A política paulista: transição ou crise?

 

Há algum tempo postei aqui algumas reflexões sobre o momento pelo qual passa a política paulista. Elas podiam ser resumidas nas suas frases finais:

“Enfim, parece que vivemos o fim de mais uma etapa. O eixo de gravidade da política parece que se desloca, ainda que lentamente, para fora de São Paulo.

A política paulista é neste momento, pelo menos, no meu entender, um pássaro na muda.”

Pois bem, agorinha mesmo lendo Jânio de Freitas creio que encontrei um inesperado eco àquelas reflexões.

JANIO DE FREITAS

Os dois fenômenos


Kassab é mesmo o político mais importante de São Paulo; como é possível que seja ele o relevo do Estado?


NEGÁ-LO, OU FINGIR que não percebe, não alteram a evidência: com a elevação de Lula a político acima de limites estaduais, Gilberto Kassab, senhoras e senhores, é mesmo o político mais importante de São Paulo. Não será isso um apelo bastante forte para os paulistas ilustrados e os nem tanto se entregarem, afinal, à reflexão que devem há tanto tempo, sobre si mesmos e sua relação com o Estado e o país?
Nem uma só frase sua, nem uma só ideia sua o nome dessa eminência política, com tantos anos de trânsito na vida pública, traz à lembrança. E não é em algum lugar subalterno que Kassab se sobrepõe aos circunstantes. É no Estado das grandes universidades, do poder financeiro e econômico, da imprensa predominante em influência nacional. Como é possível que seja ele o relevo?
Políticos tirados de uma cartola são comuns. O berço malufista em que Kassab surgiu foi o mesmo de onde saiu Celso Pitta, o que explica a união das duas crias até que o segundo sucumbisse à desgraça política. Mas Kassab encontrou outra cartola, mais surpreendente: a de José Serra. Nem com tal ajuda, ainda retribuída por serviços variados, o Kassab prefeito foi além de suas marcas físicas – a peculiaridade da aparência e do timbre de voz.
Não. Teve uma diferenciação no território político, sim. Ficou aí, mesmo inerte e insignificante, mesmo para nada. E à volta os outros foram minguando, ou aturdindo-se, ou errando em cada passo. Os que ainda falam às vezes, falam sem eco. Quem ainda ambiciona, refugia-se no ressentimento e na perplexidade. E o mundo de pujanças que é São Paulo não foi capaz de fazer brotar nada que se mostrasse, na planície árida de um só tronco em pé, apesar de si mesmo.
Gilberto Kassab, sem contraste e sem cerimônia, pode fazer o que quiser. Por mais despropositado que seja. Cria uma representação sua na Inglaterra para ilustrar-se, na preparação da Olimpíada de Londres, para a Olimpíada que será no Rio. Só desmando debochado com os paulistanos, mais um sem reação, ou algum aviso aos cariocas? Nomeia para más particularidades paulistanas conselheiros que nelas não padecem. A respeito, parece-lhe bastante dizer que o faz “em homenagem” a Marco Maciel, atitude que a Maluf custou pesado processo, por também homenagear a seleção brasileira com dinheiro impróprio.
Bem à sua imagem, Kassab lança o tal PSD, partido sem razão de ser e sem uma só ideia definida ainda que alheia. Não é, de fato, partido político. É uma oportunidade para kassabs de diversos calibres e semelhantes propósitos. Não há como concordar, porém, com a ampla opinião de que o PSD não terá maior consequência. As adesões que recebeu na Câmara aproximam-se já de 50 deputados, uma numerosa bancada capaz ainda de crescer, e no Senado incluem já dois parlamentares com probabilidade de mais dois.
O que Kassab traz com seu partido é mais um bando do toma-lá-dá-cá. Com isso, um fator de maior degradação da vida política em suas instâncias institucionais e maiores desvios da atividade parlamentar. Como e por que esse é o realce da política de São Paulo e sua única oferta ao país, eis um fenômeno no melhor sentido da palavra. Em nível semelhante, só a apatia paulista diante dele e da realidade decadente que o produz.

 

Luis Nassif

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