Qual é a situação das ações que pedem a cassação da chapa Bolsonaro-Mourão no TSE?

A Sputnik explica a situação das ações que pedem a cassação da chapa e conversa com especialistas para entender o que a Justiça Eleitoral está fazendo para coibir crimes de fake news.

Reuters – Ueslei Marcelino

Como está o julgamento da chapa Bolsonaro-Mourão no Tribunal Superior Eleitoral (TSE)? A Sputnik explica a situação das ações que pedem a cassação da chapa e conversa com especialistas para entender o que a Justiça Eleitoral está fazendo para coibir crimes de fake news.

Não bastasse a pandemia de COVID-19 que atingiu o Brasil ainda no primeiro trimestre, o ano de 2020 poderia ter entrado para história se o TSE tivesse cassado o mandato do presidente Jair Bolsonaro e de seu vice, Hamilton Mourão. Neste possível cenário, novas eleições seriam marcadas, podendo levar o país a um ciclone de incertezas políticas.

Porém, ao chegarmos ao fim de novembro, qualquer especulação neste sentido – de novas eleições – desvaneceu-se. Em julho, por quatro votos a três, o plenário do TSE determinou que duas ações ajuizadas contra a chapa do presidente retornem à fase de instrução para a produção de prova pericial. O colegiado acompanhou uma divergência aberta pelo ministro Luiz Edson Fachin.

A partir desta decisão, a chapa de Bolsonaro ganhou tempo: é muito improvável que a decisão do TSE aconteça em 2020. No entanto, o entendimento do colegiado da Justiça Eleitoral é de que é preciso haver mais investigações sobre as denúncias que pairam sobre as eleições presidenciais de 2018. A chapa Bolsonaro-Mourão é alvo de quatro ações apenas no TSE, sendo que outras duas já foram arquivadas.

Cerimônia de tomada de posse do presidente da República eleito, Jair Bolsonaro
© AP PHOTO Cerimônia de tomada de posse do presidente da República eleito, Jair Bolsonaro

Mulheres contra Bolsonaro

O TSE analisa atualmente se houve benefício à chapa do atual presidente no episódio em que um site de mulheres contrárias a Bolsonaro foi atacado em 2018 para parecer que as mulheres apoiavam o então candidato. Presidente do TSE, Luís Roberto Barroso ressaltou que considera isso um fato gravíssimo. “Não considerei pouco grave, não. Isso é quase como um sequestro”, afirmou.

Em setembro de 2018, o grupo “Mulheres Unidas contra Bolsonaro”, que reunia mais de 2,7 milhões de pessoas, sofreu um ataque de hackers com o objetivo de alterar o conteúdo da página. A página teve o nome alterado para “Mulheres com Bolsonaro”, passando a compartilhar mensagens de apoio ao presidenciável. As defesas de Bolsonaro e Mourão negam autoria e participação nos ataques.

Em outra ação que corre no TSE, o PDT e o Avante pedem a cassação da chapa de Bolsonaro apontando supostas irregularidades na contratação de serviço de disparos de mensagens em massa por meio do WhatsApp durante a campanha de 2018.

Caso no STF

Atual ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Luis Felipe Salomão entendeu que outras duas ações protocoladas pela coligação “O Povo Feliz de Novo” (PT/PCdoB/PROS) devem aguardar definição sobre compartilhamento de dados de inquérito, cujo processo corre no Supremo Tribunal Federal (STF) e apura ofensas a ministros daquela corte.

No processo que corre no STF, as investigações podem desvendar não só um esquema de propagação de notícias falsas que opera a favor de Bolsonaro nas redes sociais – o chamado gabinete do ódio -, como também ajudar a entender o funcionamento da operação durante as eleições de 2018.

O blogueiro Allan dos Santos cumprimenta o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) durante sessão da CPMI das Fake News, em 5 de novembro de 2019.
© FOTO / AGÊNCIA SENADO / ROQUE DE SÁ O blogueiro Allan dos Santos cumprimenta o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) durante sessão da CPMI das Fake News, em 5 de novembro de 2019.

Falta de celeridade?

Dada a quantidade de provas, evidências, recursos e testemunhas que podem compor ações judiciais, o tempo de julgamento de processos no TSE muitas vezes é contestado.

Para Márcio Vieira Santos, advogado, doutor em direito e professor de direito constitucional e eleitoral, “todo processo, respaldado no devido processo legal, segue seu rito próprio. Igualmente, a celeridade e a razoável duração do processo são princípios obrigatórios, ladeados aos direitos fundamentais da ampla defesa e do contraditório. Portanto, o referido processo segue em sua normalidade jurídico-processual-temporal”.

