Como os presidenciáveis querem governar (ou não) para as mulheres?

Ana Gabriela Sales
Repórter do GGN há 8 anos. Graduada em Jornalismo pela Universidade de Santo Amaro. Especializada em produção de conteúdo para as redes sociais.
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Mulher = maternidade 

por Alunos da FESPSP – Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo

como as mulheres aparecem/desaparecem nas Propostas dos Candidatos à Presidência nas Eleições 2018?

O objetivo aqui é analisar as propostas dos 13 candidatos à presidência da República a partir dos pontos prioritários definidos pela ONU Mulheres:

  • Liderança e participação política das mulheres;
  • empoderamento econômico;
  • fim da violência contra mulheres e meninas;
  • paz e segurança e emergências humanitárias;
  • governança e planejamento;
  • normas globais e regionais.

Para tanto, foi verificado o número de páginas que cada candidato/coligação registrou como Proposta de Governo no Sistema do TSE. No site também estão disponíveis informações sobre prestação de contas dos candidatos, estatísticas de candidaturas, doadores e fornecedores de campanhas, entre outras questões, veja (aqui).

De modo geral, os documentos não constam das pautas relevantes nacionalmente. Dentre elas, os direitos das mulheres. Em sua maioria as propostas são genéricas e não tratam a especificidade da luta das mulheres. Pouco foi abordado em relação à violência contra a mulher, sua posição e lutas pela igualdade no mercado de trabalho, direitos sexuais e direitos reprodutivos, representatividade no cenário político e consequente fortalecimento nos espaços de poder e decisão, sendo estas iniciativas fortemente abordadas pela ONU Mulheres.

Em matérias publicadas em diversos veículos, é comum ver candidatos, ao serem questionados sobre tais ausências, responderem que os planos de governo são resumidos. Ou resumido é o espaço que que a política brasileira determina para mulher?

Comparados os 13 planos dos candidatos à presidência a partir da frequência de palavras “feminino”, “mulher” ou “mulheres” nas propostas registradas no TSE, tem-se o seguinte resultado gráfico:

Tal gráfico evidencia que os candidatos com maior número de menção as mulheres são: Guilherme Boulos (125), Ciro Gomes (41) e Fernando Haddad (34). Os candidatos, Cabo Daciolo, Eymael e João Amôedo, não mencionam a palavra “mulher em seu plano de governo.

Na sequência uma síntese de acordo das metas prioritárias da ONU e o que consta no programa dos candidatos, segundo TSE, já mencionado o link.

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A forma como cada um dos candidatos menciona as mulheres em seus planos de governo, o tipo de soluções e metas que propõem e quais abordagens utilizam, foi colocado como “Anexo”, por candidato, em ordem alfabética, para os que querem o detalhamento da análise dos programas.

Aqui importa à análise sobre tais propostas no que diz respeito aos direitos das mulheres enquanto projeto que caminha para paridade de gênero, meta da ONU 2030.

Se fosse sintetizar os programas dos candidatos em uma palavra, os que os unifica é “MATERNIDADE”. Isto para os mencionaram a palavra “mulher”. Em três deles ela é, no mínimo, ausente.

O papel da maternidade sempre foi tema do debate político. Alguns perguntam: “quem cuidará dos filhos se as mulheres forem para política?”. Isso, por si, justifica uma série de práticas históricas de exclusão da participação das mulheres na política, no Brasil e no mundo.

A questão da mãe é recorrente da política sempre que o sentido for atribuir “cuidado”, “amor”, ou qualquer outra que o marketing (político) capte do imaginário social e que possa gerar maior engajamento3. Exemplos: “Dilma, mãe do PAC”, “Evita, mãe dos pobres”, “Tereza de Calcutá, mãe dos pobres”, entre outras mulheres que lideraram diferentes territórios.

Os alemães tratam Angela Merkel como mãe (“mutti”), e é público que não têm filhos. O que não impediu que oponentes políticos tentassem politizar o tema: em 2005, quando Merkel concorria contra seu antecessor, Gerhard Schröder. A mulher deste, Doris Schröder-Köpf, comentou que ela “não personificava, com sua biografia, as experiências da maioria das mulheres” – em uma clara referência à ausência de filhos.”

