Ajuste será com Dilma ou será com outro, por Janio de Freitas

Da Folha

Hoje tem amanhãs

Janio de Freitas

As crises atraem todo o pensamento para elas, e não para o que, nelas, mais importa: o seu amanhã, os desdobramentos que persistem, historicamente, no mau hábito de fugir a todo controle. É o que estamos vendo, no impeachment sim ou não, no “ajuste” sim ou não. Como se as crises institucionais desde a morte de Getúlio, e seus desdobramentos sempre para pior, nada ensinassem para o futuro que são os nossos dias.

Políticos rasos são imediatistas. Logo, os políticos brasileiros só pensam em sua conveniência imediata. Esta é origem da tese de impeachment. A “desconstrução” que Aécio não conseguiu fazer na disputa eleitoral quer, agora, levar a oposição a obtê-la por outro meio. Sem risco, porque um novo fracasso estaria isentado de qualquer consequência funesta. A permissividade vigente na política brasileira garante.

Não se dá o mesmo com os movimentos reivindicatórios, tipo Movimento dos Sem-Terra, o dos Sem-Teto, a CUT, movimentos de professores e universitários, de funcionários públicos, enfim, aquilo tudo que muitos chamam de “a esquerda”. Ser contrários ao “ajuste” arrochante é óbvio, para eles. Mas até onde? –eis a dificuldade além do óbvio e do imediato.

O “ajuste” será com Dilma ou será com outro. Será, é ponto pacífico: no mundo político não se vislumbra segmento algum capaz de se elevar para impor correções econômicas não arrochantes. A rejeição prática e absoluta ao “ajuste” de Dilma/Levy confunde-se com o impeachment, ainda que sem tal intenção. Já é assim, e as manifestações programadas tendem a dar a esse embaralhamento evidência e força influentes.

Também por isso, mas não sobretudo por isso, Dilma impôs às duras discussões sobre cortes no Orçamento, contra a quase indiferença na equipe econômica, certa imunidade de vários programas à tesoura. Como o Bolsa Família e o Minha Casa, Minha Vida, assim depois destacados, entre outros, pelo próprio Levy.

Se não conduzido pelo atual governo, o “ajuste” será no mais puro e duro neoliberalismo. Caso o governo ficasse com o PMDB, estaria minado por uma falta de quadros próprios que o obrigaria a sujeitar-se às exigências direitistas do PSDB. O PMDB de hoje é numeroso e vazio. Mercantilista e vazio. Amorfo e vazio.

Caso o governo ficasse com o PSDB, por uma eleição precipitada, contaria com serviços bem pagos do PMDB, como foram os do PFL no governo precedente dos peessedebistas. Para o “ajuste” de retorno ao Brasil que começara a deixar-se superar, aos 500 anos de história.

A escolha dos movimentos reivindicatórios é óbvia? Não. É de sua índole e de sua sobrevivência que combatam o “ajuste” de Dilma. Na concepção de comando e tática desses movimentos, está sempre a ideia de que as chamadas lutas sociais e o estrato político-social que comanda o país são entidades à parte. Cada qual sabe de si e cuida de como enfrentar o outro. Fora dessa concepção, os movimentos caem na perplexidade emudecida a que o PT sucumbiu, diante do governo Lula –que em momento algum foi governo do PT.

Em qualquer destinação da crise, é muito provável o recrudescimento dos movimentos reivindicatórios organizados. Menos acirrados e duradouros, em um dos casos, e muito mais nos outros. Com que modos e até que ponto final, o Brasil está muito mudado para que se se tente imaginar. Sobre isso basta lembrar que os militares mostram-se muito mais civilizados do que os civis. 

Redação

12 Comentários

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  1. O PT abriu mão do apoio

    O PT abriu mão do apoio popular, pelo menos é o que parece.

    Manifestações contra o governo foram marcadas com antecedência e no “domingo”.

    Manifestações a favor do governo foram marcadas para dia de semana, durante horário de expediente. Quanto vejo isso, até eu que sempre apoiei fico contra o governo. Os atos pró-governo ficam parecendo que só contam com sindicalistas e pessoas ligadas MST. Pros críticos, fica parecendo que ali só tem vagabundo que não trabalha. Infelizmente, a imagem que vai pra mente de muita gente que viu essas manifestações de apoio é este. O PT perdeu a competência e a capacidade de mobilizar as massas para fazer frente às pequenas massas pra coxinha que o PSDB conseguiu reunir. Que tristeza !!!

     

  2. De Getulio, passando por Jango, chegando à Dilma

    Olha Jânio, o ajuste esta sendo feito com Dilma como seria com Aécio, não foi essa a exigência? Agora explica uma coisa: que editoiral ameaçador foi aquele?

  3. O ajuste de Dilma

    Claro que o ajuste é necessário para corrigir erros havidos na trajetória econômica. 

    Mas há ajuste e ajuste Basta que o BACEN reduza os niveis escorchantes da SELIC para far folga ao Tesouro, mais recursos entrariam com um acompanhamento dos maiores contribuintes à Receita Federal, são relativamente poucos e conhecidos, e fechamento das torneiras do CARF. Aumento no tempo dos objetivos e redução dos danos políticos.

    Junto com os governadores Dilma poderia promover uma revisão do sistema fiscal brasileiro, num projeto de progressividade e repartição do bolo. 

    Ah, e mudar a condução política do governo atualmente beirando o “sem noção”.

  4. No governo FHC já tivemos

    No governo FHC já tivemos dólar a 4 reais, CPMF de 0,38, inflação a 12% e selic a 45%.

    A grande diferença entre o governo FHC e o da Dilma é que no de FHC o PIB sempre cresceu e no da Dilma estamos tendo uma brutal recessão.

    Simplesmente não há mais clima para a Dilma continuar presidente da república. E isso não é em relação aos políticos, mas em relaão à população.

    A crise econômica de hoje é fichinha em relação a que FHC teve de enfrentar. Mas nesse 2015 o país está parado esperando a queda da Dilma.

    Adiar esse momento é judiar do povo brasileiro.

    1. O pessoal da direita é muito

      O pessoal da direita é muito engraçado.

      Quando se fala sobre as melhorias economicas e sociais promovidas pelos governos de Lula, o sucesso é atribuido pelos reacionarios  as “condições externas excepcionais”.

      Ja quando se aborda as dificuldades do governo Dilma, devido a crise internacional, a direita diz que tal fato não é justificativa.

      E comparar a crise economica enfrentada por FHC com a atual beira o ridiculo.

      O mundo esta economicamente em frangalhos. Na verdade não conseguiu vencer a crise de 2008,so comparada a de 1929

    2. 20% de desemprego durante

      20% de desemprego durante fhc. Taxa de juros bateu em 45%. Brasil submisso ao FMI. Entrega de empresas estatais por muito menos do que valiam. Aumento cavalar da dívida externa, apesar dos bilhões amealhados com a privataria. Apagão por falta de investimentos em infra-estrutura, PROER, Sivam, compra de votos da emenda da reeleição, privatizações feitas “no limite da irresponsabilidade”, a fazendola de fhc e o aeroporto construído por empreteira na fazenda vizinha que era usado pela família de fhc, etc etc. Será mesmo que você quer colocar o pior presidente civil da história do Brasil na conversa? Você é direitão,eleitor frustrado porque um despreparado para assumir qualquer cargo público de responsabilidade perdeu a eleição e apoia o golpe de estado branco contra a Presidenta. Assuma isso em vez de ficar tentando arrumar desculpas para seu golpismo.

  5. bem apropriado

    Que o ajuste tem que ser feito concordo, mas que seja bem feito e de modo justo.

    Não sejam os mesmos de sempre a pagar a conta.

    Qual apresentar a fatura ao andar de cima?. Há meios legais para fazer a cobrança mas com esse congresso…

    Um dos erros imperdoaveis do governo Lula e Dilma é que não tiveram grande parcimonia com os nosso impostos.

    Perderam uma grande oportunidade de se diferenciar. Se tivem feito isso, junto ocm uma politica decente de comunicação social, poderiam agora exigir mais sacrificios. Em tempo: não sou coxinha, muito pelo contrario…

    1. Então se os…

      Então se os crápulas do PSDB/DEM/PPS/SD, e o Gilmarginal derrubassem o atual governo, iriam implementar um ajuste de forma suave e justíssima, consultando cada brasileiro, inclusive, você, não é mesmo?

      Quanta ingenuidade!

  6. Lucidez!

    Finalmente, consigo ler algo lúcido sobre a crise, ajustes, governo, oposição e movimentos sociais.

    O cenário é exatamente esse e por isso digo que, devido a qualidade atual dos políticos, esta recessão e o baixo crescimento vão durar alguns anos.

    Aí, e somente então, poderá vir o tal do NOVO que o Nassif sempre pede.

  7. conter os movimentos sociais é a bola da vez dos governistas?

    Acho que ninguém que milita em movimentos socias dos trabalhadores tem dúvida que o ajuste (arrocho) prossegue com ou sem impechment. Acho também que a maior parte dos movimentos que são organizados e tem um histórico de lutas – e portanto não confunda com MBLs, Revoltados e coisas desse subgênero – sabe que o impechment não é saida para o ajuste. Se o ajuste prossegue com ou sem impechment, então ele não  é pauta dos movimentos de trabalhadores. Parece ma-fé do articulista confundir as duas coisas, ou pelo menos um profundo desconhecimento sobre os movimentos dos trabalhadores. Os movimentos organizados dos trabalhadores não devem satisfação ao governo de plantão seja ele qual for, legitimo, democrático, golpista, PT, PMDB, PSDB, PQP. Devem satisfação as suas bases, que pagam impostos, perdem seu emprego, tem seu salário congelado e vêem a saúde e educação públicas completamente sucateadas.Há uma fração do pensamento e da prática politica da ‘elite’ brasileira – incluida a da grande imprensa da qual o articulista faz parte – que não entende o que é base, tem horror do ‘populacho’ e infantiliza a população achando que ela precisa de papai e mamãe para dizer o que é certo e errado. Ao que parece agora a tônica do ajuste é conter os movimentos sociais, os chamando de ‘golpístas’ – essa história de golpistas me lembra a história do menino e do lobo; de tanto gritar olha o lobo, olha o lobo, quando ele veio ninguém levou a sério.

    PS: o frase final do texto é tétrica, além de falsa. Militares civilizados deve ser porque o Sr. Janio não foi torturado por nenhum deles na ditadura, nem mora na favela.

  8. Desmemoriados

    Se a maioria se esqueceu, eu me lembro muito bem das promessas vazias da candidata Dilma. E pior! Ela chamou a Marina e o Aécio de alarmistas, pois a crise estava sobre controle! Tá tudo gravado! Mentiras sobre mentiras!

  9. indubitavelmente será com outro!

    … indubitavelmente será com outro!

    já estamos no terceiro tempo do jogo flagorosamente perdido de lavada por dilma que, teimosa sem-noção no seu autismo político e social, se recusa a deixar o campo e ir para casa… pois que, a presidenta foi, pelo próprio conjunto da obra pública inacabada, destituída de duas prerrogativas essenciais da governabilidade em qualquer regime político: perdeu a confiança e a credibilidade dos agentes públicos e das instituições e, principalmente, “nos corações e mentes” do povo crente… e aí babau!

    umas racionalidades Racionais AC/DC dos “Espelhos dos Príncipes y dos Ogros” quando no Poder, logo ali, da Baixa Idade Média… para des/nortear a presidenta default da essencial, e anterior ao fato consumado, análise das consequências por seus atos falhos sem-noção sem sabedoria sem pé nem cabeça…

    “Na França de 1259, o tempo é ainda da busca de um equilíbrio entre o rei e a Igreja. O rei é o braço secular de Deus e da Igreja, garante a fé, é ele próprio o rei cristianíssimo, mas não se deixa conduzir pela Igreja, sobretudo nos negócios temporais. Para Gilbert de Tournai (doutor teólogo antepassado ilustre de frei Beto e frei Boff, recentemente recebidos em palácio como confessores juramentados e conselheiros magistrais do reino de Dilma a Teimosa…), nessas altas esferas do poder, o pecado mortal número um continua sendo a superbia, a soberba, o orgulho. A avaritia, a cobiça, que tem tendência a suplantá-la na hierarquia dos vícios, apesar da lição sobre o desprezo aos tesouros, não ameaça o rei tanto quanto a soberba. A hipervalorização do fisco real ainda não era insuportável.

    […]

    O rei deve agir como a cabeça em relação aos membros. Dele devem partir as ondas positivas que se espalham pelo corpo todo da monarquia. […] O rei deve ser um investigador do mal, um inquisidor.

    […]

    Esses onze últimos capítulos dessa primeira parte são consagrados às personagens mais execráveis do círculo íntimo real, os curiais, os homens da Cúria, a corte. Não é preciso aqui tomar “cúria” no sentido senhorial e cerimonial que a palavra assumirá a partir do século XVI. A Cúria é o lugar do aparelho governamental e administrativo de um rei feudal no ato de desenvolver a ideia  e os órgãos de um Estado centralizado e burocrático.

