Os comentaristas consultores da CNN

Conclusão: o problema não é criticar ou não o governo Dilma e Lula. Mas saber separar o que é lobby do que é crítica jornalística consistente.

É curiosa a iniciativa da CNN de trazer consultores para seu quadro de comentaristas. Com exceção de algumas grandes consultorias, o consultor, em geral, tem que refletir o pensamento médio de sua clientela. 

Quando fala para dentro, ele ajuda a clientela a se posicionar frente à conjuntura econômica e política. Quando fala para fora, em geral meramente endossa posições políticas e/ou econômicas de sua clientela. Atua como lobista, especialmente quando inclui na análise jabotis com intenções políticas..

Confira quatro situações na mesma emissora, de críticas ao governo Dilma.

1. O consultor-comentarista político diz que a crise atual é reflexo da crise de 2016, que, por susa vez, foi provocada por decisões do governo Lula (que saiu em 2010). Daqui a pouco atribuirá a Lula a pandemia da Covid. Na economia, há certa defasagem entre decisões e consequências. Lula deixou o governo com indicadores macro-econômicos sólidos, relação dívida/PIB, superávit primário. Os indicadores se deterioraram quando o PIB começou a cair. E o PIB começou a cair por decisões tomadas por sucessivos governos, incluindo Michel Temer e Jair Bolsonaro. Portanto, estabelecer relações entre 2010 e 2016 e, dai a 2022, é política pura, lobby puro.

2. O economista-consultor-comentarista diz que a estagnação da economia e crise do emprego brasileiro começaram em 2013. 2013 e 2014 registraram os menores índices de desemprego da história. A crise começa com o fim do ciclo das commodities e a estratégia atrapalhada de contornar os números em 2014. Puxando para 2013, o consultor pretende transformar erros de 2015 em falhas intrínsecas do modelo econômico em voga. Sempre que ouvi-lo, anote que, no meio das suas análises, ele coloca jabutis.

3. A âncora da tarde da CNN, Daniela Lima, que não é consultora, acusa Dilma Rousseff por erros cometidos no represamento dos preços do petróleo e na tentativa de mudar o preço da energia elétrica em 2014. A crítica é correta. E merece boa discussão.

4. A comentarista Renata D´Agostini faz um levantamento técnico competente das discussões sobre mudanças na legislação trabalhista, colocando os argumentos de todos os lados e as perspectivas do debate. Não é consultora.

Conclusão: o problema não é criticar ou não o governo Dilma e Lula. Mas separar o que é lobby do que é crítica jornalística consistente. E os jornalistas-comentaristas do canal são bem mais consistentes e imparciais que os consultores-comentaristas.

Luis Nassif

3 Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. Também tem o problema que muito jornalista da grande mídia, ajudou a plantar vento vagabundo para colher tempestade perfeita. Quando os economistas do PT, a exemplo de Mantega e Nelson Barbosa, apontam os problemas criados pelos profetas do caos, eles reagem raivosos acusando as vítimas das artes que praticaram.
    Desde muito cedo, antes mesmo de 2014, só se falava na tal tempestade perfeita que iria tirar o PT do governo. O bando de irresponsáveis jogou todos os escrúpulos no lixo para embarcar na missão dos patrões e do Dr. Mercado.

  2. Luis Nassif,
    Você também comete os seus pecados. Primeiro não identificou nenhum consultor-comentarista político. Uma coisa é uma opinião de Delfim Netto que pode ter amplo conhecimento de economia, mas que emite opinião segundo os interesses de quem ele serve, e outra coisa seria a opinião de por exemplo Mario Henrique Simonsem que provavelmente tinha tanto conhecimento como Delfim Netto, mas que emitia opinião segundo o conhecimento e o interesse dele.
    Um segundo pecado foi quando você chega a identificar alguém, “a âncora da tarde da CNN, Daniela Lima”, e você acrescenta que ela não é consultor-comentarista. Ocorre que ela provavelmente não é nem mesmo economista e isso deveria ser informado.
    E terceiro, no caso de Daniela Lima, você diz que ela “acusa Dilma Rousseff por erros cometidos no represamento dos preços do petróleo e na tentativa de mudar o preço da energia elétrica em 2014.” Dizer isso seria suficiente, mas você diz mais. Se o mais fosse o que você diz no final você estaria de parabéns, pois você diz no final que a crítica de Daniela Lima “merece boa discussão”.
    Sim, a crítica de Daniela Lima “merece boa discussão”. Qual era o preço do petróleo no mercado international em 2014 e em 2015? Qual era o câmbio em 2014 e em 2015? Agora, o preço de energia no mercado interno está mais alto ou mais baixo do que o praticado em 2014 e em 2015? E o Brasil, como produtor de petróleo e como produtor de energia das hidroelétricas, deve manter o preço de energia em paridade com o mercado internacional ou deve manter mais baixo para ganhar competitividade comparativa no setor industrial?
    Ocorre que do alto do seu conhecimento econômico você, depois da frase em que você diz que a Daniela “acusa Dilma Rousseff por erros cometidos no represamento dos preços do petróleo e na tentativa de mudar o preço da energia elétrica em 2014,” você diz que a crítica de Daniela Lima é correta. E só depois disso, talvez já arrependido por chancelar a crítica sem discussão da Daniela Lima você diz que a crítica dela “merece boa discussão”.
    Então se você que, como provavelmente a Daniela Lima ou como a mim, que nem economista sou, chancela uma crítica sem discussão da Daniela Lima porque consultores comentaristas que podem até ser economistas não podem fazer crítica semelhante.
    Aliás, como venho dizendo há tempo a crítica ao primeiro governo da ex presidenta às custas do golpe Dilma Rousseff merece uma análise mais profunda. É análise para um curso de pós-graduação em que se levaria em conta os efeitos das manifestações de junho de 2013. Não é um curso só para economistas, mas também para cientistas políticos.
    E do mesmo modo deveria ser o entendimento para o segundo governo. Seria preciso um curso de pós-graduação em que se levasse em conta pelo menos duas possibilidades: manter a política econômica de Guido Mantega ou adotar a política econômica tão bem explicitada no artigo de Fernando Nogueira da Costa, intitulado “Tática fiscalista e estratégia social-desenvolvimentista” de quinta-feira, 03/12/2014, e que foi publicado no blog dele, no blog Brasil Debate e também no seu blog.
    E não haveria como fazer essa discussão via curso de pós-graduação só para economistas, pois seria preciso levar em conta o Congresso Nacional que fora eleito em 2014, e que só deu no Senado cerca de 22 votos contra o impeachment.
    Clever Mendes de Oliveira
    BH, 09/01/2022

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador