Vaza Jato: PF gravou 22 telefonemas de Lula mesmo após ordem para interromper

Conversas mantidas em sigilo no âmbito da Lava Jato enfraquecem a tese de Moro de que ex-presidente buscava assumir ministério para suspender investigações contra ele

Foto: Lula Marques

Jornal GGN – Os procuradores da Lava Jato sabiam que a divulgação do diálogo entre a então presidente da República, Dilma Rousseff, e Lula, foi ilegal, porque a captação ocorreu horas depois do fim da ordem judicial. Eles ainda demonstraram preocupação com as consequências que sobrevieram sobre o então juiz Sérgio Moro, responsável por permitir a divulgação do pacote de grampos de conversas entre Lula e pessoas próximas.

A revelação foi divulgada neste domingo (08) pela Folha de S.Paulo em parceria com o Intercept Brasil, site que recebeu de uma fonte anônima mais de 3.000 páginas de conversas de procuradores da força-tarefa da Lava Jato e que revelam que o então juiz Sérgio Moro e os procuradores, incluindo o coordenador do grupo no Paraná, Deltan Dallagnol, agiram à margem da lei discutindo processos e atuando em parceria.

Às 18h32 do dia 16 de março de 2016, a Globo News noticiava que a então presidente Dilma fora grampeada e uma cópia da transcrição do diálogo que ela tivera com Lula naquela tarde foi lida ao vivo. Em pouco tempo, em Brasília, vários manifestantes se aglomeraram em frente ao Palácio do Planalto para protestar contra o governo. Paralela à revolta popular, deputados da oposição pediam a renúncia de Dilma no plenário da Câmara, levando a um encerramento tumultuado da sessão naquele dia.

O áudio acelerou o processo de derrocada do governo Dilma. Alguns dias antes, a presidente negociava entregar o cargo de Ministro da Casa Civil para Lula. A estratégia era avaliada pela oposição e membros da Lava Jato como uma forma de o ex-presidente tentar escapar da Lava Jato. Obtendo foro privilegiado, as investigações contra Lula, caso se tornasse ministro, passariam a correr no Supremo Tribunal Federal, em Brasília, não mais sob a jurisdição de Moro.

Após a decisão da Justiça para que os grampos fossem suspensos, a PF ainda captou 22 telefonemas do ex-presidente Lula, isso porque as operadoras de telefonia demoraram para cumprir a ordem de Moro e o sistema usado pela PF continuou captando as ligações. Entre os diálogos grampeados estavam dois entre o então vice-presidente Michel Temer e Lula.

A maioria dos diálogos demonstrou que Lula não tinha interesse em assumir a pasta da Casa Civil, mas sim fazer conciliação com políticos e partidos para reverter a crise política.

Nas conversas analisadas na reportagem Folha-Intercept, Lula disse para algumas pessoas, incluindo seu advogado Cristiano Zanin Martins, o ex-ministro Franklin Martins e o presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Vagner Freitas, que não queria se tornar ministro e, ainda, que aceitava assumir o cargo por pressão das pessoas próximas.

“O tom foi outro nas conversas com políticos. As anotações da PF indicam que Lula expressou a todos entusiasmo com sua ida para o governo, apostando em sua capacidade de recompor a base de apoio a Dilma no Congresso e promover mudanças na política econômica”, prossegue a reportagem.

Na época, já se sabia que a gravação de conversa entre Dilma e Lula havia ocorrido depois da ordem judicial de interrupção das escutas telefônicas contra o petista. O fim da coleta de dados telefônico ocorreu às 11h12 do dia 16 de março de 2016, e a conversa em que Dilma liga para o celular de um dos seguranças de Lula foi às 13h32. A cópia do áudio foi anexada aos autos pela Polícia Federal às 15h37.

No diálogo, Dilma combinava a entrega do termo de posse de ministro a Lula “em caso de necessidade”. O ex-presidente concordou e acertou com Dilma que só tomaria posse na semana seguinte, no dia 22.

A reportagem Folha-Intercept ressalta que o impacto dessa última conversa foi imediato entre os procuradores da Lava Jato, ao contrário de outros telefonemas trocados entre Lula e políticos, incluindo com o então vice-presidente Michel Temer.

“Estao preocupados se vamos tentar prende-lo antes de publicarem no DOU [Diário Oficial da União] a nomeação do Lils [iniciais do nome completo de Lula]”, escreveu o agente da Polícia Federal Rodrigo Prado em um grupo com membros da força-tarefa da Lava Jato no Telegram.

O procurador Athayde Ribeiro da Costa respondeu concordando: “já é calro. mais isso demonstra ainda mais o desvio de finalidade da nomeação”. A transcrição das mensagens manteve a grafia original dos arquivos obtidos pelo The Intercept Brasil.

A hipótese de que Lula aceitava a nomeação como ministro para travar as investigações contra ele foi usada pelo então juiz da Lava jato para justificar o ato de tornar público o diálogo entre Dilma e o petista.

