Completando o Xadrez da confraria dos cultivadores de assassinatos e do Xadrez da entrega do Brasil ao crime organizado

As milícias passaram a controlar tanto quem se candidata a cargo eletivo, como os eleitores que votam nestes candidatos.

Completando o Xadrez da confraria dos cultivadores de assassinatos e do Xadrez da entrega do Brasil ao crime organizado

Contribuição enviada ao GGN

Os governos do Rio de janeiro aprofundaram tanto as práticas de diminuir a influência do Estado como ator econômico e social, que deram vazão ao surgimento de outro tipo de agente para ocupar o seu lugar. Tirando proveito das falhas operacionais, do volume e lentidão da burocracia defasada, se abriu espaço, seja pela corrupção ou pelas relações permissivas de poder, ao que durante muito tempo ficou conhecido como “Estado paralelo’.

Hoje, o estado do Rio faliu sua capacidade de induzir prosperidade econômica e social à sociedade e o “estado paralelo” se tornou o Estado de fato, como afirma o professor José Claudio Souza Alves[1] ao Apublica. Este fato acontece, sobretudo, no que se refere às principais atividades desempenhadas pelo poder público, como é o caso da segurança.

O Rio, sobretudo a cidade, é a caixa de ressonância do país. A continuidade de redução dos investimentos do Estado em segurança tende a repetir o que ocorreu nesta cidade nos demais entes federativos.

A degradação da qualidade de vida e das condições de trabalho de policiais e bombeiros provocou a necessidade deste grupo vender sua força de trabalho e seu conhecimento técnico ao setor privado. Desta forma, foram se proliferando grupos de segurança privados e paramilitares ilegais que invariavelmente são organizados ou possuem relações muito próximas políticos, como relata a reportagem de Breno CostaReinaldo ChavesHyury Potter do intercept[2]

Assim, a população, sobretudo a mais pobre, se tornou vulnerável e dependente do fornecimento de serviços irregulares destes grupos. Luz, gás e telecomunicações não podem ser garantidas pelo Estado, mas que por serem de regiões de risco, muitas empresas privadas não podem atuar.

Aos poucos, o que era aparentemente uma troca comercial, passou a ser realizado através de coação. E o nível de organização destes grupos evoluiu. Hoje, moradores da praça seca, no Rio de janeiro, relatam, por exemplo a cobrança das taxas de segurança através de boleto bancário[3].

A milícia tem origem nos grupos de extermínio da época da ditadura militar, lembra o professor José Claudio e a violência da época passou a ganhar apoio da classe média e da classe política de maneira velada. Atualmente, através das milícias, esses atos foram reavivados e receberam apoio de autoridades, como foi o caso do ex-prefeito Eduardo Paes e do atual presidente Jair Bolsonaro, por supostamente ajudar a força policial oficial a acabar com a criminalidade[4].

Como atesta o jornal Nexo[5], existem diferentes grupos de milícias no Rio de Janeiro e no país. Estes grupos são geralmente compostos por membros das forças armadas e policiais que abrem um espaço de poder e canais de influência e impunidade. Desta forma, seja pela coação de moradores, seja pelo fornecimento irregular de serviços, como televisão a cabo, gás, luz (em alguns casos já ocorrem registro de tráfico de drogas e armas) eles financiam a disputa pelo controle de comunidade contra o tráfico.

Fato é que as imbricações da milícia com o Estado são multifacetadas. Existem relações com a classe política, com o sistema de persecução judicial, fiscalizatório (com braços em diferentes setores desde sanitário ao de engenharia civil e imobiliário) e eleitoral. Há referência farta disto no relatório da CPI das milícias presidida pelo então deputado estadual Marcelo Freixo, PSOL.

Freixo, ameaçado sequencialmente de morte, anda escoltado desde então.

Da face politica

A ALERJ, hoje, abriga uma gama de políticos eleitos por causa da ação de milicianos, como retrata a matéria do el país[6]. A milícia cumpre o papel de angariar votos, seja pela coação ou pelo convencimento da população em votar no político X, mas também são responsáveis pela arrecadação financeira que são “doadas’ aos candidatos. Esses pactos não são feitos de maneira gratuita: os políticos eleitos devem favores aos grupos de milicianos e passam a trabalhar de maneira extraoficial para eles. Seja legislando de forma a facilitar a ação desses grupos[7], seja empregando familiares e amigos em seus gabinetes.

