Chile: aos 41 anos do golpe militar país é sacudido por atentados à bomba

Estação Escuela Militar

Santiago do Chile

Exclusivo para Jornal GGN

 

Uma bomba explode em uma igreja, outra no metrô de Santiago, outra ainda diante de um jardim infantil. Desde meados de 2013, a capital chilena tornou-se alvo de uma vintena de atentados com explosivos de baixa intensidade e de fabricação caseira, como extintores de incêndio recheados com pólvora. Alguns artefatos sequer explodiram, o que seria indício evidente do amadorismo dos seus autores. Quando o Chile democrático se preparava para recordar o 41º. aniversário do golpe militar de 11 de setembro de 1973, três novas bombas voltam a explodir em locais públicos, deixando mais de 15 feridos e o país em sobressalto. Quem está por trás dos atentados, a quem interessa tumultuar o sofrido processo de transição democrática, que se arrasta há mais de vinte anos?

O metrô de Santiago do Chile é um dos mais organizados das Américas e transporta 2,5 milhões de passageiros diariamente. Porém, funcional não é, porque tentar tomá-lo nas horas de rush é exercício penoso e desesperador para quem tem hora marcada: ele está irremediavelmente lotado e, sem educação nem pena, os passageiros nas plataformas tomam de assalto os vagões e empurram de costas os que já estão espremidos em seu interior, transformando a viagem em tortura de sardinhas silentes e socadas em uma lata de conserva. Já quem não tem pressa, pode optar pela espera, mas confortavelmente instalado a poucos metros das plataformas.

É o que aprendi a fazer em Santiago, jamais imaginando que beber meu café espresso ou almoçar nas praças de alimentação instaladas a céu aberto à entrada das estações Baquedano (Praça Itália, Providencia) e Escuela Militar (Las Condes), algum dia se tornasse fruição perigosa, capaz de custar minha vida. Depois do atentado do dia 8 de setembro, decidi mudar de hábito. Pelo menos por enquanto.

Na segunda-feira, 8 de setembro, em torno das 14h, era absolutamente normal o movimento na praça de alimentação da estação Escuela Militar: pencas de passageiros entrando e saindo do tubo, jovens e idosos passeando cachorros, barracas e quiosques expondo suas comidas, filas de clientes, pequenos grupos conversando em torno das mesas a céu aberto, fumandes tragando nervosos seus cigarros sob os guardassóis reservados.

E então o estrondo!

Chuva de vidro picado! Grossas nuvens de fumaça e pó! Gritos! Pânico! Correria!

Então chegaram os Carabineiros, fantasiados de robocops e a tudo decididos, só depois as ambulâncias. Gente no chão, sangrando, gente chorando convulsivamente, para-médicos correndo com padiolas, atendimento de emergência, a área do atentado interditada, a polícia ordenando circular a massa de curiosos.

Nas primeiras horas da noite, a polícia indicava que a bomba fora colocada em uma lata de lixo da praça da alimentação.

Cúmulo da coincidência, Ángela Margarita Jeria, a mãe da presidente Michelle Bachelet – de 88 anos de idade, recém-completados em 22 de agosto último – encontrava-se em uma das lojas das galerias adjacentes, acompanhada de um agente de segurança, não sofrendo lesões. Doña Ángela é dessas pessoas que não necessitam de segurança, pois parecem sempre levadas a tiracolo por um poderoso anjo-da-guarda, que já a livrou da morte uma vez. Após o assassinato de seu marido, o Gal. da Aviação Alberto Bachelet, pela ditadura Pinochet, em 1974, junto com sua filha Michelle, a arqueóloga baixou aos infernos dos centros clandestinos de tortura da DINA, em Villa Grimaldi e Cuatro Álamos, de onde foi salva graças à pressão internacional, logo expulsa do país pelos militares, com asilo politico, primeiro na Austrália, em seguida na ex-Alemanha Oriental.

A volta da Lei Anti-Terrorista

Da direita à esquerda, o atentado teve condenação unânime e a caracterização no âmbito do governo foi a de “ato terrorista”. Michelle Bachelet convocou o Conselho de Segurança Nacional, órgão instituído na década de 1980 pela Constituição da ditadura Pinochet e integrado pelas três armas das FFAA, mediante a qual os militares pretendiam comprometer os civis (Câmara dos Deputados e Senado) com seu programa de repressão, baseado na Lei Anti-Terrorista. Entulho autoritário que impede o avanço na construção do Estado de Direito no Chile, o Conselho e a Lei já foram repudiados pelos partidos atualmente no governo, mas continuam em vigor.

Submetida a estudos por uma comissão especial do governo, antes mesmo da Lei Anti-Terrorista sofrer alterações, como prometera Michelle Bachelet, ela volta a ser invocada pelo ministro-chefe da Casa Civil, Álvaro Elizalde, e o subsecretário do Interior, o socialista Mahmud Aleuy, quem avisou, batendo o punho na mesa de reuniões: “Nós vamos perseguir sem trégua estes assassinos!”.

Quem são os suspeitos, a quem interessa?

O atentado na estação Escuela Militar deixou 15 feridos, dois dos quais em estado grave. A intenção dos autores não visava a menos, e é signifcativo que o ato foi perpetrado na véspera do 11 de setembro, data do odioso golpe civil-militar de 1973.

Um ataque da extrema-direita? Não é o que indicam as sofríveis pistas.

As câmeras de vigilância da estação registraram movimentos de dois jovens que depositaram o explosivo em uma lixeira e partiram em debandada com um Chevrolet. Mas não há registros faciais dois criminosos, motivo pelo qual o governo apelou à ajuda de criminologistas internacionais, capazes de detectar pormenores que encaixerm com os modos de indivíduos já procurados, lembrando que, após um atentado realizado no passado mês de junho, apareceram em Santiago panfletos alusivos aos chilenos Mónica Caballero e Francisco Solar, acusados pela Justiça espanhola de atentarem com uma bomba contra a basílica do Pilar de Zaragoza.

A rigor, a Procuradoria Nacional chilena trabalha com a hipótese doméstica, suspeitando os autores do atentado entre “grupos anti-sistema e anarquistas”. Através de un comunicado, uma tal “Célula Revolucionária Felice Orsini” assumiu a responsabilidade do ataque a uma igreja de Santiago (eis a semelhança com a Espanha), mas rebateu na internet a autoria de uma bomba colocada à entrada de um jardim infantil.

“Deixaram a agenda a favor da direita!”, protestou o escritor underground e ex-músico punk, Jorge Baradit, entendido no cenário, advertindo: “Há uma diferença entre lutadores sociais e esses putos terroristas que causam danos aos trabalhadores que dizem defender!”.

Em silêncio, a frase provavelmente foi assinada embaixo pela esquerda chilena em bloco.

 

 

 

Redação

9 Comentários

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  1. omodus operandi da direira
    omodus operandi da direira chega a ser cansativo. Esquerda no poder, terror da direita para mudar o jogo.
    Nao duvido que aconteça o mesmo por aqui.

    1. Aqui não precisa…

      Tem a urna eletrônica sem papelzinho.  Com a ajuda de Datafolha e Ibope para preparar o povo para aceitar o resultado, 10 milhões de votos mudam de dono rapidinho.

      1. Feliz Ano Velho…

        Sinto assim também. Acredito que estamos vivendo é o “tempo da preparaçao do povo” para a “aceitaçao” de um resultado já aceito como “possibilidade” real,mas que é na verdade um “golpe”, É na urna eletronica que esse golpe vai se legitimar.

        O golpe começou com a mídia, há anos,  com o objetivo de  ” evidenciar um clima de descontentamento”, depois as pesquisas distorcidas  vao dando conta de manter a aparencia da”coerencia” em tudo isso e, por fim,  é nas urnas que a legitimaçao do golpe se dará e, dentro do clima das distorçoes criadas, o povo nem vai perceber que “TUDO” foi calculado para tirar os trabalhistas,desmontar o Brasil e a América Latina, para favorecer principalmente os interesses dos EUA, mas nao só esse.

        Com a independencia do BC, retomada da política de Privatizacoes  – de bancos públicos, aos pocos das universidades, paralizacao de obras de infraestrutura, flexibilizaçao de leis trabalhistas, diminuiçao de investimentos sociais, desvalorizaçao do real, aumento de juros etc..etc.. – nao fica difícil concluir que “dessa pilhagem” o Brasil cairá de joelhos e nao sobrará muita “substancia” para se levantar – será um retrocesso sem volta.

        O atraso social dos latinos americanos que se arrasta por décadas promoveu um tipo de analfabetismo complexo demais, porque  mesmo com a classe que se diz “!intelectualizada” é evidente a falta de cidadania e politizaçao. No Brasil avançamos  muito pouco no quesito “conscientizaçao”. Aí o resultado só pode ser esse mesmo – o de uma naçao tornada refém de uma classe política pouco convicta dos interesses da maioria, de uma mídia desonesta e de uma povo despolitizado. O Brasil está no “olho do furacao” dos interesses inernacionais porque está em cima do petróleo que os Eua quer porque quer. Com o golpe eles numa só tacada resolvem vários problemas – assumem o petróleo, desmontam o Brics, enfraquecem o mercosul etc..,etc.. eliminam a concorrencia de uma país que tinha tudo para o sucesso. Só se consegue dominar um povo pela “ignorança” e falta de organizaçao política. Pois bem, aqui eles conseguiram as duas coisas.

        Sem palavras.

         

         

         

  2. é isso,…

    Militares a serviço dos EUA, traindo o povo brasileiro, matando e torturando uma juventude brilhante, acobertados por uma elite covarde, …uma mídia venal, … e uma casta de funcionários públicos subornados por privilégios imorais, sustentados por uma população miserável, que pagou por isso com a vida de seus filhos transformados em gabirús, ou morrendo de inanição nos braços esquálidos de mães e pais famintos, sujeitados ao domínio de “coronés” nos fundões do nosso país…. Hoje vejo essa casta canalha pregando o golpe, afirmando que a tortura nunca aconteceu… Covardes que publicam orações em sua linha do tempo no Face, … são como os sepulcros caiados de branco por fora de que Jesus falava…. por fora tudo bonitinho e caiado, … mas haverão de levar para o inferno a podridão moral e a miséria humana por terem vivido décadas se alimentando da vida dos mais pobres e humildes…

    por favor, … me desculpem o desabafo, …

    é só….

     

  3. e por aqui…

     ainda há quem acredite que a tolerância com grupos mascarados de todo tipo não pode nos levar a este ponto crítico, com atentados à segurança e à vida de qualquer pessoa

    para este tipo de ativista classe média e apoiado pela oposição não oficial,  tolerância significa direito adquirido

    portando não é aconselhável encarar a formação desses grupos por aqui, apenas coisa de jovens desmiolados

     

    alguns entraram com a Copa, fizeram “”amizades” e ficaram, à espera do resultado da eleição para presidente

    estão por aí, nos points principais, vivendo de que, se não trabalham?

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