Usar dados do Coaf sem autorização é promiscuidade, diz Marco Aurélio concordando com Toffoli

‘Sob o meu modo de ver, é promiscuidade, e não contribui para a segurança jurídica’, disse Marco Aurélio que é relator do caso no Supremo

Jornal GGN – O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Dias Toffoli, decidiu nesta segunda-feira (15) suspender, a nível nacional, as investigações criminais que envolvam relatórios que especifiquem detalhes de dados bancários de órgãos de controle – como Coaf, Receita Federal e Banco Central – sem que tenha havido antes autorização da Justiça.

O recurso foi levado à Corte pela defesa do senador Flávio Bolsonaro para barrar as investigações do Ministério Público do Rio de Janeiro, iniciadas a partir de informações do Coaf. O relator do processo no Supremo, é o ministro Marco Aurélio Mello, mas como o período é de recesso, quem recebeu o recurso foi Toffoli, como ministro do plantão judicial. Ele decidiu suspender por liminar (decisão provisória) todas as investigações iniciadas a partir de compartilhamentos de informações financeiras entre órgãos de controle e órgãos de investigação, até que o Supremo julgue o recurso, o que está previsto para acontecer em novembro.

Em entrevista à BBC News Brasil, Marco Aurélio disse que concorda com o argumento da defesa de Flávio, sobre o compartilhamento de informações bancárias e fiscais entre o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) e o Ministério Público do Rio, sem prévia autorização judicial.

“Isso, sob o meu modo de ver, é promiscuidade, e não contribui para a segurança jurídica”, pontuou. Por outro lado, o ministro disse ter dúvidas se a decisão pode suspender todos os casos que se encaixam em um recurso com repercussão geral. Acontece que a decisão de Toffoli foi baseada nesse princípio, encontrado no artigo 1.035 do Código de Processo Civil. Procuradores da Lava Jato, inclusive, se manifestaram preocupados com os efeitos do ato sobre investigações em andamento.

“É um artigo que eu tenho sérias dúvidas quanto à constitucionalidade. Esse artigo revela que o relator pode suspender os processos que corram sobre a matéria que já tenha sido admitida a repercussão geral, no país inteiro. É um poder muito grande”, avaliou Marco Aurélio.

Um dos pontos do artigo destaca que “reconhecida a repercussão geral, o relator no Supremo Tribunal Federal determinará a suspensão do processamento de todos os processos pendentes, individuais ou coletivos, que versem sobre a questão e tramitem no território nacional”.

“Agora, quanto à matéria de fundo, eu tenho votado nesse sentido: só quem pode afastar a privacidade —e nós estamos aí a cogitar dados econômicos, financeiros, do cidadão Flávio Bolsonaro— é o Judiciário”, completou Marco Aurélio.

A BBC News Brasil questionou também se a investigação contra Flávio Bolsonaro poderia ser encerrada caso a maioria do STF se posicione concordando com o ato de Toffoli, contra esse tipo de compartilhamento. A resposta do relator foi que não.

“Não, é só recorrer ao Judiciário e pedir ao Judiciário que ele afaste o sigilo. É tão fácil, o protocolo do Judiciário está sempre aberto. Por que não recorrem? Aí partem para esses convênios esdrúxulos de compartilhamento”, criticou.

Na decisão recente, Toffoli criticou a inclusão de dados de inteligência no material da acusação sem a autorização da Justiça e que tragam mais do que “a identificação dos titulares das operações bancárias e dos montantes globais”. Portanto, os relatórios repassados pelo Coaf ao MP não poderiam trazer o detalhamento dos recursos movimentados, o que poderia caracterizar uma quebra de sigilo não autorizada.

Entenda a investigação e o argumento da defesa de Flávio

Em novembro a Corte deve analisar um recurso do Ministério Público Federal contra uma decisão do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3) que anulou uma ação que envolvia dados compartilhados pela Receita ao MPF sem prévia autorização judicial. O Ministério Público alega que o compartilhamento se deu dentro das margens legais.

O MP do Rio de Janeiro investiga possíveis crimes de peculato, lavagem de dinheiro e organização criminosa envolvendo Flávio Bolsonaro e ex-assessores que trabalharam para ele no gabinete da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alert), quando deputado estadual.

A investigação começou há mais de um ano e foi levantada pela movimentação atípica de R$ 1,2 milhão, durante o ano de 2016, na conta bancária de Fabrício Queiroz, ex-assessor de Flávio.

O volume da movimentação chamou atenção do Coaf, órgão de inteligência que atua contra a lavagem de dinheiro. Ele recebe informações de instituições financeiras de todo o país quando elas encontra operações consideradas atípicas. As investigações do Ministério Público do Rio, portanto, partiram de relatórios do Coaf de movimentações financeiras de Queiroz que, além de ex-assessor de Flávio, é policial militar aposentado e se apresenta como comerciante de veículos usados.

