A semana de falácias do general que comanda o Ministério da Saúde, por Lauro Mattei

Para fechar a semana com chave de ouro, o general pediu que seu garoto propaganda anunciasse para a sociedade nesta sexta-feira que estará publicando uma Medida Provisória em breve para confiscar qualquer iniciativa de vacinas de estados

O ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, participa do lançamento do Programa Genomas Brasil no Palácio do Planalto

A semana de falácias do general que comanda o Ministério da Saúde

por Lauro Mattei

Desde sua interinidade à frente do Ministério da Saúde (MS), o general Pazuello vem dando mostras constantes de sua incompetência para lidar com os assuntos da pasta, especialmente no momento em que a pandemia sanitária voltou a afetar duramente todo o país. Mas nas últimas semanas, além desse quesito visível, outro mais agravante ficou evidente nos debates recentes sobre a vacina contra a COVID-19: ele passou a lançar mão de inverdades para esconder seu pecado original. Vejamos alguns fatos que comprovam essas afirmações.

Diante de sua letargia para definir, enquanto órgão de Estado, um plano nacional de imunização da população, bem como de aquisição do antídoto para a doença, governadores estaduais passaram a pressioná-lo por uma definição do assunto, visando evitar que cada unidade da federação tivesse que fazer esta parte por sua conta, como foi no caso das medidas preventivas à doença ao longo de todo o ano, quando de forma irresponsável o governo federal passou grande parte de suas responsabilidades aos governadores estaduais. Nesse compêndio de irresponsabilidades destacam-se: o negacionismo da doença; a falta de planejamento e de ações por parte do governo federal; a difusão de crenças relativas ao uso de medicamentos sem qualquer comprovação de suas eficácias; o desprezo pelo uso de medidas que mitigassem o contágio, particularmente da máscara; o boicote a determinadas vacinas, etc.

Foi nesse clima que o Ministro se reuniu (de forma presencial e virtual) com os governadores dos estados no dia 08.12.20 (terça-feira). Desde o início, a reunião foi marcada por um clima tenso, especialmente quando o ministro foi categórico em afirmar que a certificação de qualquer vacina por parte da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) levaria ao menos 60 dias e só deveria ocorrer a partir do mês de fevereiro de 2021, fato que deixou o governador de São Paulo muito contrariado, uma vez que o mesmo já anunciou que a vacinação da população paulista começaria no dia 25.01.2021. Tal posicionamento do ministro estava ancorado no calendário da vacina preferida do governo federal que será produzida pelo laboratório AstraZeneca e que ainda se encontra em fase final de testes. Além disso, o ministro se comprometeu a apresentar no dia seguinte o Plano de Aquisição e de Vacinação da População, bem como aceitou as ponderações de que vacinas reconhecidas por outras agências reguladoras fossem reconhecidas pela ANVISA em até 72 horas.

Todavia, em coletiva no dia 09.12.20, o pronunciamento do general ministro em coletiva no Palácio do Planalto mais se pareceu com uma biruta de aeroporto, tamanho o grau de falácias de que o mesmo foi acometido. Vejamos algumas pérolas que foram proferidas: 1ª) afirmou-se que o Brasil poderia começar a vacinar sua população ainda no mês de dezembro, caso venha a ocorrer aprovação emergencial de vacina; 2ª) informou-se que o contrato com a empresa Pfizer já estava sendo finalizado; 3ª) que caso a Pfizer recebesse autorização emergencial ela adiantaria doses até final do ano; 4ª) que diante da cobrança dos governadores se comprometia a comprar outras vacinas caso houvesse demanda; 5ª) que essa ação (vacinação) seria centralizada no Ministério da Saúde, pois é uma atribuição do Governo Federal, não podendo existir qualquer plano em paralelo porque o momento é de “unir o país”.

A primeira informação foi desmentida pelo próprio secretário executivo do MS que, em coletiva no dia 10.12.20, foi categórico ao afirmar que o calendário do Governo Federal prevê o início da vacinação a partir do mês de março, não existindo, portanto, nenhuma data definida para o início desse processo. Além disso, ressaltou que até aquele momento o MS não tinha comprado nenhuma vacina.

Quanto ao segundo e terceiro aspectos, coube à própria empresa Pfizer desmentir o falacioso general, revelando que recebeu um memorando do MS datado de 09.11.20, em que o governo manifesta a intenção de aquisição de 70 milhões de doses em 2021, sendo 8,5 milhões para o primeiro semestre e o restante para o semestre seguinte. Além disso, a empresa informou que, mesmo que o contrato seja firmado ainda em 2020, ela não dispõe das doses para entrega imediata. Tal impossibilidade, segundo declarou o CEO da empresa, se deve à demora das negociações com o MS, uma vez que a Pfizer formalizou sua proposta junto ao governo brasileiro há mais de quatro meses, sem nunca ter recebido uma resposta formal até o presente momento.

Quanto ao quarto aspecto, é importante frisar que ainda no mês de outubro, em reunião com os governadores, o ministro assumiu o compromisso público de adquirir 46 milhões de doses da vacina chinesa CoronaVac, decisão esta que foi cancelada no dia seguinte por ordem do presidente da república. Mas a questão aqui é a prepotência e a desqualificação do ministro, uma vez que qualquer leigo no assunto sabe que num país com a dimensão continental como a do Brasil todas as vacinas disponíveis deveriam ser adquiridas para garantir a imunização do conjunto da população. Portanto, não se trata de existir ou não demanda, mas sim de garantir a oferta, pois de antemão sabe-se a procura imensa que as vacinas terão, a não ser que o negacionismo esteja pesando mais alto nesta hora e apostando na não adesão à imunização por parte de uma parcela expressiva dos seguidores dos genocidas que governam o Brasil atualmente.

Quanto ao quinto ponto, registra-se que até o momento não há, além de memorando de intenções, um plano claro sobre o total de vacinas que o país irá comprar, bem como o tipo delas. Esses itens são fundamentais, uma vez que existem muitas especificadas entre as diferentes vacinas que requerem uma logística de armazenamento e de distribuição totalmente distinta. Na verdade, o que se viu até o momento foi a apresentação de um esboço de um plano de imunização com apenas 18 páginas parecido com o que já vinha sendo feito pelo MS para outras campanhas, o que parece ser mais um grande erro, uma vez que essa doença é bem distinta e, por isso mesmo, exige um plano bem mais complexo e rigorosamente organizado. Portanto, ao ser pressionado diante de mais uma incompetência, o que o general fez foi pegar um plano do MS e apresentá-lo como sua estratégia para a imunização das pessoas. Na essência, o que se observa na área da saúde é que a mesma está sob gestão de um general de competências duvidosa e que se curva às maluquices e ignorâncias de seu chefe. Em resumo, o documento apresentado nem sequer pode ser considerado um esboço do que deveria ser um plano nacional de imunização de enfrentamento dessa terrível doença, tamanho é sua superficialidade. E isto é bastante revelador do desastre que tem sido a gestão nesta área crucial para a sociedade brasileira.

Para fechar a semana com chave de ouro, o general pediu que seu garoto propaganda anunciasse para a sociedade nesta sexta-feira que estará publicando uma Medida Provisória em breve para confiscar qualquer iniciativa de vacinas de estados (produzidas e/ou importadas) fora do comando do MS e de seu estapafúrdio plano nacional de imunização.

Desta maneira, o país se encontra nesse atoleiro produzido por um governo que constantemente despreza a vida e que está deixando um lastro de mortes e de destruição institucional, fatos que por si só projetam um presente e um futuro muito sombrios para o conjunto da sociedade brasileira.

Lauro Mattei – Professor Titular do Departamento de Economia e Relações Internacionais e Professor Permanente do Programa de Pós-Graduação em Administração, ambos da UFSC. Coordenador geral do NECAT-UFSC e Pesquisador do OPPA/CPDA/UFRRJ. Email: [email protected]

 

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