Tal cobrança da “função maternidade” perpassa corações e mentes de mulheres casadas, solteiras, divorciadas, com ou sem filhos, entre outras designações. O fato é que existe uma cobrança social para que a mulher assuma “seu papel reprodutivo” (mesmo que não se garanta assistência para isso), caso bastante discutido pelo Estado, Igreja e demais instituições e pouco debatido por mulheres. Tema para outros artigos/TCCs devido a complexidade de fatores que o envolvem.

Voltando para representação da mulher na política, o Brasil ocupa a 152ª posição no ranking Interparlamentar, ficando atrás de todos os países latino-americanos, tendo 16% de representação no Senado e 10,5% na Câmara Federal. Desde a aprovação da Lei de Cotas (70% a 30% de gênero) as mulheres têm integrado listas enquanto candidatas nas eleições proporcionais, apenas atendendo exigência da legislação eleitoral. Portanto, ficando com a menos cota (30%) e sem comprometimento por parte dos Partidos de eleger efetivamente tal percentual. Em 2018 foi determinado que o mínimo de 30% dos recursos do fundo partidário fossem destinados à campanha das mulheres, questão que deve ser fiscalizada pelo TSE/TREs, eleitores como um todo e, principalmente, pelas mulheres.

As mulheres são a maioria do eleitorado brasileiro (53%), pelas pesquisas de opinião, são a maioria dos indecisos, e possivelmente sejam a variável determinante na eleição de 2018. Isso é o mínimo que pode ser dito para que as eleitoras (mulheres, para frisar) não somente leiam os programas de governo dos candidatos, mas também escolham aqueles comprometidos com a especificidade de suas lutas. Do contrário, talvez daqui a 100 anos o Brasil se aproxime do que conquistaram “As Sufragistas” inglesas há exatos 100 anos atrás.

Assinam este artigo os alunos: Beatriz Ramires de Britto, Camila P. Monteiro Costa, Danilo de Oliveira Romano, Débora Toniolo, Felipe Pragmacio Travassos Teles, Ivair J.A. Junior, Julia Isabel Miranda Travaglini, Jimmy Augusto Moreira Pitondo, Jusuá Jihad Alves Soares, Kathleen Ângulo, Larissa Regina Ramos da Silva, Marcela Pereira Pedro, Mariana de Camargo Rodrigues, Rodrigo da Silva Pereira, Rosimeire da Silva dos Anjos, e a professora Jacqueline Quaresemin, Pós-Graduação em Opinião Pública e Inteligência de Mercado – Disciplina de Opinião Pública e Pesquisa Eleitoral, na FESPSP.

ANEXO
 
(síntese das propostas dos candidatos na questão de políticas para mulheres)
 
Álvaro Dias (Podemos): Apresenta o plano de 19 metas inspiradas no plano de metas do ex- presidente Juscelino Kubitschek (1956-1961). A única menção à mulher está localizada no tópico de “Família Unida”, no qual indica que dará acesso universal a creches para as mães que trabalham. Ou seja, apenas no contexto da maternidade. Não há menção a nenhuma das áreas prioritárias indicadas pela ONU Mulheres.
 
Ciro Gomes (Partido Democrático Trabalhista – PDT): A proposta de governo do candidato inclui um capítulo intitulado ‘Respeitar a todos os brasileiros’, que aborda a inclusão de grupos minoritários como mulheres, negros, comunidades LGBTI e pessoas com deficiência.
 
Tratando-se especificamente das mulheres, o programa apresenta três páginas que contemplam áreas como a participação na política institucional, o mercado de trabalho, a formação, a saúde e a diminuição da violência contra à mulher. Entre as principais propostas estão: a recriação da Secretaria das Mulheres; a eliminação do uso de material de ensino e educação estereotipados, que reforçam o papel da mulher como menos apta ao mundo da produção ou mais aptas à esfera doméstica; garantia de condições legais e de recursos para a interrupção da gravidez quando ocorrer de forma legal (ponto sensível para mulheres) e o fortalecimento dos programas de treinamento dos profissionais de saúde e da polícia voltados para atender mulheres vítimas de violência.
 
Entre os pontos listados pela ONU Mulheres, o único que não está especificado nas propostas do candidato é o que trata do direito à terra, enquanto outros como enfrentamento ao racismo, sexismo e lesbofobia e também a igualdade para mulheres com deficiência são abordados em outros itens do mesmo capítulo não voltados somente às mulheres. De forma geral, as propostas do candidato em relação ao tema estão claramente descritas em seu programa, embora misturados, desconsiderando a especificidade da luta das mulheres.
 
