A tensão geopolítica na crise da Venezuela

OEA cancela saída da Venezuela e expulsa embaixadores chavistas; China, Rússia e Turquia reconhecem Maduro
 
Foto: Kremlin/Fotos Públicas
 
Jornal GGN – A crise da Venezuela se desenrola numa velocidade cada vez maior no plano geopolítico. Nesta quinta-feira (24) o Conselho Permanente da OEA (Organização dos Estados Americanos) se reune por volta das 14h (horário de Brasília) para cancelar o pedido de desligamento da Venezuela feita por Nicolás Maduro, em abril de 2017, além de anunciar o afastamento de todos os membros do governo chavistas. 
 
O ato é mais uma resposta em apoio ao líder da oposição e chefe da Assembleia Nacional, destituída por Maduro, Juan Guaidó que se declarou presidente interino da Venezuela nesta quarta-feira (23), durante uma manifestação em Caracas. Nicolás Maduro não reconhece a mudança e continua no Palácio de Miraflores.
 
O sucessor de Hugo Chávez, foi reeleito em maio de 2018 e, como manda a lei do país, tomou posse do segundo mandato no dia 10 de janeiro. Seu governo é reconhecido por nações de peso no xadrez geopolítico como China, Turquia e Rússia. Logo após Guaidó se proclamar presidente o interino, Turquia e Rússia reiteram o reconhecimento da legitimidade de Maduro. 
 
Já outros 12 países, incluindo Brasil, Estados Unidos e o secretário-geral da OEA, Luis Almagro, se manifestaram reconhecendo a presidência de Guaidó. 
 
O encontro desta quinta, no Conselho Permanente da OEA, foi pedido por representantes de Argentina, Brasil, Canadá, Chile, Colômbia, Costa Rica, Estados Unidos e Peru. Maduro havia anunciado a saída da Venezuela da OEA, após a organização convocar uma reunião para discutir a situação humanitária do país. O prazo de desligamento se completaria em abril de 2019.
 
Em entrevista à BBC News Brasil, o diplomata Gustavo Tarre Briceno, nomeado por Guaidó como novo representante especial da Venezuela na Organização disse que a decisão do Conselho, além de “acolher a ideia de a Venezuela permanecer no sistema interamericano”, será a de “reiterar a decisão anterior que declarou ilegítimo o governo de Nicolás Maduro” e “declarar que a presença da representação diplomática venezuelana que está lá até o momento é igualmente ilegítima e deve retirar-se”, explicou o chanceler.
 
As nações que apoiam a oposição e Guaidó alegam que a Venezuela vive nos últimos anos uma crise humanitária causada pelas políticas dos governos chavistas (leia-se os mandatos de Hugo Chavez (fevereiro de 1999 a março de 2013) e de Maduro, que substituiu o anterior logo após sua morte). 
 
O cientista político venezuelano Diego Area, diretor associado do Atlantic Council, em Washington, entrevistado pela BBC New, avalia o cancelamento da saída da Venezuela da OEA, contrariando Maduro, e a expulsão de chavistas da organização como uma forma de “acelerar e converter em ações concretas o reconhecimento de Guaidó”.
 
“Isso deve abrir eixos imediatos de ação executiva: primeiro, a organização convocatória e definições para novas eleições na Venezuela (com suporte técnico da OEA). Segundo, impulsionar e seguir avançando na abertura humanitária para ajudar aos venezuelanos vivendo a crise”, disse. Sanções e bloqueios econômicos impostos pelos EUA e seus aliados, também devem ser retirados.
 
Mas, para outra especialista entrevistado pelo jornal, a professora de direito internacional público na Universidade Bolivariana da Venezuela, em Caracas, Aline Piva, a decisão de Guaidó de se proclamar presidente interino e o apoio internacional tendem a “atiçar os governos dos países vizinhos a tomarem ações que causarão duros efeitos à população venezuelana”. Ela também avalia os movimentos internacionais contra Maduro como responsáveis de “asfixiar o país, política e economicamente”. 
 
Entenda  
 
Venezuela foi o primeiro país fora do Oriente Médio a integrar a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP), logo quando a instituição formada pelos maiores detentores mundiais de reservas da commodities foi criada, em 1960. No dia 1º de janeiro, o país assumiu a presidência da Organização. 
 
Em termos de reserva, a Venezuela se configura como a primeira no mundo, na frente de Arábia Saudita, Canadá, Irã, Iraque e Kuwait. O país também é rico em coltan, a mistura de dois minerais: columbita e tantalita. Do primeiro se extrai o nióbio e, do segundo, o tântalo. Movimentos políticos internacionais, contrários às sanções econômicas impostas pelos Estados Unidos, acusam os norte-americanos de não estarem preocupados com a ação humanitária.
 
“Alguém acha, sinceramente, que os EUA estão preocupados com a democracia e com os diretos humanos na Venezuela? Por que não se preocupam com a fome no Iêmen? Por que tratam as pessoas em processo migratório de forma hostil?”, questionou em nota a presidente do PT, Gleisi Hoffmann em resposta às críticas de ter acompanhado pessoalmente a posse de Nicolás Maduro. 
 
A oposição venezuelana, por sua vez, alega a necessidade do apoio internacional para derrubar Maduro, chamando a última eleição de fraudulenta. O voto na Venezuela é facultativo. A corrente contrária a Maduro fez campanha de boicote às eleições. 
 
Cerca de 54% dos eleitores não votaram, mesmo assim, o líder chavista foi eleito com 67% dos votos. O pleito foi acompanhado por comissões externas, um dos participantes foi o ex-primeiro ministro da Espanha José Luiz Zapatero. que declarou logo após o votação: “Não tenho dúvida de que (os venezuelanos) votam livremente”.
 
Mas as informações que chegam do país, sobre a aceitação do governo Maduro, divergem muito. Segundo uma pesquisa do Instituto Venezuelano de Análise de Dados (IVAD), feita em fevereiro de 2018, 75% da população considerava o governo “péssimo”. 
 
A situação econômica e social do país começou a piorar em 2015. Em agosto de 2017, o próprio Maduro admitiu que as importações do país caíram mais de 50% em relação a 2015. No mesmo ano, os Estados Unidos, sob o governo Trump, começaram a aplicar uma série de sanções alegando estratégia para “restabelecer a democracia” no país. 
 
Segundo dados, da Organização Internacional para Migrações (OIM), das Nações Unidas, o estado de estresse social levou, até agosto de 2018, 2,3 milhões de venezuelanos a deixarem o país – o Brasil recebeu apenas 2% desse total.
 
 
 
Redação

6 Comentários

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  1. O povo e a dissonância cognitiva

    O povo é convencido de que deve votar para eleger seus líderes.

    Ele acredita que através desse gesto se faz representar no poder.

    Então ele vota.

    Quando um grupo de espertalhões quer o poder mas não tem o povo, simplesmente cancela a existência do povo ignorando seus votos.

    Assim se governa sem povo, porque o poder é a meta.

    O povo, como dizia a Zélia Cardoso de Mello, “é um mero detalhe” e, como a gente conclui, em qualquer lugar do mundo.

    E olhando de cima e de longe, não importa pra que lado vá, o povo está sempre sem rumo, completamente à mercê dos poderosos.

    1. De fato, é um mero detalhe

      De fato, o povo é um mero detalhe. Do contrário, como você pode explicar que em um país onde 75% da população classifique o governo de ruim ou péssimo, o candidato governamental vença as eleições?

      Todas as ditaduras sabem o que fazer com o povo, para dar um jeito de vencer as eleições. As fraudes são apenas o método mais tosco. Pode-se fazer uma legislação eleitoral que privilegie regiões onde o governo é maioria. Pode-se restringir o direito de voto. Pode-se tornar as eleições indiretas. Pode-se impugnar candidaturas. Mas o melhor método é criar um ambiente de terror no qual os candidatos opositores desistam de participar do processo eleitoral, cientes de que sua vitória não será reconhecida.

       

  2. Por que será…

    Por que será que toda ditadura, quando convoca eleições, vence?

    Pode até ser verdade que as últimas eleições presidenciais na Venezuela tenham transcorrido sem fraudes. Mas não era preciso. Os opositores eram meros “sparrings”, pois os verdadeiros opositores boicotaram as eleições, e com razão: desde muito o governo vinha dando provas de que não reconheceria nenhum resultado eleitoral que lhe fosse adverso.

    Nos anos bons do preço do barril nas alturas, Chávez convocou vários referendos e venceu um por um. Mas no primeiro que perdeu, melou o jogo, e encontrou um jeito de forçar a aprovação de todas as propostas que tinham sido rejeitadas (que incluíam a reeleição ilimitada).

    Maduro venceu a sua primeira eleição, isso ninguém duvida. Mas a oposição também venceu as eleições para a assembléia nacional, obtendo inclusive mais de 2/3 das cadeiras, o que lhe dava o direito de modificar a constituição. Vários deputados foram cassados até que o índice caísse para menos de 2/3, repetindo manobra feita várias vezes no Brasil sob o regime de 1964: se a oposição fazia maioria em alguma assembléia, os deputados opositores eram cassados até que se tornassem minoria. Lembram disso?

    Maduro recusou-se a convocar o plebiscito revocatório aprovado pela assembléia, e olha que o plebiscito revocatório era um dispositivo presente na própria constituição bolivariana.

    Por fim, Maduro convocou uma nova assembléia constituinte que não foi eleita por sufrágio universal, e sim por associações dominadas pelos chavistas. Ou seja, ao invés de dissolver a assembléia, Maduro dissolveu o povo, e o substituiu por outro povo composto só de seus apoiadores…

    E nesse meio tempo, numerosos opositores eram presos arbitrariamente, cassados de seus mandatos ou mortos. Você se candidataria a uma eleição em um ambiente assim? Afirmar que as últimas eleições presidenciais da Venezuela foram legítimas é o mesmo que afirmar que as eleições presidencias sob o regime de 1964 foram legítimas.

     

  3. Democracia é quando EU MANDO 

    Democracia é quando EU MANDO  ..quando você, é ditadura

    SInceramente, gostaria de ver esta reportagem dizendo que, não o Brasil, mas o governo brasileiro

     ..pra mim seria importante traçarmos uma linha de separação entre o arbítrio que desde 2015 aqui se instalou – e que culminou com a eleição do BOZO –  e a verdadeira identidade desta Nação pacífica, hoje sequestrada por FASCISTAS psicopatas.

    EM TEMPO – há um grande erro na reportagem pra quem gosta de se enganar  ..o MAIOR DETENTOR DE JAZIDAS MINERAIS na região é o BRASIL (só que ainda não se anunciou)  ..olhe a proporção no mapa e reflita  ..minérios não reconhecem divisão geopolítica, bobo !?

    O GOLPE, aqui, continua em andamento

  4. Eu acredito em Papai Noel, assim como acredito em ação humanitaria dos Estados Unidos.
    O Papai Noel americano, tão bonzinho, vai atraverssar à América, com o seu trenó reluzente e suas renas maravilhosas, para entregar alimentos aos venezuelanos. Assim eles viveram felizes para sempre.

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