O presidente Jair Bolsonaro e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, durante cerimônia de posse do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Fux, Brasília, 10 de setembro de 2020
© FOTO / AGÊNCIA BRASIL/MARCELO CAMARGO O presidente Jair Bolsonaro e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, durante cerimônia de posse do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Fux, Brasília, 10 de setembro de 2020

O professor Marcos Ramayana, que leciona direito eleitoral na Fundação Escola do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (FEMPERJ), também conversou com a Sputnik Brasil a respeito da celeridade do julgamento da chapa Bolsonaro-Mourão.

Ele entende que, “a princípio, é absolutamente normal esse prazo. Especialmente quando envolve um candidato ao cargo de governador ou presidente. A legislação brasileira determina que todas as ações devem ser julgadas em um prazo de um ano, mas em razão das práticas recursais, isso acaba prolatando o que é determinado pela lei. Isso é normal”.

Tanto Marcos Ramayana quanto Marcio Vieira Santos concordam com o entendimento de que, em termos de américa do Sul, é comum este tipo de processo durar tanto tempo. “São muitas instâncias para essa questão eleitoral”, afirmou Ramayana.

“Na verdade, além dos princípios antes apontados, a legalidade e a lisura são bases de toda e qualquer eleição no país, e também seguem como regras nos países que adotam o regime democrático”, concluiu Márcio Vieira.

Eleições em 2018

Para quem acompanhou a eleição americana em 2016, a vitória de Donald Trump poderia ser interpretada como um prenúncio para o pleito presidencial brasileiro de 2018. As indicações da participação de Steve Bannon nas eleições brasileiras eram apenas um sinal.

O que vimos foi que as consagradas fórmulas de marketing político foram deixadas de lado. Em seu lugar, campanhas eleitorais migraram do espaço público para as bolhas segmentadas e monotemáticas nos grupos de WhatsApp.

Eduardo Bolsonaro ao lado de Steve Bannon em Nova York
© FOTO / DIVULGAÇÃO / TWITTER EDUARDO BOLSONARO Eduardo Bolsonaro ao lado de Steve Bannon em Nova York

Com efeito, os eleitores se ambientaram ao compartilhamento frenético de mensagens feitas sob medida para satisfazer ou escandalizar públicos-alvo. Concomitantemente a este fenômeno, surgiu um sentimento popular de urgência direcionado ao TSE. Algo precisava ser feito.

 

O compartilhamento desenfreado de notícias falsas, assim chamadas de fake news, coloca em xeque a legitimidade e correto andamento dos pleitos eleitorais. Além disso, acirra sectarismos e gera níveis preocupantes de instabilidade política.

O ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) e presidente do TSE Luís Roberto Barroso em foto de dezembro de 2019.
© FOLHAPRESS / UOL O ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) e presidente do TSE Luís Roberto Barroso em foto de dezembro de 2019.

Possivelmente por essas razões, observamos uma escalada de setores da mídia cobrando maior agilidade do TSE não apenas em face ao julgamento da chapa Bolsonaro-Mourão, como também no sentido de ações que possam coibir a disseminação de fake news, principalmente durante o período eleitoral. 

Para Paula Campos Pimenta Velloso, professora do Departamento de Direito da Universidade Federal de Juiz de Fora, “um julgamento assim só avança se os interesses se afinarem nesta direção”.

Ela avalia que “trata-se de um julgamento político. Seu tempo e seu resultado estão condicionados à conjuntura, aos interesses organizados politicamente, dos quais os tribunais são conhecidos operadores. Tradicionalmente, tais instituições e seus atores atuam como filtros legitimadores, capazes de apresentar interesses como resultados de procedimentos racionais e objetivos”, afirmou.

O esforço do TSE

Parece que há um consenso entre juristas que o combate às fake news é uma tarefa árdua, que envolve discussões delicadas sobre a liberdade de expressão. Neste sentido, Márcio Vieira Santos avalia que o “TSE tem buscado reforçar a fiscalização e os meios de combate aos crimes cibernéticos, inclusive através de órgãos e ações de inteligência”.