    […]

    A origem da boa reputação (bona fama), elemento muito importante na Idade Média, incluindo-se aí o plano jurídico. Esse desejo faz nascer no príncipe a justiça e a disciplina. A justiça aqui é o motivo principal. Gilbert de Tournai lembra que ela deve ser a mesma para todos, que o gládio do juiz está a serviço da justiça. O príncipe justo deve proibir os juramentos ilícitos, reprimir a injustiça dos cidadãos, dos burgueses no trato com o clero e com os fracos (é uma das chaves da política dos reis de França na relação com as cidades, no século XIII). Deve sobretudo fiscalizar e punir, quando for preciso, seus “prefeitos” e seus bailios (é o sentido de numerosos inquéritos ordenados por São Luís para corrigir os erros de seus representantes). Por fim, o rei deve refrear-se a si próprio, evitar os abusos da justiça real no trato com o pobre, assegurar-lhe essa justiça sem deixar a sentença tardar durante anos.

    […]

    A galinha, afinal, é a mãe modelo que se sacrifica por seus pintinhos (!!!???!!???) Nesses assuntos, o rei deve ter a virtude da clemência (os lugares-comuns da moderação e da misericórdia ( penso no indulto amigo de Natal ao nobre Genoíno) estão no centro da ética principesca do século XIII), porque a clemência não fragiliza a justiça. Também deve ser mais severo quanto às injustiças feitas aos outros do que àquelas de que é vítima. Se quiser ser bom com o seu povo, o rei nada perderá, ao contrário. A maior fortaleza de um rei é o amor de seu povo. Esse amor é o melhor fiador da mais alta finalidade da política: a paz.

    […]

    A primeira virtude do rei é a justiça. Luís insiste nisso e valoriza o caso em que o rei estaria enfrentando um adversário na justiça. O rei não deve influenciar o conselho que só deverá se pronunciar com base na verdade. Aqui, ainda uma vez, os ideais, os valores estão acima de qualquer pessoa humana, por mais poderosa ou mais amada que ela seja (parágrafo 17). São Luís trabalhou para reforçar o poder real, mas o manteve longe do absolutismo no qual cairão finalmente os reis de França. Não só a verdade (e a lei destinada a fazê-la respeitar) está acima do rei, mas o rei deve aceitar as decisões dos organismos estabelecidos para ditar a justiça, aqueles “membros do [seu] conselho” que constituem o Parlamento que ele acaba de criar.

    […]

    Uma outra obsessão de São Luís aparece sobretudo a partir de 1247: o remorso político, porque a política é negócio de moralidade. O rei deve reparar todo erro feito a seus súditos, em particular toda a apropriação injusta, “de terras ou de dinheiro”. Um dos grandes cuidados da Igreja, no século XIII, é obrigar os mercadores e usurários ou seus herdeiros a restituir benefícios ilícitos, juros proibidos. Numerosos são os manuais que tratam dessas restituições e os testamentos que exprimem, pelo desejo de restituição, o remorso dos beneficiários de aquisições abusivas. Mais rara e mais difícil ainda de conseguir é a restituição desse bem fundamental, a terra. E São Luís sabe bem que essa palavra “devolver” que recomenda ao filho é dura de pronunciar, pois designa uma ação ainda mais dura de se consumar. 

    […]

    Por serem os problemas não poucas vezes muito “espinhosos”, como no caso há pouco citado das restituições, Luís (creio que… está óbvio de que não se trata de Luís Inácio Lula…) recomenda ao filho recorrer nessas matérias a um conselho de magistrados.  Ainda uma vez tem-se aqui um tema essencial dos “Espelhos dos Príncipes” cristãos. O rei deve consultar, escolher bons conselheiros e escutá-los.

    […]

    O rei é responsável pelos homens que nomeou e dos quais faz seus representantes ou seus funcionários domésticos. Deve cuidar para ter bons prepostos, bons membros de seu hôtel, quer dizer, de sua casa. Chamados a fazer reinar a justiça, eles próprios têm de ser justos. 

    […]

    O rei, do qual se dizia estar exclusivamente nas mãos dos dominicanos (frei betos) e franciscanos (frei boffs), recomenda ao filho que se aconselhe tanto com os “bons” leigos (como seu nassif) como com os “bons” religiosos (como monsenhor gilbertinho).

    É a dupla “boca” e “pensamento” , que sublinha a importância da palavra, nesse século de “nova palavra” , mas que lembra a necessária ligação entre o que se diz e o que se pensa. A palavra não deve ter autonomia, deve ser submetida ao pensamento, o que se diz deve vir do coração e da razão, deve traduzir fielmente o coração e a razão.”

    São Luís – Biografia, de Jacques Le Goff. Trad. Marcos de Castro. Ed. Record, 1999.

     

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