Fernando Haddad (Partido dos Trabalhadores – PT): O candidato menciona às mulheres em seu plano de governo e traz propostas que envolvem saúde, política, maternidade, segurança e trabalho.
 
“Maternidade” é o tema mais abordado por todos os candidatos. Haddad propõe aumentar o valor e o tempo do seguro-desemprego para gestantes e lactantes e ampliação de creches. Não há detalhamento de propostas sobre creches com tempo integral.
 
Apresenta propostas de inserção da mulher no campo político com a proposta de recriar Ministério dedicado aos direitos da mulher, além de mencionar a paridade de gênero em instâncias de decisão e poder. Também coloca as mulheres como prioridade em lotes de assentamentos nos programas de reforma agrária.
 
Traz o aspecto do empoderamento econômico, abordado pela ONU Mulheres e propõe a autonomia econômica, visando igualdade de oportunidades e isonomia salarial no mercado de trabalho, incentivando a produção nos campos ciência e tecnologia para mulheres, assim como o empreendedorismo e a tomada de crédito para fortalecimento da agricultura familiar.
 
Em seu plano, Haddad também se compromete com medidas preventivas de proteção e de atenção às mulheres no enfrentamento do feminicídio.
 
Geraldo Alckmin (Partido da Social Democracia Brasileira – PSDB): Em suas nove páginas de plano de governo, o candidato concentra suas propostas para as mulheres nos temas de maternidade e segurança.
 
Em maternidade, o candidato propõe estratégias educativas para prevenir a gravidez precoce e apoio integral no caso de gestação, mas não indica qual tipo de apoio. Já sobre o tema violência, Geraldo Alckmin insere as mulheres com outros atores sociais e propõe o combate à violência e promoção do respeito às mulheres, idosos e minorias. Tudo muito genérico.
 
O candidato não menciona propostas sobre participação política da mulher em seu governo, ou instâncias de poder e decisão, nem mesmo autonomia econômica. Em relação às áreas prioritárias de trabalho da ONU Mulheres, o candidato menciona apenas o combate à violência.
 
Guilherme Boulos (Partido Socialismo e Liberdade – PSOL): O candidato é um dos que apresenta a maior quantidade de linhas dedicadas aos direitos das mulheres em seu plano de governo.
 
Aborda trabalho, igualdade salarial, redução desigualdade de gênero e discriminação no mercado do trabalho e proteção legal às empregadas domésticas.
 
Em saúde, propõe políticas de atenção integral à saúde da mulher, respeitando às mulheres lésbicas, bissexuais e transexuais. Fala também sobre maternidade e apresenta a proposta de ampliação do acesso das crianças às creches. Propõe a descriminalização e legalização do aborto. Propõe o enfrentamento da violência contra a mulher por meio de pactos nacionais e instituições referenciadas sobre o tema.
 
Boulos também propõe o fortalecimento dos espaços de poder e decisão, reforma eleitoral para a maior participação política, temas abordados pela ONU Mulheres. O candidato comenta em seu plano de governo a diferença de participação e envolvimento dos homens e mulheres no esporte, embora não apresente proposta nesse quesito. Propõe espaços de discussão para enfrentamento do racismo, sexismo e lesbofobia.
 
De modo geral, é o plano de governo com maior amplitude de propostas para as mulheres.
 
Henrique Meirelles (Movimento Democrático Brasileiro – MDB): O candidato menciona às mulheres em seu plano de governo em duas propostas: concentradas na maternidade, quando propõe a criação do Pró-Criança para que as famílias coloquem seus filhos em creches particulares e, propõe o incentivo à redução da diferença salarial entre homens e mulheres por meio da nova lei do trabalho aprovada em 2017. Não há efetivamente propostas alinhadas aos temas abordados pela ONU Mulheres.
 
Jair Bolsonaro (Partido Social Liberal – PSL): Em todo o plano de governo do candidato, somente dois pontos são citados na temática “mulheres”. Um deles é relacionado à violência contra a mulher e sugere o combate ao estupro de vulneráveis. Também é citado de forma genérica um programa neonatal para que a gestante tenha visitas ao dentista como forma de prevenção aos nascimentos de prematuros. Ambas propostas não possuem planos e metas para que sejam efetivamente concretizadas e passam distante dos planos de ação da ONU Mulheres.
 