Em despacho divulgado em 17 de março de 2016, Moro primeiro disse que “não havia reparado antes no ponto”, da conversa entre Dilma e Lula, mas também não via com “maior relevância” o diálogo.

“A circunstância do diálogo ter por interlocutor autoridade com foro privilegiado [Dilma] não altera o quadro, pois o interceptado era o investigado e não a autoridade, sendo a comunicação interceptada fortuitamente”, escreveu Moro.

“Nem mesmo o supremo mandatário da República tem um privilégio absoluto no resguardo de suas comunicações, aqui colhidas apenas fortuitamente, podendo ser citado o conhecido precedente da Suprema Corte norte-americana em US v. Nixon, 1974, ainda um exemplo a ser seguido”, continuou Moro que deixou a magistratura para assumir o Ministério da Justiça no governo Jair Bolsonaro (PSL).

Outras conversas mostravam, na verdade, que Lula estava empenhado em buscar uma reaproximação com Temer e o MDB. Em duas conversas captadas pela PF, os dois marcaram uma reunião e Lula disse a Temer que a rejeição enfrentada pelos políticos numa recente manifestação pró-impeachment mostrava que a Lava Jato colocava em risco todos os partidos, não apenas o PT.

“Embora os registros mostrem que os policiais prestaram atenção a todas as conversas do ex-presidente, o telefonema de Dilma foi o único que a PF anexou aos autos da investigação sobre Lula nesse dia antes que Moro determinasse o levantamento do sigilo do processo”, pontua a reportagem Folha-Intercept mostrando ainda que, logo quando obteve a conversa entre Lula e Dilma, o agente da Polícia Federal, Rodrigo Prada alertou os investigadores da Lava Jato.

Os procuradores registraram ainda preocupação com as consequências que Moro poderia sofrer por ter divulgado os grampos.

“Estou preocupado com moro! Com a fundamentação da decisão. Vai sobrar representação para ele”, disse o procurador Orlando Martello no Telegram.

“Vai sim. E contra nós. Sabíamos disso”, respondeu Carlos Fernando dos Santos Lima. Para a procuradora Laura Tessler, porém, a opinião pública iria garantir a proteção à força-tarefa da Lava Jato e Moro: “população está do nosso lado…qualquer tentativa de intimidação irá se voltar contra eles”, escreveu.

“Se acontecer algo com moro renúncia coletiva de MPF, pf e RF [Receita Federal]”, prosseguiu Orlando Martello. Mas Laura foi contra e sugeriu que a melhor resposta seria mover uma ação contra Lula e pedir sua prisão.

*Clique aqui para ler a reportagem da Folha-Intercept na íntegra.

Redação

15 Comentários

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  1. Vaza-jato de hj traz uma demonstração contundente da politização da LJ, instrumentalizada para derrubar o governo Dilma. A natureza política do processo-crime contra Lula apresenta-se nua, crua e escancarada, com potencial para repercutir internacionalmente, inclusive no comitê DDHH da ONU. Há que se chamar STF, cnmp, etc, na chincha, na responsa. Não dá mais pra esses órgãos se omitirem, sem que haja prejuízo irreparável às biografias dos atuais membros, com imputação de inexorável cumplicidade. Tvz esse vaza-jato de hoje seja um dos mais graves dentre todos. Traz a vergonheira que faltava para, quem sabe, propiciar a inflexão do Supremo, que, por ora, vinha desempenhando sem consciência plena (a desculpa, doravante não vale mais) a função de co-perseguidor de uma liderança política referida com ódio, zombaria e preconceito – “9 dedos” – por procuradores e juízes politiqueiros escondidos sob suas becas e togas, que debochavam das escutas e vazamentos ilegais que promoviam para interferir na política nacional. Esse vazajato de hoje tb traz clareza, para parte da população que seguia vendada, qto o grau de empulhação manipuladora a que foi submetida.

  2. se o interceptado era o ex-presidente, porque estavam interceptando o telefone do segurança, já que a conversa que pinçaram e passaram para a globo foi da Dilma com o telefone deste segurança?
    No mais, se foi DD o dedo duro que usava a globo, se tem neste evento suas conversas para o golpe lavajatista-nada-republicano.

