Disputa por vagas no Supremo da Argentina: quem é quem e o Kirchnerismo

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
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*Professor Adjunto de Ciência Política do Bacharelado em Políticas Públicas da Universidade Federal Fluminense (UFF), no Instituto de Educação de Angra dos Reis (IEAR). É pesquisador do Instituto de Ciência e Tecnologia em Políticas Públicas, Estratégias e Desenvolvimento INCT-PPED

Do JOTA

A escolha e a designação de ministros para uma Alta Corte são uns dos temas mais debatidos atualmente na Argentina a partir da indicação, por decreto, de dois ministros pelo novo presidente Mauricio Macri. Quem ocupava as últimas vagas abertas? O que aconteceu com as outras vagas extintas?

As duas vagas em disputa

Com a aposentadoria do magistrado Raul Eugenio Zaffaroni no final de 2014 e a recente saída do ministro Carlos Fayt em 15 de dezembro de 2015, a Corte Suprema Argentina ficou com apenas com três dos cinco magistrados previstos pela lei. As duas vagas preenchidas pelo presidente Macri têm uma história recente.

1 – Magistrado Carlos Fayt

Em 10 de dezembro de 2015, o mais longevo dos ministros anunciou que deixaria seu cargo no dia 15 de dezembro. Assim, depois de 32 anos na Corte Suprema (ele foi designado por Alfonsín em 1983), o magistrado de 97 anos finalmente deixou seu posto. Durante grande parte do ano de 2015, a partir de pressões políticas, o governo de Cristina Fernandez de Kirchner tentou tirar o magistrado da Alta Corte. O principal motivo foram dúvidas quanto à capacidade do magistrado de desempenhar seu papel de forma correta. Acusavam-no de participar de forma marginal das atividades, visitando apenas esporadicamente a Alta Corte.

No entanto, segundo um estudo de Gustavo Arballo (LINK), Fayt foi o ministro que menos votou em conformidade ao governo dos Kirchner, em menos de 20% dos casos. Ali residem grande parte dos desejos de trocar o juiz. Mas, Fayt resistiu aos embates do oficialismo, ficando no cargo até saber quem seria o próximo presidente. Uma demonstração que os ministros se movimentam de forma estratégica. A luta pela vaga de Fayt foi umas das últimas estratégias do governo de Cristina Kirchner antes das eleições presidenciais para tentar assegurar alguma vaga na Corte.

http://chequeado.com/el-explicador/la-corte-frente-al-gobierno-1984-2014/

2 – Magistrado Raul Eugenio Zaffaroni

Indicado pelo ex-presidente Nestor Kirchner em 2003, Raul Eugenio Zaffaroni, reconhecido jurista argentino, entregou uma carta à presidenta da República declarando sua renúncia como ministro da Corte Suprema no final de outubro de 2014. Nela, ele descreve os motivos da saída, mas o principal é o dispositivo legal: o limite de idade (75 anos) determinado pela Constituição (LINK). O limite de idade foi respeitado pelo magistrado, à exceção de Fayt, que lutou na justiça desde a reforma constitucional de 1994 para continuar na Alta Corte.http://www.telam.com.ar/notas/201410/83647-eugenio-zaffaroni-renuncio-a-la-corte-suprema.html

Zaffaroni, diferente dos outros ministros da Corte, foi e é partícipe de alguns encontros da associação Justiça Legítima, uma entidade da sociedade civil, integrada majoritariamente por personalidades do âmbito judiciário, que tem por objetivo a democratização do Poder Judiciário. A associação apoiou ativamente as criticadas reformas realizadas pelo Kirchnerismo em 2013, e sempre se colocou contra a corporação judicial. A posição de Zaffaroni colaborou para que a oposição ao Kirchnerismo o considerasse um respaldo do governo na Corte. Outros setores, pelo contrário, só salientam o profissionalismo e o respeito internacional do jurista.

Outras vagas extintas

No dia 12 de outubro de 2014 faleceu Enrique Petrachi, ministro da Alta Corte Argentina, designado pelo presidente Alfonsín em 1983. Ainda em 2014, já havia falecido, em 11 de maio a ministra Carmen Argibay, indicada por Nestor Kirchner em 2004. Desta forma, nos últimos meses do ano 2014, a Corte Suprema passou de 7 a 4 ministros. Em 2006 foi promulgada a lei n.26.183 onde se estabeleceu a redução gradual dos ministros da Alta Corte de sete até chegar a cinco integrantes. Atualmente, a Corte é composta pelos ministros Ricardo Luis Lorenzetti e Elena I. Highton de Nolasco, ambos indicado pelo Nestor Kirchner em 2004; e Juan Carlos Maqueda nomeado pelo presidente provisório Eduardo Duhalde em 2002.

O candidato Kirchnerista que não foi.

Para preencher a vaga do ministro Zaffaroni, no final de 2014, a presidenta Cristina Fernandez de Kirchner decidiu mover-se rapidamente. Nos primeiros dias de janeiro de 2015, o governo apresentou o novo candidato para a vaga de ministro da Corte Suprema de Justiça Nacional (CSJN). Em 30 de janeiro, saiu no Diário Oficial a candidatura de Roberto Carlés, carimbando o lançamento de uma nova luta política. Em uma semana, uma catarata de opiniões e declarações a favor e contra o indicado surgiram todos os meios de comunicação.

Carlés é um jovem advogado de 33 anos, com sólida formação e fortes vínculos com o governo. Foi o coordenador da comissão que elaborou o projeto de reforma do Código Penal em 2014. É penalista (um perfil inexistente na Corte atual) e tinha apoio do recém-saído ministro, Eugenio Zaffaroni.

Porém, a nomeação do Carlés foi paralisada pela oposição. Em 28 de novembro de 2014, 28 senadores nacionais assinaram um documento que rejeitava qualquer proposta de um candidato oficial para a Alta Corte. O argumento central: não iriam escolher um novo ministro até terminar o processo eleitoral de 2015. De acordo com os senadores, a declaração também era uma medida para evitar que o governo de Cristina continuasse sua expansão e dominação sobre o poder judiciário argentino. Finalmente, depois do primeiro turno das eleições presidenciais, em outubro de 2015, a presidenta Cristina Fernandez de Kirchner pediu para retirar o candidato da lista.

Com as indicações bloqueadas, a presidenta Cristina sabia que havia perdido a possibilidade de contar com dois ministros na Alta Corte nacional. Apesar da maioria no Senado, não conseguiu preencher nenhuma das vagas novas. Isso significa que a oportunidade ficou nas mãos do presidente ingressante no cargo, Mauricio Macri. Por sua orientação ideológica, Macri deve olhar para a Corte a partir de pautas determinantes a seu projeto político, como a Lei de Mídia. É esperado que essas questões estejam no centro de suas indicações para o tribunal.

Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

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