Chávez e as bandeiras sociais

Por Gunter Zibell

São conhecidos os alertas em relação a que o expressivo conjunto de forças que apóia Chávez o estimularia golpismo – dele ou da oposição -, mas isso não se deve à própria incapacidade da oposição local de oferecer alternativas políticas viáveis com o mesmo apelo?

Chávez já teve auges maiores de popularidade, não seria agora que ele abdicaria da legitimação da democracia partidária. Talvez o “golpe” já tenha sido dado, mas de modo mais sutil : Chávez apropriou-se de bandeiras como o nacionalismo e a inclusão social.

Também alinhou-se a parte da burguesia. Lá, como cá, a oposição principal é a mídia. Como os indicadores sociais desse país já são dos melhores da América Latina, fica como mote da oposição a dificuldade do governo de promover a transição da economia mono-exportadora para um modelo mais eficiente e sustentável de desenvolvimento. O mesmo problema é enfrentado pelo governo neoliberal do México, no poder também há 10 anos e que, como o da Venezuela, também será sujeito a escrutínio popular em eleições majoritárias que acontecerão em 2012.

O período 1999-2002, segundo mandato de FHC, teve alguns pontos em comum com o momento atual da Venezuela. Se recordarmos disso poderemos ter outra visão da importância das comunicações e eleições como fatores de mudança política. O Congresso, no nosso caso bicameral, era 80% de apoio incondicional ao governo. 75% da Câmera e 85% do Senado eram de apenas 6 partidos aliados : PFL (DEM); PSDB; PMDB; PPB (PP); PTB; PL (PR). Tivessem Lula ou Ciro ganho as eleições de 1998 teriam dificuldade para obter governabilidade.

Tão forte e homogêneo apoio não impediu que se tratasse de um governo de pouca atividade no que se refere a reformas de estado. Comemoramos ontem (03/maio) o aniversário da única, a lei de Responsabilidade Fiscal. A prometida Reforma Tributária não saiu, por exemplo. A imprensa sem dúvida apoiava o governo, tanto que nunca questionou fortemente o longo período de deterioração do emprego e o mais longo período sem crescimento de renda per capita vivido pelo Brasil (1997-2003.) Também não questionou em 2002 a política de manter juros reais negativos (no único momento do governo FHC) até as eleições, de modo a inflar artificialmente a desvalorização cambial e o risco-país, metamorfoseados no “Risco Lula”. O STF também não poderia ser considerado obstrutivo.

Não obstante isso, a realidade econômica se impôs, o governo foi relativamente impopular em seus últimos anos e a oposição organizada em torno do PT logrou sua primeira consagração eleitoral expressiva (a eleição de Lula em 2002.) Desde então, com o progressivo realinhamento da posição dos partidos mais centrais no espectro político, a oposição brasileira se rearticula junto à imprensa.

A oposição Venezuela parece estar com um desafio talvez menor que a brasileira. Como a população é menor, mais urbana, concentrada e afluente, seus argumentos políticos já chegaram a toda a população. E o conjunto de dificuldades econômicas que se avolumaram pode ser trabalhado politicamente. Mas será que a oposição tem um programa apto a substituir as políticas de Chávez? E, como se contrapor ao PSUV, com tantos filiados e militantes? É importante que não boicote novamente as eleições legislativas, como em 2006, ou tente golpismo, como em 2002, fatores que alavancaram a popularidade de Chávez. Da participação da oposição e de seu sucesso nas eleições programadas para 26/setembro decorrerá a legitimação do seu discurso. O próximo passo é identificar algum líder para as eleições presidenciais daqui a dois anos.

Mas algumas coisas não devem ser confundidas. Poder hegemônico, como o concedido a FHC, ou popularidade, como a que desfruta Lula, não podem automaticamente ser associados a totalitarismo. A circunstância dupla em que Chávez se encontra, de ser ainda poderoso e ainda popular é uma situação não corriqueira, que pode até causar estranheza, mas é uma das resultantes possíveis nas democracias partidárias presidencialistas. Mais importante é não confundir liberalismo econômico com democracia. O primeiro é uma ferramenta possível para a sociedade alcançar seus objetivos, o segundo é o modelo como a sociedade escolhe seus objetivos e ferramentas.

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