TSE faz teste público de segurança do sistema de votação
© FOTO / AGÊNCIA BRASIL/ANTONIO CRUZ TSE faz teste público de segurança do sistema de votação

Exemplo disso, segundo ele, é que “nas eleições de 2020 foi feita uma parceria com o aplicativo Whatsapp que, após denúncias, baniu inúmeras contas com disparos em massa de fake news. Neste tema a luta deve ser constante e árdua, principalmente diante do dinamismo que envolve o uso da rede mundial de computadores nas eleições”, concluiu Márcio Vieira Santos. 

​Marcos Ramayana também partilha desta opinião. Ao ser questionado pela Sputnik Brasil a respeito do trabalho do TSE para coibir crimes eleitorais, ele respondeu que está sendo feito “o máximo dentro do possível”.

Segundo ele, “há duas eleições, já havia fake news. Hoje é que que se fala mais sobre isso, e o assunto ganha uma importância muito grande. Porém, se você pensar, esse crime da fake news já existe de alguma forma no código eleitoral de 1965. A grande questão é o efeito político da Internet, que é muito maior do que qualquer indenização ou direito de resposta”.

Vale lembrar que pela primeira vez, nas eleições deste ano, o disparo de mensagens em massa foi expressamente proibido pela Justiça Eleitoral. Além disso, o próprio WhatsApp se comprometeu, junto ao TSE, a investigar as denúncias e inativar contas suspeitas, encaminhando as informações pertinentes às autoridades. Segundo a plataforma, trata-se de “iniciativa inédita no mundo”.

A Justiça Eleitoral também promoveu o combater o que chama de “comportamentos inautênticos”, em especial nas redes sociais. Um exemplo que costuma ser dado é o uso de robôs e contas falsas para promover artificialmente campanhas de ódio contra candidatos e instituições.

Prédio do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em Brasília.
© FOLHAPRESS / LALO DE ALMEIDA Prédio do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em Brasília.
Redação

4 Comentários

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  1. Qual é a situação das ações que pedem a cassação da chapa? Resposta: o TIMING

    Desfecho em 2020 – Chapa cassada, ELEIÇÕES DIRETAS. Sem chance, impensável, fora de cogitação, eleições diretas significam perda total de controle sobre o processo, deixar a condução do processo por conta da plebe ignara. Para isso, o TSE fez cara de paisagem e empurrou com a barriga. Deu certo, o perigo já passou;

    Desfecho em 2021 – Chapa cassada, eleições INDIRETAS, 513 deputados e 81 senadores apenas. Processo totalmente controlado, nada de aventuras. Uma delícia!

    Paula Campos Pimenta Velloso, professora do Departamento de Direito da Universidade Federal de Juiz de Fora:
    ELA AVALIA QUE “TRATA-SE DE UM JULGAMENTO POLÍTICO. SEU TEMPO E SEU RESULTADO ESTÃO CONDICIONADOS À CONJUNTURA, AOS INTERESSES ORGANIZADOS POLITICAMENTE, DOS QUAIS OS TRIBUNAIS SÃO CONHECIDOS OPERADORES. TRADICIONALMENTE, TAIS INSTITUIÇÕES E SEUS ATORES ATUAM COMO FILTROS LEGITIMADORES, CAPAZES DE APRESENTAR INTERESSES COMO RESULTADOS DE PROCEDIMENTOS RACIONAIS E OBJETIVOS”, AFIRMOU.

    Nada como o juridiquês.

    Como funcionam as fake news: O bispo Crivella, ao lado de um pastor da Universal, grava um vídeo onde afirma que o PSOL já negociou com o Paes, em troca de apoio, a Secretaria de Educação. E prossegue dizendo que o PSOL vai “implantar” a pedofilia nas escolas municipais do RJ. Não adianta a Justiça Eleitoral fazer cara – só cara – de indignada e mandar tirar do ar, bloquear, o escambau, ou ainda aplicar uma “admoestação” – ou não – ao candidato, o vídeo já está feito, daí em diante tem vida própria, uma versão compactada vai atingir, em 24 horas, TODOS os eleitores do RJ através do submundo da web, o WhatsApp.

    isto nem é fake news, é crime mesmo: https://www.youtube.com/watch?v=U62sXCaYy6E

    O mesmíssimo se aplica ao Boulos em SP, à Marília em Recife e à Manu, em Porto Alegre, e outros. As Fake News selvagens só atingem UM lado do espectro político. Imagine isso acontecendo praticado pela esquerda, o mundo desabaria sobre as cabeças dos responsáveis. A mídia, em peso, EXIGIRIA em editoriais de primeira página.