O Coaf identificou ainda o depósito de um cheque de R$ 24 mil na conta da primeira dama, Michelle Bolsonaro, e uma série de depósitos de R$ 2.000, totalizando R$ 96 mil na conta de Flávio Bolsonaro. Com isso, o MP do Rio suspeita da prática da “rachadinha”, quando servidores devem devolver parte do salário para os deputados.

Em maio, a pedido do Ministério Público, a Justiça decretou a quebra de sigilo fiscal de Flávio, Queiroz e outros ex-funcionários de gabinete do filho do presidente. O jornal O Globo revelou a decisão, que corria em segredo de Justiça, em abril.

A defesa de Flávio alega que, bem antes de obter a quebra de sigilo na Justiça, o MP do Rio se adiantou nas investigações obtendo dados, supostamente, mais apurados do Coaf, extrapolando as informações sobre identificação dos titulares das operações bancárias e dos montantes globais.

*Com informações da Folha de S.Paulo

Redação

9 Comentários

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  1. E manter preso antes de transitado em julgado gente contra quem não há prova, contra os ensinamentos mais elementares da Justiça e do Direito?
    Mais um querendo ficar bem com a famiglia?
    Eu até achava que tinha dois que se salvavam no stf, mas agora tenho certeza de que não merecem nenhum tipo de defesa, que merecem ser xingados e ameaçados por gangues de amarelo em ruas e redes.
    Bando de… juízes, rs. Agora a palavra juiz tem novo significado no meu dicionário, palavrão de baixíssimo calão e escalão mas altíssimos ganhos, um bom sinônimo de estelionatário, ladrão, picareta, salafrário, trapaceiro, trambiqueiro, gigolô, agiota, santarrão, fariseu, canalha, mau servo.
    Diz-se que Jesus teria dito, em versão não literal, obviamente, nem sequer de seus evangelistas, rs: “ai daquele que não faz justiça nem permite que se faça.” Os pseudogarantistas, seletores de frequências favoráveis dos demagogos e atuais invasores do poder, são piores que a gangue de Curitiba, porque ainda exploram uma falida esperança de justiça.

    Sampa/SP, 17/07/2019 – 14:30

    1. Concordo, mas porque só agora? Porque não antes? E as outras ilegalidades vão continuar ao arrepio da CF? Prisão sem o trânsito em julgado de pessoas que não são ameaças a sociedade, pode? Até quando?

  2. Estou em lagrimas. Chacoalhando de felicidade.

    Depois de vazamento da receita sobre Toffoli, subitamente… ja nao vale o que valeu antes…

    Operacao Fariseus mais uma vez…

    Quem vai ter os proximos vazamentos vai ser o Intercept???

  3. É função precípua do COAF identificar movimentações financeiras atípicas e informá-las às autoridades competentes. No caso, o MP.
    Se for para ceifar tal manifestação do COAF, melhor extinguir o órgão, pois ficaria sem função.
    Não faz sentido o COAF pedir autorização judicial para, simplesmente, cumprir suas obrigações legais.
    Ao receber a comunicação de atipicidade financeira do COAF, cabe ao MP abrir investigação para apurar a veracidade e a gravidade das ações suspeitas comunicadas pelo COAF. Esta é sua função. Dever de oficio. Não faz sentido pedir autorização judicial para exercer o que é sua obrigação.
    Se confirmadas as suspeitas, o MP faz uma Denuncia ao poder judiciário, que poderá acatá-la ou não. Apenas neste momento, o juiz que recebeu a denúncia passa a participar do processo.
    Em seguida, o juiz decidirá se acata ou não a denuncia. Se acatar, dá início à Ação Penal e o suspeito torna-se réu.
    Proibir o MP ou a PF ou a PC de conduzir investigação preliminar diante de graves suspeitas de movimentações financeiras atípicas, significa retirar de taís órgãos o direito e o dever de investigar, sua função constitucional.
    Totó Folli atua prematuramente em procedimento preliminar feito rigorosamente dentro da lei. Atua em favor da impunidade e da procrastinação.

  4. O Marco Aurélio está coberto de razão.
    A midia é que se precipitou ao interpretar o entendimento dele que, na verdade, põe em dúvida o
    ” notável saber jurídico ” do parvo Toffolli.
    Toffolli valeu-se de um preceito equivocado para fundamentar seus argumentos e com isso pôs em perigo todas as investigações pendentes suspendendo-as, em vez de ater-se ao processo do filho do bozo.
    Se há uma cidadão incapacitado para o exercício da alta magistratura, esse é o ministro presidente do “supremo com tudo”.

  5. O negócio do STJ é o seguinte:
    – Para os amigos a Lei!
    – Para os inimigos os rigores da Lei!
    Porém, em alguns casos a decisão poderá ser homologada fora da Lei.

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