O fator emocional nos julgamentos políticos, por Janio

O mensalão no banco dos réus

Janio de Freitas, Na Folha de S. Paulo

O que acontecer, não nos equivoquemos, será de importância extrema para o futuro da democracia

O ministro Ricardo Lewandowski confirma para esta semana a entrega do seu relatório-revisor do processo do mensalão. Este prazo que ele se deu custa-lhe trabalho dia e noite, e em todas as situações possíveis. Por seu desempenho no Supremo, Lewandowski é um nome que significa serenidade, equilíbrio e segurança. Três fatores essenciais nesse julgamento tão especial. O que nele aconteça, não nos equivoquemos, será de importância extrema para o futuro da democracia no Brasil.


Enquanto o caso do mensalão fervilhou, suas muitas verdades conviveram com muitas deformações, decorrentes do ambiente emocional que explodiu nos meios de comunicação. E que logo se estendeu à CPI, tanto pelo estímulo à oposição esperançosa de ferir Lula de morte, como pela desfaçatez com que muitos atingidos, e mais ainda seus aliados, repeliam as evidências e os indícios. Tudo isso, além da gravidade descomunal do caso em si.

Muitas CPIs têm sido perturbadas pela influência do fator emocional. É assim desde ao menos a esquecida “república do Galeão”, em que oficiais da FAB puseram-se nos papéis de CPI, polícia e Judiciário a propósito, no clímax das emoções, do atentado ao seu ídolo Carlos Lacerda por guarda-costas de Getúlio, à revelia deste. A democracia não se reabilitou, apenas resistiu até 1964.

Mais para cá, como exemplo fácil da emocionalidade perniciosa, os jardins da “casa da Dinda” foram tratados pela imprensa como se fossem os próprios Jardins Suspensos da Babilônia, o que os elevou a mais uma prova exaltada do deslimite de Collor. Só muito depois se soube, com desinteresse, que era apenas um jardim como milhares de outros com o gosto duvidoso dos novos-ricos. Mas as emoções já estavam então pacificadas e desmemoriadas.

A fase incandescente do mensalão cumpriu em alto estilo a regra das emoções influentes. Não pelos deputados em lágrimas, nos discursos de desespero e apelo como o de Sandro Mabel. Ou na pressão sobre interrogados, como o constrangimento da senhora de ar respeitável, apenas secretária na agência de Marcos Valério, a quem perguntaram de sua relação “com uma cafetina de Brasília”.

Essas eram as emoções pessoais. As outras, influentes, junto às verdades, imputaram culpas improváveis, transferiram responsabilidades, estenderam participações sem mais base e motivo do que a própria emocionalidade. Embora os fatos reais e frios não precisassem desse complemento perigoso, porque deformador.

São 39 réus. Considerados em cerca de 50 mil páginas desse bem chamado processo histórico. O anterior e o atual presidentes do Supremo, ministros Cezar Peluso e Ayres Britto, já disseram inúmeras vezes que o tribunal fará um julgamento técnico. É preciso que seja assim, mesmo. Já a partir da acusação a ser feita pelo procurador-geral da República, Roberto Gurgel.

Esse, contrariamente ao considerado, é um processo essencialmente político. Opõe o conservadorismo que se valeu e pode voltar a valer-se do grave erro de parte das forças reformistas e, no outro lado, o reformismo, mesmo o reformismo de baixo teor que se revelou.

As pressões estão ativadas. Cada ministro, no Supremo, tem que julgar o mensalão com a mais absoluta isenção política. Do contrário, não estaria julgando, mas fazendo política. E sabemos o que os tribunais estão fazendo de fato, quando fazem política.

Luis Nassif

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