Um caso suspeito é o de Flavio Bolsonaro, atualmente senador da república. O então deputado estadual empregou familiares (Raimunda Veras Magalhães e Danielle Mendonça da Costa da Nóbrega) do ex- capitão Adriano Magalhães da Nobrega, chefe do escritório do crime, milícia acusada de ter realizado a execução da vereadora Marielle Franco, correligionária de Freixo e sua suposta sucessora política, sendo ele, Adriano, suspeito do crime.

Cabe ressaltar que a milícia costuma assassinar políticos que “atrapalham’ suas ambições de poder. Seja para ajudar a campanha de algum político adversário do alvo, seja para inibir a atuação de políticos com perfil que não se alinham aos interesses dos grupos[8]. As milícias passaram a controlar tanto quem se candidata a cargo eletivo, como os eleitores que votam nestes candidatos.

O grupo miliciano, supostamente chefiado por Adriano e por Ronald Paulo Alves, também suspeito de atuar na morte da vereadora supracitada, tem atuação na Região do Rio das Pedras e do Muzema. A comunidade do Muzema recentemente enfrentou uma tragédia com cerca de 20 fatalidades por causa de uma construção imobiliária que teria sido realizada pelo grupo, de acordo com matéria divulgada pelo G1 [9]

Em nota à imprensa, Flavio Bolsonaro afirmou que a funcionária contratada em seu gabinete e parente de Adriano, foi indicação de seu assessor político, Fabricio Queiroz. Este, por sua vez, segundo relatório do COAF, procedeu com movimentações suspeitas nos valores de 1,2 milhões de reais entre janeiro de 2016 e 31 de janeiro de 2017, valores incompatíveis com salário de assessor parlamentar. Este relatório faz parte da operação “os intocáveis’ que prendeu deputados estaduais do rio de janeiro e o documento traz informações sobre movimentações financeiras suspeitas de assessores dos deputados, inclusive de Flavio Bolsonaro.

Ainda no que diz respeito às movimentações de Queiroz apontadas no relatório, uma das destinatárias foi Raimunda Veras Magalhães, mulher de Adriano, suspeito de chefiar o “escritório do crime” de atuação no empreendimento imobiliário irregular que desabou no Muzema e também da execução de Marielle Franco. A outra destinatária seria Michele Bolsonaro, atual primeira dama da república.

De acordo com o site “ o antagonista”, o presidente Jair Bolsonaro afirmou que o destinatário final dos depósitos feitos por Queiroz a sua esposa era ele, e que foram frutos de um empréstimo que teria feito ao ex – assessor de seu filho Flavio[10] e seu amigo pessoal.

Cabe observar que não apenas Queiroz era assessor de Flávio, mas sua mulher, Márcia Oliveira de Aguiar, e duas filhas, Nathália e Evelyn Melo de Queiroz, também eram empregadas no gabinete do então deputado estadual[11] durante o período de análise do relatório do COAF.

Ainda segundo a folha de SP[12], Flavio teria realizado 19 operações envolvendo imóveis durante seu mandato na ALERJ. Mesmo ramo econômico em que os supostos envolvidos no “escritório do crime” atuam no Muzema. E mais, a evolução patrimonial da família Bolsonaro se multiplicou durante os anos de suas atividades políticas como sinaliza a Folha de SP[13]

Recentemente, como foi apurado pela Folha de SP[14], Carlos Bolsonaro, também filho do presidente e irmão de Flavio, empregou outra pessoa ligada a Queiroz, Márcio da Silva Gerbatim, ex-marido da atual mulher de Queiroz durante 2008 e 2010. De onde saiu apenas para ser nomeado por Flavio como assessor, cargo que ocupou entre 2009 e 2011. No seu lugar, Carlos nomeou Claudionor Gerbatim de Lima, ex-assessor de Flavio.

