A esquerda e a militância na internet

No Tecedora 

A esquerda real e a internet

Do Poblet 
Dica de Sergio Pecci 
Texto de Carlos Martínez
Tradução de Denise Queiroz 

São muitas as pessoas de esquerda que, na América Latina, acompanham as notícias da Espanha através dos meios alternativos como Rebelión, Insurgente, Kaos, Tercera información. Tendo em vista a presença muito importante nestes sítios de organizações como Izquierda Anticapitalista, Equo e outras, esse leitores não entendem os parcos resultados eleitorais. Igualmente não entendem, observando o triunfalismo de muitos textos publicados nesses meios, como na Espanha não haja uma revolução ocorrendo ou tenha diminuído, em parte, o movimento 15-M. Ou como não aparecem novos sindicatos à margem dos tradicionais.

É verdade que as eleições servem para muito pouco, mas se podemos utilizá-las como uma radiografia da sociedade, é uma pesquisa que cobre 100% da população com direito a voto. Os resultados destas últimas eleições deram um banho de realidade nos que vivem a política através de sua conexão ADSL. 

Antes da democratização da Internet, os que nos considerávamos vermelhos sofríamos a síndrome do cachorro verde. Nos sentíamos estranhos num meio social que nos parecia alheio, éramos ilhas num oceano de conservadorismo. Com a chegada da rede, surgiram os primeiros meios de comunicação alternativos. Depois, através do correio eletrônico, ou dos grupos de notícias, começaram a ser criadas as primeiras comunidades sociais entre pessoas de esquerda (igualmente as que se criaram com pessoas de outros interesses, desde a filatelia até o aeromodelismo). 

Estas redes cresceram e se fortaleceram com o sucesso do Facebook primeiro e depois do Twitter, entre outras. O que nos transportou a outro extremo: submergimos em uma bolha junto com nossos “afins” e passamos a pensar que agora somos todos vermelhos, que somos uma legião e que temos muitos amigos e ou seguidores. 

Em recente conversa com o jornalista Pascual Serrano, ele confessou que, apesar de receber montões de e-mails, de ser muito lido na Internet e de ter alcançado certo sucesso no campo editorial, sua transcendência social se limita a um círculo ideológico muito pequeno. A prova é que seus vizinhos ou família não conhecem praticamente nada de sua atividade ou pensamento. Imagino que essa experiência possa ser posta a praticamente todos os blogueiros, tuiteiros, etc. 

Internet é um fabuloso meio, barato e sem fronteiras, onde podemos criar nossos meios de comunicação e difundir convocações. Mas, enquanto militantes de esquerda, devemos nos vacinar contra os efeitos colaterais que produz: isolamento da vida real, percepção de que somos maioria, e do ego inflado, nos casos mais agudos. 

Façamos a seguinte prova: 24 horas depois de escrever um post em nosso blog, um artigo sério em nosso meio alternativo de referência ou um tuíte, imprimamos e oferecemos a nossa família, vizinhos, amigos do bairro ou companheiros de trabalho para que leiam. Comprovemos quantos deles formavam parte dessas centenas de leitores que tivemos na rede. Depois, escutemos suas opiniões que, quem sabe, sejam mais interessantes das que colhemos na Internet dos que pensam como nós. 

Sem dúvida, é muito mais fácil apertar o botão curtir ou dar RT do que distribuir panfletos nas portas das fábricas. Mas este último é o trabalho militante que devemos valorizar. Como diz meu amigo Serrano, não podemos aceitar o termo ‘ciberativismo’ assim como não podemos ‘cibercomer’. 

Também é preocupante o modo pelo qual se transmitem entre gerações os valores da esquerda. Somos muitos os que acreditamos que são transmitidos de maneira mais eficiente através do exemplo que das palavras. Quantas famílias tem que agüentar o discurso de esquerda de um de seus membros e depois suportar seu comportamento egoísta, machista ou autoritário? 

Na web podemos ter tantas vidas quanto o tempo que estivermos dispostos a dedicar e manter diferentes perfis nas redes sociais. Mas a vida real é uma só, e algumas vezes curta, sem tempo para consertar. Nela devemos ser honrados, coerentes, combativos e solidários. Que as pessoas comprometidas com a superação do capitalismo sejam autênticas referências éticas é algo insubstituível pela comunicação escrita, e menos ainda a distribuída no mundo virtual. 

Deve-se usar a internet para propagar nossas idéias, deve-se ter e participar ativamente de meios alternativos de comunicação. Também é especialmente importante a correta utilização das redes sociais para atrair jovens às nossas teses e organizações, mas nunca se deve abandonar a militância na vida real 

Deveríamos fazer com nós mesmos o que fazemos com nossos filhos: impôr limites à Internet, dedicar as mesmas horas para expressar nossas opiniões em rede como fora dela ou falar com tantos amigos na rua ou no trabalho quanto na rede. De outra maneira, perderemos o contato com a realidade, e isto é a última coisa que nos podemos permitir. Se não somos capazes de militar na vida real, não deveríamos dar lições na rede aos que lutam por um mundo (real) melhor.

Luis Nassif

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