  3. Para Nassif se possível responder: Alguém escreveu, hoje, que cabe a Gilmar Mendes pedir desculpas a Lula por ter impedido sua nomeação na Casa Civil. Mas penso que cabe mais de isso ao Ministro, pois se ele se inteirar dessa reportagem e sentir-se enganado por Moro (assim como todos, acredito, sentimos que ele foi), penso que lhe caberia conduzir Moro coercitivamente até seu gabinete no STF, exigir explicações convincentes e, se Moro não o convencer, decretar a prisão do cafajeste, mesmo que temporariamente, até que se produzam investigações sérias sobre a atitude do cafajeste. Mas penso que todo o bando de Curitiba, Dalagnol à frente, também deveriam ser detidos até o fim das investigações (para que não possam eliminar provas). E que Gilmar aproveitasse também para convocar quem investigou o “acidente” que matou Teori, pois o grande beneficiado (moro) pode muito bem ter seu dedinho nesse assassinato (isto é convicção nossa, sem provas, mas para eles próprios, da Fraude a Jato, o que vale é ter convicção). E onde entra o Nassif nessa história? Bem, dia desses li que houve reatamento de relações entre Nassif e Gilmar…donde até caberia que ele conversasse com o ministro…….pois não dá para deixar tudo isso sem tomada firme de atitude por parte de Gilmar, pois para muita gente ele foi culpado pelo impeachement quando anulou a nomeação de Lula à Casa Civil.

  4. Que ninguém se engane…
    Moro só consegue enganar quem deseja ser enganado

    e enganou Gilmar que enganou Dilma, porque ela ainda era Presidente e não foi protegida como manda a Constituição

  5. Tenho calafrios só em pensar como estariam as coisas sem o “hacker” e sem o Intercept. Não tem perdão, deveriam todos ser condenados a 1/2 prisão perpétua com direito a condicional após cumprir 1/6 da pena. Não me venham com paredon, não, isso seria só vingança, não justiça, eles não cumpririam pena nenhuma (O segredo do seus olhos, filme argentino). REALIDADE : Eles grampearam ilegalmente, politizaram a questão assumindo o lado deles, fizeram chacota com investigados, tramaram, queriam se locupletar, enfim, fizeram tudo o que sabemos que fizeram conforme as revelações até agora. IMAGINAÇÃO : Eles encontraram podres de Dilma, de Lula, dos investigados. Contas em paraíso fiscal, propinas recebidas, bunker com malas de dinheiro, conluio com milícias, rachadinhas, etc., etc., etc.. As ilegalidades e anormalidades na investigação seriam tidas (nem mesmo assim deveriam) como filigranas. Um fim, que por ser nobre, justificaria os meios. Mas não, toda anormalidade, toda ilegalidade, só comprovam a inexistência de qualquer crime, de qualquer mal feito, da lisura da presidenta e do presidente. E como eles agiram diante desses dados ? Paro, estou tendo náusea, preciso ir ao banheiro. E sentindo calafrios.

  6. Cadeia já! Moro na cadeia já! A incompetência do MPF e da Polícia Federal em combater a corrupção por meios legais os transformou em criminosos piores que os corruptos e ladrõe. Quem é mais decente? Lula ou Sérgio Moro? Vazem tudo, depois deixem o povo escolher quem é mais decente.

  7. A divulgação da gravação do telefonema entre Dilma e Lula – especialmente por ter a ligação partido de Dilma – coloca Sérgio Moro, Dallagnol e todos os envolvidos na Lava Jato no mesmo lugar do hacker-fonte do The Intercept. Exatamente o mesmo crime só que com um agravante: as pessoas da Lava Jato são funcionários públicos. Mas com uma facilidade a mais para punição: o hacker é anônimo; as pessoas da Lava Jato estão identificadas e continuam soltas e com seus cargos, podendo até, em continuidade delitiva, sabotar as investigações.

    E da mesma forma que não se fala em punir a firma “Globo” não há como criminalizar o que faz Gleen Greenwald. A divulgação da Globo é apenas mais calhorda porque tem outra intenção que não o interesse público, intenção esta absolutamente cristalina pela constância da demonização do PT.

    Uma questão: a firma que entregou as gravações ilegais a Moro estava descoberta de mandato, estava não? Será que essa firma não deveria ser inquirida sobre o porquê de ter cometido esse crime? Pressão de Moro? Ou delinquiu de boa vontade?

  8. Infelizmente nada vai acontecer, mesmo que os envolvidos venham a público e confessem que forjaram tudo para derrubar o PT do governo e prender o Lula. Infelizmente o brasileiro esquece muito rápido dos acontecimentos. Hoje ninguém mais se lembra do que disse o senador Romero jucá. “Com o Supremo com Tudo”. Onde o contudo nada mais era que as Forças Armadas. Ninguém do Supremo vai empunhar a bandeira da legalidade agora, muito menos sabendo que as Forças Armadas estão do lado dos golpistas. Retrocedam a 2014 antes das eleições, já haviam irregularidades aos montes em favor do Aécio. O TSE não moveu um dedo para coibi-las, e ao término das eleições onde o Aécio declarou que daquele dia em diante “seria oposição ao Brasil” o TSE se apressou para ver se arrumava alguma desculpa para cassar a eleição da Dilma. A Lava Jato atuando desde então, não foram poucas as denuncias ao STF e o que ele fez? Absolutamente nada. Não seria agora que eles fariam alguma coisa, aliás se tivesse algum ministro honesto no STF eu já estaria preso desde 2014, pelas mensagens que eu mandei para eles.

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