Do espraiamento para outras atividades

Como visto no caso do “Escritório do crime”, os tipos de serviços prestados pelas milícias se expandiram. Além de extorquir moradores e comerciantes, os milicianos passaram a construir e vender casas. Eles invadem áreas, loteiam e vendem as construções, além de cobrar taxas de repasse aos que revendem o imóvel. Segundo matéria da Folha de São Paulo, o MP estadual e federal investigam denúncias de ocupações feitas em áreas de proteção ambiental na zona oeste do rio e em Duque de Caxias[15]

Com relação ao caso da milícia que atua no Rio das pedras e no Muzema, a reportagem de Sergio Ramalho, da Folha de SP[16], esclarece o grau de complexidade de atuação desse grupo. Eles utilizam laranjas que são sócios de construtoras e pagam propina para funcionários da prefeitura do Rio para conseguirem alvarás para as construções.

No que compete à atuação do judiciário em barrar esses empreendimentos, o prefeito Marcelo Crivella tem reclamado das liminares que impedem a demolição das construções irregulares [17]. Em especial no caso da Muzema, a desembargadora Marília de Castro Neves Vieira foi a responsável por impedir a prefeitura de derrubar os imóveis localizados na área em que ocorreu o desabamento. Esta mesma desembargadora se envolveu em uma polêmica no ano passado, quando por meio de suas redes sociais chamou a falecida vereadora Marielle Franco de bandida e divulgou noticia falsa de que ela seria ligada ao Comando Vermelho, facção de tráfico de drogas, e ainda  pediu o fuzilamento profilático de outro deputado do PSol, Jean Wyllys. [18]

De acordo com o professor José Cláudio, há registros da atuação da milícia no controle de quem é empregado nas obras do COMPERJ – Complexo Petroquímico em Itaboraí. As obras atraem a presença de empresas terceirizadas e ao perceberem a chegada dessas empresas, os milicianos controlam através da violência quem é empregado e passam a cobrar taxas para que as pessoas possam trabalhar nessas empresas.

Esta prática de cooptar funcionários e pegar parte dos salários destes, se assemelha bastante com o que se convencionou como “rachinha” realizados por políticos. Fabricio Queiroz, ex-assessor de Flavio Bolsonaro por exemplo, em petição endereçada ao MPRJ, relatou que o objetivo desta prática era ampliar a base eleitoral do político. Toda vez que um novo funcionário era empregado no gabinete sabia que teria que repassar, a ele, parte de seu salário para que fosse então repassado para pessoas que não estavam na folha de pagamento oficial.[19]

Ainda segundo o relato do sociólogo, ao saberem que o Ministério de pesca e agricultura não está mais fornecendo licença de pesca, eles abordam os pescadores em alto mar e passam a exigir valores mensais ou semanais para que eles continuem a atividade.[20]

 

[1] https://apublica.org/2019/01/no-rio-de-janeiro-a-milicia-nao-e-um-poder-paralelo-e-o-estado/

[2] https://theintercept.com/2018/07/16/o-lucrativo-exercito-de-seguranca-privada-comandado-por-militares-milicianos-e-amigos-de-eduardo-cunha-no-rio/

[3] https://extra.globo.com/casos-de-policia/moradores-da-praca-seca-tem-que-pagar-boleto-todo-mes-23589836.html?utm_source=Facebook&utm_medium=Social&utm_campaign=Extra&fbclid=IwAR1eHQmYaBwSuFN2yLo8PnCrUX2aDl7xeGyK4VBaU6mVoB30xD5FICnNIXw

[4] https://oglobo.globo.com/brasil/eleicoes-2006/eduardo-paes-elogia-acoes-de-milicias-de-pms-em-jacarepagua-5000337

https://oglobo.globo.com/brasil/jair-bolsonaro-defendeu-chefe-de-milicia-em-discurso-na-camara-23401641

[5] https://www.nexojornal.com.br/expresso/2018/04/10/O-que-s%C3%A3o-e-como-atuam-as-mil%C3%ADcias-do-Rio-de-Janeiro

[6] https://brasil.elpais.com/brasil/2019/03/09/politica/1552112171_521368.html

[7] https://brasil.elpais.com/brasil/2018/11/07/politica/1541621514_210694.html

[8] https://brasil.elpais.com/brasil/2016/07/21/politica/1469053544_610983.html

[9] https://g1.globo.com/rj/rio-de-janeiro/noticia/2019/04/12/milicianos-dominam-construcao-e-venda-de-imoveis-irregulares-na-muzema-onde-predios-desabaram.ghtml