João Goulart Filho (Partido Pátria Livre – PPL): Nas suas 14 páginas de plano de governo, o candidato João Goulart Filho do Partido Pátria Livre (PPL) dedica seis parágrafos para tratar das mulheres. Ele concentra o tema em três contextos: aborto, trabalho, violência e, sobretudo, maternidade.
 
Segundo o candidato, cabe ao Estado proporcionar às mulheres todas as garantias para que possam se desenvolver plenamente. Diz que o principal termômetro de avanço ou atraso de uma sociedade é a situação da mulher. Fala que a maternidade não pode ser uma carga que impeça a mulher de trabalhar, estudar, se realizar e que a licença maternidade deve ser um momento de realização da mulher, mas não aponta nenhuma medida para efetivar tal percepção. Já sobre o aborto, diz que o Estado deve conceder acesso aos meios anticoncepcionais modernos e que é evidente que o dispositivo do Código Penal que pune a mulher que fizer um aborto induzido com três anos de prisão tem que ser abolido, mas confirma que a punição do aborto deve ser apenas para os casos previstos em lei (ponto sensível para mulheres).
 
João Goulart também traz dados sobre a participação da mulher no mercado de trabalho e a disparidade de salários e diz que aprovará no Congresso uma lei estabelecendo salário igual para trabalhos iguais com as devidas punições a quem infringi-la. Também fala da redução da carga de trabalho das mulheres para apoiar as famílias e desenvolvimento de equipamentos sociais que reduzam tarefas domésticas. Ainda menciona apenas a mãe para o aumento da licença maternidade para que ela possa cuidar do filho durante um ano. E diz que irá zerar o déficit de creches e assegurará creches com horários integrais. Sobre violência contra mulher, a solução apontada em seu plano de governo é combater com mais policiamento específico: polícia e delegacias femininas.
 
Todavia, o plano de governo do João Goulart não aborda a liderança feminina, novas normas ou sobre medidas para o fim da violência contra mulheres e meninas, nem mesmo estratégias para desenvolvimento econômico, aspectos considerados pela ONU Mulheres.
 
Marina Silva (Rede Sustentabilidade – REDE): O plano de governo da candidata traz propostas relacionadas às mulheres de maneira integrada com as outras áreas do documento.
 
Marina propõe o aumento do tempo de licença paternidade e a construção de um modelo que possibilite o compartilhamento dos períodos entre mães e pais, sem prejuízo ao já conquistado na licença maternidade.
 
Ainda no tema maternidade, a candidata propõe ampliação de ofertas de creches e espaços em tempo integral, sendo esta a proposta mais comum entre todos os candidatos que abordaram o tema.
 
Marina também propõe o aumento da inserção das mães no mercado de trabalho e diz que irá apoiar o empreendedorismo feminino. Também ressalta o fortalecimento do direito à igualdade, a autonomia e liberdade das mulheres, com políticas que enfrentem a discriminação no mercado de trabalho, com o objetivo de garantir igualdade salarial para mulheres e homens que exerçam as mesmas funções e a ampliação da participação de mulheres em cargos e posições de tomada de decisão.
 
Nas propostas relacionadas à saúde da mulher, menciona a ofertas de contraceptivos pelas farmácias populares e estímulo ao parto humanizado, bem como a efetividade dos Programa de Planejamento Reprodutivo e Planejamento Familiar fortalecendo os vínculos com as famílias em seus diferentes arranjos e pluralidades.
 
Prevenção à violência contra a mulher, o combate ao feminicídio e a qualificação da rede de atendimento às vítimas também são listados nas propostas. O plano de governo da candidata possui maior alinhamento com os temas de trabalho da ONU Mulheres.
 
Vera Lucia (Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado – PSTU): Vera Lucia propõe defender a mulher trabalhadora e combater todo tipo de violência. Propõe a regulamentação do nome social, despatologização da transexualidade, igualdade de direitos, salários e aborto livre, mas não apresenta medidas e/ou estratégias.
 
Ana Gabriela Sales

Repórter do GGN há 8 anos. Graduada em Jornalismo pela Universidade de Santo Amaro. Especializada em produção de conteúdo para as redes sociais.

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