos seus textos. Mas não consigo ter esse altruísmo que você tem. Não vou ser honesto com os desonestos, pois eles não me tratam com honestidade e nem eles mesmos se convencem da necessidade da honestidade. Se eles desprezam a honestidade tanto assim, que vivam então pelo mundo que criaram que admiram.

      Declaro guerra a quem finge me amar, imagine a quem me declara ódio de peito aberto, sem meias palavras, como esses black blocs que querem derrubar um governo democraticamente eleito!

  2. A única cláusula pétrea que existe…

    A única cláusula pétrea que existe chama-se povo. É este que faz e desfaz cláusulas de seja lá o que for, mesmo que através de seus congressistas, de seus arremedos de representantes.  

    Ora, se há cláusula constitucional permitindo equivocadamente que pessoas possam fazer terrorismo urbano, que possam matar e/ou depredar bens alheios impunimente, sob o amparo de conceitos eufemísticos de direitos, liberdade, democracia…, então que se mude essa excrescência pétrea porque há que se preservar o interesse maior e coletivo e não os desatinos de desordeiros gratuítos.

     

    1. Quem matou, quem fez

      Quem matou, quem fez “terrorismo urbano”.

      Voltamos à ditadura? Esse blog está cheio de “cidadãos de bem” da época da ditadura.

      Se vc leu o texto bem viu que um dos argumentos é que não existe crime! As pessoas estão presas por nada, isto é, por serem militantes de movimentos e organizações políticas.

       

      1. Por favor…

        Leo V

        Por favor, todo aquele material farto e de alto poder destrutivo apreendido mais as gravações que confirmavam as intenções criminosas da turma, mostradas exaustivamente na TV não lhe convenceram que se tratava de um bando que deveria ser contido no lugar certo, que é a prisão, para impedir que a sociedade sofresse os riscos gravíssimos que estavam lhe aprontando????!!!!!!!!!

         

  3. Clausula petrea.

    Estes puristas juridicos vivem em um sistema político capitalista, ou neoliberal ou de mercado, como queiram,  e se esquecem que na hora de a onça beber agua, a única clausula petrea que vale é a segurança economica e a manutenção da ordem social. O resto é conversa fiada para boi dormir e markting para Sininho e seus comparsas.

  4. Em manifestações pacíficas

    Em manifestações pacíficas ninguém foi preso. As prisões ocorrem quando manifestantes que não são manifestantes começam a quebradeira e a atacar a polícia. Vamos transferir para o plano pessoal: o que se faz quando alguém começa a quebrar nossa casa, mesmo que seja nosso parente? Chamamos a polícia, não é. Pois é assim que tem que ser. A convivência em sociedade exige obediência a regras. E não é porque algum maluco sismou que protestos violentos é que resolvem os problemas da sociedade é que temos que respeitá-los. Estão fora das regras de convivência pacífica.

     

    1. Em que mundo vc vive para

      Em que mundo vc vive para dizer que em manifestações pacífics ninguém foi preso!!! Quando até jornalistas são presos!

      Ora, na imensa maioria dos casos é a própria polícia que ataca.

      Você está procurando emprego na Veja?

      1. A vaga tá ocupada…

        No padrão coxinha-radical, caso a revista deseje um “contra-ponto”, sua vaga é garantida.

        Em Munique, 1923, o pobre Hitler também reclamava dos governos eleitos (República de Weimar), e de sua polícia que não tolerava manifestações do tipo que ele promovia…

        Um vacilo, e deu no que deu…

        História repetida é farsa, repetida outra vez é sempre tragédia…

        E este pessoal diz que lê ” O Velho”…uai…

  5. Algum dia…

    Talvez eu não veja, mas há de ser vista um dia uma crítica retroativa, como a que o Nassiff fez a respeito do impeachment do Collor. Tipo “aquilo de ir no oba oba da imprensa criou um padrão perigoso”. Agora para refrear manifestações volentas tá quase todo mundo de esquerda achando tudo lindo maravilhoso, mas humildemente acho que se está criando um padrão perigoso. 

  6. Também concordo que o estado

    Também concordo que o estado tem que preservar a democracia para TODOS os cidadãos. Democracia é “não invadir o espaço alheio”. Sou totalmente contra policia militar, mas, quanto mais os “ativistas” invadirem, estratégia fracassada, o espaço alheio, menos democracia teremos, pois nunca agregarão o povo a seu movimento. Por que não mudam de tática se está se mostrou danosa aos movimentos? Burrice? Manada? Não se flagram que os métodos utilizados por eles, ativistas, está FRACASSADO? Seria maravilhoso se tivéssemos ativistas REALMENTE comprometidos com a verdade, com a busca por justiça para todos. Mas, esses ai, invadindo espaços que são de todos, é burrada e muito velhaca. Quando não há limites, quando há impunidade generalizada, não é democracia, é “espelunca”. A policia militar, só beneficia “a panela” de sempre e pau no povo. Quem sabe iniciam movimentos que agreguem esse povo para lutarmos por uma democracia onde ela não existe(mídia, justiça)? Nessa, eu ia junto.