[10] https://www.oantagonista.com/brasil/exclusivo-bolsonaro-diz-que-cheque-de-ex-assessor-para-primeira-dama-foi-pagamento-de-divida/

[11] http://agenciabrasil.ebc.com.br/politica/noticia/2019-01/mulher-e-filhas-de-queiroz-nao-comparecem-ao-ministerio-publico

[12] https://www1.folha.uol.com.br/poder/2018/01/1948527-filho-de-bolsonaro-negociou-19-imoveis-e-fez-transacoes-relampago.shtml

[13] https://www1.folha.uol.com.br/poder/2018/01/1948526-patrimonio-de-jair-bolsonaro-e-filhos-se-multiplica-na-politica.shtml

[14] https://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/agencia-estado/2019/04/15/carlos-bolsonaro-empregou-assessor-ligado-a-queiroz.htm

[15] https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2018/05/milicias-do-rio-invadem-e-loteiam-terrenos-para-expandir-extorsao.shtml

[16] https://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2019/04/17/escritorio-do-crime-usa-esquema-de-alvaras-para-manter-predios-irregulares.htm

[17] https://odia.ig.com.br/colunas/informe-do-dia/2019/04/5634142-desabamentos-na-muzema-expoem-irritacao-de-crivella-com-judiciario.html

[18] https://brasil.elpais.com/brasil/2018/03/20/politica/1521561716_720743.html

[19] https://www1.folha.uol.com.br/poder/2019/03/queiroz-diz-que-descentralizou-salarios-para-ampliar-gabinete-de-flavio-bolsonaro.shtml

[20] https://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Direitos-Humanos/As-milicias-crescem-velozmente-por-dentro-do-Estado/5/43599

Redação

7 Comentários

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  1. Posso estar enganado, quero estar enganado, mas essa organização vai crescer e se espalhar.
    Esse é o futuro do Brasil, o nosso futuro.
    Obra dos militares, no golpe de 64, que plantaram a miséria, a corrupção, a ignorância e a submissão aos estrangeiros. Plantaram isso e hoje colhemos esses frutos venenosos para nosso “deleite”.
    Tem conserto?
    Alguém acha que isso se acerta?
    Já é uma guerra.
    E, eu tenho comigo, que o projeto de poder do bozonaro está ligado a eles. Se ele pudesse ele seria o chefão da milícia (podem contar com “ele”, milicianos!).

    (E aqueles fuzis da Marinha americana, 117, fuzis m26 se não me engano?
    Caramba!, e se esses caras fizerem negócio com a CIA? Pois a CIA paga pra você trabalhar pra eles e “não exige nada”…
    Afinal somos todos patriotas, nós, os bolsominions, os milicianos, todos “nacionalistas!)

    1. Concordo, não vivi esse desastre de 64, mas quando procuro uma resposta para como o Brasil veio dar no que é sempre volto a essa fatídica data. A ganancia dos EUA afundou todo esse subcontinente.

  2. ´é o que fazem…
    criam o tal estado mínimo para
    maximizar seus lucros e crimes,
    ou: se não estivéssemos num estado
    de exceção, estariam todos presos….

  3. Pois é, só agora, depois de tirado o curativo paliativo, que se vê com clareza que a ferida estava feia, purulenta e mal-cheirosa. Bolsonaro deve estar arrependido de se candidatar a presidente, com certeza ganharia mais se tivesse continuado nas sombras do baixo clero parlamentar, onde estava acostumado há décadas. É que agora, exposto, corre o sério risco de ser defenestrado na medida em que outras instituições recobram algum senso de moral. Isso sem falar no povo, hein? Vai ser preciso cada vez mais pressão e violência para manter a pessoa comum em estado de alienação, ainda mais sem direito trabalhista, sem assistência médica, sem acesso à educação, sem previdência… sem dinheiro nem recurso nenhum.

  4. Segura a carteira!!!!! Poe o dinheiro na cueca!! A poliçada e os milicos estão roubando todo mundo. Não é mais a polícia do cantor Dicro que conhecemos.

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