    Como resolver isso? Somente se e quando o TSE puxar o cartão vermelho para essas práticas e apitar o FIM DE JOGO para o candidato. Como isso NUNCA vai acontecer em Terra Brasilis, o processo eleitoral nestas plagas será sempre um jogo viciado, onde um dos lados pode tudo, e ao outro, a mão pesada da lei.

    A compreensão do processo eleitoral brasileiro só é possível através de dois livros, fundamentais, que não só explicam minuciosamente como dão a dimensão exata do tamanho do problema:

    1) Os engenheiros do caos. Como as fake news,as teorias da conspiração e os algoritmos estão sendo utilizados para disseminar ódio, medo e influenciar eleições. Giuliano da Empoli, Vestígio, 2019.

    2) A máquina do ódio. Notas de uma repórter sobre fake news e violência digital. Patrícia Campos Mello, Cia. das Letras, 2020. A Patrícia Campos Mello cita o livro acima por duas vezes.

    1. Corretíssimo, não basta retirar do ar, xingar, sapatear, multar e o escambau se o estropício continuar como candidato. Como é o caso dos citados. Se houvesse, verdadeiramente, justiça neste país (que então não seria) de merrecas e essa gentalha, cretina, calhorda, hipócrita e criminosa estaria fora de qualquer ação politica, mas, como stfuxico, com tudo, apolha a sacanagem em nome da permanência dos mesmos de sempre, o país só vai pro brejo, pro brejo e pro brejo. Explodimo-nos, sempre.

  2. A Máquina do Ódio. Notas de uma repórter sobre Fake News e violência digital. Patrícia Campos Mello, Cia das Letras, 2020

    Capítulo 1. A eleição do WhatsApp no Brasil. Páginas 39/40

    “Uma checagem da Aos Fatos desmentia o vídeo que dizia que, para combater a homofobia, o PT havia distribuído em creches mamadeiras com bico de borracha em formato de pênis. A Agência Lupa fez a checagem de uma das mensagens, que mostrava uma antiga postagem de Olavo de Carvalho acusando um livro de Fernando Haddad de defender sexo entre pais e filhos. O livro Em defesa do socialismo, lançado em 1998 pela Editora Vozes, não faz menção ao incesto nem defende a ideia de que o “tabu do incesto” precise ser derrubado para implantar o socialismo.

    Muitas pessoas se perguntam: mas quem será que acredita nessas bobagens?

    Muita gente.

    De acordo com uma pesquisa Datafolha de outubro de 2018, 46% das pessoas liam sobre política e eleições pelo WhatsApp; também 46% das pessoas se informavam pelo Facebook. Entre os eleitores que se serviam do WhatsApp, 47% acreditavam, muito ou um pouco, nas notícias que recebiam pelo aplicativo. Entre os eleitores de Bolsonaro, 52% acreditavam, muito ou um pouco, nas notícias que chegavam pelo aplicativo, contra 44% dos que votavam em Haddad.”

    *********

    O TSE não está aparelhado para lidar com isso, são todos analógicos, não entendem o alcance das Fake News, não querem entender e têm raiva dos que entendem. Vão cozinhar o galo. Na semana que vem, a eleição de 2020 já será passado. Os processos vão criar teias de aranha, antes de morrerem por inanição.

    Em 2022, retomarão a indignação seletiva. Para ser retomada em 2024.

  3. “Para Paula Campos Pimenta Velloso, professora do Departamento de Direito da Universidade Federal de Juiz de Fora, “um julgamento assim só avança se os interesses se afinarem nesta direção”.

    ELA AVALIA QUE “TRATA-SE DE UM JULGAMENTO POLÍTICO. SEU TEMPO E SEU RESULTADO ESTÃO CONDICIONADOS À CONJUNTURA, AOS INTERESSES ORGANIZADOS POLITICAMENTE, DOS QUAIS OS TRIBUNAIS SÃO CONHECIDOS OPERADORES. TRADICIONALMENTE, TAIS INSTITUIÇÕES E SEUS ATORES ATUAM COMO FILTROS LEGITIMADORES, CAPAZES DE APRESENTAR INTERESSES COMO RESULTADOS DE PROCEDIMENTOS RACIONAIS E OBJETIVOS”, AFIRMOU.”

    A reportagem poderia ter se encerrado aqui.
    Como dizia o slogam do mandato de Genoíno: “A luta faz a lei” e…vamos combinar, a pandemia não nos ajuda em nada, somente os amantes da postergação, como parece ser todos do TSE.

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