  7. Tenho que discordar do nobre

    Tenho que discordar do nobre Marcelo Cerqueira. No caso, o crime foi praticado, pois de acordo com as investigações da polícia, o grupo foi responsável pelas manifestações violentas, pela tentativa de incendiar o prédio da Câmara no Rio, pelo incêndio de 500 onibus, entre outras coisas. Aliciavam menores, davam apoio logístico e fabricavam e forneciam os equipamentos explosivos e/ ou incendiários.

  8. Pretendem estabelecer o

    Pretendem estabelecer o Estado de Direito da Desordem Necessária, como modo preferível da oposição desestabilizar a ordem pública; para, a  título indicativo da piora social, derrubar as pesquisas favoráveis a reeleição do governo vigente.

  9. A verdade oculta…

    … é que não vêem ou não querem ver a roda do mundo girando. A dissolução da Yugoslávia em fins da década de 90 deveu-se a inúmeros motivos, entre os quais um método ou tática de infiltração de ativistas treinados e pagos para  transformar movimentos pacíficos em violentos. Tal método apareceu na Universidade de Belgrado, mas os olhos do mundo o perceberam na Sérvia ainda yugoslava, onde cresceu com desenvoltura, chegando a ter cêrca de 70 mil militantes. Era o Sérvia Otpor! (Resistência Sérvia) e que teria sido decisivo para o desmembramento da região.

    Srdja Popovic é o sérvio que trabalhava para a STRTFOR, uma agência de inteligência privada situada no Texas, EUA. A partir daí, a empresa mudou de nome, para Covan. A Covan sistematizou o método de desestabilização de regimes e hoje vende treinamento e instrução em diversos países do mundo, pagos por multinacionais que vêem seus interesses comerciais contrariados. Contrata pessoas dos extratos sociais mais baixos e as preparam para a consecução dos objetivos dos que lhe pagam. E ainda mantém o apoio do govêrno dos EUA, através de órgãos de segurança.

    Estavam presentes no Egito, e iniciaram o seu trabalho de campo na Primavera daquele país com a invasão da Praça Maidan e o assassinato de muitos dos seus acampados, chacina que a imprensa ocidental atribui ao exército egípcio. Já tinham estado presente em outras primaveras, como as dos países do noroeste e norte da África, e também do Oriente Médio. Foram os autores das ações violentas na Venezuela e em outros países latino americanos, e acredito que estão no Brasil também, Vendem seus serviços como uma empresa privada e agem sempre de acôrdo com os interesses hegemônicos dos EUA e da Europa.

    Vejo com preocupação a presença da Shell no Pré-Sal. Os sites Voltaire.net e Anti Nova Ordem Mundial, têm matérias esclarecedoras e estarrecedoras sôbre o assunto.

  10. A acusação contra esses

    A acusação contra esses ativistas são feitas pelo Ministério Público. Não sei porquê, me lembro logo da campanha que fizeram contra PEC37;

     

  11. Sabe o que fere o estado de direito?

    É querer derrubar um governo democraticamente eleito. É jogar bomba na cabeça de cinegrafista. É quebrar tudo que vê pela frente e depois dizer que está “mudando o país”. É tratar na porrada que discorda das suas ideias, como os black bloc fazem.

    Essa molecadinha de cabeça coberta com camisa preta da Abercrombie e usando tênis Adidas, com os torsos malhados por horas em academias de musculação, e que sai distribuindo violência, molotov, paus e pedras por aí (e depois corre pro Facebook pra dizer que é “black bloc”), isso sim é que fere o estado de direito.

    Fere o estado de direito o Zé Dirceu ser condenado por domínio do fato sem domínio e sem fato. O Genoíno correr risco de vida na prisão porque o Joaquim Barbosa acha isso bonitinho. Isso sim, é uma trremenda violação ao estado de direito!

  12. Nobre Advogado Marcelo Cerqueira

    Nobre Advogado Marcelo Cerqueira tão sumido o senhor estava. Que bom vẽ-lo novamente a bater-se em causas de Liberdade, como no passado!

    Agora, por gentileza, me diga Nobre Advogado, por onde andava o senhor quando aqueles que realmente lutaram arriscando suas vidas por um Brasil melhor, plural e justo, pleno de liberdade, quando eles foram moídos na farsa da AP-470? Nós, com nosso exército de Brancaleone, cerramos trincheiras nos blogs ditos  “sujos” na defesa deles, posto que justo era sua causa e ela sempre será……

    Senti sua falta de sua voz, de seus argumentos irrefutáveis, de um artigo sequer, como nos velhos tempos das lutas justas em pról da Liberdade, a verdadeira. Agora que o senhor reaparece, que bom! Certamente terá alguma palavra, vá lá, anime-se, sobre as condenações de Dirceu e Genoíno, o que já estaria de bom tamanho. Quem sabe não falaria sobre alguns a mais…..

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